Revisada por: Saturno 🪐
Última Atualização: 07/02/2025.Alguns anos atrás...
A noite estava nublada e por isso as ruas mais escuras que o normal. Havia sido uma loucura minha aceitar fugir do colégio interno em Metropolis com algumas amigas para conhecer a intrigante noite de Gotham City. Já se completava cinco anos desde que estive pela última vez naquela cidade, toda a minha família havia se mudado por questões econômicas, os negócios do meu pai necessitavam de sua atenção constante para se desenvolver. Além do fato de não querer competir com as Indústrias Wayne, pertencente a um casal de amigos muito gentis e simpáticos.
Era somente atravessar a ponte, não tinha erro nenhum, entretanto, uma parte de mim se mantinha insegura por aquela pequena travessura. Eu só tinha treze anos, e as veteranas também não tinham chegado à maioridade. Violet, que havia roubado as chaves do zelador e pegado sua caminhonete velha, garantindo que sabia dirigir, pois tinha aprendido com seu pai, lançou um olhar animado ao ligar o motor. Eu duvidei um pouco, mas, como Jack e Maya estavam tão eufóricas por nossa noite de aventuras, tentei conter meu lado filha modelo e aluna aplicada, Fletcher. Violet seguiu com o carro por algumas ruas estranhas, o que me deu um frio na espinha.
— Tem certeza de que está indo pelo caminho certo? — perguntei, correndo meu olhar pelas ruas.
— Claro que sim, estamos quase chegando à ponte — assegurou ela, dando uma gargalhada alta — Você está se preocupando muito, sabia?
— Calma, . Violet sempre foi a melhor aluna em geografia, ela é um GPS ambulante — Jack defendeu a irmã, enquanto retirava seu maço de cigarros, que sempre escondia dentro da bota.
— Você não deveria fazer isso dentro do carro — recriminou Maya. — Que nojo.
— Você não disse que havia parado? — perguntei.
— Nossa, que chatas. — Ela abriu a janela do carro e jogou o maço fora. — Satisfeitas?
Ela bufou.
— Obrigada. — Maya ajeitou sua jaqueta no corpo. — Meu pulmão agradece.
Eu ri de leve. Minhas amigas eram loucas, mas muito divertidas. Eram as únicas que eu havia conseguido no colégio, mesmo sendo mais velhas e com idades diferentes da minha. Talvez por causa da minha família, que intimidava as pessoas por suas influências econômicas, ou por ter voltado recentemente de uma temporada em um colégio interno da Suíça, ninguém queria se aproximar da herdeira de Metropolis. Não me lembrava muito de como havia conhecido elas, mas lembro que foi em um dia chuvoso em que estava fugindo de algumas meninas que haviam jogado ovos em mim, logo quando entrei no colégio.
Jack era a mais velha, estava quase se formando no ensino médio e pretendia fazer graduação em engenharia mecânica, uma jovem meio desleixada e muito extrovertida, que tinha um fraco por motos. Já sua irmã mais nova, Violet, era apaixonada por carros clássicos antigos, poderia considerá-la a pessoa mais comunicativa que eu conhecia, e ambicionava fazer medicina. Já Maya, era a nossa patricinha de porcelana, extremamente delicada, mas super inteligente e estudiosa, porém, em raros momentos, ela gostava de se fazer a menina rebelde, sob influência de Jack.
Mais alguns minutos com Violet se divertindo enquanto dirigia, chegamos à ponte que ligava as duas cidades. De imediato, pude ver a densa neblina que tomava toda a cidade. Ao mesmo tempo que meus olhos certamente brilharam com aquele clima sombrio e misterioso cheio de perigos, meu corpo sentiu um breve calafrio.
— Uau! — Maya se inclinou mais e apoiou sua mão no banco da frente onde eu estava. — Gotham é tão.... Sem palavras.
De repente, Violet freou bruscamente o carro, bem no meio da ponte. Um grupo de quatro homens surgiu entre a neblina, eu consegui notar que um deles estava com um canivete na mão.
— Acho melhor voltarmos — sugeri.
— Da a ré — falou Jack.
Em um susto, um quinto homem apareceu ao lado do carro, e como a janela estava aberta, ele conseguiu destravar e abrir a porta. Maya soltou um grito de desespero, enquanto o homem agarrou Violet e a arrastou para fora.
Nós saímos também para ajudá-la, porém os outros homens se aproximaram.
— Me solta! — gritou Violet, então o homem, já irritado, bateu em sua cara, a jogando no chão.
Eu tentei ajudá-la, já estava ficando ainda mais apreensiva e desesperada pelo que poderia acontecer com a gente. Foi quando outra pessoa se aproximou.
— Que feio... Vocês não sabem que é errado atrapalhar a noite de alguém. — Uma mulher saiu do meio da neblina, com um andar sinuoso em nossa direção. — E pior, bater em crianças.
Os homens a olharam confusos, se afastando um pouco, porém o de moletom cinza escuro foi pra cima dela e segurou forte em seu braço. Em um movimento rápido, ela lançou sua perna no rosto do segundo que se aproximou dela e, escorregando seu corpo para o chão, fez com que o terceiro socasse a cara do homem que a segurava. Eu nunca havia visto alguém se mover de forma tão precisa, fazendo com que a força do seu inimigo caísse sobre ele. Ela pouco bateu naqueles homens, porém fez com que eles lutassem entre si ao tentarem bater nela.
Fascinante.
Senti até mesmo meus olhos brilhando e minhas pupilas dilatarem ao olhar para ela. Parecia até uma cena de filmes de ação.
— Não deveriam estar aqui a esta hora, garotas — disse a mulher, ao socar a cara do último homem que estava de pé, o derrubando no chão.
— Obrigada — disse, em nome de todas.
— Venham, vou levá-las para um lugar mais divertido — continuou a mulher, seguindo até o carro. Ela abriu a porta do motorista e nos olhou. — Ou preferem ficar aqui com eles?
Apressadamente, entramos no carro com ela, e, como sempre, eu fiquei no banco do carona da frente, ainda admirada com tamanha ousadia.
— Quem é você? — perguntei curiosa.
— Podem me chamar de Selina Kyle. — Ela deu um sorriso de canto.
Seu olhar era como de um predador felino pronto para atacar.
Night, night, for a night, for a
Only if for a night.
— Goodnight Gotham / Rihanna
Conhecida como a cidade do homem morcego, Gotham era repulsiva e atrativa ao mesmo tempo, para todos que levam uma vida criminosa. Felizmente, este não é o caso da minha família, apesar do meu marido representar setenta por cento da economia que mantém aquela cidade e ser um atrativo para bandidos e ladrões. Eu tinha muitas memórias construídas ali em minha adolescência travessa, tempos estes que ganhei amizades inesperadas e perdi algumas ao longo dos anos.
— De volta a Gotham… — sussurrei, mantendo meu olhar no espelho, enquanto me perdia em meus pensamentos.
Só contava quarenta e oito horas em meu novo lar, e confesso que não seria tão fácil ser esposa de Bruce Wayne quanto imaginei. Não pelos muitos paparazzi rondando, curiosos para saber quem era a nova senhora Wayne que conquistou o “coração” do herdeiro mais cobiçado da cidade. E, sim, por eu ainda não conseguir assimilar tudo, a radical mudança em minha rotina e a realidade do nosso matrimônio nascer puramente de um acordo familiar feito por nossos pais há anos. Acordo esse que incluía muitos negócios financeiros do passado entre o Conglomerado Fletcher e as Indústrias Wayne no pacote.
— Em uma nova realidade — completei, ao retirar uma blusa de linho do cabide e vesti-la, pois o dia havia esfriado de repente.
Contudo, estava eu recém-casada, voltando de uma breve lua de mel em Paris. A partir daquele momento, eu iria conviver com o homem mais rico de Gotham City, e curiosamente mais estranho também. Seria complicado conseguir conviver com um playboy, que passa seus dias gastando a herança deixada pelos pais e deixa sua empresa nas mãos de funcionários. Pelo menos, o senhor Fox era digno de confiança.
Mas enfim, eu estava ali no segundo maior quarto da mansão, encarando minhas coisas no closet, que demorei horas para organizar, devido à quantidade de itens. Deixei algumas roupas que não usava mais na casa dos meus pais, tinha o propósito de vendê-las futuramente em um bazar beneficente.
— Senhora Wayne, posso entrar? — perguntou uma voz, vinda da porta.
— Ah, sim, Alfred. — Eu dei alguns passos para fora do closet — O que houve?
— Vim para saber se a senhora está bem instalada. Precisa de algo a mais?
— Hum, não. — Dei um sorriso singelo. — Estou muito bem, obrigada. Só preciso me acostumar com a nova rotina.
— Tenho certeza de que a senhora irá se adaptar — assegurou ele. — Se precisar de algo, basta me chamar.
— Agradeço.
Ele se curvou de leve e saiu do quarto. Respirei um pouco mais fundo e me voltei para a janela central do quarto. O sol já estava se pondo, certamente eu tinha perdido muito tempo organizando tudo, principalmente meus pensamentos. Saí do quarto e, após caminhar pelo longo corredor do segundo andar, desci os lances da escada, chegando à grande sala de estar. Bruce estava sentado na poltrona perto da lareira, lendo seu jornal, parecia concentrado. A primeira característica que tinha descoberto sobre ele: sempre lia o jornal apenas na parte do folhetim policial. Acho que aquilo poderia ser por causa da morte dos seus pais, eu não sabia muita coisa da história, mas imaginava que ele não era uma pessoa muito feliz devido a essa tragédia.
— Espero que esteja bem instalada — disse ele, com seu tom de voz baixo, porém firme, mantendo sua atenção no jornal.
— Sim. — Assenti, dando alguns passos até o sofá que ficava de frente à lareira. Me sentei de forma silenciosa, mantendo minha atenção voltada para o fogo.
— Agora você é dona desta casa tanto quanto eu. Se quiser alterar alguma coisa, basta falar com o Alfred — continuou ele.
— Eu gosto de como está — retruquei. — Parece mais familiar para você.
— E não deveria ser familiar para você? — Ele fechou o jornal e me olhou.
Havia profundidade naquele olhar.
— Logo vou me acostumar, então em breve será. E também me faz lembrar de momentos da nossa infância, do tempo que morei em Gotham antes da minha família se mudar para Metropolis. — Dei um tempo em minha fala e me levantei repentinamente. — Devo contar com meu marido para o jantar?
— Talvez. — Ele se levantou também e seguiu em direção à biblioteca.
Eu não sabia como me aproximar dele. Bruce possuía um olhar enigmático combinado a um sorriso malicioso, com uma grande fama de conquistador antes do nosso casamento. O que sempre lia nos jornais sobre ele era como aproveitava suas noites em casas noturnas e um lado libertino que mantinha com a máxima discrição. Contudo, agora com o nosso matrimônio, eu não sabia como ele começaria a agir, pois, apesar de ser arranjado, eu era oficialmente a senhora Wayne.
Pensar sobre isso me fazia lembrar da minha primeira noite com ele. Eu estava tão nervosa e assustada, fiquei surpresa com como ele me tratou como um perfeito cavalheiro, me dando a liberdade de escolher entre consumar, ou não, nossa noite de núpcias.
Bem, havia um contrato em jogo e acordos foram assinados.
— Senhora Wayne — disse Alfred, ao entrar na sala.
— Sim? — Eu o olhei.
— Deseja algo em especial para o jantar de hoje?
— Hum? Eu não havia pensado sobre isso. — Respirei fundo. Era estranho uma simples pergunta me deixar confusa. — O que o Bruce costuma comer?
— Bem, o patrão Bruce não costuma jantar, raramente se alimenta à noite — respondeu ele.
— Acho que não precisa se preocupar então, talvez ele nem fique em casa esta noite. — Eu me afastei um pouco, em direção às escadas. — E eu estou sem fome.
Voltei para meu quarto. Eu já estava sentindo que minha noite seria longa e solitária. Certamente foi proposital quando o senhor Wayne propôs que dormíssemos em quartos separados. A desculpa? Ele não desejava tirar minha liberdade e privacidade, pois, como sempre lembrava, nosso casamento era um acordo entre famílias. Caminhei até a escrivaninha e peguei o livro que tinha deixado sobre ela. Me sentei um pouco inclinada em minha cama, abri o livro na página onde parei e comecei a ler, pelo menos no romance de Jane Austen eu poderia sonhar com um cavalheiro como o senhor Darcy.
Poderiam ser horas proveitosas e leitura, porém, minutos depois, acabei adormecendo.
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Selina Kyle
Aquela era uma bela noite…
Propícia para me divertir um pouco pelas interessantes ruas de Gotham.
Já estava sentindo falta de um pouco de adrenalina de verdade em minha vida, após ficar tanto tempo parada, na pacata cidade de Metropolis. Caminhando com tranquilidade pela rua secular, até chegar à esquina do Beco do Crime, senti que precisava rever os velhos amigos e saber das novidades. As coisas aconteciam muito rápido em Gotham, assim como também estava um pouco complicado manter-se no crime, principalmente por causa do tal Batman. Eu ainda não tinha tido o prazer de esbarrar com este vigilante noturno, mas estava curiosa para vê-lo de perto e tirar minhas próprias conclusões.
— Ora, ora, ora… Quem está de volta a Gotham City — disse uma voz sinuosa, atrás de mim.
— A boa filha à casa retorna — eu disse, mantendo meu olhar em um grupo de homens, que fumavam mais à frente.
— Boa? — Ele riu ironicamente. — Por onde estava andando?
— Curtindo minhas férias. — Eu ri de leve, recordando o que realmente estava fazendo em meu tempo de hiatos. — E você, Pistoleiro? Como saiu da cadeia novamente?
— Digamos que tive um bom comportamento. — Ele riu também. — Soube das novidades?
— Estou na cidade há poucas horas, de quais novidades está falando?
— Do homem morcego — respondeu ele num tom amargo. — Ele voltou à cidade depois de alguns meses fora.
— Batman, eu li sobre ele nos jornais de Metropolis — comentei.
— Então era lá que estava passando suas férias? — indagou ele.
— Talvez. — Eu suspirei um pouco. — Mas você sabe o motivo para ele ter sumido por tanto tempo?
— Ninguém sabe. Só que ele desapareceu pouco depois que ajudou a prender o Joker — contou ele, com um olhar pensativo.
— Ah, nosso rei tinha que estar envolvido. — Eu ri de leve. — Será que o morceguinho achou que o crime acabaria?
— Talvez, não sei, só acho que você também deveria tomar cuidado — alertou ele.
— Quantas mulheres além de mim você está vendo aqui? — Eu me virei para ele, arqueando minha sobrancelha direita.
— Sei que você é diferente de todas que já tentaram se estabelecer em Gotham, mas vamos combinar que a cada dia fica mais tenso com esses heróis idiotas — argumentou ele.
— Eles e nada para mim dá no mesmo — desdenhei um pouco.
— Mas você se esqueceu da rainha Harley Quinn — disse ele com prepotência.
— A Arlequina? — Eu ri. — Aquela louca só se sente poderosa ao lado do Joker.
— Modere suas palavras, as paredes têm ouvidos, e você sabe como o soberano age quando falam da mulher dele — alertou ele. — Além do mais, ela é uma pessoa até legal de se conviver.
— Quem é você e o que fez com o Pistoleiro que conheço? — Ri de leve novamente.
— O mundo dá voltas, minha amiga. — Ele riu junto.
— O Joker está plenamente destronado, uma carta fora do baralho, como você muito bem me informou. — Eu suspirei um pouco. — Mas, atualmente, você sabe quem está comandando? Quem é o novo rei do crime?
— Um ser estranho chamado Dimitri.
— Pelo menos o nome é bonito. — Eu ri. — Nossa conversa está muito boa, mas tenho outras coisas em mente para fazer esta noite.
— Está pensando em algum lugar específico?
— Eu soube de uma exposição maravilhosa de pedras preciosas, na galeria de arte das Indústrias Wayne — respondi com satisfação.
— Hum, está mexendo em um vespeiro. Da última vez que alguém invadiu um lugar da família Wayne, toda a polícia ficou atrás.
— Se for para retornar, tem que ser em grande estilo. — Eu virei minha face para frente, sorrindo. — Além do mais, quero ter a oportunidade de conhecer o tal morcego.
— Está querendo brincar com fogo? — perguntou ele.
— Eu nasci do fogo. — Olhei de relance para ele e segui em direção ao norte. — Além do mais, gatos possuem muitas vidas.
Minha meta estava traçada.
Assim que passei pelos homens que estavam fumando, eles mexeram um pouco comigo, me dando boas-vindas pela minha volta. Eu já tinha estudado toda a planta interna e externa do prédio, que, para minha surpresa, tinha uma arquitetura bem futurista. Para não perder o costume, entrei pela porta da frente e instantaneamente o alarme disparou. Claro que eu esperava por isso. Andei pelo saguão central até chegar às escadas que davam para o segundo andar, subi sinuosamente e caminhei em direção ao salão onde estava acontecendo a exposição.
Eu comecei a olhar pelas mesas de exposição. A cada pedra preciosa diferente, mais meus olhos brilhavam, me deixando confusa em decidir qual eu iria pegar primeiro. Parei por um momento na mesa em que vários tipos de esmeraldas estavam expostas, sibilei um pouco, olhando aquelas pedras diante de mim. Até que comecei a ouvir uma certa movimentação vinda atrás de mim, eram os seguranças do prédio, que tinham vindo do estacionamento por causa do alarme que tocava continuamente.
Eu me virei com um leve sorriso nos lábios. Havia dois seguranças, ambos apontando suas armas em minha direção.
— Parada aí, senhorita — disse o mais gordinho.
— Mas eu não estou andando — retruquei com ironia, erguendo minhas mãos para cima.
— O que a senhorita está fazendo aqui? — perguntou o outro mais alto.
— Estava apreciando a exposição — respondi, segurando o riso. — Está tão linda que não resisti à tentação.
— Senhorita, se afaste das pedras — disse o gordinho.
— Com prazer. — Eu sorri, abaixando minhas mãos e seguindo em direção a eles.
Assim que cheguei perto o bastante, levantei minhas mãos novamente com cautela, o policial mais alto guardou sua na arma no coldre e veio até mim. Assim que ele retirou um lenço de seu bolso para amarrar minhas mãos, eu dei um giro completo, pegando sua arma e lançando minha perna nele, o derrubando no chão. Assim, eu apontei para o segurança gordinho, dando um sorriso de canto malicioso.
— Eu te convido a largar isso e sair daqui. — Eu olhei bem no fundo dos seus olhos, dava para perceber que era um homem covarde. — Eu juro que não conto para ninguém.
Sem pensar duas vezes, ele largou sua arma no chão e saiu correndo. Eu joguei a arma que estava em minha mão longe e continuei rindo, voltando meu olhar para a mesa onde estavam as pérolas. Porém, como uma atração magnética, meu olhar seguiu até o grande diamante rosa, que estava exposto no centro do salão. Meu olhar estava atento àquela pedra magnífica, mas não significava que não estava atenta a tudo ao meu redor.
— Está atrasado, senhor morcego — disse, sentindo a presença dele.
— Você não deveria fazer o que está pensando — disse aquela voz grossa que fazia meu corpo se arrepiar.
