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Revisada por Selene 🧚‍♂️

Última Atualização: Agosto de 2024


Ele a encontra, sentada sobre os degraus da casa dela. Ela, Miyu, com suas mechas de cabelo levemente cacheadas, castanho-avermelhadas como uma gota de sangue e perfumadas como uma rosa vermelha. Seus olhos azuis, que a deixavam ainda mais bela, estavam marejados ao vê-lo. A garota usava um vestido branco até os joelhos, de forma sutil, mas que lhe dava curvas perfeitas. Não era novidade para Evan que ela estivesse usando a sua jaqueta preta, como de costume. A jaqueta pertencia à mãe dela no tempo de ensino médio do time de lacrosse, onde ela foi a primeira mulher na história do time. Porém, a Sra. White abandonou essa carreira, para se dedicar à medicina. Miyu White parecia como se estivesse preparada para a festa de “Dia dos mortos”, como todo mundo estava, uma data que estavam comemorando naquele dia na cidade. Era um feriado trazido do México.

O “Dia dos mortos” era uma comemoração um tanto inusitada. As famílias da cidade constroem altares em suas casas, como forma de homenagear seus entes queridos. E visitam as criptas das suas famílias, que ficavam no cemitério, onde todas as famílias dos fundadores da cidade estão enterrados; e onde todos os seus descendentes vivos também vão estar um dia. Todas as famílias da pequena Ravenwest possui um cripta. Cada sobrenome uma. É muito difícil ter um forasteiro nesta cidade. E se esse forasteiro não se casar com alguma família, ele não pode ser cremado ou enterrado em Ravenwest.

Mesmo que não fossem do México, eles tinham ganhado essa tradição desde o fundador, que dizem que era alguém que já tinha conhecido o mundo. Aquela cidade escondia muitos segredos, e um deles era de quem Miyu menos esperava. O Evan. O único garoto ou homem que ela encontrou hoje. Tinha ficado dentro do seu quarto o dia inteiro, na casa de suas tias, que dificilmente Miyu via. Mas a garota sabia se estavam naquela casa ou não, como um sexto sentido, apesar de Miyu desconfiar que elas eram bruxas ou algo do tipo. Porque elas têm essa fama na cidade.

As roupas negras tomaram conta da visão de Miyu, o contraste do preto com a pele pálida do Evan deixava-o inconfundível para ela. Os olhares verdes, os de Evan, se encontram com os azuis, da Miyu. Evan, com seus cabelos esbranquiçados como a neve sob seus pés. Ele tinha o cabelo loiro esbranquiçado. Como um Jack Frost, porém de olhos verdes. E tinhas sardinhas pelo rosto, como se fossem flocos de neve. Mesmo que Miyu achasse que Evan ficava bem de azul; por mais que ele nunca admitisse, pelo orgulho vaidoso de sempre usar preto.

Evan se senta ao lado da garota, eles trocam algumas palavras, mas o clima estava diferente. Seus olhos verdes dizem muito, como nunca disseram antes para ela. Miyu percebia que o Evan escondia muitas coisas dela. Desde que a vida dela mudou, alguns meses atrás, ela percebia isso em todo mundo. Miyu não sabia em quem confiar, mas ela desenvolve sentimentos por Evan Harper, o garoto mais misterioso da escola.

— Obrigada, Evan, o dia não está sendo muito bom… – O tom da sua voz era notório, estava sentindo a dor da perda. Há algum tempo, desde que ele se recordava, o coração dela batia acelerado. Evan podia sentir. E quando Evan se aproximava dela, o coração dela ficava em um ritmo perfeito. Uma perfeita harmonia. Como se sua presença acalmasse. Um ritmo perfeito, que só Evan conseguia fazer ela sentir. Ninguém mais. Evan conseguia ouvir as batidas de seu coração. O coração que nunca foi o mesmo desde a morte dos pais.

