Revisada por Aurora Boreal 💫
Finalizada em: Janeiro/2025
releu a mensagem no chat de Nayoung, a líder do clube de intercâmbio cultural, e suspirou, deixando o celular de cabeça para baixo na cômoda.
Próxima reunião: sexta-feira, 18h.
A verdade era que não estava tudo igual.
Começou com um jogo de cartas regado a soju, pizza e frango, sugestão de Jeonghan ou de algum de seus agentes do caos para animar o último encontro do ano.
— Cada carta tem um comando diferente — ele explicou enquanto embaralhava os cartões e todos se organizavam em uma roda no chão. — Pode ser um desafio, contar uma verdade, qualquer coisa desse tipo.
— Qual é, pessoal — protestou Jinsol. — Isso não é meio quinta série demais?
— É fim de ano, um pouco de bobeira não faz mal a ninguém. É todo mundo adulto aqui, tá tudo certo — Seokmin rebateu. Foi ele mesmo quem puxou a primeira carta e deu início ao jogo.
Seguiu-se uma procissão de perguntas bobas, mensagens para ex-casinhos, com direito até a “pegarem emprestado” um troféu da equipe de futebol da universidade em uma das salas do andar de baixo.
acompanhava as besteiras propostas pelas cartas, o riso cada vez mais solto graças aos shots de soju que tomava para comemorar as missões cumpridas pelos colegas. A tensão subia conforme sua vez ficava cada vez mais próxima.
Quando chegou a rodada de Mingyu, alguns dos meninos puxaram uma rufada de tambores, gritando e batendo as mãos no chão.
— Vamos logo com isso. — Mingyu puxou a próxima carta do topo da pilha, lendo o comando em silêncio. — Ah, qual foi, vocês tão de brincadeira com a minha cara!
Ele virou a carta para o grupo e lá estava, em letras pretas no fundo branco do baralho: tente seduzir a pessoa à sua esquerda.
, que estava bem à sua esquerda na roda.
Os colegas vibraram.
— Isso vai ser bom demais — comentou Soonyoung, rindo.
Para eles, tinha todo o potencial para ser a rodada mais engraçada de todas. Não era segredo que e Mingyu andavam juntos para cima e para baixo. Tinham se conhecido logo nos primeiros semestres da faculdade, quando se juntaram ao clube. Afinal, a vida da garota tinha acabado de virar do avesso com a nova faculdade, um novo país, uma nova língua, um novo tudo, precisava começar a fazer amigos por algum lugar. E, por sorte, lá estava Mingyu. Quando se deu conta, já eram inseparáveis.
Mingyu encarou o teto e respirou fundo, antes de voltar os olhos para a amiga.
— Você vem sempre aqui? — perguntou, o que fez engasgar na sua dose de soju. A cantada, brega e inesperada, a fez ter uma crise de riso que o grupo inteiro acompanhou.
— Venho, venho — conseguiu dizer entre uma risada e outra. — Qual é, eu já te vi em festas! Sei que pode fazer melhor do que isso.
O desafio — prontamente apoiado pelo pessoal — fez Mingyu apertar a ponte do nariz. Ele sempre dizia que, um dia, os amigos iam matá-lo do coração.
— Ai, tá bom, tá bom! — Mingyu virou um dos copinhos de soju, suspirando.
O rapaz se ajeitou e encostou um dos joelhos no dela, tentando diminuir um pouco do espaço entre eles.
— Ei, — Mingyu tentou outra vez, com a voz mais baixa. Olhou diretamente para a garota antes de continuar. — Isso é um pouco estranho, né?
— Talvez? — comentou, tentando segurar uma risadinha.
Ele continuava a olhar para , trilhando um caminho até os lábios da garota. Mingyu sempre teve um olhar intenso assim?
Se era por nervoso ou timidez, ela não sabia dizer, mas precisou desviar os próprios olhos dos dele por um momento para se recompor.
Mingyu pousou uma das mãos em sua coxa, chamando sua atenção novamente.
— Até que você ri de um jeito bem fofinho, sabia? — Como é que é? prendeu a respiração por um segundo.
— A minha... minha risada? — repetiu, só para confirmar se tinha escutado aquilo mesmo.
Ele já tinha elogiado as roupas dela algumas vezes, claro, mas tudo daquele jeito meio bobo que amigos fazem. Aquilo era novo. Parecia sincero demais.
— É — ele respondeu. — Para combinar com uma pessoa fofa e irritante que nem você.
não conseguiu nem se preparar: Mingyu deu um beijo na bochecha dela, provocando outra onda de risadas do clube. segurou o próprio rosto, que agora parecia queimar. Mal conseguiu se concentrar na sua própria tarefa, porque seu coração levou alguns bons minutos para voltar a um ritmo normal.
