Revisada por: Saturno 🪐
Última Atualização: 06/06/2025.— E aí, Theseus, quem você acha que vai ganhar o jogo hoje, os Falcões de Falmouth, ou as Harpias de Holyhead? — um dos seus colegas de trabalho perguntou, enquanto Theseus arrumava suas coisas na maleta. — Você vai ver o jogo hoje, não é?
— Eu não estava planejando…
— Qual é, todos daqui vão! — Outro colega o cutucou, e mais alguns se juntaram à rodinha para o convencer a ir.
— Tudo bem, eu irei.
— Ótimo, vamos todos nos encontrar para irmos juntos. — Theseus escutou as instruções passadas pelos homens e se despediu. Ele nunca mais tinha permitido se divertir daquela forma, então por que não?
E ele o fez. Compareceu na hora marcada e foi ver o jogo com os outros. Ele nem torcia para um dos dois times, seu time favorito era o Vespas de Wimbourne. Era o de Leta também. Mas não, ele não podia pensar nela agora. Não quando só estava fazendo aquilo, não para esquecê-la, mas para conseguir viver sabendo que ela nunca mais iria voltar para ele. E até que havia funcionado naquela noite. E nas noites posteriores. Mais meses se passaram, e ele pôde aceitar que aquela era sua vida agora, teria que conhecer pessoas novas e, quem sabe, se interessar por alguém. Vez ou outra, ele recebia cartas de seu irmão e dos outros, mas nunca alguma notícia de Grindelwald. Talvez, enfim, tudo realmente tivesse acabado. Foi por pensar assim que Theseus se surpreendeu ao ver a inconfundível maleta marrom atravessar pela porta de seu escritório junto de seu dono, que havia dito em sua última carta que planejava ficar mais alguns meses na Mongólia.
— Newt? Que surpresa boa! — Ele se levantou imediatamente da cadeira com um sorriso largo, deixando a papelada de lado, e abraçou o irmão, que não aparentava estar tão animado assim. — Aconteceu alguma coisa para você lembrar que tem um irmão e voltar para a Inglaterra?
— Na verdade, sim… Dumbledore quer nos ver, agora.
— Você acha que…
— Ele não informou na carta, só disse o local que vamos nos encontrar. — Theseus engoliu em seco. Estava certo de que seria sobre a volta de Grindelwald.
— Então vou notificar que tenho que sair mais cedo hoje e vamos direto para lá. — Newt assentiu com a cabeça, e eles saíram da sala a passos largos.
— Não tenho muitas lembranças boas daqui. — Ele notou um sorriso tímido surgir no rosto de seu irmão. Poderia dizer até melancólico. — Por que aceitou voltar?
— Como assim? Eu sempre quis ser auror, Newt.
— Eu sei, mas… podia ter vindo comigo, se quisesse. — Estava claro que ele falava aquilo por causa de Leta, mas Theseus decidiu encarar aquilo com bom humor.
— E arriscar me encontrar com criaturas parecidas com aqueles Explosivins? Não vou me submeter a outra dança ridícula daquelas.
— Você dançou bem. Se não tivesse dançado, provavelmente estaríamos mortos.
— Bom, fico feliz que reconheça minhas habilidades. — Theseus inclinou a cabeça levemente, com um sorriso brincalhão surgindo no rosto.
Eles seguiram até o restaurante indicado por Dumbledore e, enquanto esperavam, decidiram se atualizar das últimas novidades, Theseus contando que finalmente conseguia acompanhar algumas partidas de quadribol dos Vespas.
— Mas e aí, como está sendo essa turnê de bichos estranhos? — ele perguntou, mudando de assunto.
— Eu encontrei animais muito interessantes, na verdade. Consegui trazer algumas amostras para estudar melhor, mas deixei Bunty lá para ficar cuidando de alguns, já que pretendo voltar para continuar minha pesquisa quando tudo isso acabar.
— E o Qilin, ainda está aí?
— Sim, eles acharam melhor eu ficar com ela e procurar por mais algum, para preservar a espécie…
— Newt, Theseus! — Os dois se viraram e se levantaram ao escutar a voz de Dumbledore vinda da porta do local, cumprimentando o mais velho, que se sentou de frente para eles na mesa.
— Quanto tempo, professor.
— Que bom ver vocês. Eu queria que o motivo da nossa reunião fosse outro, mas infelizmente surgiram boatos de que Grindelwald e seus seguidores vão agir logo.
— Mas sabe onde eles estão agora? — Theseus perguntou, e Dumbledore assentiu de leve.
— No Brasil, provavelmente para…
— Tentar um atentado contra a Vicência Santos — Newt completou. — Quando vamos?
— Vocês não vão poder aparatar, é muito longe, então precisam pegar um navio para lá o quanto antes. Eu vou assim que possível, preciso resolver umas coisas antes, mas vou mandar algumas instruções para vocês. Eu mandei uma carta para os outros, então, assim que vocês chegarem, provavelmente eles vão estar esperando no porto. — Os dois assentiram e, depois de um tempo, se despediram de Dumbledore.
E, como ele havia os instruído, partiram no navio, chegando ao Brasil alguns dias depois. Assim que descem da embarcação, avistaram Lally sentada num dos bancos, lendo o que parecia ser o jornal diário.
— Eulalie — Theseus falou, com um sorriso, cumprimentando a mulher com um abraço, seguido de Newt.
— Se não são os irmãos Scamander. Temos tanta coisa para conversar.
— E os outros? — Newt perguntou, olhando ao redor, após perceber que só havia ela lá.
— Eles estão em um lugar seguro, preferi vir sozinha para não levantar suspeitas. Vamos?
Então eles assentiram e a seguiram. Theseus sempre havia visto várias fotos do Brasil, mas nunca imaginava o quão bonito era aquele lugar. O ambiente ensolarado contrastava perfeitamente com o frio de Londres. Eles chegaram até uma região mais isolada e coberta por vegetação, e Lally os guiou até uma casa no meio da floresta.
— Você já conhecia aqui? — Theseus perguntou, e ela assentiu, abrindo a porta e dando de cara com os outros.
— Eu ajudei o dono daqui com um lance e ele ficou me devendo um favor.
— Vocês chegaram! — Jacob correu para abraçar os dois, seguido dos outros, e Theseus percebeu o irmão olhar ao redor discretamente.
— Ela não veio, mas disse que irá nos encontrar em breve. — Queenie apoiou a mão no ombro de Newt e deu um sorriso reconfortante. — E não, eu não posso evitar ler os seus pensamentos. — Ele riu de leve ao perceber o rosto levemente vermelho do outro.
— É realmente muito bom ver vocês. Mas, por acaso, alguém tem alguma ideia do que vamos fazer agora? — Yusuf perguntou, após cumprimentar os dois.
— Hoje, esperamos. E amanhã vamos investigar alguns lugares que Dumbledore pôs nessa lista. — Newt levantou um pergaminho de seu bolso, o mostrando para todos.
Eles decidiram se dividir em turnos para evitar alguma surpresa desagradável, e Theseus e Newt acabaram ficando com o turno da noite. Enquanto o magizoologista cuidava dos animais dentro da maleta, Jacob decidiu fazer companhia para o outro antes de ir dormir.
— E aí, Jacob, como está o casamento?
— Está melhor impossível. Ela se arrepende todos os dias de ter se juntado a Grindelwald, mas eu falo que o importante é termos ficado juntos.
— E… filhos?
— Bom, lá nos Estados Unidos não é permitido ter filhos mestiços, então estamos pensando em nos mudar para a Inglaterra.
— Vão ser muito bem vindos lá. — Newt surgiu da maleta e a fechou rapidamente, se virando para os dois homens. — Terminei, obrigado por ficar aqui, Jake.
— Sem problemas. Qualquer coisa, avisem. Não prometo que vou acordar, mas no que eu ajudaria também? — Ele saiu rindo e os deixou sozinhos.
— Newt, devia limpar esse rosto, tá cheio de…
— Cocô de Bezerros Apaixonados.
— Ah, sim.
— Vou tirar agora. — Theseus assentiu com a cabeça e se levantou para fazer uma ronda pelo lado de fora da casa. — Cuidado, eu já ouvi falar das criaturas daqui, elas não têm a fama de serem amigáveis.
— Pode deixar… Lumos. — Ele deixou a casa e a pouca luz que saía da varinha não era o suficiente para iluminar toda a escuridão da floresta. — Lumus Maxima! — Após rodear toda a área externa da cabana, Theseus voltou no sentido da porta, mas, antes que pudesse entrar, ouviu algo na escuridão e decidiu investigar, se movendo cautelosamente pela floresta, com os sentidos aguçados para qualquer sinal de perigo. O ar estava denso com a umidade tropical e a vegetação ao redor sussurrava com o vento suave. Foi quando ele a viu. Uma figura envolta em um manto escuro, se movendo furtivamente entre as árvores. Com a varinha em punho, ele se aproximou silenciosamente por trás dela.
— Não se mova. — Sua voz era baixa, mas firme, e a pessoa se virou em sua direção, levantando as mãos em sinal de rendição, o fazendo perceber a varinha em sua mão direita. — Quem é você? — ele perguntou, tentando ver seu rosto por baixo do capuz.
— Não sou sua inimiga — a voz feminina respondeu calmamente, apesar de Theseus notar uma ponta de ironia em seu tom.
— Olha só, minha paciência tá acabando e… — Antes que ele pudesse terminar a frase, um grito agudo cortou o ar, vindo de cima das árvores.
— Merda… — Ele a escutou sussurrar.
— Você pode colaborar comigo, ou podemos esperar o dono desse grito aparecer.
— Tá legal, eu vou com você, mas temos que ir agora! — Suas mãos desceram o capuz, revelando uma mulher de cabelos castanhos escuros, que estavam presos em um rabo de cavalo. Theseus havia ficado um pouco impactado com sua beleza exótica, mas outro grito chamou sua atenção novamente. — Eu não me rendi para ser morta. Se quiser ficar aqui, tudo bem. — Ela fez menção de correr, mas Theseus agarrou seu braço e pegou a varinha de sua mão.
— Eu quem dou as ordens aqui!
Os dois correram até a porta da casa e Theseus a fechou rapidamente, apontando a varinha novamente na direção da moça e esperando até que Newt aparecesse na sala.
— O que aconteceu?
— Ela estava nos espiando. É melhor acordar todos, Newt, podem ser eles.
— Eles quem?
— Escuta aqui, nós fazemos as perguntas. — Theseus interrompeu a mulher, enquanto Newt fazia o que ele havia mandado. — Tem mais quantos de vocês lá fora?
— Sou só eu, tá legal? Agora dos Curupiras já não posso falar o mesmo.
— Do quê?
— De quem você achou que eram os gritos? — ela perguntou, cruzando os braços, e revirou os olhos. — Claro que vocês estrangeiros vêm para cá e ao menos estudam para saber quais criaturas perigosas podem encontrar por aqui. Agradeça a Merlim por não ter visto os donos daqueles gritos.
— Ei, quem estuda esses bichos estranhos é ele! — Jacob exclamou, ao chegar à sala junto aos outros.