— Com o tempo tudo fica mais fácil, não é como se eu quisesse diminuir a sua dor. Eu ainda sinto, e mesmo que eu não seja um amor de pessoa, com o tempo tudo se acalmou. O tempo cura nossos corações, mas não como no clichê. Vai doer? Vai, contudo você vai sentir só um pouquinho e tudo estará bem. Não sou nenhum exemplo disso, mas com o tempo até que isso diminuiu.

Os olhos de Miyu estavam serenos agora, ela tinha entendido o que o garoto quis dizer. Há algum tempo achou que ele era um garoto que ela nunca entenderia, pelo menos era o que as outras garotas diziam para ela sobre Evan. Isso a surpreendeu no início.

Agora ela sabia que a única pessoa que poderia entendê-la em toda a escola era o Evan. E isso ao mesmo tempo que a confortava feria seu coração como uma lâmina, porque Evan sofria isso havia bastante tempo. Mais tempo do que ela. O pior é que desde muito cedo isso aconteceu na vida dele, ele também já perdeu os pais, isso fazia com que o coração dela se apertasse ao lembrar disso. Querendo saltar para fora do peito.

Ela entendia o que ele passou, porque estava agora passando pela mesma coisa. E quando lembrava disso, o coração de Miyu apertava. Ele “sangrava” ao mesmo tempo. Evan era como um anestésico, fazia a dor diminuir. E sua respiração voltava sempre ao normal. Com Evan, o nó na garganta dela iria embora, e as crises de choro também.

Seu coração voltou ao seu bater singelo, mais próximo de uma alegria. Evan era a companhia favorita da garota, ela queria se levantar, convidá-lo para entrar. Evan era uma das poucas pessoas que teriam coragem de entrar na casa de suas tias. Ele não tinha medo. Apesar da fama do casarão delas.

“Será que ele tem algum medo?”, pensa ela. Evan nunca pareceu ter medo de nada ou deixar transparecer o menor que seja pela segurança da Miyu, a qual ele era muito focado. Desde que eles se conheceram, Ravenwest era uma cidade perigosa para qualquer um. A cidade com a maior taxa de assassinato do país.

Miyu queria muito convidá-lo para entrar, porém, suas pernas estavam fracas pela má-alimentação. Ela estava tomada pela tristeza corriqueira, ainda mais naquele dia, e para piorar a situação, estavam bambas de verdade. Ela pensava que talvez caísse no chão se tentasse se levantar. De tanta fraqueza. E ela sabia que, se caísse, talvez nunca seria capaz de levantar. Fisicamente ela conseguiria, mas emocionalmente não. Quando é emocional, as coisas parecem “cortar” duas vezes mais. E o coração dela já estava “sangrando” havia muito tempo.

— Eu sempre digo para mim mesma: seja uma pessoa forte. Eu sou sarcástica, às vezes eu até posso parecer fria. Mas eu também tenho um coração, não escondo o que eu sou. Por um tempo acreditei nisso, me odiei por completo, mas agora eu sinto que aquela garota de 8 anos de idade ainda existe em mim, que tinha os pais maravilhosos, que não deixava nenhum imbecil estragar tudo por completo. Vou vestir minha “armadura” e tentar me levantar, espero que você esteja aqui para me ajudar.

— Sabe o significado da data de hoje? – pergunta Evan.

— Claro que eu sei, bonitão, não cresci aqui, mas meus pais faziam questão que eu soubesse. A intenção é relembrar aquelas pessoas amadas que já… — ela hesita em falar, mordendo o lábio inferior. — Se foram! — Sua voz sai fraca.

Miyu coloca as mãos em torno de si. Como se fosse desmoronar no chão e quebrar em cacos como uma boneca de porcelana, que nem mesmo remendos com fita adesiva seriam capaz de consertar. Tinha medo de se tornar “pó”. Um pó que as pessoas jogam fora, ou pisam em cima. Miyu abraçava a si mesma, como se se protegesse de alguma coisa ruim. Além do frio que ela sentia. Abraçada a si mesma, tentando se aquecer naquela noite gelada. Era como se ela estivesse colocando essa “armadura” em si mesma. Prendendo e a encaixando em seu corpo.

