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Atualizada em: 11.11.2024

Servindo tigelas caprichadas de lámen, dando sorrisos simpáticos e conferindo sua planilha de gastos do mês escondida debaixo do balcão do caixa, Iruka Umino estava em mais um dia de trabalho no Ichiraku.
Desde que ficou responsável por administrar os gastos de sua casa, o rapaz acabou desenvolvendo o pequeno vício de verificar aquela planilha sempre que possível. Obviamente, sabia que não era correto e muito menos queria misturar sua vida pessoal com o trabalho daquela forma. Contudo, as brechas que surgiam no meio do seu turno eram perfeitas para que ele soubesse — e chorasse — sobre o orçamento para o supermercado e de quanto precisaria para pagar a conta de luz.
Mesmo não sendo uma pessoa organizada nas outras áreas de sua vida, nada para Iruka era mais importante do que saber para onde seu amado e necessitado salário estava indo.
Entretanto, aquele momento íntimo de Iruka com os números não durou muito, pois a legião de clientes que vinham pontualmente às cinco da tarde para jantar cedo começou a chegar.
— Eu quero um com bastante caldo, por favor! — Um senhor de cabelos grisalhos sentado na mesa dos fundos exclamou.
— Pode trazer guardanapos, por favor? — Uma moça tímida pediu baixinho.
— Mocinho, eu quero pagar a conta! — Uma mulher com roupas formais avisou, batendo na campainha do balcão.
Em seu primeiro dia de trabalho, Iruka compreendeu aquilo que ninguém avisava, mas que a maioria das pessoas buscando um emprego precisava saber: Você nunca vai fazer só a sua função.
Por isso, o rapaz não só era atendente de caixa — como fora contratado para ser —, como também garçom, auxiliar de serviços gerais e qualquer outra profissão necessária no momento. Teuchi, o dono e chef do Ichiraku, só podia contratar um funcionário por turno. Logo, ele teve que aprender a ser um verdadeiro canivete suíço.
Todavia, apesar de não ter sido acostumado a fazer tantas coisas ao mesmo tempo, Iruka não temia o trabalho e, no fundo, gostava da sensação de poder ajudar em tudo.
Após anotar os pedidos de todos os clientes, servir seus lámens e receber os pagamentos, Iruka iniciou a única tarefa na qual sentia estar pagando todos os seus pecados: Desentupir a privada. Não soube exatamente quanto tempo demorou para fazer aquela água ficar azul novamente, mas teve certeza de que nunca agradeceu tanto ao olhar seu relógio e perceber que o turno já havia acabado.
Depois de lavar as mãos devidamente, saiu do banheiro e teve a maravilhosa visão do restaurante mergulhado na legítima paz interior tanto pregada por Buda.
Iruka sorriu satisfeito, avistando Teuchi com os cotovelos apoiados no balcão, aproveitando seu sagrado intervalo.
— E então, menino Iruka, conseguiu abrir a caverna do dragão? — O chef perguntou divertido. O jovem soprou uma risada, porém resmungou ao sentir suas costas doerem, fazendo uma careta.
— Consegui, mas por pouco não achei o Mestre dos Magos lá dentro. — O rapaz respondeu e o homem riu, balançando a cabeça. — Tô morto.
— Imagine eu, que fiquei o dia inteiro cozinhando e vou passar a noite também? — Teuchi suspirou cansado, porém sorriu. — Se eu não gostasse tanto de fazer lámen, eu juro pra você que eu estaria em casa me preparando para assistir o próximo episódio de Dragon Zakura, e então dormir para sempre, tal qual a Bela Adormecida.
— Pelo andar da carruagem, além de fazer tudo o que eu faço, eu também vou começar a cozinhar o lámen. — O rapaz brincou, soprando uma risada. — Já imaginou, você de Bela Adormecida e eu de Remy?
— Não é uma má ideia. Iruka, já que você está acostumado a dar seu sangue, suor e lágrimas pelo restaurante, o que acha de ser meu sous-chef? — Teuchi perguntou, levando a mão ao ombro do outro.
— Se eu puder temperar os lámens com esses ingredientes, na hora, meu chefe! — O rapaz respondeu divertido e riu alto junto com o patrão.
Para Iruka, nada era melhor do que ter uma boa relação com Teuchi. O chef lhe entendia até mesmo nos momentos em que ele não se entendia. O jovem perdeu as contas de quantas vezes precisou sair mais cedo e mesmo sem falar nada, Teuchi o liberava. Além disso, tinham os adiantamentos de salário, os lámens de cortesia e inúmeras outras coisas.
Teuchi sempre estava se preocupando com seus funcionários, especialmente pela maioria deles ser jovem. E no caso de Iruka, essa preocupação não se estendia só a ele, como também a um garoto esperto e espevitado chamado Naruto Namikaze, mais conhecido como o meio-irmão de Iruka Umino.
Ao pensar no garoto, o alarme do celular do rapaz tocou e ele arregalou os olhos, dando um pulo no lugar e percebendo que já tinha passado da hora de buscar Naruto no colégio.
