Revisada por: Júpiter
Última Atualização: 24/11/2024— Você vai gastar a bateria só de olhar para a tela assim — comentou ao meu lado, me despertando da minha bolha. Ela estava com um sorriso de canto que tentava aliviar minha tensão. Dei um suspiro, largando o celular por um instante e cruzando os braços.
— Eu sei, é só que... é importante. Mais importante do que eu gostaria de admitir — murmurei, sem tirar os olhos do aparelho, como se isso fosse fazer a resposta chegar mais rápido.
Antes que pudesse responder, uma risada familiar veio de algumas mesas à frente. Meus olhos, quase por reflexo, encontraram . Ele estava sentado com um grupo de amigos, a voz baixa, mas o suficiente para que eu percebesse que ele estava contando alguma história divertida. Ele levantou o olhar por um breve segundo e, ao me ver, ergueu as sobrancelhas e abriu um sorriso de canto ladino, o mesmo daquele dia.
Tentei ignorar, mas minha mente já estava viajando de volta para aquele momento.
Era final de semestre e o dia mais aguardado do campus havia chegado, o último debate da matéria de Cultura Digital e Mídias Sociais e, finalmente, os dois favoritos do campus iriam se enfrentar. Dentro do auditório da Boston College, aquele espaço não era apenas um lugar de aprendizado naquela manhã, mas o epicentro do evento que agitava todo o campus. Estudantes de diversas áreas se empilhavam nos corredores, disputando um lugar para assistir ao confronto entre e . Murmúrios e risadas ecoavam pelas paredes enquanto as expectativas cresciam.
se preparava em silêncio, sentada na primeira fileira com um caderno repleto de anotações minuciosas e post-its coloridos. Era sua marca registrada: uma organização impecável e uma mente afiada. Ela podia sentir os olhares de curiosidade e apoio dos colegas, mas se manteve focada. À sua esquerda, chegava ao auditório com seu jeito descontraído e a confiança que sempre exalava. Um fone de ouvido pendia de um lado, e ele murmurava algo para si mesmo, talvez ensaiando seu discurso. Quando seus olhares se cruzaram por um breve segundo, deu aquele sorriso ladino de costume, que irritou profundamente, fazendo-a rolar os olhos e prestar atenção na nova movimentação que acontecia atrás de seu colega.
O professor entrou e pediu silêncio, dando início àquele que seria o debate mais comentado do semestre.
— Hoje, exploraremos um tema polêmico: “A influência das redes sociais na saúde mental. Avanço ou ameaça?” E, como todos sabem, nossos melhores debatedores já estão prontos para começar.
, sempre meticulosa e incisiva, começou seu discurso com um tom sério e certeiro:
— A pressão para corresponder aos padrões irreais promovidos pelas redes sociais afeta diretamente a autoestima dos jovens. O ciclo de comparação permanente leva a um sentimento de insuficiência. Há pesquisas que mostram que o aumento do tempo de tela está ligado a picos de ansiedade e depressão, criando uma geração que, ironicamente, está mais conectada e, ao mesmo tempo, mais sozinha do que nunca.
O auditório que até então estava em silêncio, acabou explodiu em murmúrios e acenos de concordância. Um grupo de alunos na primeira fila, que sempre apoiava , lançou olhares desafiadores para , esperando por sua resposta.
levantou lentamente, ajeitando a postura com um sorriso que sugeria um desafio implícito. Seu tom era calmo, mas carregado de uma confiança que irritava profundamente.
— Claro, a narrativa sobre o impacto negativo da internet é convincente, mas é apenas uma metade da história. Quem aqui já aprendeu algo novo por meio de vídeos curtos ou encontrou uma comunidade que o fez se sentir menos sozinho? — Ele lançou a pergunta para a plateia, e várias mãos se levantaram, algumas acompanhadas de expressões de reconhecimento.
Ele prosseguiu, com um olhar direto para :
— A verdade é que culpar as redes sociais é mais fácil do que encarar o fato de que a responsabilidade está em como escolhemos usá-las. Sim, a internet tem seus perigos, mas também é um lugar onde vozes marginalizadas encontram apoio e onde talentos anônimos podem ser descobertos. O problema não é a ferramenta, mas a maneira como a usamos.
O silêncio inicial foi quebrado por um burburinho de estudantes que discutiam entre si. Alguns murmuravam concordâncias:
— Ele tem um ponto, né? — comentou um aluno, enquanto outro retrucava:
— Mas também não está errada, o impacto mental é real!
sentiu uma pontada de irritação crescer, mas manteve a compostura.