— Estou feliz que esteja bem agora. Eu não sou muito de coisas assim, mas eu tenho um presente para você.

Evan retira uma caixinha do bolso, lá dentro tinha duas caveiras mexicanas típicas dessa data. Pequeninas. Todas tinham desenhos de flores de cerejeiras.

Eles sabiam que naquele dia a bandeira da escola ou até a bandeira da cidade estava em meio mastro para lembrar essa data. De tão importante que essa data era. Só poderia ser porque a cidade é um cemitério ambulante de tão perigoso. Onde a morte estava no dia a dia das pessoas mais do que se imaginava.

— Eu mesmo que tive a ideia disso, espero que tenha gostado. Essas são as lembranças de seus pais simbolicamente, mostram que ainda vivem em você, mesmo que não estejam mais aqui, por isso as caveiras são tão coloridas. Mesmo que eu goste de preto… odeio a representação dela com a morte. E às vezes deixo você me vestir com roupas mais coloridas, por sua causa. Eu sei o que pode acontecer com você, Miyu, no fundo você sabe que eu sou um desastre. E eu sinto muito. Mas eu não vou deixar você triste. Nunca mais. Vou fazer de tudo para proteger você.

Miyu pensou neste momento que não queria ser protegida, mas ela sabia que existia algo que ela ainda não entendia. Coisas que ela via em sonhos. Coisas que pareciam fora do normal. Como se fosse uma “fantasia” dentro da sua cabeça.

Ela se aproxima e pega os presentes nas mãos, as caveirinhas eram bastantes coloridas, essas flores de cerejeiras eram de diferentes cores. Parecia que ela tinha uma memória muito importante com esse tipo de flor. Miyu sempre sonhara com ela. Apesar de não conseguir se lembrar exatamente o porquê. Ainda que fosse muito familiar para ela.

Isso a surpreendeu, porque ela mesma tem uma espécie maluca de memória perfeita. Era como se tivesse um bloqueio em sua mente.

As caveiras tinham olhos em formato de corações, e cabiam na palma de suas mãos pequenas. Pareciam ser pintadas a mão, Miyu lembra que isso só poderia ter sido feito pela melhor amiga do Evan, a Tess Jackson.

Esse detalhe da pintura deixava as flores ainda mais bonitas. Sakuras, ou conhecidas também como cerejeiras, eram o tipo de flor que Miyu White mais admirava, as “sakuras”, que lembravam tanto o Oriente. Sempre foi muito familiar para ela.

Mesmo que Miyu acreditasse nunca ter vivido lá. Ela não era muito fã de botânica, mas conseguia reconhecer algumas flores quando as via, por causa do livro que sua mãe guardava na cabeceira do quarto dos pais, o livro de capa dura azul e grosso que ficava embaixo da caneca de gatinho ruivo. Onde sua mãe colocava chá, chás malucos que serviam para tudo. Como se fosse xarope. Às vezes, a Sra. White se parecia com as tias da Miyu.

Ela tem uma lembrança.

A pequena Miyu sentada em um banquinho de madeira azul bebê, mostrando à mãe que tinha aprendido a ler palavras novas. Miyu aprendeu a ler lendo esse livro. Apesar de parecer muito difícil para uma criança. Porém, Miyu sempre foi muito mais inteligente do que as outras crianças normais da idade dela. Miyu lembra que a Sra. White sempre enfeitava os cabelos da filha, com flores do próprio jardim da família, e ela sempre achava sua mãe a mais linda do mundo. Mas ela não se parecia tanto com a aparência da mãe. Miyu sempre se achou parecida com sua antepassada. Apesar de ter puxado os olhos azuis da mãe.