— Claro, o magizoologista! Newt Scamander, não é? — A mulher se virou para Newt, que apenas assentiu com a cabeça, confuso. — Vicência me falou de você.
— Espera aí? Você quis dizer Vicência Santos?
— Sim, eu trabalho para o Ministério. Eu sou … . — Newt apertou a mão que ela havia estendido para cumprimentá-lo. — Bom, eu não esperava encontrar vocês, mas já que isso aconteceu, acho que posso ajudar.
— Você quer dizer ajudar o Grindelwald a matar todos nós?
— Você não escutou nada do que eu disse? Eu estou do lado de vocês. — A garota tentou se explicar, mas Theseus a interrompeu.
— Desculpa, , mas você não pode esperar que a gente acredite em você quando eu te pego nos espionando na floresta no meio da noite.
— Você seria?
— Não importa, eu ainda tô com a sua varinha.
— ? Eulalie…
— Hicks… eu sou muito sua fâ, professora. — Ela sorriu e, pela primeira vez, Theseus percebeu um tom de vergonha em sua voz.
— Muito obrigada, fico lisonjeada. Então, por que em vez de assustá-la mais nós não conversamos calmamente, como adultos? — Lally pôs a mão no ombro de Theseus, e assentiu com a cabeça. — Tenho certeza de que nossa amiga Queenie pode ajudar. — A loira se aproximou da moça e a guiou até o sofá, se sentando ao seu lado, enquanto Lally e os outros ficavam de frente para elas. Tinha que admitir, estava sendo muito explosivo, mas ele não podia arriscar que sofressem um ataque inesperado. Não novamente.
— Obrigada, o seu amigo aí não me deixa explicar. — Ela lançou um olhar raivoso para Theseus, que apenas deu de ombros, e Lally começou o interrogatório.
— Vamos começar por partes… O que você veio fazer aqui, senhorita ? Não é um lugar muito comum para caminhar à noite.
— Eu vim procurar por pistas… Nós, do Ministério, soubemos que Grindelwald e seus seguidores foram vistos por aqui e, aproveitando que encontrei vocês, precisamos de toda ajuda possível.
— Você trabalha para a Vicência Santos, correto? — assentiu com a cabeça, e Theseus riu sarcasticamente.
— E você quer que a gente acredite nisso? — Assim como os outros, ele olhou para Queenie, aguardando qualquer reação.
— Ela é oclumente, não consigo acessar.
— Eu fui treinada para isso, não podia arriscar ser pega por algum seguidor de Grindelwald.
— Tá, e por que não destrava a mente, ou sei lá o quê? — Jacob perguntou confuso.
— Não é tão simples assim.
— É tão conveniente você estar com a oclumência ativada logo agora.
— Claro que é. Eu não sei se você tá sabendo, mas eles estão se espalhando por aqui. Atentados estão acontecendo por todo o país e está ficando cada vez mais difícil contê-los. Parece que Grindelwald está conseguindo trazer cada vez mais bruxos para o lado dele. Nós precisamos da ajuda de vocês e, querendo ou não, vocês também precisam da gente.
— E o que necessariamente a gente pode fazer para ajudar?
— Newt, você realmente vai acreditar nessa desculpa? Qualquer um pode falar isso. — Theseus chamou a atenção do irmão, e revirou os olhos.
— Por que o amigo de vocês é tão exagerado?
— Fica na sua…
— Theseus tem razão, não podemos acreditar nela totalmente de primeira… — Yusuf o interrompeu, e ele soltou um longo suspiro aliviado.
— Obrigado!
— Mas também não podemos desconsiderar que o nosso trabalho em conjunto seria muito importante.
— É isso que estou tentando falar.
— Na minha opinião, devíamos ficar de olho nela até termos mais informações. Não podemos arriscar nossa segurança.
— Ele tem razão. Senhorita , você parece ser uma pessoa muito amigável, mas não podemos botar tudo a perder. Espero que entenda. — Lally se virou para , que, apesar de relutar um pouco, se levantou e estendeu as mãos, e, com a varinha, ela amarrou os pulsos da mulher. — Muito bem, quem vai fazer companhia para nossa nova convidada?
— Não sei se estou na posição de exigir algo, mas se pudessem deixar esse homem longe de mim…
— Esse homem? Pensei que era mais valente, senhorita . Se não gostou da forma que eu falei, o problema é todo seu. Só estou tentando proteger meus amigos.
— Isso não te dá o direito de ser arrogante!
— Me desculpe, a bruxinha ficou ofendida?
— Seu morcego velho.
— Cabeça de trasgo. — Theseus se aproximou o suficiente para notar umas sardas discretas na garota, que não se moveu um centímetro. Ele ouviu Jacob pigarrear e sentiu seu rosto esquentar automaticamente.
— Sou só eu, ou o clima…
— Jacob! — Queenie o repreendeu, enquanto Theseus voltava para uma distância aceitável de , que, após perceber o que havia acabado de acontecer, também se afastou.
— Bom, seria um prazer ficar de olho nela. — Ele deu um sorriso cínico, e revirou os olhos, mas se sentou no sofá novamente, enquanto os outros saíam do cômodo, os deixando sozinhos.
Theseus tamborilava os dedos contra o braço da poltrona, mantendo os olhos fixos na mulher à sua frente. A maneira como falava com ele, sem o menor indício de respeito ou receio, o irritava mais do que deveria. Poucas pessoas se dirigiam a ele daquela forma, especialmente alguém que estava amarrada e sob suspeita.
— Então você é o Theseus Scamander… — A voz dela carregava um tom casual demais para a situação. Ele ergueu a sobrancelha e assentiu, como se fosse óbvio. — Ah, tá explicado, então.
— Terá que ser mais clara.
— Nada demais, sabe... — Ela deu um sorriso inocente, mas algo na forma como seus olhos brilharam fez Theseus estremecer levemente, e ele agradeceu mentalmente por Queenie não estar ali naquele momento para captar seus pensamentos. — É que dá pra ver claramente a diferença. Pelo que dizem, seu irmão é um homem gentil e mais calmo também. Mas o senhor… — Ela interrompeu a frase de propósito, deixando seu olhar deslizar por ele de cima a baixo, como se o analisasse. — Bem, o rosto bonitinho é a única coisa que salva. — Theseus sentiu a mandíbula travar. Ele não sabia o que o irritava mais, o tom insolente, ou o fato de ter gostado da maneira como ela o olhava.
— Fico feliz que tenha achado alguma qualidade minha, senhorita . Não imagina o quão importante isso é para mim. — Theseus cruzou os braços, fingindo uma expressão reflexiva. — Acho que temos algo em comum, então. — Ele devolveu a provocação, a observando revirar os olhos em resposta.
— Tá vendo que o senhor consegue ser gentil? Fiquei intrigada, vocês ingleses são sempre receptivos assim?
— Ah, como eu sou rude, você aceita um chá? — ele rebateu, a voz carregada de ironia. — Como acha que qualquer um em sã consciência receberia alguém que estava espiando entre as árvores?
— Eu entendo que nosso primeiro encontro não foi muito formidável, mas não vejo motivo para você me tratar com tanta desconfiança e grosseria. — A mulher ergueu as mãos, como se realmente estivesse ofendida.
— Não é como se a senhorita fosse um exemplo a ser seguido.
— Estou apenas devolvendo, querido. — O jeito que a palavra saiu de sua boca, junto ao sorriso desafiador, fez algo no estômago dele se contrair de um jeito estranho. Ele odiava isso. Odiava como ela falava como se soubesse exatamente que o estava provocando.
Então, sem quebrar o contato visual, ele se aproximou devagar, diminuindo ainda mais o espaço entre eles. parou de sorrir, mas não recuou.
— Sabe o que mais me faz desconfiar de você, senhorita ? — Theseus murmurou, a voz mais baixa, arrastada e o olhar se tornando mais frio. — O fato de você dizer que trabalha para a Vicência Santos e não fazer ideia do que passamos para tentar deter Grindelwald. — Ele apoiou uma das mãos na lateral do sofá onde estava sentada, inclinando a cabeça levemente em sua direção. — Porque se você soubesse ao menos um terço do que aconteceu, não questionaria a minha desconfiança. — abriu a boca para responder, mas hesitou, então ele continuou, seus olhos escuros analisando cada expressão dela. — Das duas uma… ou você realmente está mentindo e é uma espiã, ou é tão incompetente que nem consegue fazer o seu trabalho direito. — A provocação foi o suficiente para se levantar em um salto, o obrigando a dar um passo para trás.
— Já chega! Não estou pedindo que acredite em mim, senhor Scamander, mas um pouco de respeito seria bom. — Os olhos da bruxa faiscaram de raiva e seu peito subia e descia com a respiração alterada. Theseus percebeu tarde demais que também estava respirando mais fundo do que deveria.
O clima na sala estava tão tenso que o ar parecia vibrar. Mas antes que qualquer um pudesse dizer mais alguma coisa, a voz de Jacob interrompeu.
— Ei, vocês dois. — Theseus e se viraram ao mesmo tempo, encontrando o homem parado à porta, com os braços cruzados e uma expressão impaciente. — Tá dando pra escutar a ‘conversa’ de vocês lá dentro, então achei melhor ficar no lugar do Theseus.
— Obrigado — Theseus murmurou, lançando um último olhar para , antes de sair da sala, seus passos firmes ecoando pelo chão de madeira.
— Finalmente. Ele é sempre assim tão adorável? — A mulher bufou e cruzou os braços, voltando a se sentar no sofá.
— Ele pegou um pouco pesado com você, né? — Jacob suspirou, coçando a nuca.
— Um pouco? Parecia que o problema dele nem era com Grindelwald, e sim comigo.
— É, sinto muito por isso…, mas você tem que entender que ele passou por muita coisa — ele disse, sentando em uma cadeira próxima, e ergueu uma sobrancelha, ainda irritada.
— Todos passamos por muita coisa.
— Sim, mas… é que Theseus já perdeu gente demais nessa guerra. Ele se culpa por muita coisa, especialmente pelo que aconteceu com Leta.
— Leta Lestrange? — piscou, surpresa pela mudança súbita de assunto, e Jacob assentiu com um semblante triste.
— Eles foram noivos. Ela morreu tentando salvar a gente... e acho que, no fundo, Theseus nunca se perdoou por isso.
O nome Lestrange não era estranho para , mas ela nunca havia ligado a figura de Leta àquele homem rígido e controlador. Pensava que todo aquele comportamento era apenas arrogância, um traço comum em homens como Theseus. E, pela primeira vez naquela noite, ela se perguntou se havia sido injusta com ele.
se aproximou da porta entreaberta da cozinha, onde Theseus e Newt estavam sentados à mesa. Newt falava em um tom calmo e concentrado, os olhos fixos na superfície de madeira à sua frente, enquanto desenhava algo com a ponta dos dedos, e Theseus segurava uma xícara de café entre as mãos, a postura rígida como sempre, se inclinando ligeiramente sobre a mesa, enquanto escutava o irmão. não conseguia ouvir tudo o que diziam, mas captou fragmentos soltos, palavras desconectadas, menções a um plano que não lhe era familiar.