— , é fácil romantizar a ideia de uma internet que conecta e inspira, mas a realidade para muitos é a constante busca por validação. Essa busca leva à exaustão emocional. Não se trata apenas de como a usamos, mas de como somos moldados a depender dela — ela enfatizou a última frase com um olhar que transmitia desafio.
sorriu de lado, sabendo que havia atingido um ponto sensível.
— E é por isso que eu digo, , que devemos educar para um uso consciente, não demonizar o meio. Quando usamos as redes sociais como uma ferramenta de crescimento, elas são mais poderosas do que qualquer crítica pode argumentar.
, agora com uma expressão mais séria, rebateu:
— Talvez seja real para quem se destaca, mas para muitos, essa realidade é uma máscara que esconde o cansaço de tentar pertencer.
O debate continuou por mais alguns minutos, cada troca elevando a temperatura no auditório. Alguns alunos gravavam a discussão, outros trocavam mensagens animadas comentando as falas mais afiadas.
— Essa briga é sempre um show à parte — alguém comentou em um sussurro que arrancou risadas ao redor.
Quando o debate chegou ao fim, a tensão ainda pairava no ar, como se as palavras ainda reverberassem nas paredes do auditório. O silêncio que se seguiu foi rapidamente quebrado por uma série de murmúrios e aplausos dispersos. O professor, com um sorriso de satisfação, levantou-se e dirigiu-se aos alunos:
— Hoje, tivemos mais uma demonstração do poder do diálogo e da importância do confronto de ideias. É por meio de debates assim que a nossa compreensão sobre temas complexos se aprofunda. — Ele olhou para e , que ainda se encaravam com expressões intensas. — Lembrem-se, o propósito aqui não é vencer, mas provocar reflexões e questionar certezas. E vocês dois, mais uma vez, fizeram isso com maestria.
Os murmúrios aumentaram, desta vez acompanhados de sussurros de reconhecimento. O professor continuou, sua voz firme, mas cheia de entusiasmo:
— Não existe um vencedor hoje, porque ambos conseguiram provar seus pontos de forma clara e fundamentada. O verdadeiro triunfo é de todos nós, que saímos daqui com novas perspectivas. Então, levem isso consigo: questionem, ouçam e continuem a debater. Até o próximo semestre!
O professor acenou com a cabeça, e os alunos começaram a se levantar, comentando sobre as falas que mais os impactaram. ajeitou suas anotações com uma expressão de irritação, enquanto se recostava na cadeira, com um sorriso de satisfação dançando em seus lábios. O garoto sabia o quanto a rival não gostava daqueles discursos.
— Mandou bem, — disse enquanto se levantava, observando a garota, agora já de pé, virar-se para a saída do auditório.
parou por um breve instante ao ouvir a voz de , mas não se deu ao trabalho de responder. Em vez disso, lançou um olhar de canto que misturava desprezo e desafio, antes de retomar seu caminho para fora do auditório. O corredor já estava cheio de alunos comentando animadamente o debate, e ela sentiu as ondas de conversas cruzarem o espaço como se ainda estivessem em volta dela.
O rapaz a observou sair, com o sorriso afiado ainda no rosto. Ele sabia que aquele tipo de comentário a irritava, mas era impossível resistir. Provocá-la era quase um ritual para ele, uma forma de manter a rivalidade viva e pulsante.
Enquanto ela passava pelos grupos de alunos, algumas vozes surgiram no ar:
— estava afiada hoje. Ela quase desbancou o dessa vez — disse uma colega, admirada.
— Mas ele foi mais convincente no final, com aquele argumento sobre a responsabilidade de uso. Eles são como fogo e gelo — respondeu outro, rindo.
respirou fundo, tentando afastar a irritação que borbulhava em seu peito. Era frustrante o quanto conseguia tirá-la do sério com tão pouco esforço. Mas, por mais que o odiasse naquele momento, sabia que ele era o único que conseguia empurrá-la além de seus limites intelectuais.
finalmente se levantou e começou a caminhar em direção à saída. Ao passar pelos colegas, acenava casualmente e respondia a alguns comentários com sua voz calma e confiante. Ao alcançar a porta, seus olhos cruzaram novamente com , que estava parada ao lado de um grupo, escutando um amigo falar. Por um segundo, o olhar dela encontrou o dele, cheio de uma determinação que ele conhecia bem.
Ele sorriu novamente, dessa vez mais suave, como um aceno silencioso de reconhecimento. virou o rosto, mas não antes de ele perceber o leve rubor em suas bochechas.
— É, isso vai ser interessante — pensou , saindo do auditório e se misturando ao mar de vozes e olhares curiosos.