— Eita, eu preciso ir! — Iruka exclamou enquanto se xingava mentalmente por ter colocado o alarme no modo soneca tantas vezes enquanto desentupia o buraco negro. O rapaz se preparou para sair correndo, mas lembrou de algo que o ajudaria a se desculpar pelo atraso e sorriu para o patrão. — Chefe, eu sei que tá na hora do seu intervalo, mas não teria como fazer um lámen simples pro Naruto?
Teuchi abriu um sorriso tão brilhante quanto um diamante e pôs as mãos na cintura em um gesto confiante.
— É por isso que eu sempre preparo macarrão a mais. — Teuchi deu uma piscadinha, amarrou novamente o avental e correu para a cozinha.
Iruka riu soprado, desejando mentalmente que Naruto não fosse a última criança a ser buscada no colégio. Então, o sininho da porta de entrada tocou, revelando a pequena e cansada silhueta de Rin Nohara.
Rin era colega de trabalho de Iruka. Ela ficava no turno das seis, mas sempre acabava chegando um pouquinho mais tarde, pois pegava dois ônibus para chegar ao Ichiraku. Sua doce face com marcas de nascença e sorriso gentil estava sempre com feições cansadas, resultado do outro emprego em que trabalhava durante o dia.
Por esse motivo, sempre que podia, ele a cobria durante a noite. Sabia bem como era precisar se dividir em várias áreas e a empatia de ambos era um dos motivos para se darem tão bem.
— Boa tarde, Rin! — Iruka a cumprimentou com um sorriso suave. — Como você tá?
— Morta e enterrada. — Rin respondeu limpando o suor da testa e acompanhando o colega em uma risada. — Trabalhar com atendimento ao público sendo uma pessoa estressada é fogo, viu?
— Eu imagino. Na verdade, sabe que eu nunca esqueço o dia em que aquele cliente foi grosso comigo e você gritou com ele?
— Mas é claro! — Rin exclamou com as mãos na cintura, fazendo o outro rir. — Se eu não tivesse feito nada, você ficaria parado que nem uma porta escutando ele te esculachar. Ainda bem que você aprendeu.
— Aprendi mesmo. — Iruka disse rindo, lembrando do dia em que uma situação parecida aconteceu e foi a vez dele de, com todo o respeito, esculachar um cliente debochado e fazer a colega bater palmas.
— Enfim, como está sendo essa jornada de ser o novo chefe da casa? — Rin questionou gentilmente.
Iruka sorriu sem graça, coçando a nuca. Mesmo cuidando de seu lar e de Naruto desde o final do ano anterior, ainda era difícil falar sobre os aspectos daquele assunto.
— Vai bem e vai mal ao mesmo tempo. Quer dizer, eu ainda não me acostumei a sempre que surgir um problema com a casa, com o Naruto ou até mesmo comigo, lembrar que, agora, sou eu que resolvo. Fora as contas, os momentos intensos de estresse e o fato de já ser um adulto batendo na minha porta. Mas tô conseguindo me virar.
— Eu torço muito por você, Iruka. Afinal de contas, estamos juntos nessa, não é? — Rin respondeu com um sorriso reconfortante, referindo-se ao fato de ela também ser “a chefe da casa”, já que estudava, trabalhava e cuidava sozinha dos dois irmãos pequenos. — Aliás, já não passou da hora de você buscar o Naruto?
Iruka arregalou os olhos de novo e dessa vez, deu um tapa na própria testa por ter esquecido daquilo momentaneamente. Então, como um mago do tempo, Teuchi apareceu magicamente entre os dois, segurando uma embalagem de lámen quentinha e cheirosa dentro de uma sacola de delivery, entregando-a nas mãos de seu jovem funcionário.
— Prontinho!
— Eba, obrigado! — Iruka agradeceu de modo fofo, equilibrando a embalagem com uma mão e tirando dinheiro do bolso com a outra. — Vejamos, um lámen comum custa…
— Ei, ei, ei, nada disso! — Teuchi o impediu. — Você sabe bem que não precisa pagar, menino.
— Mas chef, você sabe bem que eu me sinto incomodado quando não pago pelos lámens! — O jovem suspirou inquieto e sorriu ao lembrar de algo. — E se você descontar do meu salário?
— Iruka, quer andar logo antes que o Naruto decida ir sozinho pra casa e se perca no caminho? — Rin quem respondeu, com uma expressão irritada no rosto e os braços cruzados, enquanto Teuchi apenas sorria.
Iruka bufou inconformado e revirou os olhos, mas no fim, acabou dando o sorriso mais grato do mundo.
— Obrigado! — agradeceu em alto e bom som, correndo em direção ao colégio de Naruto, sentindo o pôr-do-sol iluminar seu corpo e uma felicidade enorme inundar todo o seu coração.

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Após correr uns bons quilômetros — para não dizer quase uma maratona —, Iruka finalmente chegou ao colégio de Naruto. Ofegante e cansado, sua expressão e postura mudaram rapidamente assim que avistou a silhueta de seu irmão com uma mochila de sapinho nas costas, olhando para os lados e tentando lhe encontrar.
— Ei, criatura! — Ele gritou sorridente. Naruto virou o corpo em sua direção e seus olhos infantis rapidamente perceberam a sacola com o lámen. O garoto abriu um sorriso enorme e foi ao encontro do irmão.