A única filha dos White lembra de Shade. Seu buldogue francês cinza azulado, bem velhinho, dormindo sobre os seus pezinhos de criança. Deitado de costas, as patinhas levantadas para cima. Como se estivesse fingindo de morto, como os gatos fazem. Shade nunca pareceu um cachorro normal. E Miyu nunca soube quando Shade nasceu. Ele sempre esteve na sua família. Sua mãe mostrara a foto de uma garota idêntica a ela, em preto e branco, dizendo que era uma tataravó da pequena Miyu White. A garota sempre achou que ela parecia mais com essa tal de Ruby White do que a própria mãe. E um cachorro igual ao Shade estava na foto. Apesar de Miyu nunca saber exatamente por que era uma foto em preto e branco.

— O que nós fazemos agora? - pergunta Miyu.

Miyu tenta afastar os pensamentos ruins de luto internamente, e sua franjinha balança junto. A franja tem um volume sutil, não muito espessa, mas o suficiente para manter o formato do coração claramente definido. Bem no meio. Esse era seu corte preferido e sua marca registrada. A franja era cuidadosamente cortada para formar um coração na testa: o corte enquadrava bem o rosto, geralmente caindo logo acima das sobrancelhas. Ela mesma que fazia o corte, com suas mãos cuidadosas e talentosas, por ela ser uma artista.

Miyu sente a brisa gelada de Ravenwest tomando conta de seu rosto. Evan Harper vê com sua visão aguçada os flocos de neve presos nos cachos do cabelo ondulado de Miyu. A forma que os flocos ficam se um humano pudesse enxergar a pequenez e delicadeza dos flocos de neve.

— Daremos um nó e colocaremos na árvore que tem aqui, toda vez que você passar por aqui você se lembrará de seus pais. É uma tradição local que só existe aqui em Ravenwest, mas acho isso muito especial, saiba que não é aquela coisa rigorosa. Ela é feita de coração. Só que não de forma triste, e sim como uma segunda presença deles, que não está só no seu coração. Algo físico. Um talismã emocional.

Ele se aproxima da árvore. Estava diferente de antes, por causa do inverno ter chegado. A Miyu de antigamente sempre adorara aquelas folhas secas, eram das cores das folhas, que iam dos tons alaranjados ao dourado. Tinha folhas secas vermelhas abaixo dos pés dela, porque não tinham caído totalmente no último mês.

As folhas vermelhas eram como sangue seco, ela se lembra do acidente. Como um gatilho.

As gotas de sangue caindo sobre a sua cabeça, sangue de sua mãe. O Sr. White e a Sra. White presos no carro detonado e capotado. Os pais dela mortos e presos aos cintos. Miyu também estava dentro do carro. Ela se recorda de tentar quebrar o vidro da janela para procurar ajuda, chutando a janela do carro com suas botas vermelhas novas. Seus pais estavam de cabeça para baixo em relação a ela, presos ao cinto de segurança. O carro, além de ter capotado, continuou de cabeça para baixo. Miyu foi a única sobrevivente, e foi considerado um milagre porque estava intacta. Miyu estava até sem o cinto. Para a surpresa de muitos, só estava com alguns arranhões. Algo tinha despertado nela naquele dia. Algo que ela não conhecia. Miyu só não sabia o que era. Ela sabia que continuava uma humana, porém nunca tinha se sentido tão estranha antes.

O carro dos White tinha se chocado contra um trem. Desde aquele dia, Miyu teve medo de dirigir por causa do acidente. Ela tinha um carro próprio intocado fazia um tempo. Miyu nunca dirigiu o carro dos pais. Ela não tinha sido culpada pelo acidente. Mas isso ainda a machucava, Miyu sendo a única sobrevivente, muitas vezes não se achava “merecedora”. Miyu se lembra exatamente de ser retirada do carro intacta, com suas botas vermelhas e suas roupas, que estavam exatamente iguais a minutos antes do acidente. Ela sentiu que o peso de se tornar órfã era algo gigante.