Foi apenas quando ela se mexeu levemente que ambos perceberam sua presença e o silêncio foi imediato. Newt cortou a própria frase no meio, desviando o olhar para Theseus como se perguntasse se deveriam continuar. O mais velho, por sua vez, girou o rosto em direção a , os olhos escuros encontrando os dela com algo que variava entre irritação e outra coisa.
— Desculpem se atrapalhei alguma coisa — falou, olhando de um para o outro, ainda lembrando da conversa que teve com Jacob na noite anterior. Ela até estava tentando pegar leve com Theseus, mas seus pensamentos foram interrompidos pela risada seca do homem à sua frente, levando a xícara aos lábios antes de responder.
— Ah, tá mais educada agora? O que algumas horas de sono não fazem.
— Bom, você me amarrou — ela respondeu, pendendo a cabeça para o lado e apertando os lábios em um sorriso sem humor. — Não tem muita coisa que eu possa fazer para mudar isso, então não vejo motivo para eu começar a tratar todo mundo mal. Acho que mereço pelo menos um pouco de cortesia em troca. — Theseus arqueou a sobrancelha, repousando a xícara sobre a mesa com um toque suave.
— Cortesia, senhorita , não é algo que se ganha apenas por reclamar. Mas quem sabe? Talvez, se você continuar assim tão dócil, possamos reconsiderar.
— Então é assim que funciona? Gentileza em troca de um pouco de liberdade? — perguntou, estreitando os olhos, sentindo a irritação ferver sobre sua pele.
— Não se engane… — Theseus inclinou-se ligeiramente para frente, apoiando os antebraços na mesa. — Não espero gentileza de você. Apenas clareza. — Seu olhar permaneceu preso ao dela mais tempo do que deveria, mas sustentou o contato visual, desafiadora, apesar de sentir um arrepio percorrer sua espinha. Não de medo, mas algo muito mais perigoso. E ela odiava isso.
Ambos voltaram à realidade ao ouvir Newt pigarrear, se levantando da mesa e indo até .
— Theseus, se puder nos dar um segundo. — Ele se virou para o irmão, que assentiu com um suspiro antes de se levantar e sair da cozinha.
acompanhou Theseus com o olhar até ele desaparecer pela porta, então voltou a atenção para Newt, que, diferente do olhar severo do irmão, carregava nos olhos um tipo de gentileza que a fez relaxar levemente os ombros.
— Ele pode ser um pouco... intenso — Newt comentou, oferecendo um pequeno sorriso, antes de puxar a varinha do bolso do casaco. — Mas espero que entenda o motivo.
arqueou uma sobrancelha, observando enquanto ele apontava a varinha para suas mãos. Em um instante, parte das amarras se afrouxou, aliviando a pressão em seus pulsos sem libertá-la completamente.
— Você também acha que sou uma ameaça? — ela perguntou, testando os dedos dormentes, enquanto sentia o sangue voltar a circular.
— Eu acho que não sei o suficiente sobre você para ter certeza — Newt respondeu com honestidade, indo até a mesa, onde encheu uma caneca de chá fumegante. — Mas suspeito que se fosse realmente perigosa, teria tentado fugir de outra forma e não trocando farpas com Theseus.
soltou um riso anasalado, aceitando a caneca quando ele a entregou. O calor entre seus dedos era bem-vindo depois das horas de desconforto.
— Bom, se eu soubesse que ele era tão cabeça-dura, talvez tivesse reconsiderado minhas estratégias — murmurou antes de levar o chá aos lábios, e Newt sorriu de leve, cortando um pedaço de pão e colocando o prato perto dela. — Obrigada. — Ela sorriu de volta, notando que não havia comido nada desde que fora capturada, e mordeu o pão, sentindo o calor reconfortante do alimento recém-cortado.
Newt puxou uma cadeira e se sentou ao lado dela, os movimentos um pouco contidos, como se não quisesse invadir seu espaço. percebeu que ele era bem diferente do irmão, menos imponente, menos confrontador. Havia algo nele que parecia um pouco deslocado, como se preferisse estar em qualquer outro lugar que não fosse ali. Ele limpou a garganta, desviando o olhar para suas próprias mãos antes de falar.
— Você trabalha para Vicência Santos, certo?
assentiu devagar, mastigando o pão antes de responder.
— Sim. Eu faço parte da equipe dela. Trabalho com informações, movimentações políticas e estratégias de defesa.
Newt inclinou a cabeça levemente, parecendo absorver cada palavra com atenção genuína, sem pressa em reagir. Diferente de Theseus, que confrontava tudo de imediato, ele parecia ponderar antes de julgar. notou como ele evitava contato visual prolongado, como se não estivesse totalmente confortável com interações diretas.
— Então por que estava espionando? Se realmente trabalha para Vicência, poderia simplesmente ter vindo até nós.
— Porque nem todos aqui parecem dispostos a ouvir antes de apontar a varinha. — Ela soltou um suspiro, encostando as costas na cadeira.
— Theseus viu Grindelwald manipular e trair pessoas que diziam estar do nosso lado. Não é simples confiar. — franziu os lábios, desviando o olhar para a porta por onde Theseus havia saído. Mesmo sem vê-lo, ainda sentia a intensidade do olhar dele sobre ela.
— Eu sei. — Sua voz saiu mais baixa, carregada de um peso que ela mesma não esperava. — E eu não o julgo por isso.
Newt ficou em silêncio por alguns segundos, como se escolhesse as palavras certas antes de continuar. percebeu que aquele era o jeito dele, mais quieto, mais tímido, como se preferisse falar através dos gestos em vez das palavras.
— O que estava tentando descobrir naquela floresta?
— Algo não estava certo — disse, por fim, voltando a encará-lo. — Recebemos informações sobre movimentações suspeitas perto desse território. Eu precisava confirmar se Grindelwald estava mesmo aqui, ou se era uma armadilha. Mas antes que eu pudesse descobrir qualquer coisa, fui capturada.
— E você acredita que ele realmente veio para cá?
— Acho que estamos perto de algo grande, mas não sei dizer se é uma pista real, ou mais uma peça no jogo dele.
Newt trocou um olhar pensativo com ela, então se inclinou ligeiramente para a frente, a voz baixa, mas firme.
— Se for verdade… podemos ir com você até o local. — assentiu, mas depois soltou uma risada baixa, balançando a cabeça.
— Duvido muito que seu irmão vá aceitar isso tão fácil.
— Theseus pode ser… teimoso. Mas ele entende o que está em jogo. Se essa pista for real, ele não vai ignorá-la.
— E se eu estiver mentindo? — arqueou uma sobrancelha e observou o homem à sua frente sorrir de leve, o olhar gentil, mas perspicaz.
— Então, eventualmente, vamos descobrir.
Ela segurou o olhar dele por um momento antes de desviar, levando a xícara aos lábios novamente. terminou o chá em silêncio, sentindo o calor do líquido acalmar levemente seus nervos. Newt permaneceu sentado ao seu lado, a observando com aquela expressão analítica e ponderada que parecia ser sua marca registrada. Ele não a tratava com desconfiança, mas também não era ingênuo. Assim que ela pousou a xícara vazia sobre a mesa, eles se levantaram, indo até a sala, onde os outros estavam espalhados com expressões sérias. Theseus, como sempre, foi o primeiro a reagir, cruzando os braços e lançando um olhar de desagrado para .
— Ela já está à vontade demais.
sorriu de lado, arqueando uma sobrancelha.
— Se preferir, posso voltar para a cadeira dura da cozinha. Mas considerando que vou ajudar vocês, acho que um pouco de conforto é permitido.
— Nos ajudar? O que ela quer dizer com isso?
— Theseus… — Newt interveio, sua voz pacífica, mas firme. — pode nos levar até o local onde supostamente Grindelwald passou. Se ela estiver certa, podemos encontrar algo útil.
O auror franziu o cenho, claramente não gostando da ideia. Os outros trocaram olhares entre si, avaliando a proposta em silêncio.
— E desde quando confiamos nela? — Theseus retrucou, voltando a encará-la, e revirou os olhos.
— Eu já disse que não preciso da confiança de ninguém, só quero que descubram logo que não sou uma ameaça.
— Se Grindelwald está por aqui, não podemos ignorar qualquer pista. — Lally olhou para Theseus, que apertou os lábios em uma linha fina, a mandíbula travada em resistência. percebeu que ele olhava para Newt primeiro, como se tentasse encontrar uma justificativa para recusar sem parecer irracional. No fim, ele soltou um suspiro pesado, passando a mão pelos cabelos.
— Isso é uma péssima ideia.
— Mas é a única que temos — Newt retrucou calmamente.
Queenie, que estava sentada perto de Jacob, inclinou a cabeça, observando com curiosidade. Ela não podia ler sua mente, o que apenas tornava a situação mais intrigante.
— Talvez devêssemos dar uma chance…
— Se for uma armadilha, saberemos lidar com isso. — Yusuf, até então calado, assentiu levemente.
— Partimos em algumas horas. — Theseus lançou um último olhar desconfiado para antes de se levantar da poltrona em que estava sentado.
— Ah, então agora confia em mim? — sorriu de lado, inclinando a cabeça, e o homem bufou, desviando o olhar antes de sair do cômodo.
— Nem por um segundo.
observava enquanto os outros checavam seus pertences. Yusuf organizava alguns papéis, enquanto Lally conferia frascos de poções cuidadosamente embalados em um estojo de couro. Ela se aproximou de Theseus, que estava perto da porta, ajustando um coldre onde mantinha a varinha.
— Se vamos viajar juntos, acho que já passou da hora de me soltarem.
— E por que exatamente eu faria isso? — Ele se virou lentamente para encará-la, a expressão carregada de ceticismo.
— Porque, a menos que planeje carregar alguém amarrado pelo meio da floresta, não faz sentido continuar com isso.
— Eu posso carregar você, se for preciso. — Ele cruzou os braços, ponderando por um momento, e sorriu de lado, debochado.
— Ah, claro. E quando Grindelwald aparecer, você vai me segurar com uma mão e duelar com a outra? — arqueou uma sobrancelha, abrindo um sorriso irônico.
— Eu meio que queria ver isso. — Jacob, que amarrava o cadarço do sapato em um canto, ergueu a cabeça, e Queenie riu baixinho, enquanto Theseus soltava um suspiro irritado, claramente sem paciência. Ele olhou para Newt, esperando alguma intervenção sensata, mas o irmão apenas observava em silêncio, o rosto neutro como sempre.
— Se ela quisesse fugir, já teria tentado — Lally comentou, dando de ombros.
— Ótimo. — Theseus apertou a mandíbula, contrariado. — Mas se fizer qualquer coisa suspeita, eu não vou hesitar. — Então, sem aviso, deu um passo à frente e puxou a varinha, murmurando um feitiço que desfez as amarras. nem teve tempo de reagir antes de sentir a pressão nos pulsos desaparecer. — E eu vou continuar com sua varinha, por precaução.
— Uau, quanta confiança. Não imaginava que sabia ser gentil, Scamander. — Ela massageou os pulsos, arqueando uma sobrancelha.