Ela tentou dizer a si mesma que era só o efeito do álcool. Afinal, era só um beijo na bochecha — uma porcaria de um beijo na bochecha — numa brincadeira idiota de festa de fim de ano.
Os olhares, a proximidade, o jeito que sua própria respiração perdeu o ritmo... Foram dias revisitando a mesma cena em sua mente.
Quis gritar contra o próprio travesseiro.
É claro que ela tinha reparado que Mingyu chamava a atenção — gentil e bonito daquele jeito, Mingyu era o sonho de qualquer garota naquele campus. Mas quando tinha passado a vê-lo como mais do que um amigo?
Talvez desde o início? Ou teria sido em algumas das milhões de vezes em que ele a acompanhou até o dormitório depois que algum encontro do clube se estendeu? Em alguma das vezes que foram ao cinema depois da aula? Quando seu coração se aqueceu porque ele insistiu em cozinhar para ela seu prato favorito, para diminuir as saudades de casa?
Honestamente, como ela não tinha percebido os próprios sentimentos antes?
Agora que tinha se dado conta, não conseguia mais agir como de costume. Não queria mentir para ele, mas, ao mesmo tempo, não queria que Mingyu soubesse que algo tinha mudado. Era uma receita certa para perder o melhor amigo que ela tinha.
Então, ela se escondeu o melhor que pôde atrás da tela do celular.
Durante o recesso de fim de ano — quando só se falavam por mensagens, cada um no seu canto — não parecia tão estranho que ela demorasse a responder ou enviasse algo curto e rápido para o amigo. Era só colocar a culpa na correria de fim de ano, que acontecia com todo mundo, e problema resolvido, certo?
Ao vivo, era outra história. Como agir naturalmente se a garota não sabia se conseguiria disfarçar o rosto vermelho ou as batidas descompassadas do próprio coração?
Pensou em faltar, porque não era como se fosse uma grande coisa, mas talvez ficasse suspeito demais. Mingyu com certeza ia notar e ir atrás dela. Também não dava para ignorar alguém, especialmente seu amigo mais próximo, em um grupo tão pequeno.
O jeito, então, era ir com medo mesmo. Afinal, ia ficar tudo bem.
Não ia?
A questão do clube de intercâmbio nem eram os encontros em si — sempre se esforçava para conversar com boa parte do grupo, algo que veio muito a calhar na sua atual situação. Até que estava conseguindo se divertir.
O problema estava, na verdade, nos pós-encontros, aqueles momentos em que o grupo saía das dependências do campus para comer, beber e jogar mais conversa fora em algum bar ali perto — tudo em nome do aprendizado, é claro. Conforme a noite avançava, o grupo ficava cada vez menor e, em geral, se refugiava na casa de alguém para uma saideira.
Para o desespero de , a escolha da vez era o apartamento de Mingyu.
E foi bem aí que seu disfarce começou a falhar.
Pelo canto de sua visão, viu Jinsol bocejar e conferir o relógio. Bingo, ali estava sua deixa! Era só aproveitar para fugir antes de ficar estranho demais. Começou a arrumar a bolsa, pronta para acompanhar a colega.
— Ei, vou levar a Sol em casa — anunciou Seokmin, dando um tapinha no ombro de Mingyu.
Ele ainda deu uma piscadinha para Jinsol. Seria um sinal entre os dois ali? Não ia ser que empataria a foda deles, então...
— Vê se não deixa a ir embora sozinha depois, viu? Não abusa da ajuda dela — ele ainda recomendou antes de segurar a mão de Jinsol, que acenou para os outros dois, e sair porta afora.
Agora, era oficial: e Mingyu estavam sozinhos.
No apartamento dele.
Que maravilha.
Droga, Lee Seokmin! Ok, nada de pânico. Aja naturalmente, recitou para si mesma. Mingyu respondeu o amigo, mas a ansiedade tinha se tornado um zumbido em seus ouvidos, silenciando tudo ao redor da garota. Ela precisava ocupar as próprias mãos ou seria capaz de arrancar os cabelos.
Em silêncio, começou a recolher os copinhos de soju e pratos espalhados pela mesa, levando tudo até a pia da cozinha. O trabalho manual lhe devolveu algum foco, então conseguiu ouvir quando Mingyu bateu a porta, provavelmente indo deixar o lixo lá fora.
Os ombros de relaxaram e ela respirou fundo. Tinha acabado de ganhar alguns minutos para se recompor e pensar no que dizer, qualquer coisa que justificasse sua rota de fuga daquela situação. Se ficasse sozinha com ele, com certeza diria algo que não devia. Estava pronta para sair de fininho, torcendo para não esbarrar com ele pelo caminho.