— Então você é o homem que veio aqui me educar? — Mantive meu olhar em direção ao diamante. — Acho que está acostumado com criminosos desqualificados, mas eu não sou uma qualquer.
— Você é o quê? — Um homem apareceu diante de mim como um piscar de olhos. — Uma mulher atrás de uma máscara?
— Hum? — Eu ri debochadamente. — Olha só quem fala, senhor morcego. Não sou louca e imprudente como a Arlequina, você não vai atrapalhar meus planos.
— Quer apostar? — O tom da sua voz demonstrava ainda mais seriedade.
— Aquele diamante! — Eu apontei para a pedra. — No final desta noite, será meu.
"So shine bright, tonight, you and I
We're beautiful, like diamonds in the sky
Eye to eye, so alive
We're beautiful, like diamonds in the sky."
— Diamonds / Rihanna
Um suspiro fraco e voltei meu olhar para a cama, apesar de ser nova e muito confortável, era um fato que eu não conseguiria dormir bem na primeira noite naquela casa. Após longos minutos no banheiro, entrei no closet e fiquei olhando para as prateleiras. Demorou um pouco para eu decidir o que vestiria, muitas opções e nenhuma ideia do meu cronograma para aquele dia. Voltei para o quarto ainda de roupão, pensativa em como seria minha vida agora como a senhora Wayne. Me aproximei da janela, estava um lindo sol de outono. Mesmo com as folhas caindo das árvores, a paisagem continuava linda no jardim da mansão, linda a ponto de Alfred servir um café da manhã ao ar livre.
Retornei ao closet e coloquei um vestido floral com tonalidades de amarelo, prendi meu cabelo e coloquei o colar que minha mãe havia me dado de presente. Saindo do quarto, segui em direção ao jardim. Alfred estava parado perto da mesa preparada, Bruce ainda não havia acordado, pelo que aparentava.
— Bom dia Alfred — disse, ao me sentar.
— Bom dia, senhora Wayne — disse ele, começando a me servir.
— Por favor, me chame somente de — disse a ele, dando um sorriso suave. — Não me acostumei ainda com este sobrenome. Wayne se tornou uma palavra muito forte na minha vida.
— Imagino. — Assentiu ele, despejando um pouco de suco em meu copo. — A senhora teve uma noite confortável?
— Um pouco, meu corpo estranhou a cama, mas logo vou me adaptar. — Eu suspirei um pouco. — Por acaso você sabe quando o Bruce retornou?
— Não, senhora. Eu já havia me recolhido pouco depois que ele saiu — respondeu ele, de uma forma estranha, como se estivesse pensando nas palavras para dizer.
— Bem, acho que terei que ver os jornais para saber. — Suspirei fraco.
— Tenho certeza de que o patrão Bruce não faria nada que pudesse manchar sua imagem, senhora — assegurou ele.
— Todos esperamos isso — disse, num tom de brincadeira, para deixar o clima mais leve.
— Esperam o quê? — perguntou Bruce, ao se aproximar de nós.
— Sua presença na mesa do café — disse, de imediato, cortando o assunto. — Bom dia.
— Bom dia — disse ele, se sentando. Estava de óculos escuros e bocejava um pouco.
Certamente, sua noite havia sido em claro, mas… na companhia de quem? Tentei não manter minha atenção nele, entretanto, quanto mais eu desviava meu olhar, mais eu queria analisar suas expressões faciais e corporais, desejando saber pelo menos um terço de seus pensamentos a respeito do nosso casamento. Se era ou não importante para ele, afinal, não era um matrimônio tradicional. Alfred o serviu de imediato, e logo Bruce pegou seu jornal, começando a folhear tranquilamente.
— Eu ouvi o som do seu carro ontem à noite — comecei minhas indagações, escolhendo bem as palavras. — Foi a algum lugar em especial?
— Não, só precisava respirar ar puro — respondeu ele, num tom sereno.
— Imagino. — Respirei fundo, voltando meu olhar para o copo de suco em minha frente. — As noites de outono são bem refrescantes.
— Aonde quer chegar? — perguntou ele, fechando o jornal e me olhando com mais seriedade.
— A lugar nenhum. — Desviei meu olhar para Alfred, que atendia uma ligação.
— Patrão Bruce, para o senhor — disse ele, entregando o telefone.
— Sim. — Bruce, ao atender, se levantou e afastou da mesa.
Certamente para que eu não ouvisse a conversa.
— De onde era? — perguntei ao Alfred.
— Das Indústrias Wayne — respondeu ele.
— Algum problema? — indaguei.
— Me parece que alguma coisa aconteceu na galeria de arte da empresa.
— Hum. — Voltei meu olhar para Bruce.
Até então eu não tinha percebido nada de diferente nele, porém, pouco embaixo do seu queixo tinha dois riscos, como se tivesse sido arranhado por algo, ou alguém.
— Alfred, peça para preparar meu carro. Após o café, irei à empresa.
— Sim, patrão Bruce. — Alfred se afastou de nós.
— Você se machucou? — perguntei a ele.
— O quê? — Ele olhou para mim, demonstrando surpresa pela pergunta.
— Você se machucou? — repeti a pergunta.
— Bem. — Ele elevou a mão até o arranhado. — Ah, isso foi com a lâmina de barbear, nada demais.
— Hum. — Eu não estava convencida com aquela explicação falsa.
Aquele machucado tinha mesmo características de um arranhão feito com garras. Traduzindo, certamente era de unhas femininas. Mesmo não querendo, aceitei sua explicação, ele já teria muitos problemas na empresa para ter que se preocupar com sua esposa talvez ciumenta. Ele terminou de tomar seu café tranquilamente. Antes de se retirar, me deu um beijo suave no alto da minha testa.
Eu não sabia definir o porquê ele tinha feito aquilo, talvez para que eu não pensasse em besteiras como traição, ou somente porque, de alguma forma, ele queria se aproximar de mim. Bruce não queria forçar nenhum tipo de vínculo entre nós, apesar do nosso casamento ter sido meio forçado diante do acordo de nossos pais no passado. O fato é que ele era muito cavalheiro para me obrigar a ter algo com ele. O que fazia acreditar que nossa noite de núpcias certamente seria a primeira e talvez a última vez que seria tocada por meu marido, e, bem, minha única função agora seria manter as aparências.
Assim que Alfred retornou, eu pedi para que preparasse outro carro para mim, eu queria saber de perto o que tinha acontecido na noite anterior. Dirigi em direção à galeria. Assim que cheguei, tinha faixas de isolamento e alguns policiais e peritos ainda examinando a área. Para minha surpresa, Bruce ainda não havia chegado.
— Senhora Wayne — disse o comissário Gordon, ao se aproximar.
— Bom dia, comissário — o cumprimentei, dando um sorriso. — Como está sua esposa?
— Muito bem, obrigado. — Ele deu um suspiro, parecendo estar preocupado. — A senhora veio para ver o que aconteceu?
— Talvez. Bem, Bruce recebeu uma ligação mais cedo, senti que precisava entender também o que houve — expliquei a ele minha presença ali.
— Hum. — Assentiu ele, com a face.
— ? — disse uma voz atrás de mim, que, de forma inesperada, fez meu corpo arrepiar.
Era ele, meu marido.
— Bruce. — Olhei para trás.
— O que está fazendo aqui? — perguntou ele, seu habitual tom sério.
— Basicamente o mesmo que você — respondi enigmaticamente. — Pensei que já estivesse aqui.
— Passei na empresa primeiro. — Ele desviou seu olhar para o senhor Gordon. — Bom dia, comissário.
— Bom dia, senhor Wayne. — O comissário respirou fundo. — Já que ambos estão aqui, gostaria que vissem uma coisa.
O comissário Gordon nos levou até a sala dos seguranças e nos fez assistir a fita de vídeo das câmeras de vigilância. Algo inacreditável. Uma mulher, com trajes de couro e com uma máscara preta cobrindo parte de seu rosto, entrando na galeria e seguindo em direção ao segundo andar.
— Ela age como se o alarme não fosse o problema — sussurrei de leve, tentando disfarçar minha admiração pela ousadia.
— É assim que ela trabalha, senhora Wayne. Uma boa forma de confundir seus rivais e a própria polícia — explicou o comissário Gordon. — Nas ruas, a chamam de Mulher Gato, também conhecida como Selina Kyle.
— Impressionante — disse, ao ver ela pegando a arma do policial. — Ela é bem rápida.
— O mais impressionante está por vir — garantiu o comissário.
— O que tem a mais? — perguntou Bruce.
— Isso! — Assim que o comissário apontou para a tela, o Batman apareceu no vídeo.
Foi como um piscar de olhos. Eles estavam conversando e começaram a lutar de forma harmoniosa, como se estivessem seguindo o ritmo de uma dança clássica. A forma com que a tal mulher gato conseguia se desviar com agilidade, usando a força do homem morcego contra ele mesmo, era impressionante e difícil de descrever. De alguma forma, lá no fundo, aquela mulher me lembrou alguém do meu passado, uma velha amiga a qual não via há muito tempo.
— No final, parece que ela conseguiu levar o que queria — comentei, assim que o comissário pausou o vídeo.
— Sim. — Assentiu ele. — Não é à toa que ela se compara a um felino. Os gatos tendem a ser assim, flexíveis, precisos e astutos.
— Mas e esse Batman? Ele vai atrás dela? — perguntei.
— Quem sabe — disse Bruce, desinteressado.
— Certamente, sim. Ele está sempre nos ajudando contra o crime em Gotham City. — Assentiu o comissário.
— Se ele fosse mesmo útil, teria conseguido prender essa ladra — reclamou Bruce, parecendo desdenhar do trabalho dos outros. — Eu tenho outros assuntos para me preocupar. Comissário, se souber de mais alguma coisa, pode se reportar ao senhor Fox.
— Como quiser, senhor Wayne. — Assentiu o comissário, se afastando de nós.
— Não precisava ter falado daquela forma. Eu não acho que o Batman seja uma pessoa inútil. Pelo que leio nos jornais, ele tem ajudado muito a polícia.
— Os jornais podem ser sensacionalistas às vezes — retrucou ele.
— Sendo ou não, você não deixa de ler todos os dias — retruquei.
Por alguns instantes, ele pareceu estar sem argumentos.
— Não importa. — Ele suspirou um pouco. — Te aconselho a voltar para casa, as ruas de Gotham não são tão seguras assim.
— Fala isso por ler nos jornais sensacionalistas? — o perguntei ironicamente.
— Falo isso por ver pessoalmente — respondeu ele, com segurança.
Não sei por que, mas me lembrei de seus pais no mesmo momento. Talvez ele realmente estivesse preocupado comigo.
— Te vejo à noite? — perguntei.
— Provavelmente. — Assentiu ele.
Eu respirei fundo e me afastei dele, seguindo para a saída do prédio. Enquanto não pensasse em alguma atividade para preencher meu dia de uma forma produtiva, já havia entendido que a mansão Wayne seria meu local de exploração. Não que eu fosse uma garota mimada que adora reformas desnecessárias por não gostar da cor das cortinas, ou do mogno da sala de jantar. Eu tinha um diploma na gaveta e um pequeno sonho que deixei em off, devido ao anúncio do casamento. Contudo, mal havia completado quinze dias de casada e já estava pensando em uma profissão além da senhora Wayne. — Senhora Wayne — disse Alfred, ao me ver retornar, um olhar surpreso. — Alfred, já combinamos de deixar o senhora de lado — pedi a ele, num tom singelo, com um sorriso. — Estarei na biblioteca até o jantar, preciso ocupar minha mente com um pouco de leitura. Quem sabe os romances de Jane Austen me dessem algum tipo de inspiração… ---
Selina Kyle
Lá estava eu, apreciando meu diamante mais uma vez antes de vendê-lo para o novo rei do crime, esperando por sua presença, sentada na janela de seu escritório, sentindo a lua tocar minha pele. Em instantes, lancei meu olhar para a porta assim que a maçaneta se mexeu. Ao abrir, um homem loiro e alto entrou. Analisei um pouco seu terno de marca, tinha uma postura chamativa que me lembrava mafiosos da Itália.
— Boa noite, majestade — disse, cruzando minhas pernas. — Estava ansiosa para conhecê-lo.
— O sentimento é mútuo — disse ele, dando alguns passos para dentro do escritório. — Presumo que seja a Mulher Gato de que todos falam.
— Deixemos de formalidades, pode me chamar de Selina. — Eu o olhei tranquilamente, levantando o diamante em minha mão. — Soube que estava ansiando por isso.
— O diamante de Gotham — disse ele, focando seu olhar na pedra. — Quando soube que tinham roubado e que era você, confesso que fiquei com certa inveja por não trabalhar para mim.
— Digamos que eu sou autônoma. Tenho uma queda pelo mercado de empreendedorismo. — Eu ri um pouco. — E gatos não são domesticados.
— Ouvi sobre isso também — concordou ele.
— Mas podemos negociar. — Me afastei da janela, dando alguns passos até ele. — O que acha?
— Quanto você quer por ele?
— Quanto você acha que vale? — retruquei.
Dimitri caminhou até um dos quadros que estava pendurado na parede. Retirando, tinha um cofre atrás. Após digitar rapidamente a senha, retirou de dentro uma maleta prateada. Ele se virou para mim e abriu a maleta, mostrando a quantidade de dinheiro dentro. Eu arqueei a sobrancelha direita, olhando todas aquelas notas.
— O que me diz? — perguntou ele. — Temos um acordo?
— Claro — disse, esticando o diamante.
— Muito bem. — Ele fechou a maleta e esticou para mim.
Fizemos a troca juntos, ele tinha o que queria e eu tinha o que no momento precisava, uma troca justa. E… se eu mudasse de ideia, seria fácil pegar o diamante de volta, afinal, tinha decorado sua senha.
— Ficará por mais tempo em Gotham desta vez? — perguntou ele.
— Talvez sim, talvez não. — Nem eu mesma tinha esta certeza.
— E como poderei vê-la novamente? — insistiu ele.
Quanto interesse por mim.
— Não vai. — Dei alguns passos até a janela. — A menos que eu queria.
Subi na janela e pulei no beiral do prédio ao lado. Movi meu corpo até alcançar a escada externa e subi até o telhado. Comecei a andar livremente pelos telhados dos prédios, até que parei em um, me posicionando em um canto escuro. Fiquei observando dois homens que acusavam uma mulher em um beco qualquer. Aquilo parecia um pouco estranho para mim, algo estava me incomodando, como se não fosse exatamente uma cena real. Em instantes, uma sombra passou diante dos meus olhos. Quando olhei novamente, lá estava o homem morcego sendo o herói da noite. De repente, mais oito homens saíram de trás das lixeiras, com tacos de basebol em suas mãos.
— Como eu previ, uma armadilha — sussurrei, para mim mesma. — Veremos como você se sai nesta luta — sibilei um pouco. — Apesar de estar meio em desvantagem, vai ser interessante ver isso.
Fiquei atenta aos movimentos do morcego. Ele era, sim, muito forte e ágil, uma decepção para mim, que na noite anterior consegui escapar dele com facilidade, talvez por eu ser uma mulher e ele só querer me imobilizar. Mas era impressionante vê-lo em ação, e, por mais que estivesse em desvantagem, não significava muito.
De certa forma, comecei até a ter pena daqueles homens, que apanhavam incansavelmente, até que começaram a ficar caídos no chão. Assim que Batman terminou, a mulher que estava sendo coagida correu para ele, agradecendo, entretanto, aquilo era o que eu já esperava, a parte vital da armadilha para pegar o morcego. A mulher o abraçou e, em um movimento rápido, injetou algo em seu pescoço.
— Eu sabia que você estava envolvida. — Ri baixo, vendo o morcego começar a cambalear um pouco.
Os homens começaram a se levantar, mesmo com o corpo dolorido por terem apanhado, e, pegando seus tacos, começaram a bater no Batman. Eu fiquei olhando aquela cena por alguns minutos, decidindo se iria ou não participar daquela pequena festa. Senti até mesmo meus olhos brilharem, em uma vontade grande de interferir.
— Olá, rapazes — disse, após pular do prédio, caindo em cima de uma das lixeiras. — Dando uma festinha sem me convidar?
— Selina — disse um dos homens. — Isso não é problema seu, volte para o lugar de onde veio.
— Ah… Eu não gosto quando me dizem o que eu deveria fazer. — Desci da lixeira e dei alguns passos até ele, fazendo uma cara de choro. — Gatos não são domesticados…
Assim que me aproximei, a mulher veio em minha direção com outra seringa em suas mãos. Eu larguei minha maleta no chão e dei um giro curto, pegando no braço dela, e, movendo seu corpo para trás, cravei minhas unhas em sua jugular. Forcei seus braços para frente até encostar a agulha no pescoço dela, retirei minhas unhas da sua jugular e peguei na agulha, fincando no seu pescoço e empurrando o líquido.
Os homens, ao verem que eu fiz aquilo, em poucos segundos, vieram todos para o meu lado. Eu já tinha enfrentado gangues maiores, com eles não seria diferente. Sempre que me desviava de um, usava o outro para atingir seu próprio companheiro. Agilidade, rapidez e instinto. Usar a força do meu inimigo contra ele mesmo era uma das minhas habilidades.
No final, todos estavam devidamente estirados no chão, com as marcas das minhas garras em seus corpos. Eu suspirei um pouco, sentindo uma mudança no tempo. Logo um forte barulho veio do céu e a primeira gota caiu em meu rosto. Gatos não gostavam de chuva. Dei alguns passos até minha maleta e peguei. Ao olhar para o lado, vi ironicamente um guarda-chuva encostado na porta.
Sem cerimônias, peguei o guarda-chuva e abri. Por um instante, pensei em sair logo dali, mas não podia perder a oportunidade.
— Ora, ora — disse, ao me aproximar do Batman e virar seu corpo com o meu pé. — Me parece que você não é muito popular por aqui.
— Hum. — Mesmo após injetarem algo nele, apanhar dos homens e com a face toda ensanguentada, ele ainda estava meio consciente. — Você.
— Sim, eu. — Abaixei, o olhando. Logo seu rosto também foi coberto por meu guarda-chuva. — Acho que me deve um agradecimento.
Sorri de canto.
Naquele momento, estava curiosa para saber quem ele era, seria uma oportunidade única para isso.
"Quando o sol brilhar, brilharemos juntos,
Te disse que estaria aqui para sempre,
Disse que sempre seria sua amiga,
E o que eu jurei eu vou cumprir até o fim.
[...]
Você pode ficar sob meu guarda-chuva."
— Umbrella / (feat. Jay-Z) Rihanna
Deixei o cobertor na cama, coloquei um casaco e saí do quarto. Silenciosamente caminhei pelo corredor, até chegar às escadas. Eu vi um vulto de repente, seguido de um trovão forte. Meu corpo tremeu um pouco em reação de medo, mas, respirando fundo, comecei a descer as escadas. Liguei as luzes e logo vi Bruce caído no sofá. A primeiro momento, não tive reação, mas voltei a mim e corri até ele.
— Bruce? — Toquei de leve nele, vendo seu rosto machucado. Ele estava com suas roupas meio rasgadas. — Bruce o que houve?
— . — Sua voz estava estranha, parecia estar zonzo ou embriagado.
— ALFRED — gritei, tentando não entrar em desespero. — ALFRED, SOCORRO!