— Não se acostume. — Ele inclinou a cabeça ligeiramente, a voz baixa e carregada de ironia. notou a proximidade entre os dois, a forma como o olhar dele deslizava sobre ela, misturado entre irritação e outra coisa que ela não sabia decifrar. Por um segundo, ninguém disse nada.
— Então, qual é o plano? — Ela quebrou o silêncio, se virando para os outros. — Vamos direto para o local, ou o senhor Scamander vai querer fazer mais uma verificação para garantir que eu não sou uma espiã?
— Eu ainda não descartei essa possibilidade.
— Vamos diretamente para o ponto que você indicou. Se Grindelwald passou por lá, é melhor não perdermos tempo. — Lally se aproximou, já com sua varinha em mãos, e Newt assentiu, verificando sua maleta, a fechando com cuidado. Antes que ela se fechasse completamente, notou um pequeno vulto de pelos pretos se remexendo entre os objetos dentro da mala. Seus olhos se estreitaram por um instante, curiosos, mas Newt rapidamente empurrou a criaturinha para dentro, como se aquilo fosse a coisa mais natural do mundo.
— Todos prontos? — Eles assentiram, e lançou um olhar provocador para Theseus, abaixando o tom de voz.
— E você, Theseus Scamander? Vai conseguir lidar com isso? — Ele não respondeu, apenas lhe lançou um olhar longo, a mandíbula travada, antes de pegar seu casaco e vesti-lo. — Ótimo. — sorriu, sentindo uma pontada de satisfação.
E então, com a tensão pairando no ar, o grupo saiu da cabana, prontos para mergulhar mais fundo na busca.
— Devemos ficar atentos — avisou, lançando um olhar para os outros. — Essa floresta está longe de ser vazia e muito menos segura.
— Você fala de animais normais ou de algo mais... peculiar? — Jacob perguntou, com uma expressão cautelosa.
— Os dois, talvez. — Ela esboçou um sorriso enigmático. — Modéstia à parte, tanto no mundo bruxo, quanto no trouxa, estamos falando de um dos biomas mais ricos do mundo. Eu não iria querer dar de cara com uma sucuri ou uma onça-pintada.
— Ótimo. Então, além das criaturas mágicas, temos que nos preocupar com cobras gigantes e felinos carnívoros? — Jacob arregalou os olhos, enquanto Newt estava extremamente interessado no assunto.
— Basicamente. Ah, sem falar em algumas cobras venenosas, como a jararaca e a surucucu, que podem ser bem difíceis de lidar se cruzarmos o caminho delas. — Ela olhou para Jacob novamente, que pareceu estremecer. — Mas, sinceramente, eu diria que elas são os menores dos nossos problemas.
— Tem algo específico com que deveríamos nos preocupar? — Theseus perguntou desconfiado, e lançou um olhar divertido para ele antes de responder.
— Bem, você quase teve um encontro com alguns Curupiras noite passada, mas eles não costumam se aproximar se você respeitar a floresta. — Ela levantou o dedo, começando a contar. — Mas, se querem algo para sentir medo, temos os Capelobos, por exemplo. Metade homem, metade fera, se alimentam do sangue de quem invade seu território.
— Ótimo, vampiros tropicais. Isso só melhora — Jacob retrucou, olhando ao redor.
— Tem também os Mapinguaris, gigantes cobertos de pelo. Dizem que são quase imortais.
— Imortais? — Yusuf repetiu, parecendo interessado.
— Eles têm uma pele tão dura que quase nada consegue feri-los. Alguns acreditam que foram bruxos que se transformaram em algo que não conseguiram reverter.
— Eu adoraria ver um. — Newt parecia ainda mais fascinado.
— Sim, claro, vamos convidar um para o jantar também, quem sabe — Theseus resmungou, e soltou uma risada curta, mantendo os olhos na trilha à frente.
— E tem as Caiporas, que não são perigosas, mas adoram pregar peças. Se algo da sua mochila sumir, já sabe quem foi.
— Isso está cada vez melhor. — Jacob suspirou, puxando a alça de sua mochila como se já pudesse sentir alguém tentando roubá-la.
— Mais alguma coisa, ou são ‘apenas’ esses? — Lally questionou com um tom brincalhão na voz.
— Bem, já que perguntou… a Iara é uma sereia de pele morena, que atrai os pescadores com seu canto hipnótico, os levando para as profundezas dos rios.
— Sereias que afogam pessoas?
— Exatamente. — olhou para Queenie, que andava de mãos dadas com Jacob. — E o Boitatá, uma serpente gigante de fogo, com olhos que podem até cegar quem ousar se aproximar dela. E essas são só algumas, claro.
— Desde que não apareça nada que nos faça perder tempo, já estou satisfeito. — Theseus revirou os olhos, ajustando o coldre da varinha, e lançou um olhar discreto para ele, o canto da boca se erguendo ligeiramente.
— Ah, não se preocupe, Scamander. Tenho certeza de que a floresta vai ser muito generosa com você. — E então, com um brilho travesso no olhar, ela voltou a caminhar, o deixando para trás resmungando algo inaudível.
Newt, ao lado do irmão, apenas sacudiu a cabeça, mas Theseus percebeu um sorriso divertido surgindo em seus lábios.
— Nem uma palavra, Newt.
— Eu não disse nada — o mais novo respondeu, ainda sorrindo, enquanto voltavam a seguir o grupo.
Antes que ele pudesse retrucar, Yusuf, que caminhava mais à frente, parou de repente e ergueu a mão em um sinal para que todos ficassem atentos.
— Tem algo aqui.
O grupo imediatamente ficou em alerta, varinhas em punho, observando entre as folhas secas pegadas parcialmente apagadas.
— Podemos estar no caminho certo — Eulalie murmurou, analisando as marcas, e Theseus assentiu, se virando para , sua voz firme.
— Vamos ver se sua pista realmente nos leva a algum lugar, senhorita .
— Se minha pista não levar a nada, vocês podem me deixar amarrada em uma árvore e seguir sem mim. — cruzou os braços ao encarar Theseus. — Mas, até onde sei, sou a única aqui que entende os rastros dessa floresta.
— Até onde eu sei, apenas há algumas horas, você ainda estava com as mãos amarradas. — Theseus estreitou os olhos, mas Lally interveio antes que eles pudessem continuar a discussão.
— As marcas seguem para o leste. Se for um acampamento ou uma base temporária, não devem estar muito longe.
se ajoelhou ao lado de Yusuf para examinar o chão. A terra estava revirada, mas não o suficiente para indicar uma grande movimentação. Alguém estivera ali recentemente, mas sem a intenção de ser descoberto.
— Eles estão se movendo com cautela. — tocou a borda de uma pegada, analisando sua profundidade. — E são poucos. Talvez dois, três no máximo.
— E como sabe disso? — Theseus cruzou os braços, cético, e ela ergueu o olhar, um sorrisinho no canto dos lábios.
— Porque eu sei ler pegadas, Scamander. Diferente de você, que provavelmente chutaria uma pista antes de perceber que ela estava ali.
Antes que ele pudesse responder, um estalo entre as árvores fez todos virarem na direção do som. As varinhas foram erguidas em um instante, os olhos atentos vasculhando a vegetação densa. O silêncio que se seguiu pareceu ainda mais ameaçador do que o próprio barulho.
— Se for um animal, ele já nos sentiu há muito tempo — Queenie murmurou, os olhos varrendo os arredores com preocupação.
— E se não for? — Jacob sussurrou ao lado dela, e se levantou devagar, estreitando os olhos.
— Se não for, talvez seja melhor nos prepararmos para descobrir.
O vento soprou entre as folhas, carregando um cheiro metálico, quase imperceptível. O tipo de cheiro que alertava qualquer um que já havia estado em um combate antes.
Sangue.
— Fiquem atentos. — Yusuf foi o primeiro a dar um passo à frente, varinha firme na mão, enquanto os outros seguiam atrás dele com cautela, dessa vez em silêncio absoluto. Algo, ou alguém, estava naquela floresta. A questão era: estavam sendo seguidos, ou eram eles os caçadores?
manteve os olhos atentos ao redor, sentindo um arrepio percorrer sua espinha, e a única coisa que ela pensava naquele momento era em pegar sua varinha de Theseus. Newt caminhava ao lado dela, o olhar alternando entre as pegadas e as sombras nas árvores.
— Há um cheiro estranho no ar. — Foi Theseus quem quebrou o silêncio primeiro, e Lally assentiu.
— Sangue.
— Não, mas tem algo a mais… — franziu o cenho. — Algo como enxofre misturado com terra molhada.
— Isso não é um bom sinal. — Newt parou abruptamente, as sobrancelhas franzidas, e Jacob sentiu seu corpo estremecer.
— Ótimo. Como se não bastassem as criaturas da floresta, agora temos um cheiro suspeito.
— Mantenha a calma. — Lally lançou-lhe um olhar de advertência, mas, antes que alguém pudesse dizer algo mais, o silêncio foi rasgado por um grito. Um som seco, desesperado e próximo.
— Ali! — Queenie apontou para uma clareira mais adiante e, sem hesitar, Yusuf avançou primeiro, seguido de perto pelos outros.
Ao chegarem à clareira, se depararam com uma cena desconcertante. No centro, um homem caído no chão, se contorcendo, os olhos arregalados de puro pavor. Seu corpo estava coberto de feridas profundas, como se garras tivessem deslizado por sua pele, e o sangue se espalhava cada vez mais pelo solo. Newt já se ajoelhava ao lado do homem, analisando os ferimentos com precisão clínica. Mas, antes mesmo que eles pudessem fazer qualquer coisa, os olhos do homem ficaram sem vida.
— Isso parece obra de um Mapinguari.
— Tem certeza? — perguntou, sentindo os pelos da nuca se eriçarem, enquanto o cheiro de enxofre e terra molhada ficava mais forte, quase sufocante. — Não se movam — ela murmurou, os olhos varrendo a clareira e, antes que alguém pudesse questionar, as árvores ao redor deles tremeram.
Ninguém ousou respirar. O grupo ficou imóvel, atento a qualquer mudança ao redor.
O silêncio foi quebrado por um som baixo e gutural que ressoou entre as árvores. Galhos estalaram, folhas se agitaram violentamente e então, emergindo da escuridão da mata, uma criatura monstruosa surgiu. Seu corpo era coberto por um pelo espesso e negro, mas o detalhe mais aterrorizante era o único olho vermelho e brilhante no centro de sua testa. Suas garras curvadas eram tão longas quanto lâminas, e a boca, situada verticalmente desde o começo do nariz até o final do abdômen, se abriu em um grunhido ensurdecedor, liberando um hálito pútrido de carne em decomposição que os fez engasgarem.
— Mapinguari — falou com a voz trêmula, e Newt confirmou com um aceno, fascinado e preocupado ao mesmo tempo.
— Eu nunca vi um pessoalmente.
O Mapinguari avançou um passo, sua silhueta colossal bloqueando a luz do sol filtrada pelas copas das árvores. A pele grossa e escamosa, misturada com pelos desgrenhados, parecia uma fusão de vários animais ao mesmo tempo. Seu olho oscilava entre os membros do grupo, como se analisasse qual deles faria a melhor refeição.