Quando volta do devaneio, Evan conta que Miyu tem que prometer para si mesma que não deixaria de amar aquela pessoa, mas que ia seguir em diante. Miyu então se afasta das folhas, enterrando as folhas vermelhas na neve; ela faz isso quase que inconscientemente com os seus pés. Acabando com as memórias ruins e pensamentos dolorosos.

— Não precisa ter pressa, eu estou aqui. Pense nas memórias que mais ama, coisas simples que para você fazem falta.

Ela se aproxima e amarra as duas caveirinhas nos galhos, como ele tinha falado antes. Os flocos de neve começam a cair sobre a cabeça dos dois jovens. Então Miyu abre uma mão, e os flocos de neve começam a cair na palma da mão dela. Nesses instantes, ela pensava nos dias que, quando a neve caía, eram perfeitos para fazer bolas de neve, e brincar com elas com os seus pais. O chocolate quente dessa época e os abraços calorosos que a aqueciam na frieza dessa estação. Toda dor que agora estava sentindo, de alguma forma, estava indo embora. Ou quase isso.

Eles voltam em direção aos degraus, e Miyu escorrega no gelo por causa da fraqueza dela naquele dia, se apoiando em Evan; que a impede de cair. Evan parecia surpreso, e ao mesmo tempo preocupado. Ela agarrou o braço de Evan com tanta confiança que ele estranhou.

— Preciso que você saiba que eu gosto de você, Evan!

Miyu continuava segurando no seu braço direito. Mesmo não precisando mais para se equilibrar. Evan estava virado de costas nesse momento. Ele olha para trás para vê-la. Não acreditando no que estava ouvindo. Como se ele estivesse sonhando, inventando ou alucinando o que tinha escutado.

— ...Você gosta? — disse Evan Harper, surpreso.

Miyu assentiu com a cabeça.

— Eu gosto… e eu gosto muito!

Eles se sentam, Evan parecia chocado. Ela não tinha reagido assim na primeira vez.
Eles estavam sentados um de costas para o outro. Porém, uma das duas mãos de cada um foram se aproximando. Ambos pareciam envergonhados e tímidos, mesmo estando de costas um pro outro. As mãos deles vão se encontrando. Cada um estava com sua respiração acelerada. Eles vão ficando mais próximos, ficando de joelhos de frente para o outro agora. Dessa vez quase se beijam, mas Miyu se desequilibra, com as pernas falhando por não ter se alimentado direito nos últimos dias. E precisa voltar para um lugar seguro. Evan parecia “tirar o seu chão sempre". Miyu vai para o degrau mais alto, que estava antes quando Evan chegou. Evan a segue. Senta ao seu lado.
Miyu colocou a mão na barriga, ela sentia a falta de sangue no estômago. A Srta. White sabia que era uma resposta natural do corpo, quando estamos ansiosos ou muitos nervosos, ou quando estamos apaixonados, por exemplo. Próximos de quem nós amamos, em uma relação de alma e alma. Almas eram muito importantes no mundo deles. Miyu só não sabia ainda.

— Nunca pensei que fosse tão sentimental, dessas pessoas você seria a última, Evan. Eu sempre penso isso. Obrigada, não sabe o quanto estou grata a você, e eu não sou muito de dever algo a alguém. Não sabe o quanto você significa para mim.

Ele era uma criatura paranormal, enquanto Miyu era apenas uma humana, seres assim só poderiam lhe trazer sua própria morte. A espécie de criatura que estava na terra só para causar dor às outras pessoas. Um ser que se acha um deus para escolher quem vive e quem morre.

— É que eu gosto de você demais, Evan. E agora não sei o que fazer com isso… – Miyu se aproxima do rosto de Evan. A respiração de Evan aumenta. Como se ele estivesse se descontrolando, a “fera” que existia dentro dele.