Eu respirava fundo, tentando manter a compostura, mas o episódio passou pela minha mente. Bufei, apertando o lápis entre os dedos enquanto olhava para o caderno aberto à minha frente. As palavras rabiscadas ali pareciam perder o foco, sendo rapidamente substituídas pela imagem de recostado na cadeira, aquele sorriso insuportavelmente confiante no rosto.
— Ainda pensando no debate com o ? — perguntou baixo, com um tom de quem já sabia a resposta, mas não resistia em provocar. Ela me observava com um olhar divertido e a sobrancelha arqueada, pronta para qualquer reação minha.
— Eu não estou pensando nisso — menti, mordendo o lábio e desviando o olhar para qualquer lugar que não fosse o rosto curioso da minha melhor amiga. Mas o jeito que ela me olhava deixava claro que não acreditava em uma palavra sequer.
riu, um som leve e familiar que sempre me desarmava um pouco.
— Ah, claro. Porque é super comum você bufar feito um touro quando está tranquila, não é? — Ela cutucou meu ombro, arrancando um sorriso que tentei, sem sucesso, esconder.
— Ele só... ele sabe exatamente como me tirar do sério — suspirei, voltando a me recostar na cadeira, deixando a cabeça cair para trás. A luz suave da biblioteca parecia mais intensa quando atravessava as janelas, destacando algumas mesas à frente, conversando com um grupo de amigos. — E a pior parte é que ele faz isso de propósito, como se fosse uma competição.
— E não é? — provocou, piscando e me lançando um sorriso de quem já conhecia aquela história de cor. — Vocês dois transformam qualquer troca de olhares em uma guerra fria. Todo mundo já espera por isso.
Revirei os olhos, mas uma pequena risada escapou. Ela tinha razão, e isso me irritava tanto quanto a lembrança de se levantando e dizendo "mandou bem, Mendes" naquele tom condescendente.
— É, bom... ele que se prepare. Da próxima vez, sou eu quem vai sair com aquele sorriso irritante, não ele — dei um sorriso de canto.
ergueu as mãos em rendição, ainda rindo.
— Eu nem duvido, amiga. Mal posso esperar para ver o próximo round.
Foi então que o som agudo de uma notificação cortou o ar, fazendo meu coração disparar. Minhas mãos tremiam levemente enquanto olhava para a tela do celular. O brilho da notificação parecia iluminar mais do que devia.
— Chegou — para Jeisa, a voz saiu baixa e trêmula.
se aproximou ainda mais, os olhos brilhando de curiosidade e empolgação. Ela colocou a mão suavemente em meu braço, como se quisesse me dar coragem.
— Então, o que está esperando? Abre logo! — disse ela, tentando esconder a própria ansiedade com um sorriso encorajador.
Respirei fundo, sentindo meus dedos trêmulos deslizarem pela tela. Toquei na notificação e a mensagem se abriu lentamente, cada segundo se arrastando como uma eternidade. A primeira palavra que vi fez meu coração saltar.
soltou um pequeno grito abafado, levando a mão à boca para não fazer barulho na biblioteca.
— Você conseguiu! Eu sabia! — sussurrou, a animação dançando em seus olhos.
Olhei para a mensagem completa, lendo em voz baixa para que só nós duas pudéssemos ouvir:
— “Parabéns! Sua inscrição foi aprovada. Mais detalhes sobre o evento serão enviados em breve. Prepare-se para uma experiência única.” — Senti uma mistura de alívio e excitação percorrer meu corpo, um sorriso finalmente se formando em meus lábios.
me deu um leve empurrão no ombro.
— Isso é incrível, Koi! Eu sabia que você ia conseguir!
Antes que eu pudesse responder, senti um olhar queimando de curiosidade a poucos metros. , agora sozinho em sua mesa, parecia perceber a nossa animação. Ele ergueu uma sobrancelha, um sorriso intrigado surgindo enquanto inclinava a cabeça levemente, como se perguntasse silenciosamente o que estava acontecendo.
Eu ignorei o olhar dele, voltando para .
— Eu não acredito!!! — disse, mais para mim mesma do que para ela. apertou minha mão.
Quando olhei de novo, meio que por reflexo, para a mesa de , percebi algo diferente. Ele tinha o celular na mão, e uma expressão de surpresa atravessava seu rosto. Em seguida, seus lábios se curvaram em um sorriso satisfeito. Ele parecia tão contente quanto eu, e isso fez uma onda de emoções confusas passar por mim. Será que ele também...?
Entrei no auditório que reservaram para a reunião dos aprovados, e estava mais vazio do que o habitual. Apenas os selecionados estavam presentes, um grupo pequeno e ansioso que ocupava as primeiras fileiras. A atmosfera refletia a ansiedade de todos que estavam presentes. O som de cadeiras rangendo e cochichos abafados ecoava pelo espaço, criando um contraste estranho com o silêncio que pairava sobre todos.