— Não. — Bruce encostou seu dedo indicador em minha boca. — Estou bem.
— Não está. — Me virei em direção à cozinha e gritei novamente. — ALFRED.
— Patroa — disse Alfred, entrando na sala. — Oh, patrão Bruce.
— Alfred, me ajuda, eu não sei o que fazer — pedi um pouco desnorteada com o que estava acontecendo. — Eu não sei o que houve com ele.
— Precisamos limpar os ferimentos — disse Alfred. — Eu vou buscar a caixa de primeiros socorros. Leve o senhor Bruce para o quarto.
— Tudo bem. — Assenti, começando a ajudar Bruce a se levantar.
Foi com certa dificuldade e muitas quedas por parte dele no caminho que conseguimos chegar ao corredor do segundo andar. Bruce, mesmo com vestígios de embriaguez, já imaginava que deveria me dar explicações, assegurando que conversaríamos sobre isso no dia seguinte. Ao entrar pela porta, o ajudei a se deitar com cuidado e fiquei sentada ao seu lado até Alfred chegar. O quarto de Bruce não era muito diferente do meu, mas tinha um aspecto mais escuro e sombrio, talvez por causa das grossas cortinas, ou das cores escuras em sua mobília. Definitivamente, demonstrava ser o quarto de uma pessoa triste e solitária.
— Aqui está, senhora — disse Alfred, entrando com sua caixa na mão.
— Eu vou deixá… — Eu ia me levantando, quando Bruce segurou em meu pulso.
— Acho melhor a senhora ficar e fazer — disse Alfred, entendendo o gesto dele e me entregando a caixa.
— Tudo bem. — Eu peguei e me sentei novamente, abrindo.
Aos poucos, fui limpando sua face com lenço umedecido. Quando comecei a passar o remédio em suas feridas para desinfectar, seu corpo começou a reagir. Bruce estava segurando o grito com precisão, mas dava para perceber sua dor. Coloquei os curativos nos pontos que precisava e deixei a caixa ao lado da cama, já tinha feito tudo que poderia naquele momento.
— Obrigado — sussurrou ele, abrindo os olhos. Sua voz já estava começando a voltar ao normal.
— Não fiz nada demais. — Me mantive séria e me levantei novamente. — Sou sua esposa, apenas cumpri com o meu papel.
Ele segurou novamente em meu braço e me puxou para cima dele. Assim que meu corpo caiu sobre a cama, Bruce se virou, lançando seu braço sobre mim, como se estivesse me prendendo a ele. Fiquei um pouco estática, não estava entendendo mais nada.
E, com isso, meu coração já estava acelerado.
— Fique aqui esta noite, por favor — sussurrou ele.
— Não acho que deveria — disse, me remexendo para me soltar.
Obviamente sem sucesso, sua força era superior.
— Acabou de dizer que é minha esposa… — replicou ele, me aninhando mais aos seus braços. — Não deveria passar a noite com o seu marido?
Eu respirei fundo, sem ideias para usar de argumento.
— Acho que não será um problema dormir aqui hoje. — Assenti, deixando meu corpo mais relaxado em seus braços.
Eu daria uma trégua até o dia seguinte, mas não deixaria de cobrar uma explicação do que aconteceu com ele. Por incrível que pareça, consegui pegar no sono novamente, aquelas horas restantes pareceram uma eternidade para mim, pelo tanto que dormi. Demorou um pouco para que eu acordasse, e devo isso a um feixe de luz que bateu em meu rosto. Despertei do sono e abri os olhos, percebendo que tinha uma fresta entre as cortinas.
— Hum? — Me espreguicei um pouco, virando minha face para o lado, Bruce já tinha se levantado. — Me parece que alguém está fugindo de ter que dar respostas.
— Não estou fugindo — disse ele, num tom baixo.
— Hum? — Ergui meu corpo e olhei para frente. Ele estava encostado na porta que dava para o closet, de braços cruzados, sem camisa e vestido somente com uma calça de moletom. — Bom dia.
— Bom dia — retribuiu ele, com um sorriso de canto discreto.
— Acho que precisamos conversar — disse a ele, tentando não focar muito na parte do seu corpo que estava descoberta.
— O que aconteceu esta madrugada, eu… — Ele respirou fundo, parecia escolher as palavras. — Me envolvi em uma briga.
— Percebi pelos machucados. — Tentei não ser tão irônica nas palavras. — Mas como se envolveu em uma briga?
— Não quero te deixar preocupada. — Ele descruzou os braços, mantendo seu olhar em mim.
— Se eu não souber a verdade, ficarei preocupada. — Me levantei da cama e cruzei os braços. — Mas não posso te obrigar a falar.
— Como eu disse, Gotham está perigosa. — Ele deu alguns passos até mim e me abraçou de leve. — Me desculpe por te deixar preocupada. Após sair da empresa, tive a impressão de estar sendo seguido, o que foi confirmado quando meu carro foi fechado e vi alguns homens aparecerem.
— Oh, céus — sussurrei, me afastando um pouco dele. Fingi aceitar sua explicação, sentindo lá no fundo que não era real a história. — O que importa é que conseguiu chegar em casa.
— Sim. — Ele deu um sorriso singelo e acariciou minha face. — , obrigado por cuidar de mim.
— Não precisa agradecer. — Mantive o tom sereno, porém firme. — Já disse, sou sua esposa.
Eu tentei não o encarar.
Aquele era o lado sedutor do Wayne que sempre ouvi as amigas da minha irmã falarem, seu olhar profundo e envolvente, tanto que poderia até me fazer esquecer tudo que tinha acontecido pela madrugada. Bruce foi se aproximando lentamente de mim, eu já estava sentindo meu coração um pouco acelerado.
Em um piscar de olhos, senti seus lábios tocarem os meus. Mais do que na nossa primeira noite, seu beijo estava mais intenso e malicioso. Eu conseguia sentir que ele queria realmente me beijar, não era uma mera obrigação por estar casado comigo. Não queria ter falsas esperanças, me iludir e sofrer sendo a única se permitindo ter sentimentos naquela relação, mas ficaria feliz se nosso casamento desse certo e talvez nos apaixonarmos um pelo outro. Aos poucos, senti seus braços envolverem minha cintura. Conseguia sentir o calor do seu corpo, fazendo o meu se aquecer mais ainda.
Será que aconteceria o que eu estava pensando?
Estar em seus braços parecia fazer o tempo parar, entretanto, o dia estava acontecendo fora daquele quarto. Um lugar que pareceu ficar menor e mais quente de uma forma inexplicável, talvez pela sensação diferente que tinha sentido, talvez porque definitivamente não foi pela obrigação de consumar o casamento. Desta vez, eu consegui me sentir amada e desejada, mais do que isso, consegui definir o que Bruce poderia estar sentindo por mim.
— Acho que estou com fome — disse, mordendo os lábios, assim que ele saiu do banheiro enrolado na toalha.
— Quer que eu peça algo para o Alfred? — perguntou ele, mantendo seu olhar em mim.
— Não. — Eu me levantei da cama, enrolando o lençol em mim. — Mas precisamos sair deste quarto.
— Não vejo problema nenhum em ficarmos mais um pouco aqui. — Ele sorriu de canto.
— Mas eu, sim. — Peguei minhas roupas que estavam espalhadas pelo chão e caminhei até a porta.
— O que deseja para o almoço, senhora Wayne? — perguntou Bruce, de forma brincalhona.
— O que me sugere, senhor Wayne? — Olhei para ele por um momento e, pegando na maçaneta, abri a porta e saí.
A distância entre meu quarto e o dele não era muita, mas estava com certa vergonha, não queria que Alfred me visse enrolada num lençol. Assim que entrei no meu quarto, me tranquei por um breve momento, até que pudesse tomar uma ducha relaxante e trocar de roupas. Nosso almoço foi servido. A pedido de Bruce, Alfred fez uma tradicional comida italiana para nós, talvez por ser considerada a melhor culinária romântica entre os casais. Saboreamos aquela refeição tranquilamente, com direito a cheesecake de morango de sobremesa.
Gostaria de ter passado mais tempo ainda com ele, porém uma ligação do comissário Gordon surgiu após nossa refeição. Pelo que Alfred me explicou, a polícia tinha possivelmente localizado o diamante roubado. Segundo alguns informantes infiltrados, estava com um tal de Dimitri, o novo rei do crime de Gotham.
— Hum, pensei realmente que o Batman conseguiria pegar de volta — disse ao Alfred. — Espero que ele consiga.
— Eu também espero que sim, patroa — concordou ele.
Ao final da tarde, recebi uma ligação de uma colega de faculdade, me convidando para o lançamento de sua marca de sapatos. Joseline tinha um dom para este segmento, além de uma criatividade enorme também. Pedi para que me enviasse o convite formal, assim eu poderia organizar minha vazia agenda para não esquecer do evento.
— Seria interessante estar acompanhada do meu marido — sussurrei, ao encerrar a ligação e dar alguns passos pela biblioteca até a estante de livros de romance.
Um suspiro fraco e mais uma reflexão.
— Acho que deveria pensar em algo para fazer também… — sussurrei para mim, pensativa sobre o futuro.
Eu havia me formado no curso de moda com honras, especialização em estilismo e uma pós em seguimento editorial. Um universo que sempre me atraiu de alguma forma, que eu queria explorar, só não sabia por onde começar. Peguei o celular e mandei uma mensagem ao Bruce, relatando sobre o evento surpresa daquela noite, que aconteceria em Metrópole. A tarde passou e pontualmente o senhor Wayne estava a me esperar no hall de entrada da mansão, charmoso como sempre e com seu olhar intenso em minha direção.
— Boa noite, senhor Wayne — disse num tom baixo, ao me aproximar dele.
— Boa noite, senhora Wayne — disse ele, ao me olhar de cima para baixo com malícia. — Está mais linda do que nunca.
— Temos um evento para comparecer. — Tentei não me retrair com a intensidade que emanava dele. — Acho melhor irmos.
Aquele seria nosso primeiro evento juntos como um casal. Mesmo não sendo em Gotham, certamente teria muitos comentários no jornal do dia seguinte. Era um fato que toda a elite e demais interesseiros tinham curiosidade por saber como era o relacionamento do casal do ano. Se fosse a considerar por semana atrás, talvez pudesse nem haver um mínimo ato de afeto entre nós dois publicamente, entretanto, não conseguiria continuar com esta mesma ideologia após a manhã calorosa que tivemos em seu quarto.
— ! — Joseline abriu um largo sorriso ao me ver, abraçando-me depois. — Ou melhor, senhora Wayne.
— Deixe de bobagens e formalidades, ainda sou a mesma — disse, retribuindo o abraço.
— Não é mesmo. — Ela riu de leve, voltando seu olhar para meu marido ao meu lado.
— Este é Bruce, e, Bruce, esta é uma amiga da faculdade, Joseline — continuei, a apresentando a ele.
— Prazer em conhecê-la. — Ele esticou a mão em cumprimento, tentando ser o mais cordial possível.
— Igualmente. — Joseline tentou conter seu olhar, mas dava para perceber sua fascinação.
Não somente ela, como metade das mulheres que tinha naquele lugar.
Aquele seria meu momento de me permitir sentir ciúmes?
— Wayne! — uma voz desconhecida soou atrás de nós, certamente um conhecido dele.
— Barry Allen? — A voz de Bruce demonstrou traços de surpresa. — O que faz aqui?
— Minha esposa é repórter, lembra? — Ele riu de leve. — Vim acompanhando-a.
— Bem, eu vou deixá-los à vontade — disse Joseline, ao voltar seu olhar para trás. — Preciso cumprimentar mais algumas pessoas.
— Tudo bem, Jose. — Assenti, com um sorriso singelo. — Mais uma vez, parabéns pela conquista.
— Ainda quero conversar com você. Se não hoje, vamos marcar um café. — Seu tom foi quase de uma intimação.
Eu ri de leve, a observando se afastar de nós.
— , quero te apresentar um… conhecido. — Ele parecia escolher bem as palavras e talvez explicações, afinal, era conhecido como um playboy sem amigos e rodeado por mulheres. — Barry Allen.
— Prazer, senhora Wayne — disse ele, esticando a mão.
— Prazer. — Apertei sua mão, com um sorriso. — É uma surpresa conhecê-lo, a contar do histórico de amizades do meu marido.
Era mais forte do que eu comentários como esses.
Ambos riram um pouco, me fazendo rir também. Barry, por sua vez, começou a me contar como havia conhecido Bruce, em uma entrevista que sua esposa fez a ele, nas Indústrias Wayne. Eu que achei que seria um simples evento de lançamento de uma marca de sapatos, se tornou uma noite interessante, em que seu findar fora bem longe da cidade perigosa em que moramos.
— Não sabia que tinha propriedades em Metrópole — comentei, assim que adentramos a cobertura que pertencia a ele.
Um belo e luxuoso apartamento com cobertura, uma vista de 360 para a cidade e localizado no bairro mais nobre.
De se surpreender.
— Por que eu não teria? — indagou ele, ao fechar a porta e caminhar até o sofá.
— Hum… — Me voltei para ele, o observando.
Mesmo que não demonstrasse, lá no fundo dava para perceber sua chateação por não termos voltado a Gotham naquela noite. O evento estava tão descontraído que não queria encerrar a noite em seu ápice.
— Está chateado por não termos voltado para Gotham hoje? — indaguei a ele.
— Claro que não. — Ele deu um sorriso disfarçado, que não me enganava, e se aproximou de mim. — O que importa não é onde estou, mas é estar com minha esposa querida.
Eu deveria ter alguma reação diante daquilo?
Sim.
Ele havia mudado sua forma de me olhar da água para o vinho.
Mas nem mesmo tive a oportunidade de resposta, pois seus lábios maliciosos trataram de me tomar o fôlego, atraindo minha atenção apenas para a intensidade das suas carícias.
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Selina Kyle
Estava completando uma semana desde que descobri quem era o homem por trás da máscara do morcego. Uma parte de mim estava surpresa e a outra torcia para que fosse quem eu queria e imaginava. Não sabia ao certo definir o que estava sentindo, mas era como unir o útil ao agradável. Comecei a estalar meus dedos, pensando em como me divertir naquela noite. Por mais que eu quisesse pensar em outras coisas valiosas que poderiam existir em Gotham, a imagem do diamante não saía de minha cabeça. Ainda mais após saber que Dimitri venderia para um homem chamado Shea, chefe de uma gangue de Metropolis, em troca de informações.
Confesso que fiquei triste e indignada quando soube, o que me deixou com ainda mais vontade de pegar de volta o que um dia foi meu. Eu não pensaria nem um pouco mais sobre isso, estava decidida no que faria aquela noite. Me levantei do vitral da igreja onde estava sentada e caminhei por entre os bancos daquele lugar sagrado. Em menos de dez minutos, eu já estava em frente à mansão desse tal Shea, uma bela propriedade que ficava próxima à ponte que ligava Gotham à Metropolis. Pela quantidade de carros que havia no lugar, certamente a transação seria feita.
Seria pretensão demais a minha entrar sem ser convidada?
— Odeio quando meu nome não está na lista — sussurrei para mim mesma, seguindo em direção à porta.
Eu sabia que estava sendo vigiada, mas não me importava, meus sentidos estavam atentos a cada movimentação ao meu redor, mesmo que minha atenção estivesse focada na mansão. Assim que toquei na porta, ela se abriu, parecia que estavam esperando por isso, ou talvez as câmeras de segurança haviam me detectado.
— Boa noite, cavalheiros — disse, ao entrar, com meus passos sinuosos.
— Senhorita Kyle — disse Dimitri. — A que devemos a honra?
— Soube que estava acontecendo uma transação aqui, fiquei curiosa — disse, adentrando um pouco mais a sala.
— Era só curiosidade mesmo, ou estava mesmo querendo pegar de volta o que me vendeu?
— Majestade, não me interprete mal, não sou tão ambiciosa assim. — Fiz um olhar inocente.
— Tem certeza? — disse um homem, aparecendo atrás de mim, colocando uma arma encostada em minha cabeça.
— Hum, é assim que recebe uma visita inesperada? — indaguei, me ofendendo.
— Talvez, depende da visita — disse ele, a arma fez o barulho de um click.
Eu dei um sorriso debochado, levantando minhas mãos. Esperei o momento mais propício e me virei, lançando minha perna sobre a arma. Um disparo foi feito, acertando a janela, eu aproveitei e soquei a cara dele no impulso do disparo. Quando voltei minha atenção para Dimitri, senti algo picar minha nuca. Elevei minha mão para entender o que era, e constatei ser um dardo tranquilizante. O efeito foi tão rápido que nem senti meu corpo caindo ao chão, não conseguia distinguir se estava inconsciente ou não, apenas ouvia vozes ao fundo. Ao sentir meu corpo sair daquele transe sinistro, abri meus olhos com minha visão ainda embaçada, demorando um pouco para voltar ao normal.
Foi questão de minutos para finalmente adaptar meus olhos à forte luz que estava sobre mim.
— Então é assim que trata as mulheres? — Dei uma risada debochada, sentindo meus pulsos presos a uma algema. Meus braços estavam estendidos para cima, pendurados por uma corrente grossa presa ao teto.
— Não, este tratamento é especialmente para você — disse Shea.
— Eu te conheço? — disse, tentando me lembrar do seu rosto. — Já te vi uma vez em Metropolis, entrando no prédio da LexCorp.
— Então você já me viu antes. — Ele deu um sorriso irônico. — Digamos que tenho um amigo lá.
— Não é pelo diamante que estou aqui — disse, olhando ao meu redor. Eles tinham me levado a um galpão abandonado. — O que acha que vai conseguir de mim?
— Como você mesmo presumiu, Selina, estamos em uma transação — explicou Shea, engatilhando sua arma novamente. — E você faz parte dela.
— O quê? — Eu o olhei.
— Dimitri só estava em minha casa com o diamante para te atrair. Ele viu o seu olhar quando vendeu a pedra para ele, só confirmava o que sua fama te prediz — explicou ele. — Não foi difícil te atrair para uma armadilha.
— Se o diamante era apenas uma peça de xadrez nisso, estou me perguntando o que Dimitri ganhou me atraindo aqui — sibilei um pouco, tentando ganhar tempo.
— Ele ganhou uma pedra bem mais rara e valiosa que aquele diamante — respondeu ele.
— Hum, só para me atrair até você? — Desviei meu olhar para os dois capangas que estavam atrás dele. — Estou curiosa para saber o que quer de mim.
— Eu soube que esteve envolvida em uma briga noites atrás, e que possivelmente tenha uma informação valiosa — explicou Shea.
— E acham que me tratando assim vai conseguir algo de mim? — Eu comecei a rir, mexendo um pouco meus pulsos, tentando me soltar. — Idiota, eu não tenho medo de você.
— Veremos.
Ele se virou, ficando de costas para mim, assim seus dois capangas vieram em minha direção. Eu já esperava por algum tipo de chantagem ou suborno, mas tortura estava sendo baixo demais. Foi questão de dois ou três socos de cada um dos dois para que eu começasse a rir, mesmo sentindo meu corpo em dores, o deboche soava nitidamente em minha voz.
— Nós podemos fazer isso a noite toda, mas você nunca terá o que quer — disse a ele.