— Esse é o lámen especial com caldo concentrado e macarrão super hiper ultra macio? — Naruto perguntou e nem mesmo esperou uma resposta, tomando a sacola e tirando a embalagem de dentro.
— Nossa, que ultraje! — O irmão mais velho levou a mão ao peito, suspirando chocado e fingindo estar magoado. — Não vai ter um “Oi, Iruka, meu grande irmão! Como eu te amo!”?
— Você é o Kenai do Irmão Urso, por acaso? — Naruto questionou com as sobrancelhas arqueadas e os dois riram alto.
Enquanto Naruto comia o lámen, os irmãos conversavam animadamente até em casa. Naruto contou sobre o tombo que um valentão do secundário levou quando tentou mexer com um garotinho do primário e também sobre as perguntas de literatura japonesa que ele conseguiu responder perfeitamente, através do seu jeitinho único de ser.
Iruka o escutou com felicidade, comentando sobre tudo. Entretanto, quando o irmão perguntou como havia sido o seu dia, omitiu a maior parte das coisas. Em momentos bons como aquele, preferia não falar nada e proteger Naruto de possíveis preocupações. Ele era o irmão mais velho, afinal.
— Então, estou perdoado por ter demorado? — Iruka questionou divertido ao chegarem em casa.
— Depois desse lámen dos deuses, é óbvio, né? — Naruto respondeu feliz da vida, jogando a embalagem no lixo e fazendo o irmão rir. — Podemos assistir One Piece juntos?
— Claro. — Iruka sorriu calmo. Mesmo cansado, assistir alguns episódios não era nada demais, apesar de saber que “alguns” na linguagem de Naruto significava uns dez, no mínimo.
Após assistirem o começo do arco de Water 7, com a tripulação dos Chapéus de Palha sabendo sobre a existência de um trem marítimo e navegando até a ilha, Naruto soltou um longo bocejo.
— Cansado? — Iruka perguntou, soprando uma risada.
— Bastante. — Naruto respondeu e ficou em silêncio. Não bastou muito para o rapaz perceber que ele iria pedir algo. — Irmãozão…
— Ah, agora eu sou o Kenai? — Iruka questionou em um tom falsamente incrédulo e sorriu logo depois, fazendo o outro revirar os olhos. — O que você gostaria, irmãozinho?
— Ah, é que… — Naruto se remexeu no sofá e coçou a cabeça. — Será que é coisa de criança eu pedir pra dormir com você?
Iruka riu baixinho com a pergunta fofa do irmão mais novo, abraçando-o de lado e o aproximando para ficar mais perto de si enquanto Naruto encostou a cabeça em seu ombro.
— Claro que não. No fim das contas, você é uma criança, Naru. E mesmo que não fosse, em grande partes das vezes, só queremos nos sentir protegidos por alguém.
— Sinto falta de ser protegido pelo papai. E pela mamãe Kushina também. Sinto falta deles por completo. — Naruto confessou, melancólico demais para um garoto tão alegre.
Iruka suspirou, abatido. Desde que tudo havia acontecido, os irmãos tocaram naquele assunto inúmeras vezes e algo dizia que aquela não seria a última delas. Mesmo ele fazendo de tudo para Naruto não se sentir sozinho, era óbvio que a presença de seus pais era uma das coisas mais importantes da vida dele.
E Iruka sabia disso pelo simples fato de ele também se sentir assim. Entretanto, como irmão mais velho, não podia ser tão vulnerável a ponto de deixar aquelas emoções inundarem seu coração tão intensamente.
— Eu também sinto falta deles. Por completo e em todas as partes. — Iruka respondeu e deu um sorriso fraco, acariciando os fios loiros e tentando demonstrar que apesar de tudo, ele estava ali. Entendia os sentimentos de Naruto como se fosse um espelho e refletisse seus pensamentos e emoções. — Eu vou dormir com você e…
Nesse instante, como uma maldição que quebra o encanto de um momento bom, Iruka sentiu o brilho de seus olhos sumir ao lembrar da lição de matemática que precisava fazer. Isso porque sua mochila estava largada em um canto da sala, aberta e com os livros aparecendo, como se fossem uma espécie de lembrete sobre aquela parte de sua vida.
— Naru, me desculpa. — Iruka pediu desolado e o irmão lhe olhou confuso. — Eu preciso muito fazer a minha lição agora, mas prometo que assim que eu terminar, eu subo pra podermos dormir, ok?
Iruka explicou a situação com receio, pois tinha medo de Naruto ficar com raiva, chateado ou simplesmente não saber lidar. Mas, pelo contrário, ele sorriu, surpreendendo o irmão.
— Tá tudo bem, Iru. Agora você tem muito mais responsabilidades do que antes e eu não sou mais um bebê, sou capaz de entender isso. Eu e Kurama vamos esperar você lá em cima. Só não demora, tá? — Naruto respondeu sorridente, fazendo questão de incluir a raposa de pelúcia com a qual dormia desde bebê.
Iruka suspirou, aliviado e orgulhoso. Ainda precisava aprender muito com o irmão sobre ser resiliente.
— Prometo que vou tentar. Mas, em todo caso, não durma tarde. — Iruka aconselhou gentilmente e Naruto assentiu, subindo as escadas em direção ao seu quarto.