— Isso é sua culpa! Você disse que queria ver um desses bichos pessoalmente! — Jacob apontou um dedo acusador para Newt.
— Tecnicamente, eu disse que adoraria ver um… e isso ainda é verdade. Ainda não consegui estudá-lo apropriadamente. — Newt piscou algumas vezes, claramente dividido entre a fascinação e a urgência do perigo.
— Nós podemos ser devorados a qualquer momento e você quer estudá-lo? — Yusuf exclamou, desviando para trás quando o Mapinguari soltou outro rugido ensurdecedor.
— Podemos discutir isso depois? Preferencialmente quando não estivermos prestes a virar janta de um monstro? — Queenie, com os olhos arregalados, segurava a mão de Jacob.
Newt forçou a mente a funcionar rápido, tentando lembrar-se de qualquer detalhe relevante sobre o Mapinguari. Criatura amazônica, forte, resistente… quase impossível de derrubar com feitiços comuns. O cheiro é uma defesa natural, que desorienta presas e predadores. E a pele? Praticamente impenetrável.
— Se alguém tiver um plano, agora seria uma ótima hora para compartilhá-lo. — tentou manter a calma, os olhos fixos na criatura, que parecia cada vez mais impaciente.
O Mapinguari rosnou, suas garras enormes rasgando a casca de uma árvore próxima como se fosse papel. O som ecoou pela floresta, enviando uma revoada de pássaros assustados para o céu. O grupo deu mais um passo para trás.
— Está bem… — Newt murmurou, os olhos brilhando com uma ideia repentina. — Ele pode ser forte e assustador, mas deve ter um ponto fraco.
— Diga logo antes que ele resolva nos transformar no almoço — Theseus resmungou, ajustando a postura para um possível ataque.
— Eu preciso pensar mais um pouco. — Newt tentou forçar a mente.
— Ah, claro, leve o tempo que precisar, não é como se estivéssemos prestes a morrer. — estreitou os olhos, enquanto ele já estava remexendo nos bolsos do casaco, claramente com um plano em mente.
— Certo, meu primeiro palpite é que precisamos cegá-lo… Theseus, você é bom com feitiços de luz intensa, certo?
— Por quê? — O mais velho estreitou os olhos, desconfiado.
— Porque se conseguirmos desorientá-lo, podemos ganhar tempo para fugir. — Newt finalmente puxou um pequeno frasco de dentro do casaco e jogou para Theseus. — Quando eu disser agora, quebre isso no chão e conjure um Lumus Maxima diretamente no rosto dele. — Theseus pegou o frasco no ar e o encarou por um segundo antes de assentir, e Newt respirou fundo. — Três… dois… um… AGORA!
Theseus arremessou o frasco no solo, e uma explosão de fumaça prateada subiu ao ar. No mesmo instante, ele apontou a varinha e conjurou um poderoso Lumus Maxima. A floresta foi banhada por uma luz intensa, ofuscando tudo ao redor. O Mapinguari soltou um rugido de dor e recuou desorientado, seu único olho lacrimejando.
— CORRAM! — gritou, puxando Theseus pelo braço sem esperar resposta.
O grupo disparou pela trilha, os pés esmagando folhas secas e galhos retorcidos. O barulho de algo enorme se movendo atrás deles, seguido por rugidos furiosos, deixava claro que o Mapinguari estava se recuperando rapidamente.
— Ele ainda tá vindo! — Jacob exclamou, olhando para trás e acelerando o passo. — Isso não devia ter derrubado ele?
— É uma criatura extremamente resistente! — Newt ofegou, desviando de uma raiz exposta. — Mas ele não pode nos perseguir para sempre!
— Ótimo, então só precisamos correr por, sei lá… DUAS HORAS? — Jacob retrucou, desviando por pouco de uma árvore.
— Theseus, me diga que você tem um feitiço na manga que pode resolver isso de vez! — Yusuf perguntou, enquanto saltava sobre um tronco caído.
— Estou aberto a sugestões! Além disso, o magizoologista é ele — Theseus rebateu, se referindo a Newt, a voz cheia de irritação e adrenalina.
— Temos que despistá-lo! Ele pode ser grande e forte, mas não é exatamente ágil! — olhou para o lado e viu Queenie segurando a saia do vestido enquanto corria, tentando manter a velocidade.
— Então precisamos de uma distração — Yusuf concluiu, lançando um olhar rápido para o lado.
Foi então que viu, mais à frente, uma trilha que se dividia em duas. Ela pensou rápido.
— Vamos nos separar! Ele não poderá seguir todos ao mesmo tempo!
— SEPARAR? — Jacob quase tropeçou ao ouvir a ideia. — Que ótima ideia! Vamos dividir o cardápio da criatura!
— Theseus, eu, você e o Newt vamos para a esquerda! — comandou. — Vocês quatro vão para a direita!
— Isso é um péssimo plano. — Theseus resmungou, mas não desacelerou. — Além disso, quem te botou no comando?
— Então pense em um melhor! Enquanto um grupo o distrai, o outro pensa em algo para detê-lo — rebateu, puxando os dois irmãos para a esquerda no momento em que chegaram à bifurcação, enquanto Queenie, Jacob, Yusuf e Lally seguiram para a direita.
O Mapinguari parou por um momento, confuso, e rugiu furioso ao ver seu ‘almoço’ se separando. Depois de hesitar por um segundo, se virou e seguiu na direção de , Newt e Theseus.
— ÓTIMO, ELE ESCOLHEU A GENTE! — gritou, sentindo o chão vibrar sob seus pés com os passos pesados da criatura.
— Talvez ele tenha nos achado mais interessantes — Theseus murmurou, correndo ao lado de .
— Se você se mexesse menos como um alvo fácil, talvez ajudasse — rebateu, sem fôlego, e Theseus lançou um olhar cortante para ela.
— Se você falasse menos e corresse mais, talvez não estivéssemos nessa situação!
— Ah, claro, porque a culpa é minha! Você quer discutir isso agora, Scamander? Enquanto temos uma criatura tentando nos devorar? — rosnou, mas, antes que ela pudesse protestar, Theseus segurou seu pulso por reflexo, a puxando para um lado quando o Mapinguari investiu contra eles. sentiu o corpo colidir contra o dele, a respiração quente de Theseus próxima à sua pele por um breve instante antes de se afastarem rapidamente.
— Se vocês puderem parar por um segundo, seria ótimo! — Newt sussurrou, tentando recuperar o fôlego, enquanto os empurrava para trás de uma grande árvore caída.
piscou algumas vezes, tentando recuperar a compostura. Sentia o olhar de Theseus sobre ela e, quando se virou, encontrou aqueles olhos intensos que faziam um calor irritante subir pelo seu corpo. O Mapinguari soltou outro rugido, girando o corpo massivo e farejando o ar. A boca em seu abdômen se abria e fechava, emitindo um ruído viscoso.
— E então, qual o plano, gênio da sobrevivência? — Theseus limpou o suor da testa, e cerrou os olhos para ele, respirando fundo.
— Bom, auror, se eu estivesse com a minha varinha, tenho certeza de que…
— Nem pensar. — Theseus a interrompeu, e ela revirou os olhos.
— Então alguém tem um plano brilhante, ou vamos continuar esperando-o decidir quem vai jantar primeiro?
— Água! — Newt exclamou, com um sorriso animado até demais.
— Água? — franziu a testa, lançando um olhar confuso para ele. — Tem como ser um pouco mais claro?
Newt, que já havia começado a remexer em sua maleta, levantou a cabeça rapidamente.
— Eles são sensíveis à água! Se jogarmos uma grande quantidade nele, podemos desorientá-lo, ou até afastá-lo.
— Eu poderia lançar um feitiço útil para isso, se estivesse com a minha varinha. — estreitou os olhos para Theseus com um brilho satisfeito.
Ele cerrou a mandíbula, claramente relutante, mas diante da aproximação ameaçadora da criatura, xingou baixinho, antes de pegar a varinha em seu bolso e estender para ela.
— Isso não significa que eu confie em você.
— Claro que não. — sorriu de lado, pegando a varinha.
— Isso é uma essência de feromônio de Fiuum misturada com néctar de Plimpy. Vai desorientá-lo por tempo suficiente para lançarmos o feitiço e fugirmos. — Newt segurou um pequeno frasco com um líquido brilhante e azul, bem no momento em que a criatura os encontrou.
— JOGA LOGO! — Theseus gritou, puxando para que eles se afastassem.
Newt abriu o frasco, atirando o líquido brilhante para trás. No instante em que o cheiro doce se espalhou pelo ar, o Mapinguari parou abruptamente, fungando o ar com desconfiança. Ele balançou a cabeça, confuso, e começou a cambalear para o lado, distraído pelo aroma inebriante.
— Agora! — ergueu a varinha. — Aqua Erupto!
Um forte jato de água disparou da ponta da varinha, acertando a criatura no rosto. Theseus e Newt conjuraram o mesmo feitiço, e o Mapinguari soltou um rugido alto, recuando, enquanto os jatos d’água o atingiam.
— Corram! — Newt exclamou, ainda tentando olhar para trás enquanto corriam.
Os três dispararam pela trilha, aproveitando a hesitação da criatura para colocar uma boa distância entre eles. Quando finalmente pararam para recuperar o fôlego, os sons do Mapinguari tinham sumido na floresta.
— Bom… foi emocionante. — Newt, com um sorriso satisfeito, guardou o frasco, enquanto bufou, as mãos nos joelhos, tentando recuperar o ar.
— Você precisa rever sua definição de emocionante.
— Pelo menos agora posso dizer que vi um Mapinguari pessoalmente.
— Da próxima vez, escolha algo menos mortal para estudar, por favor. — Ela lançou-lhe um olhar cansado, mas acabou rindo.
O silêncio caiu entre eles por um instante, antes de um barulho surgir da trilha à direita. Em poucos segundos, o restante do grupo emergiu da vegetação. Yusuf estava sujo de lama, Lally ajeitava o cabelo esvoaçado, Queenie ofegava e Jacob… bom, Jacob parecia o mais aliviado de todos.
— Então… — Ele arquejou, apoiando as mãos nos joelhos. — Qual é a próxima maravilha mortal da floresta que vamos encontrar?
— Você quer mesmo saber? — deu uma risada curta, e Jacob endireitou-se, erguendo uma mão.
— Na verdade, não. Eu retiro a pergunta. — O grupo trocou olhares cansados, mas satisfeitos por estarem todos inteiros.
— Você está bem? — Theseus perguntou, ao se aproximar de , o olhar a avaliando rapidamente antes de desviar, seu semblante irritado.
Ela ergueu as sobrancelhas, surpresa com a pergunta repentina, mas deu de ombros.
— Bem o suficiente. Nada que um pouco de ar puro e a minha varinha de volta não resolvam.
— Falando nisso… — Theseus pegou a varinha antes mesmo que pudesse reagir, e ela soltou um suspiro exagerado e cruzou os braços.