Ela tenta beijá-lo, mas Evan muda de ideia. Miyu fecha as mãos, descontando a ansiedade de não ter conseguido, colocando as mãos próximas do coração. Parecendo com a pose da Mulher Maravilha, com seus braceletes com os braços cruzados, mas não totalmente. Evan imaginou os braceletes de metal por um momento. Era como uma pose que fazia ela vestir “sua armadura” emocional. Uma reação mais intuitiva, como se quisesse proteger o coração dela com as mãos. Com os braços cruzados, de punhos fechados, acima do coração. Abraçando a si mesma. Ela se sentia como se tivesse sido rejeitada, como quando descobriu a verdade pela primeira vez. Ela o rejeitou.

— Nós não podemos, Miyu…

Evan vai até onde está as mãos de Miyu, sobre o coração, e começa a desfazer as suas “barreiras” para acalmá-la. Desfazendo os punhos dela. O lugar onde estava os punhos cruzados era bem no coração, então Evan coloca as próprias mãos dele sobre o coração da garota. E Miyu coloca as mãos dela no peito dele. Miyu sente as batidas do coração dele, e Evan sente as do coração dela. Esse gesto é reconfortante para ela, que fecha os olhos; quando abre, enxerga as sardinhas no rosto pálido de Evan. Sardinhas como constelações, como várias estrelinhas pelo corpo dele. A coisa que ela achava mais linda no mundo. Como um jovem deus escadinavo. O rosto de Evan estava ficando avermelhado pelo fluxo de sangue, fazendo suas bochechas ficarem acentuadas.

Eles eram de mundos diferentes, marcados por uma guerra. Por causa de uma consequência médica. E Evan era uma criatura noturna, que só poderia causar destruição ao mundo.

— O meu mundo era você, Miyu. O meu mundo pequeno e particular. Mas talvez você seja boa demais para mim. E por isso tenho que me conformar com o mundo preto e branco que eu tenho.

— O que quer dizer com isso? E daí se somos de mundos diferentes? Você não quis contar, mas eu sei como se já tivesse vivido isso, de alguma forma eu sinto que nós somos reais. Evan, eu não sou uma garota perfeita, e nem quero ser. Então que importa o moralismo e o mundo? Se eu quero é você, Evan.

Os olhos de Evan se iluminam.

Ele se descontrola. Tenta tirar as mãos do coração de Miyu, mas ela os prendeu. Evan percebe que o coração dela não se alterou quando viu sua “verdadeira alma”, não estava aterrorizada como na última vez. Ele tinha força para tirá-las dela, mas não conseguia. Evan adorava sentir o coração tão frágil e bonito de Miyu, ele não queria deixar de sentir.

O coração que ele se apaixonou, metaforicamente, e que bombeia todo o seu sangue para todo o corpo dela. Evan sente uma conexão entre Miyu e ele. De uma forma maluca. Como se tivesse um fio vermelho amarrado um ao outro. Só o toque das mãos do Evan sob o coração da Miyu faz com que Evan sinta algo, como se o coração dela estivesse se alimentando da energia dele. O amor dele, os sentimentos dele por ela. Como uma corrente elétrica mágica. Um laço indestrutível que nunca se partiria. Evan estava principalmente preso no coração dessa garota. Assim como a Miyu estava em todo canto de Evan, antes mesmo dela se apaixonar por ele. Era como se cada célula do corpo dela vivesse se alimentando de Evan. Evan e somente Evan. Como uma fonte de energia.

Ela, mesmo que não possa, se aproxima e o beija.

Os olhos verdes de Evan se iluminam em um vermelho iluminado, nada humano. Ou convencional. Como se ela estivesse vendo-o pela primeira vez. De uma forma totalmente diferente, como se tivesse dado uma segunda chance. Mesmo que ela não tivesse noção disso. Quando na primeira vez o Evan a fez esquecer.

Era como se as séries de TV sobrenaturais que ela assistia ganhassem vida. Mas que conseguia ser algo novo. Algo que deslizava pela íris dos olhos de Evan. Eram estrelas, estrelas dentro de suas íris.

— Eu não sei o que você é, eu suspeitava de alguma coisa, mas você não é como eles, mas….

Evan interrompe.