Então, Iruka levantou do sofá, esticou as costas e pegou sua mochila, sentando-se à mesa e abrindo o caderno para resolver a lição.
Minutos depois, uma chuva forte começou a cair e a temperatura esfriou, fazendo o jovem abraçar a si mesmo para se aquecer. Entretanto, em cima da mesa, a lição continuava sem respostas, dado que Iruka não conseguia concentrar-se de jeito nenhum. Então, antes que percebesse, o furacão de pensamentos começou.
Tudo começou naquele dia. Era para ser um dia perfeito, pois quando ele e Naruto chegassem da escola, Minato buscaria Kushina no trabalho e então eles iriam ao cinema. E de fato, quando soube que seu filho e o enteado estavam em casa, ele foi buscá-la. Minato só não contava com um caminhão desgovernado em seu caminho.
Quando recebeu a notícia através do celular, Iruka se controlou para não chorar na frente de Naruto, sabendo que quando chegasse ao hospital, teria que consolá-lo. E assim aconteceu. Não só no hospital, como no velório e em quase todas as noites dos meses seguintes. E de todos esses momentos, a única vez em que o rapaz se permitiu chorar foi quando Naruto perguntou como as coisas seriam dali para frente.
Iruka chorou, pois, genuinamente, não sabia. As contas chegavam aos montes, a comida estava prestes a acabar e as economias já haviam sido usadas. Naquele momento, Iruka percebeu que se não quisesse que ele e Naruto fossem morar na rua ou pior, que seu irmão fosse para um orfanato, ele teria que dar um jeito.
E assim ele fez. Se humilhou por um mísero emprego em todos os estabelecimentos de Konoha até conseguir encontrar o Ichiraku em uma noite estrelada e Teuchi lhe oferecer um lámen ao ver seu rosto pálido e sua barriga roncando de fome, contratando-o na hora e dizendo que o ajudaria em tudo o que precisasse.
Então, sem perceber, Iruka fechou os punhos, controlando-se para não chorar. Após todos aqueles acontecimentos, ele prometeu ser forte até o último minuto.
Contudo, Iruka era humano. Ele sentia falta de sua vida normal. A vida onde participava do clube do jornal da escola, sonhava acordado com a faculdade de jornalismo e contava com o apoio de sua mãe e padrasto em qualquer coisa que fizesse. Sentia falta da época em que tinha vontade de fazer tudo. Porque apesar de tentar esconder, a verdade era que Iruka não tinha mais vontade de fazer nada.
Iruka respirou fundo, soltou um suspiro e balançou a cabeça. Precisava se concentrar na lição e não nos momentos antigos de sua vida. Afinal de contas, se o fizesse, não voltaria à realidade tão cedo.
— São só algumas questões. Não vou desistir agora. — Iruka disse a si mesmo com o máximo de firmeza possível e voltou a tentar resolvê-las, esforçando-se para lembrar do que estudou.
E se havia algo nas palavras de Iruka que era uma verdade absoluta, era o fato de ele não desistir. Nem naquele momento, nem nunca.


Iruka sentia-se um verdadeiro zumbi.
O fato de não estar dormindo bem não era uma novidade para ele. Aliás, começou a ter conhecimento sobre a piora de seus episódios de insônia logo que sua rotina tornou-se pesada e ele passou a ficar acordado durante as madrugadas frias de Konoha, conseguindo dormir apenas quando o sol raiava e atrasando-se para a escola quase sempre.
Algo irresponsável de se fazer, levando em consideração que ele precisaria permanecer acordado pelo resto do dia? Claro que sim. No entanto, não era como se ele pudesse controlar o próprio sono.
Ao pôr os pés dentro daquele prédio antigo e chique, Iruka foi bombardeado pela agitação costumeira do Colégio Senju. Esfomeados lanchando antes do horário, desesperados fazendo suas lições minutos antes da aula começar, patotas comentando as últimas fofocas da semana. Por mais que já estivesse acostumado com tudo aquilo, o rapaz precisou cobrir os ouvidos por um momento e dar pequenos tapinhas no próprio rosto, tentando acordar pelo menos o seu sistema nervoso.
Todavia, assim que Tobirama Senju entrou em sua mira, Iruka soube que suas esperanças de ter um dia tranquilo estavam completamente fora da realidade.
Quer dizer, Iruka não o percebeu de imediato, já que uma pequena chama de positividade ainda queimava em seu peito. Então, apenas deduziu ser ele até sentir um aviãozinho de papel ser jogado em sua nuca. Ao levantar os olhos, observou ele inclinar a cabeça discretamente para o lado, indicando que fossem para um lugar mais reservado. Igualmente discreto, Iruka o seguiu de longe, mas não escondeu seu revirar de olhos com aquela situação.
Desde o início do terceiro ano, Tobirama e Iruka tinham um acordo onde o aspirante a jornalista resolveria grande parte dos trabalhos do metido a valentão, recebendo dinheiro em troca mediante o grau de dificuldade dos trabalhos. Então, quando as coisas apertaram, ele passou a contar com esse dinheiro muito mais.
Por conta disso, mesmo cansado na noite anterior, deu o sangue para resolver as questões daquela bendita lição de matemática duas vezes, uma para ele e outra para Tobirama.