— Eu acabei de ajudar a salvar todos nós. Se isso não é uma prova de confiança, eu não sei o que é.
— Você nos colocou para correr de uma criatura gigante e fedorenta. Se a gente não tivesse seguido suas ‘pistas’, nada disso teria acontecido.
— Se a gente não tivesse seguido minhas pistas, não teríamos encontrado aquele homem…
— Encontrado e perdido na mesma hora. Agora não fazemos ideia de onde ele está.
— Bom, isso ajuda? — Lally tirou uma varinha e uma carteira da bolsa, e Theseus franziu a testa ao ver os objetos. Ele pegou a varinha primeiro, a girando entre os dedos com uma expressão avaliativa. — Enquanto vocês estavam ocupados com o monstro gigante, eu revistei nosso colega. — Newt se aproximou, os olhos analisando o objeto com fascínio.
— Se conseguirmos identificar o núcleo e a madeira, podemos rastrear o dono.
— Talvez isso não seja necessário — murmurou, pegando a carteira das mãos de Lally e a abrindo. Lá dentro, havia um pequeno maço de notas de bruxos, algumas moedas encantadas e um pedaço de papel dobrado. o desdobrou cuidadosamente, revelando o que parecia ser um bilhete rabiscado às pressas, e o leu em voz alta.
— Se tudo der errado, encontre-me onde a serpente se curva para beber.
Um silêncio tenso pairou entre eles.
— Isso é uma localização? — Jacob questionou, se inclinando para espiar o bilhete.
— Parece um tipo de código. — Yusuf acrescentou. — A serpente se curva para beber… pode ser um rio.
franziu a testa, tentando lembrar de algo.
— No Brasil, há lendas de serpentes gigantes em rios e lagos. Se esse homem é um bruxo brasileiro, ele pode estar se referindo a algo local. — Antes que alguém respondesse, seus dedos encontraram outro documento dentro da carteira. Era um cartão de identificação levemente amassado, com um selo oficial no canto. Ela estreitou os olhos para ler o nome e a ocupação do homem. — Marcos Vasconcelos. Departamento de Execução das Leis da Magia do Ministério da Magia dos Estados Unidos do Brasil.
— Você não o conhece? — Theseus cruzou os braços, a encarando com intensidade, e ergueu o olhar para ele, percebendo a nota de desconfiança em sua voz.
— Deveria? — Ela devolveu, arqueando uma sobrancelha, enquanto Theseus inclinou ligeiramente a cabeça, sem desviar o olhar.
— Se ele trabalha no Ministério, e você também… é estranho nunca ter ouvido falar dele.
— Estranho seria se eu conhecesse pessoalmente todos os funcionários — rebateu, mas sentiu o peso do olhar dele ainda sobre si. Queenie pigarreou, tentando dissipar a tensão crescente.
— Bom, isso confirma que ele estava infiltrado em algo. Talvez ele estivesse monitorando Grindelwald, ou até mesmo trabalhando para ele.
— Seja qual for a verdade, parece que ele sabia de algo importante. — Yusuf assentiu lentamente. — Mas acabou encontrando o Mapinguari no caminho. Será que haviam outros com ele? Podem ter aproveitado enquanto o bicho fazia um lanchinho e fugido.
— Então só há uma coisa a fazer: achar esse tal lugar antes que quem quer que estivesse com aquele homem o encontre e suma. — fechou a carteira e a entregou para Lally, que assentiu.
— Podemos tentar localizar mapas ou registros antigos que mencionem algo assim. Isso pode nos levar ao próximo passo.
— Então é melhor começarmos logo — Theseus disse, guardando a varinha do homem no bolso interno do casaco e pegando o bilhete das mãos de , que cruzou os braços, o encarando.
— Ah, então agora minhas pistas são úteis?
— Não enche, . — Ele revirou os olhos, a observando por mais um instante antes de soltar um suspiro contido. — Mas, só pra lembrar, eu ainda não confio completamente em você.
— Ótimo. Seria muito chato se fosse fácil demais. — deu um pequeno sorriso, se inclinando ligeiramente para ele, que apenas bufou, desviando o olhar, enquanto o grupo voltava à discussão sobre o bilhete. — Mas veja pelo lado positivo… a floresta realmente foi generosa com você.
— Eu não suporto você. — Theseus lançou-lhe um olhar afiado, enquanto apenas riu, voltando a caminhar pela trilha.
A luz do dia começava a se apagar, tingindo a floresta com tons alaranjados e sombras que se estendiam como dedos longos pelo chão coberto de folhas secas. O canto dos pássaros diminuía, dando lugar ao som distante de criaturas noturnas despertando. se afastou um pouco do grupo, observando ao redor com o cenho levemente franzido, como se procurasse algo entre as árvores. Theseus, que a observava de onde estava, notou a rigidez em seus ombros e como seus olhos percorriam a escuridão crescente com uma atenção quase instintiva. Mesmo sem sua varinha, que ainda estava sob posse dele, ela parecia alerta, como se esperasse que algo saltasse das sombras a qualquer momento.
— Vamos precisar acampar aqui — ela anunciou de repente, se voltando para os outros, e Theseus arqueou uma sobrancelha.
— E por que, exatamente?
— Porque quando o sol se põe, a floresta se torna um lugar bem mais… traiçoeiro. — Ela cruzou os braços, olhando diretamente para ele.
— Mais? Já não estava traiçoeiro o suficiente? — Jacob, que ainda tentava recuperar o fôlego da correria de mais cedo, soltou um riso nervoso.
— Ela tem razão. Além dos predadores naturais da floresta, algumas criaturas mágicas ficam mais ativas à noite. E se formos azarados o bastante, podemos acabar cruzando caminho com outro Mapinguari. — Newt, já observando atentamente os arredores, assentiu, e Jacob arregalou os olhos.
— Outro? Espera aí, você tá dizendo que aquele grandalhão nojento pode ter família por perto?
— Os Mapinguaris são caçadores noturnos. De dia, eles podem ser territoriais, mas quando anoitece… bom, é quando eles realmente saem à caça — Newt continuou, ainda olhando ao redor, e Queenie fez uma careta.
— Então talvez seja melhor não ficarmos perambulando por aí.
— É o que eu estou dizendo. — gesticulou com a cabeça para a área ao redor. — Se quisermos evitar nos tornar a janta de alguma coisa, precisamos acampar aqui e lançar proteções.
Theseus pareceu pouco convencido, mas Newt já começava a traçar um perímetro. Eulalie sacou sua varinha, murmurando feitiços de dissuasão ao redor do local escolhido, enquanto Yusuf e Queenie reforçavam a barreira mágica. permaneceu parada, os observando em silêncio, com as mãos presas atrás do corpo. Theseus notou quando o olhar dela desviou brevemente para ele, depois para o bolso do seu casaco, onde ainda mantinha a varinha dela, e, por um instante, um brilho de frustração passou por seus olhos, mas ela não disse nada.
— Isso deve ser o suficiente para passarmos a noite sem surpresas desagradáveis. — Newt soltou um suspiro satisfeito ao ver que a área estava segura, e lançou um último olhar para a floresta já escura entre as copas das árvores.
— Espero que sim.
— Se algo nos atacar no meio da noite, , eu vou jogar a culpa em você. — Theseus se sentou sobre um tronco caído, cruzando os braços, enquanto mantinha os olhos nela, e a moça apenas sorriu de canto.
— Você já joga de qualquer forma. O que é mais uma acusação? — Ele resmungou algo inaudível, desviando o olhar, enquanto o resto do grupo se acomodava para a noite que prometia ser longa.
A fogueira crepitava suavemente, lançando sombras dançantes nas árvores ao redor. O grupo estava espalhado pelo acampamento, aproveitando o raro momento de calmaria depois da perseguição mais cedo. Lally ajeitou os óculos ao folhear um pequeno caderno, enquanto Queenie brincava distraidamente com uma faísca mágica que fazia flutuar entre os dedos. Jacob, por outro lado, estava deitado de costas sobre a terra, as mãos atrás da cabeça e um suspiro cansado escapando de seus lábios.
— Eu só queria dizer que essa foi, oficialmente, a pior corrida da minha vida — ele resmungou, olhando para o céu estrelado.
— Pior que a vez em que você teve que correr daquela Erumpente? — Newt perguntou, com um meio sorriso, e Jacob abriu um olho e apontou um dedo para ele.
— Okay, talvez seja a segunda pior.
— Vamos ver depois que passarmos mais uma noite na floresta. Quem sabe você não ganha mais uma história para adicionar à lista? — perguntou, se sentando em um tronco caído.
— Ah, que ótimo, é exatamente isso que eu queria. — Jacob bufou, fazendo todos rirem.
pegou um pedaço de pão da sacola de mantimentos e o partiu ao meio antes de dar uma mordida, observando enquanto Newt ajeitava algo em sua maleta.
— Será que já temos intimidade o suficiente para eu perguntar o que tem aí? Sempre quis saber. — Ela apontou com a cabeça para o objeto marrom nas mãos do bruxo.
— Bem, tem algumas criaturas que carrego comigo. Quando tudo estiver mais calmo, não me importaria de te mostrar.
— Só tome cuidado para elas não fugirem novamente — Queenie brincou, e Newt deu um sorriso fraco.
— Bom, eu… preciso ir ao banheiro. — Jacob pigarreou, quebrando o momento, e e Queenie se entreolharam antes da loira revirar os olhos com um pequeno sorriso.
— Você sempre escolhe os piores momentos, Jacob.
— O que posso fazer? A natureza chama. — Ele deu de ombros, e, antes que qualquer um pudesse responder, Theseus se adiantou.
— Eu vou com você.
— Eu agradeço a preocupação, grandão, mas acho que dou conta sozinho.
— Não é questão de dar conta ou não. Quero fazer uma ronda pelo perímetro, e você não vai andar por aí sozinho. Nem por um minuto. — Theseus cruzou os braços, olhando ao redor antes de voltar a encará-lo.
— Tá bom, tá bom. Vamos logo, antes que eu mude de ideia.
Os dois se afastaram pela trilha pouco iluminada, deixando o resto do grupo ao redor da fogueira. acompanhou com o olhar até que as silhuetas deles sumissem entre as árvores, levantando a cabeça para observar os pássaros que levantavam voo das copas das árvores, como se tivessem sido perturbados por algo invisível. Pequenos vagalumes começaram a piscar ao redor do acampamento, suas luzes douradas flutuando entre os troncos, e, por um instante, tudo parecia calmo.
Calmo até demais.
— Isso sim é um verdadeiro luxo em meio a uma floresta traiçoeira. — Jacob suspirou, aliviado, enquanto terminava de esvaziar a bexiga atrás de um tronco. A poucos passos dele, Theseus caminhava devagar, os olhos atentos ao chão, como se estivesse avaliando cada detalhe ao redor.
— Se considerar que podemos ser atacados a qualquer momento, talvez não seja tão luxuoso assim.
— Você realmente sabe como acabar com a única parte boa dessa viagem. — Jacob bufou, ajeitando as calças, e Theseus ignorou o comentário, se mantendo em alerta.