— Agora você me odeia?! – O tom de sofrimento era notório. A alegria desaparece de seu rosto.

Ela pega o rosto de Evan com a sua mão direita e olha para os seus olhos vermelhos. Ela toca seu rosto, com a mesma delicadeza quanto tocou os flocos de neve antes. O cabelo de Evan estava até mais esbranquiçado do que o normal, por causa da neve no cabelo, daquela noite que não parava de nevar.

— Eles são lindos. É como se estivesse neles pequenas estrelas. Não te odeio, você pode ser algo totalmente diferente do meu mundo, mas...

Eles dizem em silêncio um para o outro. Ela sussurra para ele, e ele sussurra para ela em seguida. Um atrás do outro.

“Eu te amo!”.

Só a expressão que eles fizeram um para o outro também já dizia isso.

Estrelas reluzem nos olhos vermelhos de Evan. Deslizando como estrelas cadentes em uma batalha entre deslizar pela íris ou iluminar. Miyu tinha ouvido falar que os olhos são as janelas da alma. E Evan era um Dark Soul. Alma Negra. Uma criatura que se alimentava da morte. Mas a garota sabia que esse não era assim. Que tinha um coração. Podia ser quebrado, mas mesmo assim era o coração pelo qual ela se apaixonou.

Miyu não se importava com o que poderia acontecer caso ela o amasse, pois para ela seria como uma... doce morte.

Eles dão beijos ardentes, que curariam todos os machucados do coração dos dois, pelo menos por um momento. Por causa de um amor jovem que mudaria o mundo de ambos. Evan segura Miyu pela cintura, puxando-a para si, e fazendo-a cair sobre seu corpo. Ele faz os dois caírem no chão da varanda. Ele por cima dela. Ele com as mãos nas curvas dela. Evan esperava que as tias de Miyu White não chegassem a tempo de verem aquilo. Eles só não esperavam que seus corações seriam como vidro nesse mundo, onde tentaram quebrá-los até ficarem caquinhos. Evan sorriu quando viu que na janela do quarto da Miyu estava escrita a palavra “Malus” em vermelho. A palavra em latim que era importante para os dois, que definia o que o Evan era. Noites em claro que Miyu passava acordada com Evan conversando no quarto dela, sem suas tias saberem, sempre Miyu tentando descobrir informações sobre ele. O mistério sobre ele. Ela sempre falava dessa palavra da tradição, da qual Evan fazia parte. Miyu tentava desvendá-lo como uma caixinha de mistérios. Ou montando um quebra-cabeça. Tudo em Evan chamava a atenção dela. E essas noites em que Evan aparecia em seu quarto eram as mais felizes dela. Quando ele não estava ela sentia falta. Tinha dias que Evan desaparecia, e só aparecia com a maior cara de culpado dias depois, como se estivesse com as mãos “sujas de sangue”. E ele estava, literalmente. Essas noites eram as noites que o Evan chamava de ”noites de maldição”. Ele chegava triste e abatido após esses dias. Miyu sempre sentia sua falta nas noites em que dormia sozinha. Quando Evan estava, era o dia em que ela não chorava. A palavra Malus era o maior código, a mais sagrada para os Dark Souls.

Evan então olha para a janela dela enquanto Miyu beijava seu pescoço. Na mente dele, a palavra “Malus” se transforma em 3 de suas traduções.

Ruim. Perverso. Mau.

O que Miyu sempre falava que ele não era. Que o Evan dela não precisava ser. Como um lembrete de que ele não precisava ser assim. Ele sussurra para si mesmo, olhando para a janela da Miyu, marcada em vermelho.

Evan solta um: “Foda-se o Malus!”.

E então volta seu olhar para a sua humana amada.


Continua...


Nota do autor: Sem nota.

Nota da bethinha 🧚‍♂️:Já tô apaixonada pelo Evan, como que faz? Aproveita, hein, Miyu, tá certíssima, agarra esse homem mesmo 🙏🏻


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