Sentei-me em uma das cadeiras do meio, ao lado de um garoto loiro que nunca tinha visto pelo campus, o couro frio fazendo minhas costas se enrijecerem. Minhas mãos estavam geladas e inquietas, dedilhando o tecido do meu jeans enquanto meus olhos varriam a sala. Podia ver rostos conhecidos e desconhecidos, todos com a mesma mistura de ansiedade e antecipação. Olhares trocados, sorrisos nervosos, respirações contidas.
A mulher que conduzia o evento entrou e tomou o microfone com uma presença que fez todos pararem de murmurar. Seu cabelo grisalho estava preso em um coque apertado, e seus olhos tinham um brilho severo. Ela olhou ao redor com um ar de avaliação antes de começar a falar.
— Bem-vindos — sua voz ecoou pela sala — à primeira etapa da nossa jornada. Vocês foram escolhidos para uma experiência que desafiará suas habilidades e sua capacidade de se adaptar e trabalhar em dupla.
Enquanto ela continuava, uma onda de nervosismo e expectativa me percorreu. Tentei focar no que ela dizia, mas algo chamou minha atenção na fileira da frente. O movimento familiar de uma cabeça se virando, os dedos tamborilando casualmente na borda da mesa. E então, eu vi. .
Ele estava sentado ereto, com o olhar concentrado no palco, mas os olhos brilhavam com aquele misto de confiança e curiosidade que eu conhecia tão bem. Meu coração deu um salto involuntário, e por um momento, esqueci de onde estava. A presença dele tornava o ambiente, que já era tenso, ainda mais intenso.
Aquele sorriso presunçoso dançava em seus lábios enquanto ele olhava ao redor, relaxado e confiante, como se o evento inteiro fosse uma extensão do seu palco pessoal. Meu sangue ferveu instantaneamente. A presença dele era um lembrete incômodo de todas as vezes que ele tinha sido um obstáculo, uma provocação constante que testava meus limites e minha paciência.
Ele notou meu olhar e, como se tivesse esperado por isso, ergueu uma sobrancelha e deixou seu sorriso se alargar ainda mais. Um aceno de cabeça mínimo. A provocação silenciosa que ele sempre usava para me desestabilizar.
Revirei os olhos, apertando as mãos com força até os nós dos dedos ficarem brancos. “Por que ele tinha que estar aqui?” Era como se o universo tivesse prazer em colocá-lo em cada passo do meu caminho, apenas para testar minha paciência. Desviei o olhar, tentando ignorar a sensação de que ele me observava e lutando contra o desejo de me levantar e sair dali.
— Agora, farei a chamada dos participantes aprovados. Por favor, levantem-se quando seus nomes forem ditos. — A voz da coordenadora ecoou pelo auditório.
— Felix, da Austrália, estudante de design. — O menino ao meu lado se levantou.
— , do Brasil, estudante de literatura. — Levantei-me, sentindo os olhares voltados para mim, algo que sempre achei incômodo.
— , da Coreia do Sul, estudante de música. — Bufei ao ouvir o nome e ver o rapaz se levantar com um aceno de cabeça, os olhos varrendo a sala até se encontrarem brevemente com os meus. Olhei para o outro lado, tentando manter a compostura.
— Seonghwa, da Coreia do Sul, estudante de relações internacionais.
Enquanto a coordenadora prosseguia, eu me distraí momentaneamente com o brilho do celular do rapaz ao meu lado; ele estava engajado em uma conversa. Sei que é feio olhar conversa alheia, mas, bem, você me pegou. Voltei à realidade quando o garoto guardou o celular e voltou a prestar atenção na senhora à nossa frente.
— Agora — continuou ela, com um sorriso de canto —, vamos formar as duplas. Cada um de vocês irá até a frente e tirará uma bolinha da caixa. Encontrem seu par com a mesma cor para saber com quem trabalharão.
O burburinho na sala aumentou conforme os primeiros participantes foram até a caixa e retiraram suas bolinhas coloridas. Meu peito parecia apertar a cada passo que eu via. Finalmente, chegou minha vez. Caminhei até a caixa, respirei fundo e enfiei a mão, puxando uma bolinha roxa.
foi logo em seguida. O silêncio caiu na sala quando ele retirou a sua bolinha e olhou para ela por um momento. Com um sorriso que misturava surpresa e satisfação, ele levantou a bolinha roxa, mostrando que era a mesma cor que a minha.
Nossos olhares se encontraram, e eu senti uma onda de ironia e apreensão passar por mim. É claro que, por obra do destino, acabaríamos juntos.