Depois de alguns segundos, ele quebrou o silêncio:
— Você confia nela?
— Em quem?
— .
— Bom, ela não tentou nos matar ainda, o que já é um bom sinal. — Theseus não riu. Seu olhar permaneceu fixo em algum ponto adiante.
— Não estou brincando.
— Olha, eu não sou um especialista em julgar caráter, mas… algo me diz que ela está do nosso lado. Não sei explicar, só sinto isso — Jacob constatou, mas ele não respondeu, apenas continuou a andar ao redor. — Não julgo você por ser cauteloso, mas eu acho que ela só quer ajudar.
Os dois seguiram de volta para o acampamento, enquanto a floresta ao redor ainda parecia inquieta, com os sons distantes de insetos e o ocasional farfalhar das folhas.
— Então, quais os planos para amanhã? — Jacob perguntou, cruzando os braços.
— Provavelmente teremos que sair da floresta e nos dividir para procurar mais informações sobre aquele bilhete e o dono dele — Theseus respondeu, ainda em tom de análise. — Alguns de nós podem tentar encontrar registros no Ministério, enquanto outros investigam possíveis locais que se encaixem na descrição.
— Você quer dizer que vamos voltar pra civilização? Com ruas, comida de verdade e, principalmente, camas?
— Temporariamente. — Theseus lançou um olhar de canto, mas Jacob parecia esperançoso demais para se importar.
O acampamento já estava à vista. A barreira mágica ao redor oscilava levemente, quase imperceptível, garantindo que nada do lado de fora os enxergasse. Assim que Theseus deu um passo à frente e adentrou o acampamento, se moveu rápido e segurou seu braço. Ele parou, surpreso, e encarou o rosto dela.
— Silêncio — ela sussurrou, os olhos fixos nele, os dedos apertando seu braço mais do que o necessário, e, por um instante, ele não conseguiu desviar o olhar.
Só então percebeu o que realmente estava acontecendo. não estava olhando para ele, mas além dele. Theseus se virou lentamente e viu o que a deixou tão tensa. Um brilho sinuoso cortava a floresta, como se o próprio fogo tivesse ganhado vida e estivesse deslizando entre as árvores. Ele se movia com uma fluidez hipnotizante, um calor espectral que não queimava, mas iluminava tudo ao redor. O Boitatá deslizava entre as árvores, seu corpo iluminado como uma chama viva, desenhando rastros dourados e azulados na vegetação ao redor. Ele não parecia agressivo, mas se movia como se estivesse farejando algo, tentando enxergar além da barreira mágica que protegia o acampamento.
— Não pode ser… — Newt se levantou de imediato, fascinado, mas atento. — Um Boitatá.
Jacob, que estava prestes a perguntar do que se tratava, apenas engoliu em seco ao ver a expressão de Queenie. Lally se inclinou ligeiramente para frente, observando a luz com fascínio, enquanto Yusuf segurava a varinha com mais força.
— Ele protege a floresta contra aqueles que a destroem — murmurou, ainda com os olhos fixos na luz ondulante. — Mas se achar que somos uma ameaça…
— Ah, claro, porque a floresta já não tinha criaturas suficientes tentando nos matar. — Theseus bufou baixinho, e o encarou com um olhar sério.
— Ele sente os invasores pelo cheiro e pelo som. Se ficarmos em silêncio, ele não vai nos ver e vai simplesmente passar.
O brilho intensificou-se por um instante, se espalhando ao redor do acampamento como se analisasse a área. Por um segundo, sentiu a respiração de Theseus prender ao lado dela, e sua própria pulsação acelerou. A chama viva passou perigosamente perto, iluminando os rostos do grupo por um instante antes de deslizar para a escuridão. O silêncio era absoluto, como se ninguém ousasse se mover até ter certeza de que a criatura tinha ido embora. Quando o brilho finalmente sumiu por completo entre as árvores, foi como se um peso invisível fosse retirado de seus peitos. Um por um, todos soltaram longas e silenciosas expirações, percebendo o quanto haviam prendido a respiração.
piscou algumas vezes, ainda sentindo a tensão em seus músculos. Foi só então que percebeu que sua mão ainda estava segurando o braço de Theseus. Seu olhar caiu para os próprios dedos, firmes sobre a manga do casaco dele, e ela rapidamente o soltou, como se tivesse sido queimada. Seu rosto esquentou levemente, e ela desviou o olhar antes que ele pudesse perceber.
— Olha, eu sei que o Brasil é lindo e tudo mais, mas eu vou precisar de umas férias depois disso. — Jacob quebrou o clima, soltando um suspiro exagerado.
Newt sorriu de leve, ainda observando onde o Boitatá havia sumido. Theseus desviou o olhar da escuridão e o pousou sobre , ainda sentindo o fantasma do toque dela em seu braço.
— Parece que suas pistas nos trouxeram para um caminho bem… iluminado — ele comentou, com um tom de provocação.
arqueou a sobrancelha, os lábios curvando-se em um pequeno sorriso.
— Não enche, Scamander. — E então, como se nada tivesse acontecido, ela se afastou, voltando a se sentar. — De nada por salvar sua vida… de novo.
passou uma das mãos pelo rosto, afastando o sono, e se levantou. Lally, que estava próxima, percebeu o movimento e se virou para ela com um pequeno sorriso.
— Bom dia. Dormiu bem?
— Considerando que a qualquer momento podíamos ser atacados por uma criatura mortal? Maravilhosamente — respondeu com sarcasmo, e Lally soltou um leve riso antes de apontar para um dos mapas abertos sobre uma rocha.
— Bom, se quiser um pouco de conforto e um teto sobre a cabeça, é melhor se apressar. Sei exatamente para onde devemos ir para sair dessa floresta e voltarmos à civilização.
— Tá, mas por que, exatamente, vamos seguir andando? — perguntou, e Newt ergueu os olhos de sua maleta, enquanto os outros também pararam para encará-la. — Podemos aparatar — ela continuou, dando de ombros. — Se fizermos isso em conjunto, eu posso levar a gente direto para o centro da cidade mais próxima.
A ideia parecia sensata, mas enquanto os outros ponderavam sobre a sugestão, Theseus cruzou os braços e lançou um olhar cético em sua direção.
— E se for uma armadilha? — ele questionou, a voz carregada de desconfiança, e soltou um suspiro audível, já esperando que ele fosse ser um problema.
— Certo, Scamander, me diz… qual seria meu grande plano? Te levar para o meio do oceano e te largar lá? Porque, sinceramente, me soa tentador.
— Eu só queria um café da manhã antes de mais uma briga — Jacob, ao fundo, murmurou, mas foi em vão, porque o auror já se aproximava de com um olhar desconfiado.
— Não é possível que vocês vão cair nessa. Yusuf, uma ajudinha aqui? — Theseus falou, sem tirar os olhos da mulher à sua frente, sabendo que o amigo era o mais racional de todos ali.
Yusuf suspirou, cruzando os braços enquanto analisava a situação. Ele não parecia completamente convencido, mas também não parecia descartar a ideia de imediatamente.
— Eu entendo a preocupação, Theseus, mas… a alternativa é andarmos por horas em uma floresta que claramente não quer a nossa presença. — Ele lançou um olhar significativo ao redor, como se esperasse que algo surgisse da mata a qualquer momento.
— Obrigada. — sorriu, satisfeita, mas Theseus não se deu por vencido.
— Isso não prova que ela não pode nos levar para um beco sem saída, ou pior.
revirou os olhos e deu um passo à frente, diminuindo a distância entre eles.
— Olha, eu entendo que você tem essa necessidade constante de controlar tudo, mas talvez, só talvez, seja hora de confiar em alguém que conhece melhor esse lugar. — Ela inclinou levemente a cabeça, o desafiando com o olhar. — Ou prefere arriscar e encontrar outro Mapinguari pelo caminho?
Theseus sustentou o olhar por um momento, a mandíbula travada em frustração. Ele sabia que ela tinha razão, e isso só tornava tudo mais irritante.
— Se alguma coisa der errado…
— Pode me prender pessoalmente. — sorriu de lado, levantando as mãos em rendição. — E, caso te faça sentir mais seguro, pode amarrar minhas mãos.
Theseus exalou pelo nariz, fechando os olhos por um instante antes de finalmente ceder.
— Tudo bem. — Ele observou a mulher estender as mãos em sua direção e as amarrou novamente.
— Ótimo! Agora todo mundo dá as mãos.
Os membros do grupo começaram a se posicionar, formando um círculo. Theseus segurou a mão de Newt com naturalidade, mas hesitou antes de pegar a de . Ela notou e ergueu uma sobrancelha.
— Você quer que eu assine um contrato garantindo que não vou te matar?
— Só nos leve logo para a cidade. — Ele bufou, mas finalmente entrelaçou os dedos aos de , sua mão quente e firme contra a dela.
No instante em que o toque se fechou, sentiu um arrepio subir por sua espinha, uma corrente elétrica que percorreu seu corpo em um segundo. Foi involuntário, inesperado, e completamente irritante. Mas ela não demonstrou. Apenas respirou fundo, mantendo a expressão indiferente, enquanto se preparava para aparatar. E então, com um movimento firme, girou sobre si mesma, levando todos consigo. O impacto da aparatação foi imediato. O mundo girou por um instante antes que o grupo sentisse o chão sólido sob os pés novamente. Jacob, no entanto, não teve tanta sorte.
— Eu odeio isso… — ele gemeu, segurando o estômago, enquanto se curvava levemente, tentando se recompor.
— Respire fundo, Jacob. O enjoo passa logo. — Lally tentou tranquilizá-lo, dando leves tapinhas em suas costas.
Os outros, no entanto, já estavam absorvendo o novo cenário ao redor. O lugar era vibrante, um contraste gritante com a floresta densa e perigosa de onde tinham vindo. As ruas eram movimentadas, repletas de pessoas que pareciam diferentes umas das outras. As roupas eram um espetáculo à parte, cheias de cores vivas, tecidos leves e padrões únicos. Havia magia por toda parte, escondida sutilmente dos olhos trouxas, mas perceptível para aqueles que sabiam onde olhar. observava a cena com familiaridade, mas, ao se virar para os outros, viu os olhares curiosos, e completamente deslocados, que lançavam ao redor. Os Scamander estavam vestidos em seus característicos casacos pesados, Yusuf e Lally usavam roupas formais demais para o clima, e Queenie chamava atenção de um jeito que não deveria.
— Temos que mudar esses trajes. — Ela suspirou, estendendo os braços para que Theseus tirasse as amarras, e assim ele o fez.
— Eu gosto do meu casaco — Jacob comentou, franzindo a testa ao olhar para si mesmo.
— Sim, e eu também gostaria de não ser presa por andar com um monte de espiões estrangeiros vestidos como se saíssem de um jornal britânico — rebateu, estreitando os olhos. — Theseus já quer me matar, então não me deem mais problemas.
— Ele quer matar todo mundo — Jacob murmurou, já um pouco mais recuperado.
— Não é verdade — Theseus protestou, mas o olhar de dizia que ela não estava muito convencida. — E como exatamente você sugere que façamos isso?