Os dois estudantes foram parar na parte de trás da escola, onde ficava o porão cheio de entulhos e as salas que já não eram mais utilizadas. Tobirama estava encostado na parede de braços cruzados em uma típica pose marrenta de quem permanecia sem paciência vinte e quatro horas por dia. Mentalmente, Iruka desejou que ele pegasse aquela bendita lição e enfiasse onde o sol não bate, mas como não gostava de brigar, permaneceu firme no seu objetivo de entregar o que lhe foi mandado.
— E aí, Umino, trouxe a mercadoria? — Tobirama questionou baixo, como se os dois estivessem em um episódio de Narcos e ele fosse o Wagner Moura.
— Conforme o combinado. — Iruka respondeu, calmo, mostrando a lição copiada com uma letra impecável e respostas justificadas. Tobirama sorriu de canto e tentou alcançar a folha, mas o aspirante a jornalista a puxou de volta. — Dinheiro primeiro, mercadoria depois, por favor. Você sabe bem como funciona o meu esquema de resoluções.
Obviamente, o sorriso do valentão sumiu, dando lugar a uma boca torta e a um olhar incrédulo. Não precisou de muito para Iruka perceber que ele iria retrucar.
— Qual é a sua, hein, Umino? — Ele perguntou irritado, desencostando-se da parede e fechando os punhos em sua direção. — Quer cantar de galo pra cima de mim logo agora?
— Na moral, Tobirama, eu pedi por favor, então para com o seu show. — Iruka o interrompeu em um tom firme, fazendo a expressão raivosa de Tobirama se abalar. — Não sei se você sabe pensar em outras coisas que não sejam brigas com esse seu cérebro de marshmallow, mas todo mundo tem problemas. E os seus com certeza vão aumentar se eu me aborrecer e decidir contar sobre isso para o seu irmão. Eu vou ganhar uma suspensão e precisar limpar os corredores? Claro que vou. Mas eu te garanto que você tem muito mais a perder.
Ali estava o pulo do gato. O valentão era o irmão mais novo de Hashirama Senju, ex-diretor do colégio e professor de literatura japonesa. E se tinha alguém de quem Hashirama gostava, era de Iruka.
Sendo assim, como não era burro, Tobirama sabia bem que se o acordo fosse descoberto, ele traria vergonha ao sobrenome da família e Iruka sairia com, no máximo, alguns arranhões. Portanto, o rapaz engoliu em seco e retirou do bolso um bolo de notas amassadas, revirando os olhos para não perder a postura.
Iruka aceitou as notas de bom grado, entregando a lição em suas mãos e fazendo questão de sorrir falsamente.
— Foi um prazer fazer negócios com o senhor, jovem mestre Senju. Deseja um suco de uva para oficializar nossa parceria? — Iruka perguntou com a boca pingando sarcasmo e Tobirama rosnou, batendo os pés e voltando para dentro do colégio como em uma cena de novela. Iruka olhou-o com uma expressão enojada. — Vai é muito tarde, mimadinho.
Olhando toda aquela quantia em suas mãos, Iruka soprou uma risada por estar agindo feito o próprio Tio Patinhas, mesmo que a felicidade do Tio Patinhas fosse não gastar dinheiro e a dele fosse pagar a conta de luz.
Tranquilo e serelepe, o rapaz permitiu-se abrir um sorriso satisfeito e caminhou até o refeitório do colégio a fim de tomar a bebida da sua vida: Café expresso com creme de baunilha. Simpático como sempre, ele cumprimentou a senhora da cantina e sentiu-se realizado ao pagar apenas metade do preço por um copo largo. Ter bolsa integral em um colégio particular tinha lá suas vantagens, afinal.
Ao tomar o primeiro gole da bebida, seu corpo relaxou por completo e ele soltou um suspiro extasiado. Fazia meses que não tomava aquilo, mas ainda assim, possuía o mesmo gosto fantástico de sempre.
— Iruka!
A voz animada e enérgica assustou o rapaz, o fazendo agradecer por ter colocado o café em cima da mesa. Em seguida, abriu um pequeno sorriso. Não precisava nem olhar para adivinhar que o dono daquela voz era Maito Gai, que com sua silhueta atlética, calça skinny verde, colete preto e corte de cabelo no estilo tigela, apareceu em sua frente.
— Oi, Gai. — cumprimentou simpático, fazendo menção para ele se sentar. — Como você tá? Faz bastante tempo que não conversamos.
— Eu tô bem, Iruka. E você sabe bem que se eu não estiver, me esforço o dobro para estar! — Gai respondeu divertido, ajeitando suas polainas e fazendo o outro rir com seu jeitinho único de ser.
— Fico feliz pelas coisas não terem mudado entre nós. — Iruka disse genuinamente, suspirando aliviado e coçando a nuca.
Naquele momento, o rapaz sentiu, do fundo de seu coração, a necessidade de dar uma satisfação ao outro sobre o seu sumiço. Afinal, Gai estava lá como se aquele fosse um dia normal, daqueles onde os dois se encontravam para conversar antes da aula, como sempre faziam antes de tudo acontecer. Portanto, foi o que fez.
— Me desculpa por estar tão ausente, Gai, de verdade. É só que a minha vida se transformou naquela fase difícil dos joguinhos de uma hora para a outra e eu continuo pensando em como vencer essa gameplay.