— Você acha? — Ele me olhou com raiva. — Você não sabe com quem está lidando.
— Nem você. — Mesmo sentindo o gosto de sangue em minha boca, eu sorri com a maior satisfação do mundo.
Em um piscar de olhos, toda a luz do galpão se apagou. Meu riso se transformou em gargalhada ao ouvir o primeiro capanga sendo jogado em cima de alguma coisa. Um grande barulho surgiu à minha frente, além de um vento estranho passar por mim. Após alguns minutos de silêncio total, senti uma pessoa perto de mim, retirando minhas algemas.
— Você demorou — disse, em sussurro, sentindo minhas pernas meio bambas.
— Não abuse, eu só vim retribuir o favor — disse o homem morcego, com sua voz grossa e sexy.
— Não estou abusando. — Assim que ele terminou de soltar meus pulsos das algemas, eu me joguei em seus braços. — Adoraria te ajudar, mas minhas pernas estão dormentes.
Sem dizer mais nada, ele me pegou no colo e seguiu em direção à saída. Mesmo um pouco desnorteada por causa dos socos, eu ainda estava consciente.
— Ela está bem? — perguntou uma voz masculina diferente.
— Sim. — Assentiu Batman. — Vai precisar de ajuda?
— Não — respondeu o homem. — Lex Luthor é assunto meu.
— Como quiser. — Batman começou a se mover comigo em seus braços.
Por mais que eu quisesse ver a face daquele homem, eu estava tão confortável de olhos fechados nos braços do homem morcego que nem tinha vontade de me mover. Não demorou muito até que chegamos ao seu carro. Para minha surpresa, ele me levou para o lugar onde se encontrava sua caverna de descanso. Para um homem da lei, estava sendo inusitada a forma que ele estava se preocupando comigo, apesar de dizer que estava meramente devolvendo o favor que um dia eu fiz a ele. Eu segui seus movimentos com meu olhar, ele parecia estar procurando algo que não conseguia achar. Respirei fundo, voltando meu olhar para baixo, e destravei o cinto de segurança. Saí do carro e fiquei olhando os detalhes daquela caverna, até que ele se aproximou de mim, me fazendo sentar no capô do carro. Ele começou a limpar levemente o pequeno corte que estava em minha boca. Mais que a dor em meu corpo, sentir aquele corte arder por causa do remédio era pior ainda.
— Não precisava ter feito isso — disse a ele. — Afinal, a única coisa que eu fiz por você foi levá-lo ao seu carro. Podia ter me deixado em qualquer lugar da cidade.
— Qualquer lugar? — Ele me olhou. — Pensei que morasse no sótão da igreja.
— Desde quando gatos de rua tem lar? — retruquei, dando uma risada rápida.
— O que eles queriam de você? — perguntou ele, mudando de assunto, ao se afastar um pouco para guardar a caixa de primeiros socorros.
— Tem certeza de que não ouviu? — Desviei meu olhar para uma mesa onde estava um notebook. — Me parece que todos querem saber quem é você.
— E você sabe? — Seu olhar estava intenso e preocupado.
— Talvez. — Eu sorri de canto, me aproximando dele. — Mas se esse for o caso, o que fará comigo?
— Terei que persuadi-la — disse ele, num tom frio.
— Estou curiosa para saber como vai conseguir.
Seria mais fácil eu persuadi-lo. Foi exatamente o que eu fiz ao me aproximar ainda mais e atrair seus lábios para os meus. Aquele era o momento em que eu poderia seduzir ainda mais aquele homem misterioso e estava totalmente empenhada em descobrir todos os seus pontos fracos naquela noite, claro, sem deixar de aproveitar aquele momento único.
Seria uma longa noite para nós dois, uma noite cheia de beijos ardentes, carícias e muito calor sendo trocado dentro do seu famoso carro.
"Só vai ficar aí me assistindo queimar,
Tudo bem, porque gosto da maneira que dói,
Só vai ficar aí me ouvindo chorar,
Está tudo bem, porque adoro o jeito como você mente,
Adoro o jeito como você mente."
— Love The Way You Lie / (ft. Eminem) Rihanna
O que me custou algumas dores nas costas.
— Não acredito que dormi aqui — sussurrei para mim mesma, me levantando. — Acho que estou sentindo as consequências disso.
Olhei para o chão e peguei o livro que havia caído de minha mão enquanto dormia. Dei alguns passos até a estante para colocá-lo no lugar. Assim que peguei um dos livros para deslocar para o lado, ouvi um barulho estranho de algo destravando e uma fresta se abriu entre as prateleiras. Eu coloquei meu dedo de leve e puxei, descobrindo ser uma porta escondida. De início, eu não entendia o que era, mas adentrei, me deparando com um estreito corredor que dava a uma escada ainda mais estranha. Desci as escadas silenciosamente, até que comecei a ouvir algumas vozes, reconhecendo de imediato.
— Ela estava aqui — disse Bruce, ao se aproximar de uma mesa. — Não sei como conseguiu sair sem que eu visse.
— Patrão Bruce, o senhor tem certeza de suas teorias? Pelo que disse, esta senhorita que resgatou é bem imprevisível — comentou Alfred.
Bruce ficou em silêncio por um tempo, até que seu olhar se desviou para a minha direção. Eu estava um pouco estática ao ver e ouvir aquilo. Quem seria essa de quem falavam? Já estava sentindo meu coração doer.
— O que é tudo isso? — perguntei, descendo o último degrau, vendo todas aquelas coisas que compunham o lugar.
— . — Bruce se afastou da mesa e veio em minha direção.
— Se afasta de mim — disse, esticando minha mão. — Você…
Eu olhei para todo o lugar, tentando não ficar desnorteada, mas não tinha outra explicação para o que eu estava vendo. Havia uma caverna embaixo da mansão da família Wayne e nesta caverna tinha um segredo. Agora algumas coisas começaram a fazer sentido para mim.
— , por favor. — Ele deu mais um passo.
— Não — gritei, recuando um pouco. — Não se aproxima, por favor. Eu preciso processar tudo isso.
Desviei meu olhar para o lado, vendo todos aqueles uniformes do Batman. Meus olhos percorreram novamente as ferramentas que estavam no chão, até chegar ao batmóvel. Eu me lembrava daquele carro, o tinha visto várias vezes nos jornais e na televisão. Parecia surreal, mas estava confirmado que meu marido, Bruce Wayne, era o Batman. Eu segurei as lágrimas, não sabia o que sentir naquele momento. Me virei para trás e subi as escadas correndo, passei pela biblioteca e segui em direção ao meu quarto. Minha mente estava fervendo de perguntas e questionamentos, mas saber o segredo dele era apenas uma pequena parte dos meus surtos internos.
Minha mente estava apenas em saber sobre a tal mulher da qual falavam.
— — disse Bruce, ao bater na porta. — Abra, por favor, vamos conversar.
— Não temos nada para falar. — Desviei meu olhar para a janela, respirando fundo. Tinha deixado a porta trancada. — Me deixe sozinha.
— Eu preciso me explicar — insistiu ele.
— Meus olhos já viram tudo — gritei, me virando para a porta do banheiro.
Eu não queria mesmo vê-lo naquele momento, estava me sentindo traída e enganada, não sabia se estava com mais raiva por ele ser o Batman, ou por ter me enganado tão bem. Entrei no banheiro e me joguei na banheira cheia de espumas, precisava relaxar meu corpo e minha mente. O tempo foi passando comigo trancada no quarto. A maior parte fiquei sentada, ao lado da janela, de roupão, pensando em tudo que tinha acontecido naqueles últimos dias. O que me fez pensar na noite que Bruce chegou em casa machucado. Certamente não era um assalto, não um assalto ao senhor Wayne. Suspirei cansada, voltando para o closet, e coloquei roupas mais confortáveis, acho que estava pronta para abrir a porta.
Bruce estava encostado na parede de braços cruzados, com seu olhar fixo em minha direção.
— … — se pronunciou ele, descruzando os braços.
— Se for para negar o que meus olhos viram, nem comece a falar — alertei, mantendo minha voz baixa, porém firme.
— Não vou, o que você viu é real. — Ele deu dois passos até mim. — Aquele é o motivo para eu não comparecer ao jantar, chegar sempre de madrugada.
— Quem é ela? — perguntei. — Eu ouvi você falando com o Alfred sobre alguém. Era uma mulher?
— Sim. — Assentiu ele.
— Quem? — insisti.
— Alguém que me ajudou uma vez e eu retribui o favor ontem — explicou ele superficialmente.
— E você a levou para a caverna?
— Sim, ela havia se ferido. — Ele desceu seu olhar. — O que aconteceu com sua boca?
— O quê? — perguntei, sem entender. — Não mude de assunto.
— Não estou mudando. Sua boca está machucada. — Erguendo sua mão, ele tocou em meus lábios. — O que aconteceu?
— Eu acho que… escorreguei no banheiro — respondi, me afastando dele. — Eu ainda não voltei a confiar em você.
Me desviei dele e segui em direção às escadas. Assim que entrei na cozinha, Alfred estava preparando uma bandeja de café, provavelmente para mim.
— Patroa , eu já ia levar seu café — explicou ele, pegando a bandeja.
— Há quanto tempo você sabe, Alfred? — perguntei, tentando não ficar com raiva dele, ele era uma pessoa legal.
— Desde o início, senhora. — Ele colocou a bandeja sobre a mesa e se aproximou de mim. — Me desculpe por não ter dito nada antes, mas eu não poderia contar um segredo que não é meu.
— Eu entendo os seus motivos. — Me sentei na cadeira, suspirando um pouco.
— Que bom. — Ele parou ao meu lado. — Eu peço que entenda os motivos do patrão Bruce. Vocês são casados há pouco tempo. Se ele manteve isso em segredo, era para a proteção da senhora.
— Estou tentando levar por esse lado. — Eu o olhei. — Mas preciso de tempo para digerir tudo isso.
— Se precisar de algo, basta chamar.
Assim, com um sorriso, desviei meu olhar para a bandeja, estava me decidindo se iria ou não comer, estava com a sensação de ter perdido a fome. Horas depois, no meio da tarde, recebi uma visita inesperada, era um repórter do jornal Planeta Diário, chamado Clark Kent, que estava ali para me entrevistar sobre o bazar beneficente que a empresa do meu pai estava organizando em Metropolis. Eu não consegui prestar muita atenção nas perguntas, e na maioria delas dei respostas rápidas e curtas. Aquele bazar era alvo de dois interesses, o do meu pai de fazer o marketing de suas empresas naquela cidade e do meu interesse, que pegaria toda a quantia arrecadada para doar aos dois orfanatos de Gotham. E como eu era a esposa do bilionário Bruce Wayne, o jornal Profeta Diário não poderia deixar passar uma matéria dessa.
— Senhora Wayne — disse o repórter. — Como a senhora vê seu projeto social vinculado à imagem da empresa do seu pai?
— Como deveria ver? — O olhei sem entender. — Instituições privadas têm total liberdade para apoiar este projeto e ajudar a divulgá-lo, pertencendo ou não ao meu pai.
— O mesmo vale para as Indústrias Wayne?
— Sim, provavelmente vão apoiar a causa.
— E, quanto aos orfanatos, a senhora conhece as crianças de lá?
— Sim, conheço cada uma — respondi com propriedade.
— O que levou a senhora a querer ajudar essas crianças? — indagou ele.
— Eu tive uma amiga de infância que cresceu em um desses orfanatos.
Já estava até imaginando o título da manchete: “Pai ganancioso promove empresa às custas de boa ação da filha.” Jornais são realmente sensacionalistas. Soltei um discreto suspiro de alívio quando a entrevista acabou e o repórter foi embora.
— Está tudo bem? — perguntou Bruce, ao entrar na sala.
— Agora, sim — disse, voltando meu olhar para a xícara de café. — Nunca vi alguém tão desastrado quanto esse repórter.
— Qual o nome dele?
— Clark Kent, eu acho — sibilei um pouco. — Estranho que a voz dele me pareceu familiar.
Lá no fundo, era como se eu já tivesse ouvido aquela voz antes.
— Você acha? — Bruce agiu com naturalidade. — Talvez tenha esbarrado nele em Metropolis e não se lembra.
— Talvez. — Eu me levantei do sofá.
— Posso te fazer uma pergunta.
— Sim.
— Ainda está zangada comigo? — perguntou ele, com ar de receio.
— Talvez. — Eu me virei em direção às escadas e subi até meu quarto.
Ao final da tarde, Bruce bateu de leve na porta do meu quarto. Após um silêncio de minha parte, ele disse que estaria na biblioteca se caso eu quisesse conversar com ele, prometendo não sair naquela noite. Porém, ao contrário dele, naquela noite era eu quem iria quebrar as regras do matrimônio e sair com as amigas. Aproveitando a passagem de Joseline pela cidade com seu lançamento profissional, marquei um jantar de meninas no Bistrô Martin. Eu ainda lhe devia as fofocas do casamento do ano.
— ! — Seu tom empolgado veio seguido de um abraço apertado, que me deu certo medo dos comentários que viriam ao longo da noite. — Que saudade de você. Não nos vemos desde a formatura, e nem conseguimos conversar direito no coquetel.
— Sim. — Assenti, retribuindo o abraço e sorrindo de leve.
— Vejo que o casamento te fez bem, sua pele está incrível — comentou ela, se sentando novamente.
— Pois é, ainda estou me adaptando à nova realidade — brinquei, me sentando também.
— Foi um susto quando vi nos jornais sobre — ela continuou, num tom animado. — Só fiquei chateada por não ter me convidado.
— Me desculpe, foi algo de última hora, apenas para membros da família — expliquei a ela, voltando meu olhar para o garçom vindo em nossa direção.
— E como é? — indagou ela, com o olhar curioso.
— Estar casada? — retruquei.
— Não, estar casada é normal… — Ela riu um pouco, me deixando confusa. — Como é estar casada com Bruce Wayne?
— Acho que normal também — respondi, um pouco constrangida.
Aquele não havia sido o melhor dia de casada pra mim.
— Amiga, é o Bruce Wayne, o homem mais charmoso de Gotham e mais cobiçado — argumentou ela. — Com todo respeito.
— Tudo bem, não é a única que acha isso. — Forcei um sorriso. — Como eu disse, ainda é tudo novo para mim.
— Hum… Ok, vamos mudar de assunto, então — sugeriu ela, me conhecendo.
Sempre fui muito reservada quanto à minha vida pessoal.
Após sermos servidas pelo garçom, Joseline continuou em seu monólogo sobre sua marca de sapatos e de onde surgiu a ideia de investir naquela área específica da moda. Apesar de eu saber desde o dia que a conheci que seu maior sonho era ser a Channel dos sapatos. Foram longas duas horas e diversos assuntos, até que nos despedimos na fachada e ela seguiu de táxi para casa. Quanto a mim, caminhei até o carro, o motorista já me aguardava com a porta aberta. — Seguimos para casa, senhora Wayne? — indagou ele. — Sim. — Assenti ao mover meu olhar para o céu. Era uma noite estrelada e refrescante. No relance antes de entrar no carro, minha atenção se voltou para o alto do prédio da frente, me permitindo ver o que parecia a silhueta de uma pessoa, bem ao canto, se misturando à sombra.
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Selina Kyle
Alguns dias depois, eu ainda me lembrava da noite maliciosa de forma vívida e prazerosa, porém, apesar de tudo ter acabado bem, eu ainda estava com raiva por ter sido atraída para uma armadilha. Eu não costumava me vingar de ninguém, mas Dimitri merecia algo a altura do que ele tinha feito comigo. Por isso, havia passado aqueles dias pensando em como poderia retribuir sua gentileza.
— Perdoe-me, pois eu pecarei — sussurrei, olhando para a cruz que estava no altar da igreja.
Eu estava no mezanino do salão onde celebrava a missa, saí dali e fui para o telhado da igreja. Olhei para o céu e o símbolo do Batman já estava o iluminando, era sinal de que alguém já estava rondando pela cidade. Eu me sentei no beiral do telhado da igreja e fiquei olhando para o céu, estava deixando que ele viesse até mim.
— Ando me perguntando sobre como você conseguiu sair sem que eu visse — disse ele, ainda nas sombras.
— Gatos são silenciosos — disse, me virando e levantando.
— Você leva isso muito a sério — disse ele, saindo do escuro e aparecendo em minha frente.
— Acredite, eu já tive sete vidas — expliquei, rindo do fato.
— E agora tem quantas? — perguntou ele.
— Apenas duas, por assim dizer.
— Quem realmente é você? — insistiu ele. Mesmo debaixo daquela máscara, percebi seu olhar confuso para mim.
— Você está mesmo me fazendo essa pergunta? — retruquei, dando alguns passos até ele. — Já sabe a resposta, só não quer admitir.
— Só quero confirmar algo. — Ele se manteve parado.
— Sabe de uma coisa, acho que nossa história realmente merece ficar um pouco equilibrada. — Eu elevei minha mão até minha máscara. — Mesmo sabendo quem sou eu, não me custa nada confirmar suas teorias…
Retirei minha máscara lentamente para ele. Consegui perceber seu corpo paralisado, seus olhos fixos em mim e sua respiração descoordenada. Claro que, ao me salvar das algemas, ele havia visto e sentido com precisão a pequena cicatriz em meu pulso, um detalhe muito sutil que o deixou atordoado e ao mesmo tempo muito aberto a retribuir o beijo que iniciou nossa noite de malícias.
— — sussurrou ele, confirmando suas suspeitas.
— Sim, e não — disse tranquilamente, abrindo um singelo sorriso no canto do rosto para ele. — Mesmo sendo ela por fora, existe outra pessoa aqui. Pode me chamar de Selina Kyle.
"Isso é o quanto eu te amo,
Isso é o quanto eu preciso de você,
E eu não suporto você,
Tudo o que você faz me faz querer sorrir,
Eu posso não gostar de você por um instante? (Não)."
— Hate That I Love You (feat. Ne-Yo) Rihanna
Porém, para mim, não estava sendo nada fácil explicar ao meu marido que eu tinha um leve transtorno de múltipla personalidade. Bem, aquilo não era fácil nem para mim mesma entender. E já havia tempos que Selina não dava o ar da graça, que achei mesmo que ela tivesse partido de vez como as outras.
— Eu… — Bruce se sentou na cadeira, ainda desnorteado. — Ainda está sendo difícil processar tudo.
— Imagino. — Respirei fundo, passando a mão no uniforme dele pendurado. — Sei que o que eu tenho não é normal. Isso não é como você, eu não tenho nenhum controle sobre a Selina.
Certamente, por uma ideia da Selina, eu havia acordado na caverna. Estava dormindo no banco de trás do seu carro, com ele do lado de fora, me olhando.
Me esperando acordar.
— Há quanto tempo você sabe que tem isso? — Ele desviou seu olhar para mim.
— Como sabe, meus pais se divorciaram quando eu tinha sete anos. Minha irmã mais velha ficou a minha mãe e eu com meu pai. Foi nessa época que comecei a ter alguns traumas por causa disso. Comecei a ter amigas imaginárias por ser sempre sozinha. — Desviei meu olhar para a frente da caverna. — Eu pensava que elas só existiam na minha mente, até que comecei a não me lembrar de coisas que me diziam que eu tinha feito. Então, aos quinze anos, a Selina apareceu e tomou o controle pela primeira vez.