Ela os observou da cabeça aos pés. De fato, um grupo de pessoas vestindo roupas gastas de viagem e capas longas chamava bastante atenção, mesmo em meio à agitação do centro.
— Eu conheço um lugar — enfim disse, balançando a cabeça. — Mas vocês vão ter que confiar em mim.
— Começamos bem. — Theseus suspirou pesadamente.
— Bom, então sigam-me. — Ela indicou com a cabeça, já caminhando entre as ruas agitadas.
O grupo hesitou por um momento antes de segui-la, trocando olhares entre si. Theseus ainda mantinha a expressão cautelosa, enquanto Newt parecia absorver cada detalhe ao redor, atento às pequenas peculiaridades do lugar. Diferente do mundo bruxo na Europa, onde a magia era cuidadosamente separada da vida dos não-mágicos, ali tudo parecia se misturar de uma forma mais sutil, quase natural. andava com confiança pelo meio das pessoas, desviando habilmente de feirantes, vendedores ambulantes e até de um garoto que brincava com um pião encantado. O grupo tentou acompanhá-la, mas não era tão fácil. Jacob quase tropeçou em um senhor que carregava uma bandeja com pequenos frascos coloridos, e Queenie teve que puxá-lo pelo braço antes que derrubasse tudo.
— Eu já disse que preciso de um café antes de qualquer coisa? — ele resmungou, tentando recuperar o equilíbrio.
Após alguns minutos de caminhada, parou diante de um prédio grande e rústico, sua fachada de madeira escura e janelas altas se misturando bem com os edifícios ao redor. O letreiro acima da entrada era discreto, quase imperceptível para olhos desatentos. O grupo se reuniu ao redor dela, observando a construção com expressões curiosas.
— É uma hospedaria para bruxos que chegam de outras partes do mundo. Não é muito chamativa, o que é ótimo para nós agora.
— E você tem certeza de que podemos confiar nesse lugar? — Theseus estreitou os olhos, ainda desconfiado, e soltou um suspiro dramático, colocando as mãos na cintura.
— Eu confio mais nesse lugar do que em qualquer um de vocês, para ser bem sincera.
Queenie abafou um riso, enquanto Newt apenas arqueou uma sobrancelha, interessado na hospedaria. Theseus, por sua vez, apenas fechou a cara, soltando um suspiro impaciente.
— Certo. Então vamos logo com isso.
— Sejam bem-vindos à Casa dos Ventos.
As portas da hospedaria se abriram para revelar um ambiente acolhedor, iluminado por candelabros encantados que flutuavam pelo salão principal. O cheiro de café recém passado e pão de queijo quente pairava no ar, e o som de risadas e conversas preenchia o espaço. O lugar era rústico, mas convidativo, com móveis de madeira escura e tapeçarias coloridas pendendo das paredes. Diferentes bruxos ocupavam as mesas espalhadas pelo salão, alguns vestidos como viajantes, outros com trajes típicos de diferentes partes do Brasil.
Antes que a brasileira pudesse dizer qualquer coisa, uma voz animada ecoou pelo espaço, falando uma língua que ninguém do grupo, exceto Lally e , conseguia entender:
— Mas veja só quem resolveu aparecer! — Um homem de cabelos cacheados e sorriso largo surgiu do balcão, limpando as mãos no avental antes de caminhar apressado na direção de . Ele abriu os braços e a puxou para um abraço forte, a erguendo do chão por um instante. — Até que enfim deu as caras, !
— Se soubesse pelo que passamos nas últimas vinte e quatro horas, não estaria me tratando assim. — Ela riu, dando um tapa de leve no ombro dele assim que ele a soltou.
— Ora, mas é claro que estaria. — O homem sorriu, antes de dar um passo para trás e olhar os outros com curiosidade, analisando as vestimentas de cada um. — E quem são seus amigos? Ingleses, eu suponho.
— Exatamente. Esses são Newt, Jacob, Queenie, Yusuf, Lally e Theseus. — indicou o grupo com um gesto casual.
— Sou Caio, atual dono deste lugar. Meu pai e a família da sempre foram muito próximos, então essa garota vive entrando e saindo daqui como se fosse dona do pedaço.
— Ei! — protestou, cruzando os braços. — Exagerado.
— É verdade. — Ele piscou para ela, antes de olhar para os outros. — Mas fiquem tranquilos, vocês são bem-vindos. E tenho certeza de que estão morrendo de fome.
— Finalmente, um homem que entende o que realmente importa! — Jacob exclamou, aliviado, fazendo os outros rirem. Caio riu também e estalou os dedos, chamando um dos funcionários.
— Prepara uma mesa com comida para os nossos hóspedes.
Enquanto o grupo seguia para uma das mesas, Theseus observava a interação entre e Caio com um olhar curioso. Havia algo na forma como o brasileiro falava com ela, na maneira como ele sorria sem qualquer hesitação e a tratava com uma familiaridade descontraída que Theseus não estava acostumado a ver.
A mesa estava repleta de pratos coloridos, exalando aromas que fizeram Jacob suspirar de alívio ao ver que, finalmente, teria uma refeição decente.
— Isso sim é hospitalidade — ele murmurou, antes de dar a primeira mordida em um pão de queijo, fechando os olhos com satisfação.
— Se tem uma coisa que nunca vai faltar aqui, é comida boa. — riu, pegando um pedaço de pão e passando uma generosa camada de manteiga.
Os outros se acomodaram aos poucos, experimentando os pratos que lhes eram servidos. Newt tentava descobrir os ingredientes, enquanto Queenie sorria, divertida com a empolgação dele.
— Theseus, prova esse aqui — Caio sugeriu, empurrando um prato na direção do auror, que até aquele momento não havia tocado em nada. Theseus ergueu uma sobrancelha, hesitante, mas, sob o olhar desafiador de , pegou um pedaço e mastigou lentamente.
— É… muito bom — admitiu, fazendo o amigo dela rir.
— Viu só? Não é só você que sabe das coisas, Scamander. — apoiou o cotovelo na mesa e o rosto na mão, sorrindo.
— E agora? — Yusuf perguntou, voltando a focar no que importava. limpou a boca com um guardanapo antes de responder.
— Temos que nos dividir. Theseus, você trabalha no Ministério, não é? — perguntou, e o bruxo assentiu com a cabeça. — Então eu, você e Newt podemos ir até lá para procurar informações sobre o cara que encontramos na floresta. Queenie, Jacob, Lally e Yusuf podem começar a procurar informações sobre aquele bilhete, e depois nos encontramos aqui.
— E desde quando você dita os planos? — Theseus cruzou os braços, cético.
— Tem algum plano melhor? — ela perguntou, o esperando protestar, mas o bruxo permaneceu calado. — Ótimo, faremos assim então.
— O que nos garante que você não está nos levando para uma armadilha? Quer dizer, quando Grindelwald estava começando a ganhar poder anos atrás, havia apoiadores dele infiltrados no Ministério.
soltou um suspiro, se recostando na cadeira com uma expressão cansada, mas mantendo o olhar fixo em Theseus.
— Se eu quisesse entregar vocês, já teria feito isso há muito tempo — ela disse, cruzando os braços. — Mas entendo sua preocupação. Se você não confia em mim, confie no seu irmão. Você acha que eu levaria Newt para uma armadilha?
Theseus apertou os lábios, sem resposta imediata. Ele queria discordar, queria rebater com alguma acusação, mas sabia que Newt não teria aceitado o plano se tivesse sequer um sinal de perigo vindo dela. Ainda assim, não gostava da ideia de seguir alguém que ele mal conhecia.
— Certo, então partimos para o Ministério — Newt interveio, tentando dissipar a tensão. — Quanto menos tempo perdermos, melhor.
— Tá, mas como vamos arranjar roupas novas e identidades desconhecidas? — Theseus perguntou, se recostando na cadeira, e deu de ombros.
— Bem-vindo ao Brasil, Scamander. Se tem uma coisa que a gente sabe fazer bem, é dar um jeito. — Ele apenas a observou por um instante antes de balançar a cabeça, ainda assimilando aquela nova realidade. — Me sigam.
Ela os guiou até uma parte reservada da hospedaria, onde uma pequena loja de vestimentas mágicas funcionava no andar de cima. O lugar era apertado, mas as araras estavam cheias de roupas vibrantes e confortáveis, bem diferentes dos pesados sobretudos e trajes formais que eles usavam. Lally pegou um vestido leve com detalhes bordados e sorriu.
— Bem melhor do que minha roupa de viagem — ela comentou, já indo até um provador para se trocar.
Queenie correu os dedos por uma blusa de tecido fino e colorido, a analisando com um brilho curioso nos olhos.
— Adorei isso aqui — ela comentou, antes de pegar um par de brincos chamativos e um lenço para o cabelo.
Enquanto isso, Jacob observava Theseus e Yusuf hesitarem diante das opções.
— Vamos lá, pessoal. Não tem nada aí no gosto de vocês?
— Eu só estou escolhendo com cuidado — Theseus respondeu, pegando uma camisa de linho clara e uma calça de tecido leve.
— Que tal essa? Vai combinar com sua personalidade rabugenta. — ergueu uma sobrancelha, segurando uma peça estampada e a erguendo na direção dele.
Theseus revirou os olhos e pegou a própria escolha sem dar atenção a ela, observando Jacob segurando uma camisa parecida com a que sugerira.
— Na verdade, essa daqui parece bem confortável… — o padeiro comentou, e Theseus soltou um suspiro, sem querer prolongar o assunto.
Depois de alguns minutos, todos estavam prontos, vestindo roupas bem mais adequadas ao calor do Brasil. Queenie ajustava o lenço no cabelo, enquanto Lally admirava os detalhes do tecido de seu vestido. também reapareceu com uma nova roupa. Seu vestido era longo e leve, feito de um tecido fresco que se ajustava perfeitamente ao seu corpo, realçando suas curvas brasileiras com naturalidade. As alças finas deixavam seus ombros à mostra, e o movimento do tecido conforme ela andava adicionava um charme despreocupado. Theseus notou a mudança por um segundo a mais do que gostaria, mas logo desviou o olhar, focando em ajustar as mangas da própria camisa. , por sua vez, percebeu o olhar do auror, mas não disse nada, apenas abriu um pequeno sorriso antes de se virar para os outros, os analisando com um olhar crítico, e então assentiu.
— Agora sim, vocês não parecem que acabaram de chegar de um funeral.
— E você não parece alguém confiável — Theseus retrucou, com um sorriso cínico, e apenas devolveu o sorriso, seguindo para o salão principal novamente e se despedindo de Caio.
— Cuidado — ele disse num tom baixo, dando um leve aperto em seu ombro ao passar, e sorriu de canto, acenando com a cabeça.
Theseus observou a troca, sentindo aquela estranheza outra vez. Será que todos os brasileiros se tratavam assim, ou os dois eram mais que apenas amigos? Não que se importasse, é claro. Ele respirou fundo e pegou seu próprio casaco. Ainda não confiava completamente em , mas, por ora, não tinha escolha.
Era hora de conhecer o Ministério da Magia do Brasil.