Gai riu baixinho, debruçando-se sobre a mesa e sorrindo gentilmente.
— Você não precisa se desculpar, meu amigo. Sei que estamos meio afastados, mas preciso que saiba que, pelo menos de minha parte, a nossa conexão sempre vai ser a mesma. Contudo… — A feição do rapaz tornou-se um tanto séria e ele segurou as mãos do outro. — Eu confesso que estou preocupado com você. Não só eu, mas também o clube do jornal e principalmente o Hashirama. Você está se cuidando direito?
Desde que entrou no Colégio Senju, Gai foi o seu primeiro e único amigo. Iruka até tinha alguns colegas de sala e conhecidos de outros anos, mas no fim do dia, era o presidente do clube do jornal que estava ali para ele. A amizade deles era tão forte que no dia do aniversário de 18 anos de Gai, eles prometeram ser melhores amigos para sempre e choraram agarrados como se tivessem bebido todas.
Por isso, Iruka nunca mentia para o melhor amigo. Entretanto, como a pessoa que era, não podia preocupá-lo, e esse foi um dos motivos para ter se afastado logo que as coisas se tornaram turbulentas demais.
Iruka suspirou pensativo e então deu um pequeno sorriso.
— Eu estou sim, Gai, não precisa se preocupar. Faço minhas refeições, descanso quando posso e o principal: Sempre tomo banho. — O rapaz respondeu divertido, omitindo certos pontos e o principal: fez o outro rir. Seu melhor amigo balançou a cabeça, suspirando e, enfim, dando um sorriso.
— Sendo assim, eu fico mais tranquilo. Todavia, qualquer coisa que você precisar, pode contar comigo. Cada um de nós sabe onde o seu calo aperta, mas isso não significa que tenhamos que ir ao podólogo sozinhos. Olha, às vezes, o Tobirama enche o meu saco, mas eu aprendi a não ligar e conseguir passar de fase no joguinho. Claro que às vezes irrita, mas…
Assim que ouviu a palavra “Tobirama” na fala do amigo, a pose de Iruka tornou-se defensiva e ele fechou os punhos sem perceber.
— Qualquer coisa grave que aquele idiota fizer com você, nem pense duas vezes em me chamar. — Iruka o interrompeu com a voz firme e a expressão séria. Contudo, ao perceber que estava dando muito na cara, suavizou seus gestos. — Quer dizer, você sabe que eu sou um dos favoritos do Hashirama, então né…
O presidente do jornal soprou uma risada, assentindo.
— Sim, eu sei, obrigado por se preocupar. Aliás, é legal ver que você se tornou ainda mais protetor do que antes. Mas, olha, não esqueça de que você também precisa de proteção. Se cuida.
Antes que pudesse raciocinar sobre aquela frase, o sinal de entrada tocou. Gai sorriu em despedida e piscou, correndo para a sua sala. Enquanto isso, Iruka pegou seu café e caminhou calmamente até a sua, não podendo deixar de perceber a mais pura verdade presente nas palavras do melhor amigo. Seu instinto de proteção aflorava com todos que ele amava, menos com ele mesmo.
Logo que avistou a porta da sala, Iruka decidiu aproveitar a oportunidade para sentar no fundão e tirar um bom cochilo. O Iruka de antes com certeza abominaria essa atitude com todas as forças, mas as circunstâncias agora eram outras. Contudo, seu plano foi por água abaixo quando se deu conta de que aquela era justamente a aula de Hashirama.
— Mais essa agora. — Iruka murmurou cansado, jogando o copo de café vazio na lixeira e dando o melhor sorriso que pode. Mesmo aquele não sendo um dia fácil, ainda era aula de literatura japonesa.
Assim que entrou na sala, não sentou nem na fileira da frente e nem nas carteiras amontoadas no fundão. Seu lugar foi extremamente estratégico e perspicaz: Atrás da longa cabeleira de Hiashi Hyuuga. Assim, caso perdesse a batalha contra o sono, poderia dar um pequeno cochilo encostado na parede, totalmente camuflado.
Entretanto, Iruka não sabia que estava sendo observado.
Vendo o seu aluno mais brilhante e dedicado naquele estado — não só durante as aulas, como também nas outras dependências do colégio — com enormes olheiras no rosto e transbordando cansaço, Hashirama só conseguiu ficar mais preocupado. Iruka era o próprio significado da palavra “desanimado” e qualquer um conseguia perceber isso.
Após a morte de Minato e Kushina, Iruka perdeu seu brilho. Diante daquela situação, Hashirama soube que precisava fazer algo. Sendo assim, depois de tanto pensar, ele chegou a uma conclusão.
— Bom dia, pequenos! — O professor cumprimentou de modo carinhoso, recebendo sua resposta em uníssono. — Então, eu estive pensando e como estou de bom humor, resolvi liberar vocês mais cedo.
Não só Iruka arregalou os olhos, como também o resto da sala se espantou, fazendo com que uma onda de gritos surgisse e todos começassem a pegar suas mochilas, levantando-se para ir embora.
Todavia, mantendo o sorriso no rosto, Hashirama deu uma única batida no quadro e foi o suficiente para todos fazerem silêncio.