— O que aconteceu?
— Naquela época, existia uma governanta trabalhando para meu pai. Ela foi a única que percebeu minhas mudanças de personalidade. Foi ela que identificou que eu tinha um outro lado tão forte quanto eu. — Eu voltei meu olhar para ele. — Foi ela quem deu esse nome a Selina e que aparentemente a treinou também. Curiosamente, ela me explicou o que estava acontecendo comigo.
— Se eu não tivesse visto tanta coisa nesse mundo, diria que isso é uma loucura — admitiu ele.
— Acredite, eu também, se não fosse comigo. — Respirei fundo.
— Mas, e as outras?
— Selina as expulsou, eu acho. Depois que ela apareceu, foi questão de tempo para as outras desaparecerem, nunca mais falei com elas. — Me escorei na mesa, olhando para o chão. — Eu sempre achei que não teria problemas em ter amigas imaginárias, até descobrir que elas eram minhas múltiplas personalidades.
Bruce se levantou da cadeira e caminhou até mim. Ele me abraçou apertado e começou a acariciar meus cabelos. Foi um gesto surpreendente.
— Não se preocupe, conhecemos alguém que sabe perfeitamente lidar com a Selina — disse ele tranquilamente.
— O Batman?
— Sim — sussurrou ele — Ele mesmo.
— Bruce. — Eu me afastei um pouco dele. — Era eu, ou melhor, era ela que estava aqui?
Ele assentiu com a face.
— Por isso acordei na biblioteca. — Elevei minha mão à boca. — Meu machucado, o que aconteceu?
— Ela teve alguns problemas.
— Obrigada por ter ajudado.
— Não se preocupe, ela não vai mais se envolver em confusão. — Ele sorriu carinhosamente para mim.
Ao mesmo tempo que eu estava aliviada por ter contado a ele, eu estava intrigada por Selina ter revelado seu rosto. De todas as minhas seis personalidades, ela era a mais imprevisível. Eu não me lembrava de tudo que ela fazia durante à noite, mas sempre vinha alguns flashes em minha memória, como se fosse um sonho. Estranhamente, eu comecei a lembrar da noite que ela havia sido salva, o que me fez contar ao Bruce.
Após algumas horas de descanso, desci para a biblioteca, onde ele estava. Seu olhar, fixo na lareira, logo se voltou para mim, quando sentiu minha presença.
— Eu não me lembro de muita coisa — me pronunciei, após um longo silêncio entre nós. — Mas tenho certeza de que é algo envolvido com o diamante. Eu me lembro dele falando de uma pedra.
— Acha que a Selina vai querer pegar novamente? — perguntou ele, mantendo a atenção em mim.
— Não sei, se tratando dela. — O observei ficar de pé diante da lareira acesa e continuei. — Mas acho que tem algo a mais nisso.
— O homem que estava com ela tinha envolvimento com a LexCorp — disse Bruce, mantendo sua atenção ao fogo.
— Que envolvimento o Lex Luthor teria nisso tudo? Por que ele iria querer pegar a Selina, quer dizer, eu, ou melhor, ela? — Um nó se deu em minha mente.
— Para saber quem sou eu — respondeu ele. — Para chegar ao Super…
Bruce parou por um momento e se voltou para mim.
— Você disse pedra? — reforçou ele.
— Sim, ele mencionou a palavra pedra. Não seria o diamante?
— Não, não é qualquer pedra. — Ele fixou seus olhos em mim. — Eu aposto o meu carro que o tal Dimitri tem um pedaço de kryptonita em seu cofre.
— Kryp… — Eu pensei por um tempo, tentando definir que pedra era aquela, até que me lembrei. — E agora?
— Precisamos dela — disse Bruce.
Eu já imaginava que, de alguma forma, Selina iria se envolver novamente naquela história. Ela era a única que conseguiria pegar a pedra de volta.
— O que foi? — indagou ele, ao perceber meu silêncio inquietante.
Se afastando da lareira, veio em minha direção. Eu estava sentada no sofá em frente.
— Você a ajudou… Aconteceu mais alguma coisa naquela noite? — perguntei, num misto de curiosidade e aflição.
— Não vou mentir…, mas só foi porque achei que era você. — Ele pegou em meu braço direito e, virando meu pulso, deslizou os dedos em minha cicatriz. — Foi isso que me fez reconhecê-la.
— Você se lembra do dia em que ganhei isso? — indaguei a ele.
Uma parte da minha infância, eu tive alguns momentos de contato com ele, através da amizade de nossos pais.
— Sim, eu lembro. Fui o causador disso — assumiu ele, parecia pensativo. — Apesar de agora conhecer cada detalhe do seu corpo, essa cicatriz nunca saiu da minha cabeça.
Eu respirei fundo, deixando um sorriso singelo escapar em meu rosto.
— Eu não vou ficar com ciúmes e vou pensar que, na teoria, naquela noite foi o Batman e não o Bruce. — Era reconfortante saber que ele pensava em mim depois de todos aqueles anos, mesmo que fosse por uma travessura dele comigo.
E, além do mais, ele não havia me traído, era, de fato, sua esposa…
Ou uma parte dela.
Não queria admitir que estava com ciúmes da Selina. De alguma forma, ela era eu, um lado meio descontrolado e audacioso, mas, no fundo, ela era uma parte de mim.
— O que faremos agora? — perguntei a ele, ainda faltavam horas para anoitecer.
— Temos muitas ideias, senhora Wayne. — Seu sorriso malicioso se formou, sendo seguido por um intenso beijo de sua parte.
Afinal, Selina só aparecia com o luar.
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Selina Kyle
Eu estava surpresa por ter sido convocada tão prontamente. Mais uma vez, o morcego precisava da minha ajuda. Eu, como sou uma boa garota, estava disposta a contribuir. Me espreguicei um pouco enquanto descia as escadas da porta secreta da biblioteca. Ele já estava devidamente trajado, me esperando perto do carro.
— Olá, querido! — disse, caminhando em sua direção. — Sentiu minha falta?
— Você sabe por que está aqui. — Sua voz estava fria e firme como sempre.
— Sei e estou impressionada por ter chegado à resposta sem mim. — Eu me virei, olhando para sua moto. — Deveria agradecer por eu ter deixado ela ver algumas coisas.
— No que está pensando? — perguntou ele, mantendo seu olhar em mim.
— Se o Bruce e a estão devidamente casados, eu posso acreditar na teoria de que tudo que é seu é meu também? — Eu me virei para ele. — Acho que vou pegar sua moto emprestada.
— Pretende ir sozinha?
— Querido, se seu amigo for, ele possui algo que pode feri-lo. Se você for, pode não conseguir chegar até o cobre. Aquele prédio, apesar de não parecer, pode ser mais protegido que sua empresa em certas ocasiões, além de não saber a senha — expliquei o óbvio. — E tem outro ponto, você é amigo do Superman. Se for lá, vão saber que é por causa da kryptonita, e se não conseguir pegar, as notícias vão correr, e não acho que seja prudente saberem que existe um exemplar desta pedra aqui em Gotham.
— De alguma forma, você tem razão — concordou ele, relutante.
— Eu sempre tenho. — Estalei os dedos levemente. — Existem algumas coisas que só podem ser feitas por uma mulher.
— Selina. — Ele segurou em meu braço. — Considere este seu último roubo.
— Veremos. — Dei um sorriso malicioso, mordendo o canto do meu lábio, enquanto me soltava dele.
Eu subi em sua moto e dei a partida sem o menor receio, estava mesmo ansiando o dia em que poderia montar naquilo. Segui em direção ao meu destino. Como previsto, o prédio do rei do crime estava muito bem protegido com o dobro de homens, talvez ele estivesse com medo da minha vingança. Mas aquele era meu momento. Desci da moto e entrei no prédio ao lado. Desta vez, não teria uma entrada triunfal pela porta da frente, seria precisa e silenciosa. Assim que cheguei ao telhado, pulei no prédio de Dimitri e desci pela escada da lateral. Como na primeira vez que entrei, seria pela janela.
— Boa noite, Selina — disse ele, sentado em sua cadeira.
— Por que será que eu imaginava que você estaria aqui me esperando? — O olhei tranquilamente.
— Veio buscar o diamante?
— Talvez. — Eu sorri de canto, descendo da janela. — Soube que você possui algo bem mais valioso.
— Onde ele está? — perguntou ele, apontando uma arma para mim.
— Hum, agora está explicado por que você dobrou a segurança. Acha que o morcego está vindo? — Eu ri. — Que homem mais inocente.
Eu caminhei até a cadeira e me sentei em frente a ele. Percebi que suas mãos estavam tremendo, dava para sentir seu medo exalando. Eu levantei minha perna lentamente, cruzando com a outra. Estava mantendo minha atenção nele e, assim que Dimitri se distraiu com o movimento de minhas pernas, eu peguei o teclado do seu computador e lancei na mão que estava a arma. Assim que a arma caiu, eu joguei meu corpo para frente, subindo na mesa, me levantando de forma rápida. Lancei minha perna direita em seu rosto, o chutando, e bati o teclado em sua face novamente. Puxando o fio, envolvi em sua garganta, apertando um pouco. Minha intenção era apenas desmaiar, como, de fato, aconteceu.
— Bem, agora eu vou poder trabalhar melhor. — Me espreguicei um pouco, indo em direção ao quadro.
Retirando da parede, lá estava o cofre. Arqueei minha sobrancelha direita, analisando. Respirei fundo, me concentrando, e digitei a senha que tinha decorado. Ouvi um duplo clique e logo o cofre se abriu. O diamante estava lá, visível para mim, e a outra pedra dentro de uma pequena bolsinha de pano preta. Peguei ambos e coloquei dentro, escondido na abertura da minha bota. Refiz todo o caminho de volta. Quando cheguei ao telhado do prédio ao lado, ouvi os homens de Dimitri entrarem na sala. Eu havia deixado uma marca significativa no lado esquerdo do rosto dele. Uma perfeita obra de arte em forma do símbolo do Batman, feito com minhas próprias garras. Fiquei até com vontade de tirar uma foto para guardar de lembrança.
Outra surpresa me aguardava quando cheguei à caverna do morcego, ele estava acompanhado de seu famoso amigo.
— Hum, se eu soubesse que teríamos visita, tinha preparado o chá antes de sair — disse, num tom debochado, desligando a moto.
— Ela é sempre assim? — perguntou o convidado.
— É isso que a torna ainda mais interessante. — O morcego me olhou com um sorriso disfarçado. — Então, querida, conseguiu o que foi buscar?
— Com quem você acha que está falando? — Desci da moto, rindo, e caminhei até eles. — Não sou qualquer pessoa.
— Eu sei disso. — Batman manteve seu olhar em mim.
— Bem. — Eu me inclinei de leve, pegando a pedra verde.
— Coloque aqui — disse o Superman, abrindo uma pequena caixa, já sentindo os efeitos da kryptonita sobre ele.
— Ok. — Eu coloquei dentro da caixa e ele fechou de imediato. — Vai funcionar.
— Sim. — Assentiu Batman — A caixa é feita de chumbo, o único metal capaz de inibir os efeitos da kryptonita.
— Hum. — Me curvei novamente, retirando o diamante. — Eu tomei a liberdade de trazer algo para mim.
— Por que será que não estou surpreso? — Ele me olhou de forma séria.
— Bem, este assunto é seu, amigo. — O Superman segurou o riso, desviando seu olhar para o lado.
— Admita, eu mereço ganhar algo depois de ter me arriscado pelo seu amigo. — O olhei ironicamente. — Não mereço? Além do mais, este diamante combina tanto comigo.
— Deixarei que fique com ele, por algum tempo — respondeu ele.
— Você sabe como me agradar. — Sorri maliciosamente, mantendo meu olhar nele, suspirando por dentro. — Em forma de agradecimento, eu vou te dar cinco minutos a sós com seu amigo.
— O que é isso? Um ultimato? — perguntou Batman, com ar de indignação.
— Entenda como quiser, querido, mas quero o senhor Wayne em cinco minutos. — Eu pisquei de leve, me afastando. — Alguém estará esperando por ele no quarto.
— Agora entendo por que acha ela interessante — disse Superman, enquanto eu me dirigia para a escada.
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Foi como acordar de um sonho, mas desta vez eu estava de pé, em frente ao espelho do banheiro. Ainda me sentia zonza e um pouco desnorteada, tentava entender o que tinha acontecido enquanto ela estava no controle. Levantei minha face e me olhei no espelho. Estava com o cabelo preso, sem maquiagem. Ela tinha cuidado de tudo como sempre. Entretanto, seu toque especial estava ali. Eu estava no banheiro do quarto dele, vestida com um lingerie desconhecida e uma camisa dele por cima, com somente um botão abotoado, ri um pouco daquilo que ela possivelmente havia arquitetado.
Lavei o rosto e sequei com a toalha que estava em cima da bancada.
— Eu sei que somos diferentes, mesmo sendo a mesma pessoa, e já tem um tempo que não falo com você, mas… — Respirei fundo, me olhando no espelho. — Obrigada, Selina.
Eu pisquei para mim mesma, sorrindo, e saí do banheiro. Bruce já estava no quarto, parado e encostado na porta, de braços cruzados. Ele ficava muito sensual naquela pose.
— Então, o que aconteceu? — perguntei, dando alguns passos em sua direção.
— Deu tudo certo — disse ele, descruzando os braços. — Está tudo bem agora.
— E a pedra?
— Está com meu amigo.
— Me sinto aliviada por isso, pela Selina ter ajudado.
— Ela foi muito corajosa, você também — disse ele, sorrindo de canto. — Ambas são maravilhosas.
— Está me deixando sem palavras. — Sorri de leve.
Ficamos nos olhando por um tempo.
— Como vamos ficar agora? — perguntei, um pouco confusa. — Eu ainda possuo um lado indomável dentro de mim.
— Já disse que conhecemos uma pessoa que pode cuidar disso. — Ele segurou minha mão e me puxou para perto dele. — Vamos deixar esse assunto para eles, agora somos só nós dois.
— Só nós dois? — Segurei o riso, sentido ele aproximar ainda mais nossos corpos.
— Vamos aproveitar a nossa noite — disse, dando um suave beijo em meu pescoço.
— Teremos todas as noites de Gotham que quisermos — afirmei.
Seu beijo veio intenso e doce, nossa noite só estava começando. Eu poderia dizer que todos os acontecimentos recentes foram somente um preparo inicial em nossa vida de casados, o que me deixou ainda mais feliz e grata pelo passado de nossas famílias ter nos unido. De uma forma inacreditável, nós nos completamos em todos os sentidos, principalmente em nossas vidas noturnas, um encaixe perfeito e inesperado. Aquilo me deixava ainda mais segura e tranquila, finalmente a Mulher-Gato tinha encontrado alguém que despertasse seu olhar e admiração.
Enfim, como diz minha metade, Selina, a noite é dos gatos...
Porém agora também dos morcegos!
"Night, night, for a night, for a,
Only if for a night."
— Goodnight Gotham / Rihanna
Ainda não conseguia entender como ele conseguia se manter de pé em sua jornada dupla e me dar atenção quando chegava quase ao amanhecer. Bruce Wayne era um robô? Prendi o riso bobo, afinal, eu também não sabia nem explicar como eu conseguia sobreviver às escapadas noturnas de Selina. Meu corpo era que passava o dia se recuperando de tudo. Estava feliz por poder acordar e ver meu marido ao meu lado, fingir de vez em quando que éramos um casal normal. Me revirei mais um pouco e pousei minha cabeça em seu tórax, pude ouvir as batidas tranquilas do seu coração. Logo sua mão veio acariciar meus cabelos e uma respiração mais profunda surgiu dele.
— Bom dia — sussurrei.
— Bom dia — disse ele. — Dormiu bem?
— Sim. — Sorri de leve. — Mas estou curiosa por meu marido estar em casa nesta manhã.
— Hum. — Ele riu. — Digamos que...
Ele virou seu corpo, o jogando em cima do meu.
— Tirei o dia de folga para ficar com você. — Seu olhar estava um tanto quanto sugestivo e malicioso.
Tanto que nem consegui comentar sobre sua decisão, pois ele me beijou com intensidade e extremo desejo. Aquele lado íntimo de Bruce ainda me deixava desnorteada e derretida ao mesmo tempo. Estávamos nos apaixonando um pelo outro de forma gradativa, porém surpreendente. Eu não conseguia pensar em mais nada quando estava em seus braços, sentindo seu toque fazer meu corpo arrepiar. Meu marido sabia como me fazer sair de órbita por várias horas. E talvez sair do quarto naquele dia seria um caso a se pensar. Meu desejo era aproveitar cada segundo daquele momento, já que, na maioria das noites, eu tinha que dividi-lo com Gotham.
A cada beijo e carícia, tanto eu como ele nos entregamos mais um ao outro, fazendo aquele imenso quarto ficar cada vez menor. Acho que foi assim que não consegui entender como chegamos ao banheiro e elevamos ainda mais sua temperatura com o vapor da água em nossos corpos.
— Está com fome? — perguntou ele, ao beijar meu pescoço.
— Não tomamos o café da manhã. — Eu observei o fato, mantendo meu olhar no espelho, vendo nosso reflexo.
— Você é a minha refeição — disse, num tom malicioso, envolvendo seus braços em minha cintura.
— Canibalismo não é bem visto pela sociedade, senhor Wayne — brinquei, rindo dele.
— Você sabe o que eu quis dizer. — Ele me virou de frente para ele e me beijou novamente.
Estava sendo um sonho e parecíamos um casal de filmes românticos, mas havia um outro lado de nossas vidas que me deixava intrigada. Ao longo desses meses de casada, eu já havia percebido uma coisa, sempre que Batman e Selina brigavam, Bruce passava o dia em casa comigo, como se fosse um ato de rendição ou somente para se redimir de... Fatos que eles nunca mencionavam para mim. Por isso, já imaginava que havia acontecido algo entre os dois, e isso me preocupava um pouco.
— Alfred deve estar preocupado conosco. — Me afastei um pouco dele, me segurando para não entrar no assunto e perguntar o que provavelmente teria acontecido.
— Vamos descer, então. — Seu olhar para mim era o mesmo de sempre.
Um toque de serenidade misturado ao mistério e uma pitada de intensidade.
Isso o tornava mais que irresistível para mim. Um casamento que se iniciou por um acordo entre famílias estava se tornando algo sólido e verdadeiro. Mas eu não queria que nada estragasse isso, nem mesmo ela.
Selina.
— Vamos. — Sorri de leve, o sentindo segurar minha mão.
Seguimos até o jardim.
Ele se afastou por um momento para pedir a Alfred que preparasse um brunch para nós. Enquanto isso, me aproximei de um dos bancos e me sentei, olhando para a fonte central. Aquele jardim havia sido um presente de casamento dele para mim, algo que me deixou surpresa principalmente por ter várias flores perfumadas de que gostava tanto. Após o brunch, Bruce comentou sobre o convite de um coquetel beneficente que recebemos para sexta à noite, fornecido por Thomas Elliot. Senti alguns traços de raiva em sua voz, talvez por seu desafeto por Tommy desde os tempos de colégio. Me mantive a maior parte do tempo em silêncio, escolhendo as melhores palavras para confrontá-lo no momento certo.