A porta bateu outra vez.
— Ei, você. — Ouviu a voz de Mingyu da sala, os passos ficando cada vez mais próximos até ele se apoiar no batente da porta.
Ok, a escapatória seria a louça então.
— Ei, você — respondeu baixinho, abrindo a torneira.
Mingyu entrou de vez na cozinha e abriu o armário bem ao lado de .
— Você sumiu — disse ele, apoiando as mãos e um saco de lixo extra na bancada.
— Eu? Estive aqui a noite toda — respondeu, sem tirar os olhos da louça.
— Não hoje. Você meio que sumiu durante o recesso.
O prato quase escorregou dos dedos de .
— Foi a correria-
— De fim de ano, é, eu sei. Só... senti sua falta — confessou ele. O coração de se apertou um pouquinho mais dentro do peito. — E hoje te achei um pouco distante. Aconteceu alguma coisa?
— É só o cansaço de voltar à rotina. — Era uma meia verdade, mas talvez bastasse naquele momento. Claro que tinha sentido falta de Mingyu, ainda mais depois de se dar conta de que gostava dele.
— Digo, entre a gente.
fechou a pia e levantou os olhos, o sangue rugindo em seus ouvidos. Mingyu olhava diretamente para ela, como se procurasse algum sinal em seu rosto.
— Entre a gente? — repetiu baixinho, com o máximo de coragem que conseguiu reunir. — Por que não estaria?
— Aí que tá — ele continuou, balançando a cabeça em negação. — É que não é isso que parece. Se é sobre o que rolou no fim do ano-
Aí estava. engoliu em seco. É claro que ele tinha reparado.
— Mingyu, a gente não precisa-
— Porque a gente realmente não conversou sobre isso, e eu-
— Gyu — ela chamou, segurando o pulso do amigo. Os olhos do rapaz se voltaram para ela, surpresos com o apelido que ela raras vezes usou. — Você é meu melhor amigo e eu não quero te perder, tá legal? Deixa isso para lá. É sério.
Mingyu piscou uma, duas vezes. Então, levou as mãos ao rosto e respirou fundo, bem fundo.
— Cara, como eu odeio essa palavra — desabafou, com um suspiro.
Não era possível.
— O quê? Deixar para lá? Perder? — insistiu.
— Amigo.
Ela estava ficando louca. Devia estar sonhando acordada.
— É que eu não posso deixar para lá. Não consigo, porque eu não te vejo só como amiga. E sendo sincero, às vezes acho que você também não. Então...
Mingyu olhou diretamente para ela, aproveitando para chegar ainda mais perto. Apenas alguns centímetros os separavam um do outro.
Atrás de uma tela ou cara a cara, não importava. Não dava mais para esconder.
— Não — ela respondeu. Queria abaixar o próprio olhar e fugir, mas Mingyu segurou seu queixo delicadamente entre os dedos. — Eu não te vejo só como amigo.
— E foi por isso que eu levei um gelo nesse fim de ano?
assentiu.
— Por favor, me diz que tá tudo bem se eu te beijar agora.
assentiu outra vez — o único incentivo que Mingyu precisou antes de pressionar os lábios contra os dela. Uma de suas mãos deslizou até a nuca de , enquanto a outra a envolveu pela cintura, puxando-a ainda mais perto.
A garota pousou as mãos sobre os ombros largos do rapaz, buscando o próprio equilíbrio. Precisou apenas de milésimos de segundo para seu cérebro registrar que aquilo acontecia de verdade e, assim, retribuir o beijo com a mesma intensidade.
Como tinha passado tanto tempo sem beijá-lo? Sorriu, um risinho de satisfação escapando da própria boca.
Ouviu o mesmo som sair dos lábios de Mingyu, que apoiou a testa na dela. Aproveitando-se da pausa, levou as mãos até os quadris da amiga. Precisou de um único movimento para levantá-la do chão, o que obrigou a envolver a cintura dele com as pernas. Ela riu, surpresa, quando percebeu que ele carregou os dois até o sofá no outro cômodo.
— A gente não tem nada a perder. Só a ganhar, na minha opinião. — Ele pontuou as frases com um beijo no nariz de e depois outro, dessa vez, nos lábios. — Me dá uma chance para te provar isso. Só não... só não some de novo.
deslizou uma das mãos pelos fios escuros do rapaz e olhou para ele mais uma vez, tentando gravar todos os traços de seu rosto na memória. Segurou o rosto dele entre as duas mãos.
— Eu não vou a lugar nenhum — respondeu, a voz firme com a própria decisão.
Fim.
Nota da autora: Essa fic foi escrita com muito amor e carinho para minha amiga secreta, a Pati! Espero que você tenha gostado <3
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