— Contudo, antes disso… — tornou a falar, assistindo a curiosidade se multiplicar nas faces de seus alunos. — Por conta de estarmos no período final do ano letivo, eu pensei em passar um trabalho cuja pontuação será igual a metade da nota de vocês. Entretanto, a melhor parte disso é que nesse trabalho, vocês poderão soltar a criatividade aos montes.
“Não sei por que, mas eu sinto que vem algo pesado por aí. E o pior, esse peso vai cair em mim.” Iruka pensou com seus botões, tão curioso quanto seus colegas. Até mesmo porque, todas as vezes que Hashirama inventava de passar aquele tipo de trabalho, ele era sempre o primeiro a ser oferecido para jogar-se ao mar.
— Bem, antes que vocês morram de curiosidade, eu vou dizer logo. — Hashirama disse divertido. — Vocês terão que escrever um artigo de cunho jornalístico cujo principal intuito é chamar a atenção das pessoas da idade de vocês. Pode ser sobre qualquer assunto, atual ou antigo. O importante é ser interessante para o público jovem.
Ao ouvir a explicação do professor, o coração de Iruka foi invadido por uma sensação calorosa. A verdade era que ele achava que toda a vontade de perseguir o sonho de ser jornalista havia se esvaído, mas algumas faíscas esperançosas permaneceram ali, escondidas nas entrelinhas de sua tristeza. Isso fez Iruka sorrir aliviado.
Todavia, sua mente logo entrou em ação, lhe fazendo ver as coisas por outro ângulo. Aos 45 do segundo tempo, Hashirama inventou de passar aquele trabalho exigindo algo que ele não encontrava há tempos: criatividade. A rotina desgastante acabou com a imaginação de Iruka e o jovem murchou igual uma rosa no inverno.
Enquanto estava pensativo, as reações do restante da turma se dividiam entre pessoas que não estavam nem aí, curiosos querendo os pontos preciosos da tarefa e alguns gatos pingados realmente animados. Ao ver aquele alvoroço todo, o herdeiro dos Senju não pôde conter o sorriso enorme que adornou seu rosto.
— Fico feliz que tenham achado a proposta interessante! — Hashirama exclamou, satisfeito até demais na visão de Iruka. — Ah, um bônus: A entrega é na semana que vem. Até mais, pequenos.
Iruka sorriu aliviado, sentindo todos os pesos do mundo sendo tirados das suas costas. Naquele ritmo, daria tempo de reescrever um de seus rascunhos antigos da época em que ainda fazia parte do jornal e finalizar tudo com uma edição monstruosa. Afinal de contas, mesmo estando só o pó da rabiola, não iria entregar uma porcaria.
Logo, a turma começou a sair da sala animadamente. Iruka também arrumou suas coisas, caminhando rumo a liberdade. Entretanto, quando iria colocar o pé no corredor, ouviu a voz do professor.
— Iruka, por favor, fique. Quero falar com você.
O rapaz suspirou cansado, virando o corpo na direção do professor e caminhando até ele. Logo agora que ele se permitiu dar um sorriso genuinamente feliz, sua felicidade tratou de evaporar.
O professor de literatura soltou um longo suspiro e lançou um olhar intenso na direção de seu aluno.
— Olha, Iruka, eu sei que as coisas estão difíceis para você e se não fosse realmente necessário, eu não pediria isso. Entretanto, são tempos desesperados. — O homem então levantou-se e apoiou as mãos na mesa, em uma postura angustiada. — Eu não sei se você sabe, mas a Tsunade vai descontinuar o jornal depois da semana que vem. Isso porque dos doze membros anteriores, somente quatro permaneceram e há tempos que ninguém se interessa por ler as matérias, mesmo com a criação do blog de notícias. Você entende o que é isso?
Iruka estava chocado. Não fazia a menor ideia de que a situação havia chegado àquele ponto. Gai não disse nada sobre a saída dos membros e muito menos contou que Tsunade Senju, a sobrinha de Hashirama e nova diretora desde o começo do ano, tomou uma decisão daquele porte relacionada a algo tão tradicional quanto o clube do jornal.
Nesse momento, embora não soubesse o porquê, Iruka sentiu-se terrivelmente culpado.
— Poxa, professor, eu… e-eu não sabia… — respondeu, gaguejando um pouco por conta da surpresa que era visível em seu rosto.
Hashirama suspirou, voltando a se sentar.
— O único motivo de eu ter inventado esse trabalho foi para você ter uma desculpa e finalmente voltar a escrever. E também, para, quem sabe, os alunos se interessarem pelo gênero e perceberem que redigir um artigo não é tão chato quanto parece. Contudo… — O professor olhou para seu aluno com esperança no olhar. — Você é a nossa maior esperança, Iruka. Lembra de quando os seus olhos brilhavam ao escrever os artigos para o jornal e perceber que seus colegas gostavam? Lembra de quando você me dizia que tudo o que mais queria era ser jornalista? Eu sei que essas lembranças ainda permanecem em você, embora a frustração e a tristeza tentem te dizer que não.
Hashirama uniu as mãos em um sinal de pedido e curvou-se, fazendo Iruka arregalar os olhos e não saber como reagir ao gesto.