— Está silenciosa, algo te preocupa? — perguntou ele, enquanto permanecemos sentados, apreciando o jardim.
— Estou tentando limitar meus pensamentos — respondi, me reprimindo um pouco.
— Pode dizer o que te preocupa. — Ele segurou em minha mão, cruzando nossos dedos.
— Você estar aqui é o que me preocupa. — Suspirei fraco. — Nós dois sabemos que sempre que fica em casa durante o dia, é porque eles brigaram.
Disse subjetivamente, me referindo ao Batman e à Selina. Como se ambos não fossem nós dois em tese.
— O que aconteceu, Bruce? — Virei meu corpo e o olhei.
— Não importa agora. — Ele sorriu com singeleza. — Deixe que eles resolvam os problemas deles.
Era o que meu marido sempre dizia.
Mas eu sabia que aquele problema não era somente deles. Querendo ou não, Bruce era o Batman e Selina era minha múltipla personalidade que eu não conseguia controlar. Ou seja, ambos faziam parte de nós dois, seus problemas eram nossos problemas. Permaneci em silêncio, faria eu mesma minha própria investigação. Apesar de ter feito um acordo com Bruce de saber o mínimo possível de sua vida noturna para minha segurança, Selina teria que me dizer o que estava acontecendo de alguma forma.
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Selina Kyle
Eu não acreditava que o marido exemplar havia passado o dia com ela só pra se redimir. Já estava me cansando daquela vida de esposa recatada que vivia, eu desejava mais, não só para mim, mas para ela também. A cada dia, ansiava pela noite para ser livre novamente, afinal, gatos não foram feitos para ficarem presos, nem serem domesticados.
Caminhei pelo beiral do telhado de um dos prédios do beco do crime, observando aqueles medíocres criminosos em sua rotina de contrabando e roubos. Tudo em Gotham já estava monótono e me cansando também. Aquilo me lembrava da noite em que vi os pais de um inocente garoto morrer, em uma época que não sabia de minha existência dentro dela.
Sim, eu fui sua primeira personalidade que se desenvolveu dentro daquela criança tímida e frágil.
— Pensando na vida, Cat. — Uma voz masculina surgiu atrás de mim.
Reconheci de imediato. Só havia uma pessoa em Gotham que me chamava de Cat.
— Hush. — Mantive meu olhar na cidade, sentindo ainda mais sua aproximação. — Há quanto tempo. Soube pelo pistoleiro que estava fora da cidade.
— Você ainda se mistura à plebe. — Ele deu uma risada rápida e maldosa, se aproximando mais. — Não deve acreditar em tudo que falam.
— Hum. — Voltei meu olhar para ele. — E não era verdade?
— Confesso que me ausentei um pouco após seu desaparecimento — disse, com seu tom sério habitual.
— Eu não desapareci, só estava de férias. — Ri baixo.
— Ouvi alguns boatos sobre sua volta — retrucou ele, dando um sorriso maldoso.
— Que boatos?
— Que se tornou amiga de uma pessoa.
Eu sabia que Hush odiava o Batman com todas as suas forças, e seu desejo era um dia descobrir quem era o homem por trás daquela máscara de morcego justiceiro.
— Hum.
— Ouvi também que você curiosamente viu o rosto dele. — Agora direto e preciso.
— Não devia acreditar em tudo que dizem. — Usei sua frase.
Eu poderia confirmar?
Sim.
Poderia revelar quem ele era?
Com certeza.
Eu não devia minha lealdade ao Bruce, pelo contrário, se fosse assim, já teria dado o endereço dele para todos que conheço. Eu devia a minha vida a , somente por ela que eu mantinha aquele segredo muito bem guardado.
— Vai me dizer que foi o pistoleiro que disse isso? — brinquei com ironia. — Da última vez que soube, o governo estava na cola dele.
— Não, não foi o pistoleiro, mas não importa... Acredito em suas palavras. — Ele tocou em minha face. — Estava com saudades de você, velha amiga.
Seu sorriso nebuloso logo apareceu em seu rosto. Eu também estava com saudades do meu velho amigo.
Silêncio!
Someone call the doctor.
— Overdose / EXO
— Selina, nós ainda precisamos conversar — disse, dando um longo suspiro. — Você não pode me ignorar assim.
Tudo continuou silencioso, até que Alfred bateu à porta.
— Senhora Wayne?
— Alfred. — Saí do banheiro enrolada no roupão de banho. — Por favor, me chame de , já se passaram meses.
— Perdoe-me. — Ele riu de leve. — Prefere tomar seu desjejum no quarto novamente, ou no jardim? Hoje amanheceu um pouco nublado.
— Pode me servir na biblioteca — respondi. — Vou descer em alguns instantes.
— A senhora está com o olhar triste já tem alguns dias. — Seu olhar de preocupação era nítido. — Tem algo que posso fazer?
— Infelizmente, não.
Ele deu um sorriso reconfortante e se retirou. Caminhei até o closet e fiquei olhando por algum tempo os vestidos nas araras, pensando em que roupa eu usaria no coquetel de sexta feira. Logo meu celular tocou, era uma mensagem anônima.
“Hello, velha amiga. Eu sei quem é Selina Kyle.
- H.”
Engoli seco, não entendendo, mas um pouco temerosa.
— H?! — sussurrei.
Quem seria esse H?
Talvez a própria Selina pudesse ter suas desconfianças de quem pudesse ser. Respirei fundo e deixei o celular em cima da mesa, então troquei de roupa, colocando um macacão de moletom preto e um all star branco. Peguei o celular e coloquei no bolso, então desci para a biblioteca. Depois que tomei meu café da manhã, liguei para a senhora Barbara Kean Gordon, ela havia me convidado para o almoço com a intenção de tratarmos de assuntos do meu interesse.
Fiquei um pouco curiosa e confirmei nosso encontro no restaurante Louie's in Gotham.
Deixei as horas passarem.
Pedi ao Alfred que preparasse o carro para mim. Antes de sair, coloquei o casaco bege e peguei minha bolsa. Ainda não tinha tido nenhuma notícia do meu marido. Aparentemente, hoje ele iria visitar algumas fábricas como uma inspeção de rotina. Quanto a mim, definitivamente precisava encontrar alguma coisa além dos livros da biblioteca para que pudesse ocupar as longas e ociosas horas do meu dia. Assim que cheguei à porta do restaurante, avistei Barbara sentada à mesa, já me esperando, uma mulher muito elegante e com algumas ambições na vida, segundo ouvi o comissário Gordon dizer em uma de suas visitas.
— Boa tarde, senhora Gordon — a cumprimentei com cordialidades.
— Por favor, prefiro que me trate pelo sobrenome de solteira. — Ela deu um sorriso compreensivo.
— Ah, me desculpe. — Me sentei, um pouco constrangida.
Havia me esquecido que ela e o comissário Gordon estavam em processo de divórcio. Pelo que me lembrava do comentário de Alfred, ele havia a traído com uma parceira da polícia.
— Como está o pequeno Junior? — perguntei.
— Esperto como nunca. — Ela riu. — As crianças de hoje em dia não perdem tempo para travessuras.
— Imagino que não — concordei.
— Mas o que nos traz aqui não são as notícias de minha família. — Seu olhar ficou sério, ela sabia ser uma mulher direta em seus assuntos.
— Diga-me então, o que nos traz aqui?!
— Independência feminina — explicou.
— Independência feminina? — Meu olhar curioso se intensificou — Poderia me explicar melhor?
— Eu ouvi, por acaso, você comentando com algumas senhoras na última recepção do governador sobre sua vontade de investir em negócios à parte das Indústrias Wayne. — Seu olhar continuava fixo em mim, porém sua mão direita se movimentava pelo cardápio. — Estou certa?
— Sim, está. — Suspirei um pouco. — Apesar de estar casada com o herdeiro Wayne, não me sinto dona do seu império, menos ainda tenho essas ambições, possuo meus próprios projetos.
— Claro que você também possui o patrimônio da sua família — instigou.
— As empresas do meu pai estão muito bem nas mãos dos meus irmãos, não precisam de mim — completei.
— Bem, soube que já fez sua parte se casando com o jovem Bruce.
— Aonde exatamente quer chegar com todas essas informações sobre mim reunidas? — A observei atentamente.
— Tenho uma proposta de sociedade, só estava curiosa para saber se poderia acreditar que realmente é uma mulher de fibra, que vai ao trabalho, ou somente uma menina mimada que se esconde atrás do dinheiro dos pais. — Mais do que sincera em suas palavras — Ou, no caso, do marido.
— Se eu quisesse mesmo me esconder atrás do dinheiro da minha família, não teria organizado um bazar beneficente a favor do orfanato de Gotham — retruquei. — Não aceitei nem mesmo uma simples doação do meu marido.
— Foi um ato genuíno e de classe, o que me deixou encantada com seu caráter.
— Bem, o que seria esta sociedade que me propõe? — Fui ao ponto.
— Sou agora uma mãe divorciada, que precisa superar as barreiras sociais e criar o filho. Você é uma recém-casada, que precisa provar para Gotham que não vive à sombra de Bruce Wayne… — Seu tom ficou meio melodramático. — Mas, juntas, podemos construir um grande império também.
— Que império? — perguntei.
— Soube por boas fontes que sempre gostou de moda e até cursou em uma das melhores escolas de Paris. — Ela parecia saber mesmo sobre mim. — Não deveria deixar seu talento guardado.
— E nossa sociedade teria como foco a moda?
— Não somente a moda, mas a arte. Não sei se sabe, mas eu já fui dona de uma galeria de arte, Gotham City's Art District. Claro que muitas coisas aconteceram depois e acabou não dando certo, mas sou uma excelente mulher de negócios. Com minhas habilidades, seu talento e nossa influência — seu argumento parecia plausível —, poderíamos ter uma grife de sucesso, ditar a moda em Gotham e, quem sabe, no país.
— Você me parece ter muitas expectativas sobre isso — comentei.
— São minhas expectativas que me motivam — disse, em reconhecimento. — O que me diz?
— Bem, devemos então tirar essa expectativa da imaginação e a transformar em palavras, um plano de negócios, mais precisamente. Aí, sim, podemos chegar a um nível em que poderá se concretizar — concordei, ainda que indiretamente.
— Eu sabia que iria concordar. — Ela abriu um largo sorriso.
Não era exatamente uma má ideia.
Era a junção do útil ao agradável. Eu precisava de uma ocupação saudável e poderia voltar à minha paixão que era os croquis de moda, além de tudo, ainda ajudaria uma mulher a se reerguer financeiramente após o divórcio. Seria uma boa sociedade, e eu já estava com mais expectativas fervilhando em minha mente. Do rápido almoço, seguimos até o escritório de um amigo do meu pai, eles nos ajudaria e entender melhor nossa ideia e a planejar com clareza e segurança. Foi uma tarde produtiva, que me levou a chegar em casa pouco antes do jantar.
— Boa noite, Alfred — disse, ao entrar na mansão.
— Ah, patroa . — Ele veio me recepcionar. — Que bom que retornou em segurança.
— Sim, minha tarde foi um pouco movimentada — comentei. — Mas o que houve? Que olhar preocupado é esse?
— Acabaram de falar no noticiário que ocorreu um ataque a um dos laboratórios das Indústrias Wayne — explicou ele. — Exatamente no momento em que o patrão Bruce estava fazendo sua visita.
— Ele está bem? — perguntei, já me dirigindo à biblioteca.
— Sim, senhora . — Alfred veio me seguindo. — Ele ligou para saber se estava tudo bem com a senhora.
Eu me aproximei da estante e retirei o livro que abria a porta, então esperei até que abrisse. Por mais que tivesse prometido não invadir aquela parte do mundo sombrio do Bruce, eu precisava ver com meus próprios olhos.
— Bruce — o chamei, descendo as escadas para a caverna.
— ? — Ele já estava vestido com seu traje, próximo ao computador, com uma pasta nas mãos. — O que faz aqui?
— Eu precisava… — Me aproximei dele.
Aquela era a minha segunda vez naquele lugar, não havia observado anteriormente a grande tela que mostrava as imagens fixas enviadas do computador. Olhei de relance para as duas prateleiras de ferro com suas armas, até que meu olhar encontrou o dele.
— Precisava? — indagou ele.
— Precisava te ver — completei. — Por mais que Alfred tenha dito que estava bem, eu precisava te ver.
Não deixava de ser verdade.
Ele sorriu de canto e me beijou de leve, era estranho por ele estar com sua roupa de homem morcego.
— Não vai hoje — pedi, insegura no que poderia acontecer. — Por favor.
— Preciso saber quem foi que provocou a explosão. — Ele segurou em minha mão com carinho. — O comissário Gordon vai me ajudar na investigação.
— Só desta vez, não pode mesmo deixar com os policiais?
— Hoje foi comigo, amanhã podem tentar algo contra você. — Esse era seu único argumento.
Então me lembrei da mensagem em meu celular, pensando se deveria ou não contar a ele, talvez pudesse ter alguma ligação.
“Você não vai dizer.” — Ouvi a voz de Selina em minha mente. — “Esse é o nosso segredo.”
— Agora você aparece — sussurrei.
— O que disse? — perguntou ele.
— Nada, apenas tome cuidado.
Se aquela mensagem era problema da Selina, ela que resolveria então.
A quinta se passou sem grandes notícias. Finalmente, sexta à noite, meu marido teve que parar sua incansável investigação para estar ao meu lado no comentado coquetel beneficente oferecido por Thomas Elliot, que parecia aguardar ansiosamente nossa chegada, na porta de entrada de sua casa, na parte nobre de Gotham.
— Tommy. — Eu o abracei no impulso, pois o considerava um amigo de infância. — Que bom vê-lo novamente.
— Digo o mesmo, , ou melhor, senhora Wayne. — Eu percebi um olhar cruzado dele para Bruce ao meu lado.
Ambos não se davam bem, mas não sabia que era para tanto.
— Sim — confirmei, ao segurar na mão de Bruce.
— Que surpresa seu retorno a Gotham, Dr. Elliot, o prodígio de Harvard. — Uma ponta de sarcasmo soou.
— Bem, agradeço o elogio, Bruce. Não é sempre que alguém se torna um cirurgião renomado antes dos 30 — brincou ele. — Mas deveria ter feito como você, assim, agora estaria casado com uma bela e fascinante mulher.
Eu senti uma certa fúria crescer ao meu lado, então apertei minha mão na dele.
— Tenho certeza de que você ainda tem tempo para encontrar o amor da sua vida — intervim, quebrando a tensão. — Afinal, como disse, ainda nem chegou aos 30.
Nós dois rimos, porém Bruce continuou sério, mantendo seu olhar nele.
— Sejam bem-vindos e aproveitem a noite. — O olhar sarcástico dele estava tão afiado quanto o tom de sua voz.
Talvez seus comentários tivessem mesmo o propósito de atacar Bruce indiretamente, e se fosse mesmo isso, havia conseguido sem muito esforço.
— Você não consegue disfarçar? — perguntei, assim que nos afastamos e entramos mais na casa, para chegar ao jardim.
— Eu não gosto dele, Gotham inteira sabe disso. Estou aqui porque sei atuar. — Um leve tom irônico fluiu em suas palavras.
Respirei fundo, não me deixando levar por seu ciúme bobo.
— Que tal irmos cumprimentar o prefeito Cobblepot? — sugeri, quase o puxando comigo.
Ele assentiu, ainda relutante.
Não estava com a intenção de passar a noite ao lado do ciúme em pessoa, então, assim que o comissário Gordon se aproximou, saí estrategicamente, o deixando com os cavalheiros. Para minha surpresa, encontrei Barbara no coquetel, que, após uma trégua, aceitou o convite de ir acompanhando seu futuro ex-marido.
— Veio socializar? — brincou ela.
— Como disse, não quero estar à sombra de Bruce — respondi. — Há várias mulheres interessantes aqui que podemos conhecer e analisar. Não quero ficar seleta a um público alvo só, mas se temos que começar de algum lugar, que sejam as socialites de Gotham.
— Muito bem pensado.
Talvez uma noite que pudesse ser tediosa com o mau humor de Bruce começou a se reverter ao meu favor. Um coquetel razoável, contendo as pessoas mais influentes e ricas de Gotham, é claro que alguma coisa poderia acontecer.
— Que mulher pensativa — comentou Thomas, ao se aproximar de mim.
— Só estou me lembrando de alguns momentos da infância — expliquei, mantendo meu olhar no quadro que estava na parede central da sala. — Me lembro da primeira vez que vim aqui, antes de mudar para Metrópolis.
— Eu e Bruce não fomos cavalheiros com você — reconheceu ele.
— Não, não foram — concordei. — Tenho poucas lembranças com vocês. Me lembro de ter ido ao enterro dos pais do Bruce também.
— Sim…, mas acho que se tivesse continuado em Gotham, teríamos sido muito amigos.
— Mas eu te considero um velho amigo de infância, apesar de ter jogado… O que era mesmo aquela gosma que jogou no meu cabelo?
— Nem me lembro mais.
Nós começamos a rir.
— Mas quem diria que cresceríamos e você se casaria com o Bruce, o maior playboy da cidade. — Conseguia sentir seu olhar em mim.
— Não posso negar que nosso casamento inicialmente foi de um acordo entre famílias, mas agora… — Minha voz continuava suave, e flashes começaram a vir à minha mente.
— Agora está apaixonada pelo Wayne.
— A vida tem suas surpresas. — Voltei meu olhar para ele e sorri.
— É uma pena que nem sempre são boas. — Ele tocou de leve em minha face.
E antes que eu pudesse reagir ou me afastar, Thomas me beijou. Eu ergui minha mão para afastá-lo, porém Bruce o puxou e socou sua cara antes, o derrubando no chão.
— Bruce. — Eu o segurei no impulso.
— Então é assim? — Ele me olhou como se estivesse decepcionado.
Eu estava indignada demais com seu olhar para mim para retrucar e iniciar qualquer discussão. Saí correndo da casa de Thomas sem direção. Entrei e saí de ruas que não conhecia e nem imaginava que existiam em Gotham, até que virei em um beco qualquer e senti estar sendo seguida por alguém.
Meu coração acelerou no desespero.
— Ora ora… se não é a senhora Wayne — disse um homem, saindo da sombra e aparecendo em minha frente.
— Me desculpe, mas está me confundindo com alguém — disse, tentando me esquivar dele, sem sucesso. — Por favor, me deixe passar.
— Que isso, só queremos nos divertir um pouco. — Outro homem apareceu atrás de mim e tocou em meu cabelo. — Você não quer se divertir com a gente?
— Não — sussurrei, já quase entrando em pânico.
“Selina, por favor…” — Pensei, pedindo socorro.
Eu nem precisei continuar a frase. Senti meu corpo reagir de forma involuntária àquele homem e dei uma cabeçada nele, seguida de um chute. O homem da frente se moveu para me agarrar e me abaixando, usei sua altura ao meu favor, o fazendo tropeçar no seu companheiro. Olhei para o chão e propositalmente uma garrafa de vidro estava ao lado do latão de lixo, como se me esperasse. Sem pensar em mais nada, peguei e quebrei na cabeça de um deles, que caiu desmaiado, enquanto o outro saiu correndo.
Um som de aplausos surgiu no lado escuro. Eu não me importava mais com quem pudesse ser. Meu corpo se moveu contra a pessoa, trocamos alguns movimentos loucos de luta, até que ergui minha perna direita e encaixei perfeitamente meu sapato em sua garganta, a prendendo contra a parede.
— Ok, você ganhou — disse a voz, que era feminina. — Selina… Você ganhou, me solte.
Meu corpo estremeceu de leve.
---
Selina Kyle
— Selina?! Por favor, está me enforcando — suplicou a mulher.
Mantive-me como estava e arrastei seu corpo pela parede até chegar a um feixe de luz.
— Ivy? — A reconheci e logo me afastei, a soltando. — O que faz aqui?
— Nossa. — Ela tossiu um pouco, recuperando a estabilidade. — Você ainda está em forma.
— Do que está falando? — Me mantive na parte escura, não queria que ninguém me visse.
— Pode fingir para todos, mas não para a sua melhor amiga — retrucou ela —, Senhora Wayne.
— Repete isso e será enforcada por suas plantas — a ameacei.
— Nossa, não precisa exagerar. — Ela riu e retirou uma máscara do bolso. — Coloque.
Respirei fundo e peguei a máscara, colocando em seguida.
— O que faz aqui? — perguntei.
— Não vai agradecer? — perguntou ela.
— Você já me deve muitos favores, considere menos um na conta. Agora responda. — Fui direta e um pouco ríspida.
— Nossa, está mais amarga que nunca — brincou, soltando uma gargalhada boba, enquanto caminhava na frente. — Eu estava negociando com um cliente que queria dar férias ao pai, quando vi você passar correndo. Sabia que tinha algo errado quando virou neste beco sem saída, afinal, você conhece as ruas de Gotham melhor que a polícia.
— Isso é verdade. — Tive que concordar.
Conhecia a cidade melhor até que o morcego.
— Então fiquei no canto, esperando até que reagisse e batesse neles homens fedorentos — continuou. — Você demorou, hein, amiga?
— Estava dormindo — expliquei.
— Então é real, você e ela são pessoas diferentes. — O olhar de espanto estava estampado nela. — Que loucura.
— Uma loucura que você vai guardar a sete chaves e não perderá nenhuma.
— Claro que não, eu prezo nossa amizade. Se estou livre daquela prisão, é graças a você, e jamais a trairia.
— Bom saber. — Cruzei meus braços, avaliando seu olhar.
Eu sabia quando Ivy mentia para mim.
— Ah, uma novidade, agora todos me conhecem como Hera Venenosa — comentou ela, com ar de conquista.
— Para mim, continuará sendo a mesma Ivy boba e fascinada de sempre. — Eu ri da careta que ela fez. — E, por falar nisso, cuidado com o patrulheiro da noite.
Disse, me referindo ao Batman.
— Não estamos muito bem ultimamente. Se ele te pegar, não poderei ajudar — avisei a ela.
— Pode deixar, meus negócios são discretos e sem rastros — garantiu.
— Assim espero. — Me encostei na parede e olhei para o início do beco. — Por que mandou aquela mensagem? Eu deveria saber que aquele H era coisa sua.
— H? De que mensagem está falando? — Ela riu.
— Não tem graça, eu sei que foi você. pensou que pudesse ter ligação com a explosão do laboratório das Indústrias Wayne.
Ela deu um salto e subiu na escada do prédio, se sentando nela.
— Como eu disse, não tive nada a ver com isso — repetiu, pela milésima vez.
— Eu sei.
— Mas andei ouvindo algumas coisas sinistras no beco do crime — comentou. — Envolvendo seu amigo Hush.
— O que o Hush está fazendo? — perguntei.
— Ele quer a todo custo descobrir quem é o Batman. Ele sabe que você viu o rosto do morcego.
— Parece que Gotham inteira sabe disso.
— A culpa é do Dimitri, que saiu espalhando para todos. Quando me lembro do que aconteceu com ele, fico até feliz.
— Que mulher vingativa.
— Ele colocou a minha cabeça a prêmio, não se lembra? — A olhei séria.
— Bem, Hush não vai descansar até descobrir. — Ela tinha razão. — Então tome cuidado.
— Eu sei e, por isso, preciso de outra roupa — pedi —, pois essa é da e será vista por todos nos jornais de amanhã.
— Vai deixá-la jogada nesse beco?
— Talvez, seria um ótimo susto para seu marido. — Eu ri.
— Se não for muito desconforto, tire o vestido e venha comigo, tenho um lugar aqui perto em que vai gostar de passar a noite — disse ela.
Assenti sem o menor pudor e a segui pelos dutos do esgoto, fazia tempos que não passava por caminhos tão “tortuosos” assim. Chegamos a uma velha loja de ferramentas que, pelo que me lembrava, tinha pegado fogo ano passado, e ninguém requereu o imóvel. Entramos no espaço cheio de teia de aranha, caindo aos pedaços e cheirando a mofo combinado a cinzas. Ivy me guiou até uma porta que dava para um porão subterrâneo, no qual se encontrava seu esconderijo.
— Nossa — disse, após terminar de descer as escadas e me surpreender com o lugar luxuoso e limpo que encontrei. — Por essa, eu não esperava.
— Achou o quê? — Ela riu de mim. — Que eu vivia mesmo no esgoto?
— Não exatamente — ri junto. — Preciso de um banho.
— Segunda porta à direita — direcionou.
Seu banheiro também era bastante confortável, me lembrava o da mansão. Fiquei alguns minutos em sua clássica banheira vitoriana, aproveitando da água quente até meu corpo relaxar. Quando saí, enrolada no roupão de banho, reconheci peças de roupas minhas em cima do sofá.
— Onde achou isso? — perguntei.
— Esqueceu que deixou algumas roupas suas comigo antes da sua viagem de férias?
— Verdade.
Tinha me esquecido de muitos detalhes de antes do casamento.
— Selina. — Ela me olhou séria.
— O quê?
— O que eu te disse foi sério, não fui eu quem mandou aquela mensagem. — Seu olhar estava fixo em mim e sincero.
— Se não foi você… Quem é o outro H?
Somente um nome vinha à minha mente…
Hush.
"Enquanto a noite me cega
Você entra novamente sem ser notada."
— Obsession / EXO
Me espreguicei de leve e me levantei.
— Bom dia, senhora Wayne — disse a mulher tranquilamente.
— Bom dia — sussurrei, dando alguns passos para me aproximar. — Onde estou?
— Em minha casa. — A mulher virou seu rosto para mim, com um sorriso singelo. — Bem-vinda.
— Você sabe quem eu sou? — Seu olhar gentil me deixou confusa.
— Não se preocupe, , a Selina me contou tudo, e seu segredo está guardado comigo. — Ela sorriu com graciosidade — Jamais trairia minhas melhores amigas.
Então, eu era sua amiga? Cocei a cabeça de leve, tentando me adaptar àquela realidade em que eu estava no universo da Selina, conhecendo sua amiga.
— Além de sua casa, que lugar exatamente seria esse? — perguntei, olhando em minha volta. — Aqui parece um…
— Porão — completou ela.
— Sim, um porão — confirmei.
— Estamos no porão de uma loja que explodiu recentemente. — Ela parou de podar as plantas e virou todo o seu corpo em minha direção. — A Selina disse que estava procurando um lugar para alugar ou comprar, este imóvel está às moscas, e eu preciso continuar aqui.
— Selina quer que eu compre este imóvel — concluí o óbvio.
— Sim, seria um bom negócio para você e ajudaria uma amiga a não perder seu lar. — Ela sabia argumentar.
— Vou pensar na sugestão. — Olhei para tentar achar minha carteira.
— Nem adianta, Selina deixou tudo seu jogado no beco em que te salvou — explicou ela.
— E como vou voltar para casa? — Cruzei os braços.
— Ela te aconselhou a ficar aqui por mais alguns dias, assim seu marido ficará louco. — Ela riu, me lembrava a risada da Selina.
— Não posso, preciso chegar em casa — retruquei.
— Tudo bem então, eu te ajudo a chegar em casa.
Ivy, como queria ser chamada, me deu uma toalha para que tomasse um banho quente e me deu um pouco de chá para me esquentar, tinha que admitir que o dia estava frio. Antes que eu chegasse à escada para a parte da loja, senti uma leve tonteira e alguns calafrios, não conseguia entender o que estava acontecendo comigo, até que minhas pernas bambearam e perdi a consciência.
Onde eu estou agora?
Me perguntei, ao despertar, sentindo uma dor maluca em minha cabeça. Estava desconfortável, mas quente. Movi minhas pálpebras, as abrindo lentamente e finalmente me vi dentro do carro do Batman. Que estranho eu estar ali.
— O que está acontecendo? O que você fez, Selina? — sussurrei, ao abrir a porta e sair.
O carro estava na caverna da mansão, o que significava que eu estava em casa teoricamente.
Mas como tinha chegado lá se estava na casa da Ivy?
— O chá — constatei.
Claro que tinha algo naquele chá de camomila com gosto estranho. Ouvi algumas vozes vindo em minha direção, era Bruce e Alfred descendo as escadas.
— . — Bruce estava com uma voz rouca e pouco trêmula, seu olhar preocupado.
— Oi, Bruce — disse, em sussurro.
Eu não sabia como reagir, mas ele veio de encontro a mim e me abraçou forte.
— Estava preocupado com você — disse ele de imediato. — A polícia encontrou suas coisas no beco do crime, eu não te achei naquela noite, nem a Selina.
— Eu estou bem, não se preocupe. — Mantive meu tom baixo, me afastando dele.
Ele me olhou confuso por minha reação fria com ele.
— Nós estamos bem? — perguntou.
— Sim. — Me afastei mais. — Eu só preciso descansar.
— Onde estava? — indagou ele.
— O quê? — O olhei.
— Perguntei onde estava.
— Não é o bastante saber que sua esposa está bem? — Me alterei de leve.
— Minha esposa ficou desaparecida por dois dias — retrucou ele — e agora volta agindo de forma estranha.
— Forma estranha? — Coloquei a mão na cintura, indignada. — Disse que estou há dois dias desaparecida. Você realmente foi me procurar?
— Está duvidando?
— Não sei — o confrontei.
— O que a Selina fez com você?
— A culpa não é da Selina — a defendi. — Ao contrário de você, ela… A Selina fez o que você não teve coragem de fazer.
— O quê?
— Me proteger. — Senti meus olhos lacrimejarem. — Ao invés de me proteger, você só me acusou. Não pense que eu esqueci suas palavras na noite do coquetel. Por sua culpa, eu cheguei àquele beco, me perdi nas ruas da cidade…
— . — Ele tentou me interromper.
— Eu não quero te ouvir. Não agora, Bruce. Estou zangada com você e não quero mais brigar. — Me afastei mais. — Me deixe sozinha por enquanto.
Passei por Alfred, que permaneceu todo aquele tempo em silêncio, nos olhando discutir. Chegando ao quarto, tranquei a porta e sentindo meu corpo desfalecer até chegar ao chão, me entreguei ao choro que estava preso dentro de mim. Eu não queria dar razão a Selina quando acusava meu marido de ser egoísta, mas Bruce estava sempre agindo assim, sempre conforme seus interesses.
Passei o resto do dia trancada no quarto sem comer nada.
A semana se passou comigo concentrada no projeto da marca de roupas, em reuniões com o advogado e contador de confiança da minha família e uma pequena ajuda do senhor Fox, em sigilo, claro. Segui tentando ignorar a presença do meu marido durante aquele tempo e pedindo a Selina para se comportar. Na manhã de quinta-feira, acordei cedo e marquei um café da manhã com Barbara Kean, precisava contar a ela sobre a localização da nossa empresa.
— Quando me convidou para o café na mansão Wayne, fiquei impressionada e ansiosa — disse ela, ao se sentar na cadeira. — Agora estou empolgada.
Tinha pedido a Alfred para improvisar uma mesa de café no jardim. Apesar do tempo estar frio e com leve neblina, um pouco de ar me faria bem.
— Eu que agradeço por aceitar. — Sorri de leve, me sentando também.
— Vamos ao café primeiro?
— Claro.
Começamos a saborear o nosso desjejum. Aos poucos, Barbara foi introduzindo alguns assuntos sobre mim e meu leve desaparecimento.
— Quando suas coisas foram encontradas naquele beco, deu muita fofoca sobre ter sido sequestrada — disse ela, ao levar a xícara à boca. — Pior, teve alguns jornais que disseram que tinha fugido com um amante.
— Nem um e nem outro — desmenti. — Confesso que quase fui assaltada na noite em que eu desapareci, mas estou bem aqui.
— Que bom.
— E tenho uma boa notícia — anunciei.
— Surpreenda-me.
— Encontrei um bom lugar para instalarmos nossa marca.
— Sério?
— Sim. — Assenti. — Existe uma loja abandonada em um ponto remoto de Gotham que poderíamos movimentar novamente. Tenho uma pessoa conhecida de uma amiga minha que tem tomado conta do lugar e poderá trabalhar conosco.
— Estou começando a gostar da ideia — disse ela. — Talvez em um lugar mais remoto chame a atenção das pessoas e desperte a curiosidade.
— Foi o que pensei, vai ser um bom negócio.
— Espero não termos problema para adquirir o tal imóvel — observou ela. — Ouvi dizer que aquela área é comandada por um chefão do crime.
— Não será problema. Uma boa oferta e até um homem da máfia se rende — disse firme. — Por acaso você sabe de quem é?
— Hum… Ouvi boatos que o chamam de Pinguim — respondeu ela. — Mas não sei exatamente quem é ele.
— Bem, tenho uma amiga que pode cuidar desse assunto para nós — assegurei. — E por falar em amiga, aquela ideia de somente mulheres trabalhando em nossa empresa, estou totalmente de acordo.
— Nosso negócio será um sucesso, não tenho dúvidas, e, além do mais, teremos o apoio do prefeito Cobblepot — completou Barbara.
— O que terá o apoio do prefeito? — perguntou Bruce, ao se aproximar de nós.
— Nossos projetos para o futuro — respondi para ele.
— Ah, sim. Me desculpem, senhoras, por interromper o café. — Ele me olhou com serenidade. — Posso ter a atenção de minha esposa?
— Bem, eu…
— Ah, eu já estava de saída. — Barbara se levantou. — Já terminamos o café e espero minha sócia amanhã para formalizarmos tudo. Não precisam se preocupar, sei o caminho da porta.
Ela se afastou de nós apressadamente. Bruce manteve seu olhar em mim e eu nele, enquanto me levantava da cadeira.
— Diga.
— Me desculpe. — Ele segurou em minha mão. — Tem sido complicado, mas não posso agir assim com você, como um bobo ciumento.
— O que tem sido complicado, Bruce? — Mantive minha face séria.
— Você, Selina, ambas distintas e ao mesmo tempo a mesma pessoa. Sei que também tenho o meu outro lado, mas é tão complicado unir tudo e deixar harmônico. — Ele entrelaçou nossos dedos.
— É complicado porque você sempre quer que as coisas saiam do seu jeito. Nem tudo será assim. — Suavizei minha voz.
— Eu tenho ciúmes de você — confessou ele. — Não somente com o Thomas, mas com qualquer homem que se aproxime dela, e, sim, tenho ciúmes da Selina, porque ela é uma parte de você, o que me faz amá-la também.
— Eu te amo, Bruce. — Sorri de leve.
O olhar sincero de Bruce conseguia derreter qualquer bloco de gelo que eu pudesse colocar entre nós dois. Eu sabia que aquelas palavras eram uma conquista serem ditas por ele com tanta clareza.
— E quando digo isso, falo por nós duas — confirmei.
“Fale apenas por você…” — Ouvi sua voz em minha mente, o que me fez segurar o riso.
Bruce me abraçou forte, me aninhando em seus braços.
— Obrigado, Selina, por protegê-la. Eu prometo protegê-las sempre a partir de agora — sussurrou ele em meu ouvido.
— Bruce. — Me afastei um pouco dele e o olhei, sorrindo. — Você realmente me procurou?
— Sim, de todas as formas possíveis — garantiu. — Não pode mesmo me dizer onde estava?
— Na casa de uma amiga da Selina.
— A Selina tem amiga?
— Também achei incrível quando descobri.
— Sei que tenho brigado muito com ela, mas saiba que confio nela — assegurou ele.
— Agradeço por isso. — Desta vez, seria eu a iniciar o beijo malicioso.
Sim, aquele era o nosso momento de reconciliação que perdurou todo o dia, tanto que fiz Bruce desmarcar uma reunião com o senhor Fox para aproveitar ainda mais nosso momento casal do ano. Estar nos braços do meu marido era reconfortante. Estava feliz por Bruce se abrir comigo sobre seus sentimentos e temores, ter confessado que confiava em Selina era o melhor de tudo.
— O que vai acontecer agora? — perguntei, enquanto estávamos aninhados no sofá da biblioteca.
— Não sei. — Ele continuou acariciando meus cabelos. — Só vamos ficar juntos esta noite.
— Só nós dois? — O olhei admirada.
— Sim, só nós dois. Sem Selina e sem Batman.
— Meu marido Bruce Wayne vai passar a noite em casa?
— Vai. — Ele sorriu e me deu um selinho. — Gotham pode ficar uma noite sem seu guarda noturno.
Abri um largo sorriso, que logo foi desfeito por um beijo apaixonado dele.
Talvez aquela noite seria um remake da nossa lua de mel, ou ainda mais intensa, mas estava feliz por estar nos braços do meu marido. A mansão Wayne seria pequena para nós dois.
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Selina Kyle
Não negarei meu contentamento pelo casal do ano. Se estava feliz, eu também estava. Pior, eu estava surtando pela declaração de Bruce para mim. O que ele achava? Que eu me apaixonaria por seu lado protetor de Gotham? Talvez…
Não iria dar meu braço a torcer, mas…
Me espreguicei de leve, enquanto caminhava pelo beiral do prédio, feliz por não ter ficado zangada comigo por tê-la deixado desaparecida por dois dias, mas Bruce precisava de um choque de realidade. Voltei meu olhar para trás e vi Hush encostado na parede, me olhando de braços cruzados.
— Me esperando? — perguntei, com um tom sério.
— Sabe, Selina, a cada minuto que penso em você, mais minha curiosidade aumenta — disse ele. — De onde ela veio, quem é a mulher por trás daquela máscara.
— Jamais saberá — disse.
— Você acha? — Ele se afastou da parede e veio até mim. — Acha mesmo que eu não sei quem você é?
— Se soubesse, já teria falado. — Cruzei os braços. — Somos amigos, Hush, mas amigos também possuem segredos.
— Eu sei, por isso não vou contar o seu. — Ele me olhou profundamente. — Mesmo sabendo que isso me ajudaria a chegar nele.
— Do que está falando? Em quem você acha que chegaria?
— Você sabe do que estou falando. — Ele segurou em minha mão. — Eu já a beijei uma vez, o que aconteceria se fizesse novamente?
— Você não fará. — Eu toquei em seu tórax, o mantendo longe. — Não vou deixar.
— Por que é tão leal a ele?
— Mais uma vez, não sei do que está falando.
— Terei que te mostrar então. — Ele segurou em meu braço com força e retirou sua máscara.
Thomas Elliot.
O amigo de infância de . Será que ele sabia que ela, eu, Bruce?
— Não se preocupe, eu sei guardar segredo — disse, sorrindo de canto.
— Claro que sabe. — Ele me puxou para perto dele.
Hush tentou forçar um beijo, mas claro que eu era bem mais esperta que e logo lancei minha perna em seu abdômen, girei meu corpo para soltar meu braço dele e o soquei.
— Jamais toque em mim sem minha permissão — disse, num tom forte.
— Acha mesmo que vai ficar assim? — Ele riu. — Eu sei quem você é, eu sei quem ele é.
— Você sabe? — Uma voz grossa surgiu de trás de mim. — Então prove, Thomas Elliot.
— Olha só, a reunião de família. — Hush riu novamente. — Assim poderei eliminar ambos de uma vez só.
Antes que eu pudesse fazer algo, Batman passou por mim e socou ele novamente.
— Acho que você precisa de umas férias em Arkham — disse Batman.
— Eu… — tentei me pronunciar, mas não sabia o que dizer.
— Não se preocupe, ele é o único que sabe. — Batman sorriu de canto. — Me espere aqui.
Ele segurou forte Hush e, pegando sua máscara do chão, o levou para dentro do prédio. Hush estava sendo procurado pela polícia por algumas contravenções, e agora Batman teria o prazer de entregá-lo ao comissário Gordon. Eu me mantive ali onde estava até que o bom marido de retornasse para me buscar. Aquela era a primeira noite em meses que isso acontecia.
— Está tudo bem? — perguntou ele, ao retornar.
— E como ficará o Hush?
— Onde ele deve ficar.
Eu poderia até retornar para casa naquele momento, mas estava tão feliz pela calmaria entre nós que queria aproveitar a noite para realizar algumas travessuras que não machucariam ninguém. Quando voltei para a mansão Wayne pouco antes de amanhecer, curiosamente Bruce estava no quarto me esperando, ele sabia que não era e sim eu ali.
— Não é normal você estar de volta antes de mim — brinquei, ao fechar a porta do quarto.
— Vim em missão de paz, Selina. — Ele riu.
— É estranho te ver assim, sem o traje — comentei, o olhando de cima a baixo.
Ele sorriu de canto.
— Eu amo a , e você faz parte dela — continuou ele.
— Eu já ouvi, fico feliz pelos dois.
— Tem certeza? — Ele se manteve de braços cruzados. — O que aconteceu com o Thomas…
— Eu juro que não sabia que ele era o Hush. — Não queria que ele começasse suas cenas de ciúmes.
— Desde quando se conhecem? — indagou.
— Já tem muito tempo. Sabe que conheço quase toda a escória de Gotham. — Eu ri como se fosse algo grandioso. — E todos sabem quem é Selina Kyle.
— Sim, todos sabem. — Ele mordeu seu lábio inferior, como se estivesse pensando em algo.
— O que foi?
— Desde que prendi o Joker em Arkham, todos os dias se levanta alguém tentando ser o rei do crime — comentou ele. — E quanto mais combato eles, mais aumenta a porcentagem de caras maus nas ruas.
— Batman está ficando velho? — brinquei.
— Talvez. — Ele riu junto. — Mas… tenho pensado em uma coisa.
— O quê?
— O crime jamais vai ter fim, isso é uma realidade, mas talvez se eu tiver alguém para controlar. — Seu olhar intenso para mim dizia tudo.
— Você quer que eu me torne a rainha do crime? — perguntei, entendendo suas intenções.
— Todos a conhecem, muitos a temem, e você é a única que sabe o segredo do Batman — explicou. — É perfeito.
— E ?
— Com certeza ela vai aprovar. — Ele voltou a ficar sério. — O que acha? Podemos ter esse acordo?
— Eu, controlando o crime em Gotham. — Sorri de canto. — Nunca me passou pela cabeça… Mas não acha que vão suspeitar?
— Se acontecer, resolvemos.
Uns segundos pensando na oferta.
— Tudo bem então — aceitei.
— Temos uma aliança? — Ele estendeu a mão. — Pelo bem de Gotham.
— Temos. — Eu me aproximei dele, apertei sua mão e sussurrei. — Pelo bem da nossa família.
Ao respirar fundo, assim que senti o cheiro do seu perfume, meu estômago embrulhou todo e corri para o banheiro. Vomitei assim que abri a tampa do vaso sanitário. Mais uma vez, aquela náusea retornou. Já tinha algumas noites que eu me sentia assim, enjoada, sempre que voltava para casa e sentia o perfume de Bruce quando passava por suas roupas no closet. Além de muitas mudanças estranhas que aconteciam com o corpo dela.
Levantei-me ao terminar e lavei a minha boca. Me olhei no espelho por um momento e constatei.
— Não acredito, , você está grávida — disse, em voz alta.
— O quê?! — O reflexo de Bruce apareceu no espelho, com um olhar assustado e surpreso.
E todas as palavras
Você mostrou que acredita em mim
Mesmo se todos mudarem e me deixarem
Você é minha lady
Tudo que eu preciso é para você segurar minha mão.
— Call Me Baby / EXO
— Felicitações pelo bebê — disse a diretora Margareth, ao me cumprimentar. — Já sabem o sexo?
— Ainda não — respondi, aceitando seu cumprimento. — Ainda estamos no início da gravidez.
— Mais um Wayne vindo ao mundo — disse o prefeito, ao se aproximar de mim. — Gotham está feliz com isso.
— Será?! — retrucou Bruce, ao segurar minha mão. — Metade das pessoas dessa cidade não gosta da minha família e a outra metade não se importa.
— Não diga isso — o prefeito interveio. — Gotham deve muito à família Wayne, principalmente por ajudar na economia da cidade.
— Nisso, tem razão, prefeito — concordou Margareth.
A comemoração foi bonita, mas eu estava me sentindo tão cansada que não consegui aproveitar muito. Bruce me levou para casa pouco depois que o almoço foi servido. Me deitei na cama e fiquei olhando para a janela, o tempo tinha se fechado e começou a chover. Me distraí vendo os pingos da chuva escorrendo pelo vidro, até que Bruce entrou no quarto.
— Está silenciosa — disse ele, ao encostar na parede ao lado da porta. — Desde o almoço.
— Estou preocupada — admiti.
— Com o quê?
— Minha gravidez — respondi. — Bruce.
— A Selina te preocupa?
— Sim, talvez. — Respirei fundo. — Agora que ela será a rainha do crime, não sei o que pode acontecer. Podem descobrir que somos a mesma pessoa, minha barriga vai crescer uma hora.
— Vamos pensar no que fazer depois. — Ele se afastou da parede e caminhou até a cama. — Por agora, vamos somente viver o hoje.
— Seu olhar me transmite segurança, sabia? — Sorri de leve para ele.
— Eu sei. — Ele se deitou ao meu lado e me aninhou em seus braços. — Seremos uma família feliz, apesar de não sermos uma família normal.
Nós rimos.
— Não somos mesmo uma família normal — concordei, encostando minha cabeça em seu tórax. — Se lembra do nosso casamento?
— Sim. — Ele começou acariciar meus cabelos. — Fiquei surpreso quando descobri que minha noiva era a garota que eu colei chiclete no cabelo.
— Seu malvado. — Eu ri. — Poderíamos ter sido amigos de infância.
— Talvez.
— Depois que você e o Thomas fizeram aquilo comigo, me mudei para Metrópoles — continuei. — Então eu soube da morte dos seus pais…
— Não foi uma época muito boa da minha vida — comentou ele. — Quando meus pais morreram, senti meu mundo desabar. Não sabia o que fazer, nem como eu ficaria. Me escondi atrás da minha dor por muitos anos e tentei seguir em frente apenas com a vontade de fazer justiça.
— Sinto muito por não terem encontrado o assassino dos seus pais — disse, em consolo a ele. — Quando minha mãe faleceu, também me senti sozinha, mas ainda tinha meu pai.
— Durante muito tempo, Alfred foi a minha única família. — Ele se remexeu e ficou de frente para mim. — Agora tenho você e nosso bebê. Será que sou merecedor disso?
— Claro que é. — Eu o beijei. — E será um excelente pai, Bruce Wayne.
— Como pode ter certeza disso?
— Você é um excelente marido. — Eu sorri. — Mesmo chegando de madrugada.
Nós rimos.
— Me desculpe por isso.
— Não se desculpe, Bruce. Eu já entendi que Gotham precisa de você tanto quanto precisa da Selina — assegurei. — Ficaremos bem.
Ele me beijou com suavidade, enquanto me aninhava em seus braços.
Alguns dias se passaram e finalmente a inauguração da minha marca de roupas e acessórios estava sendo lançada. Em um coquetel muito bem divulgado pelas mídias da cidade, muitas pessoas foram nos prestigiar, até mesmo o comissário Gordon apareceu para desejar sorte em nosso negócio. Barbara era claramente a pessoa mais feliz e empolgada da noite.
— Estou orgulhoso de minha esposa — disse Bruce, ao me abraçar por trás, colocando as mãos na minha barriga. — Muito mesmo.
— Sel não é a única mulher de negócios aqui — brinquei, falando num tom baixo.
— Sim — concordou ele.
— A partir de hoje, será um novo ciclo em nossas vidas. — Me virei para ele. — Não é?
— Sim, hoje ela vai sentar no trono.
— Estou tão empolgada por mim e por ela — confessei. — E você? Como está?
— Além da preocupação de sempre?
Eu ri dele.
— Consigo me manter focado — garantiu ele. — Sempre protegendo nossa família.
— Sim. — Dei um selinho nele. — Eu te amo, Bruce Wayne.
— Eu também te amo, Wayne — declarou ele.
Confesso que foram poucas as vezes que consegui tirar essas palavras dos lábios dele e sempre me sentia eufórica por dentro quando ele falava. Eu estava feliz, e minha vida razoavelmente completa.
Agora nossa nova meta era somente esperar por nosso bebê vir ao mundo.
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Selina Kyle
Suspirei um pouco ao me olhar no espelho.
Toquei de leve em minha barriga, ser mãe era uma experiência que não imaginava viver. Mas claro que isso aconteceria um dia, o casal do ano era sempre intenso em seus momentos de amor. Me espreguicei de leve e peguei o elástico em meu bolso e prendi o cabelo, aquela noite era um tanto decisiva para mostrar a todos que eu mandava na escória de Gotham agora.
Saí do quarto com minha máscara na mão e desci as escadas. Alfred estava na sala, organizando os jornais desta manhã.
— Senhorita Kyle — disse ele, me reconhecendo. — Deseja algo?
— Onde está o Bruce? — perguntei.
— Na caverna, senhorita — respondeu ele. — Acredito que esteja de saída. A senhora Wayne disse que hoje à noite seria preocupante para ambos.
— é um tanto medrosa, mas sabe que posso me cuidar.
— Senhorita, só peço que tome cuidado — disse ele, com serenidade. — Eu conheço o patrão Bruce desde quando nasceu, estive com ele em todos os momentos, difíceis e felizes e posso dizer com clareza que a chegada da patroa nesta casa foi a melhor coisa que lhe aconteceu.
— Por que está me dizendo isso?
— Porque, assim como o patrão Bruce, eu também me preocupo com vocês duas e ainda mais com este bebê aí dentro.
— Fique tranquilo, Alfred, nós estamos seguras — assegurei. — Temos um guardião da noite para nos proteger.
Apesar de não precisar, eu contava, sim, com a segurança que Bruce transmitia para sua esposa. Me afastei dele e segui para a biblioteca, então entrei pela passagem e desci as escadas para a caverna. Bruce já estava em seu traje, com sua atenção voltada para o computador.
— Boa noite, patrulheiro, — brinquei, ao me aproximar.
— Boa noite. — Ele desviou seu olhar para mim.
— Por que está com esta roupa? Por acaso não combinamos que você ficaria em casa hoje? — Cruzei os braços.
— Precaução.
— Não confia em mim?
— Não confio em Gotham. — Ele estava sério.
— Eu sei me cuidar, Bruce.
— Me chame de Batman — corrigiu ele.
— Ah, sim, com esta roupa você não é mais o marido do ano. — Ri ironicamente. — Eles não vão descobrir quem eu sou, menos ainda que estou grávida. Fique tranquilo, minha amiga irá me ajudar e será minha porta voz após esta noite.
— Fala da Ivy?
— Ela mesma. Pode confiar que ela jamais vai nos trair, ela me deve a vida — assegurei. — Eu só preciso me estabelecer e mostrar quem manda agora.
— Eu vou com você. — Ele se aproximou de mim.
— Não precisa.
— Já disse que vou.
— Já disse que não precisa. — Eu toquei em seu tórax. — já disse que você fica sexy nessa roupa?
— Pare de desviar a conversa. — Seu olhar continuava sério.
— Não estou desviando. — Eu ri. — Ela realmente fez um bom casamento… Eu me lembro da primeira vez que você me trouxe para cá, foi uma noite maravilhosa.
— Selina.
— Não vou mais demorar, preciso iniciar meu império em Gotham. — Me afastei dele. — Ah… E como anda seu amigo da criptonita?
— Por que quer saber dele?
— Ouvi boatos de que roubaram o cofre em que as pedras que peguei para ele estavam — respondi. — Se quiser minha ajuda novamente, é só chamar.
— Não se preocupe, já estamos cuidando disso, mas se conseguir alguma informação… — Ele cruzou os braços. — Será bem-vinda.
— Você não dá mesmo o braço a torcer, Batman. — Mordi meu lábio inferior. — Mas tudo bem. Se eu souber de mais alguma coisa relacionada ao Superman, te aviso. Como já disse, conheço muita gente interessante.
— Eu me lembro disso.
Sorri de canto e me retirei da caverna em sua moto, eu amava aquela moto.
Me fazia sentir ainda mais livre, como a noite de Gotham, que parecia mais densa naquele dia. Parti para minha reunião de posse. Com a ajuda de Ivy, todos foram reunidos em um galpão nas docas do porto. Era o lugar perfeito para as mais diversas negociações.
— Todos em silêncio — disse Ivy, assim que cheguei.
— Boa noite, damas e cavalheiros — disse, ao me sentar na cadeira reservada para mim. — Todos aqui sabem que não foram chamados à toa. Depois que Joker foi preso em Arkham e sua parceira Arlequina foi confiscada pelo governo americano, esta cidade vem se tornando a cada dia um caos.
— Esta cidade está assim graças a você — acusou o mafioso Conam. — Foi você quem entregou Dimitri para o morcego. Você é uma traidora.
Eu me levantei e subi em cima da mesa, caminhando até ele. Me agachei e, lançando minha perna direita, prendi o salto do meu sapato em seu pescoço.
— Diga isso novamente — ordenei.
— Não é mentira, Selina. — Pinguim se levantou da cadeira. — Todos aqui sabemos que tem ligação com o Batman, que sabe quem ele é.
— E todos vão se opor a mim? — Eu me afastei de Conam e permaneci de pé sobre a grande mesa. — Eis aqui minha proposta: eu serei a rainha do crime de Gotham. Se andarem na linha, não deixarei que ele atrapalhe os negócios de todos.
— E se não concordarmos?
— Então…
Eu nem tive a chance de terminar meus argumentos.
A pequena parte de vidro do telhado se quebrou e o homem de capa caiu em nosso meio. Ele ainda tinha um estilo que me deixava atraída. De certa forma, era meu marido. Segurei o riso e olhei para as caras assustadas de todos, principalmente de Don Falcone.
— Você o trouxe aqui — acusou novamente Conam.
— Não me contive em ficar… — disse Batman, ao parar na minha frente.
— Imaginei. — Me voltei para Conam. — Agora será assim: eu sou a nova rainha de Gotham, e aquele que se recusar a aceitar já sabe o destino.
Apontei para Batman, que permanecia em silêncio. Ele desceu da mesa e caminhou até o canto mais escuro do galpão, com todos um tanto temerosos do que poderia acontecer.
— A reunião está encerrada. Quando precisarem falar comigo... — apontei para minha amiga — Ivy estará à disposição para ajudar.
É claro que não seria fácil controlar a escória daquela cidade, mas faria esse esforço. Antes que todos se retirassem, pedi para que Pinguim me acompanhasse até o lado de fora pelos fundos.
— Posso te ajudar em algo? — perguntou ele. — Sabe que tenho muita influência.
— Sim, eu sei muito bem — disse. — E meu guardião ali também sabe quem você é o prefeito Cobblepot.
— E presumo que usará isto para me chantagear — disse ele.
— Não, você é nosso aliado. Continue sendo um bom prefeito que eu continuo assegurando que seus negócios ilegais não sejam descobertos. — Sorri de canto.
— Sabe que não tenho mais nenhum negócio ilegal. — Ele ficou sério.
— Eu sei, estava brincando. — Ri de leve. — Preciso da sua ajuda para manter algumas pessoas em Arkham, e sei que somente o prefeito pode assinar definitivamente a saída de um paciente de lá.
— Quer manter Joker encarcerado?!
— Sim — admiti.
— Está com medo dele voltar e tomar o trono? — perguntou.
— Não, mas não quero ter preocupações desnecessárias com ele e sua companheira.
— Arlequina já está de posse do governo, assim como o Pistoleiro. Ouvi dizer que ambos fazem parte de um esquadrão secreto, algo assim.
— Não me importo com o que eles fazem, contanto que não me atrapalhem. — Respirei fundo. — Entretanto, tenho uma boa amizade com o Pistoleiro e garanti a ele que sua filha seria muito bem protegida e cuidada antes mesmo dele ser recrutado pela Amanda Waller.
— Acho que já podemos encerrar esta conversa — disse ele, movendo seu olhar para trás de mim.
— Sim, podemos. — Assenti. — E uma amiga pediu para agradecer por ter vendido aquele imóvel para aquelas damas.
— Foi um bom negócio, não me custou nada. — Ele se retirou apressadamente.
Me voltei para sua direção e vi Batman agachado em cima de um container. Quando me impulsionei para ir até ele, Ivy se aproximou de mim com a informação que tinha lhe pedido. Dei algumas instruções para ela e voltei meu olhar para a direção dele, porém já tinha desaparecido. Odiava quando isso acontecia. Demorei um pouco para voltar para casa, precisava montar meu próprio esquadrão, e, como havia feito em seu negócio, somente mulheres trabalhavam para mim.
Chegando em casa pouco antes do amanhecer, Batman me esperava em sua caverna, encostado no carro e de braços cruzados, como se esperasse por uma resposta.
— Então — perguntou ele.
— Acho que tenho muitas informações para seu amigo Superman. — Sorri de canto, seguindo até ele. — E não são tão boas assim.
— Diga. — Ele se afastou do carro e veio até mim.
— Agora não. — Sorri de leve, me desviando dele. — Sua esposa está cansada e tenho uma bebê para alimentar.
Brinquei, rindo.
— Estou com fome e precisa de algumas horas de sono — expliquei melhor, continuando a seguir para a escada. — Mas prometo que amanhã à noite contarei tudo o que sei.
Ele sorriu de canto e assentiu.
Eu estava bem, pois sabia que Bruce ou Batman, não importava a nomenclatura, confiava em mim. E, pela primeira vez, eu admitia que também confiava…
Nele.
E talvez o amava.
Night, night, for a night, for a
Only if for a night.
— Goodnight Gotham / Rihanna
“Família: Não é o que nós temos na vida, mas quem nós temos em nossas vidas que importa.”