— Eu e o clube precisamos de você. E nesse momento, precisamos do seu melhor artigo. Então, por favor, nos ajude.
O coração de Iruka batia descontrolado. Suas emoções estavam divididas entre negar imediatamente e aceitar prontamente. No entanto, ao ver a confusão em seus olhos, Hashirama sorriu compreensivo.
— Por mais que você não acredite em si mesmo, eu acredito em você. Um dia, você vai se tornar um jornalista tão bom quanto o seu avô. Mas para isso acontecer, você não pode desistir no meio do caminho. Não vou forçá-lo a escrever o artigo, mas espero que pense com carinho, tudo bem? Pode ir, está liberado.
Iruka curvou-se em despedida e saiu da sala, fechando a porta com cuidado e encostando-se nela, soltando um suspiro agoniado. Quando finalmente caiu na real sobre o que havia acabado de acontecer, arregalou os olhos e engoliu em seco, tendo somente uma palavra ecoando em toda a sua mente.
— Fodeu.

💋


Após uma longa e quase interminável semana, o domingo finalmente chegou. E com ele, todos os efeitos tranquilizantes que apenas um fim de semana era capaz de trazer.
Todavia, Iruka sentia-se o único da face da terra que não estava sendo tomado por esses efeitos. Aquele deveria ser um dia bonito, próprio para descansar e praticar a paz interior em frente à televisão, assistindo a sagrada maratona de Harry Potter do Canal 6. Entretanto, é impossível se manter pleno quando reclamações de clientes e problemas de exatas decidem fazer uma festinha de última hora em sua mente.
Contudo, existia algo muito pior acontecendo. Algo que o atormentava mais do que o último aviso para pagar a conta de luz: O bendito artigo de jornal que Hashirama inventou de passar. Além disso, existia a maravilhosa responsabilidade pela qual ele estava incumbido: Salvar o clube do exílio total. Tão fácil quanto passar de fase em Dark Souls.
"Belíssima decisão, claro que sim." Iruka pensou irônico, balançando a cabeça ao lembrar das palavras do professor ao comunicá-lo sobre sua “tarefa extra”. Contudo, sua ironia não era capaz de minar toda a falta de criatividade e tempo presentes nos rascunhos feitos por si, fazendo com que eles não fossem nem ao menos dignos de uma matéria decente.
— Sinto como se eu fosse explodir a qualquer momento. Talvez fosse bom fazer um retiro espiritual e viajar para as montanhas tal qual Shiryu? — Iruka perguntou divertido, tentando "achar graça na própria desgraça", como Minato costumava dizer quando se via em uma enrascada.
Do outro lado do celular, Gai suspirou, empático.
— Iru, eu sinto muito. Se eu soubesse que as coisas iriam piorar para o seu lado, eu jamais teria aberto o bico pro Hashirama. — O jovem respondeu, um tom culpado em sua voz. — E também teria contado tudo diretamente para você. Acho que seria mais fácil para nós dois.
Iruka sorriu compreensivo. Embora ele não tivesse, tecnicamente, ajudado, saber da preocupação do melhor amigo em fazer algo lhe deixou realmente muito feliz.
— Não é sua culpa, Gai. Na verdade, eu fico grato por ter se importado comigo a ponto de ligar para saber como eu estava em relação a isso. — O aspirante à jornalista agradeceu doce e nem precisou pensar muito para saber que o amigo sorria.
— Somos amigos, amigos não agradecem por essas coisas, Iruka Umino! — Gai disse firme e com uma pitada de diversão, fazendo o outro rir. — Olha, caso seja mais fácil, você pode escrever sobre qualquer coisa. Ou melhor ainda: Eu posso escrever pra você! O que acha?
Iruka sorriu tristemente. Àquela altura do campeonato, mesmo com pequenas feridas espalhadas sob seu orgulho — o qual ele, aos poucos, deixava de ter, mesmo isso não lhe agradando nem um pouco —, estava disposto a pedir que o melhor amigo escrevesse a matéria por ele, somente para se livrar daquele fardo em forma de tarefa.
Contudo, era esperto. Não só ele, como Hashirama. E mais do que esperto, Iruka Umino era sincero e leal.
— Obrigado, Gai, mas na primeira palavra em que o Hashirama batesse o olho, ele saberia que a escrita não é minha. — O rapaz respondeu, soltando um suspiro cansado. — Além disso, eu prometi que iria fazer. Pressionado, pois ele começou a me abordar em todo lugar para perguntar sobre? Sim, mas ainda assim prometi. Então já era.
Os dois riram com a fala e Gai assentiu compreensivo.
— De qualquer forma, saiba que eu estou sempre aqui pra te ajudar, Iru. — O chefe do jornal disse docemente e ele soube que era verdade.
— Obrigado, de novo, amigo. E desculpa por acabar falando mais do que você queria saber a essa hora da noite. Afinal de contas, precisamos acordar cedo amanhã.
— Que nada. — O outro respondeu em um tom despretensioso. — Não tem problema nenhum. Aliás, quando essa correria acabar, por que não saímos para algum lugar legal? Comer bastante, rir muito e conversar sobre a vida como sempre fazíamos antes. Seria incrível.
Iruka sorriu animado. Era óbvio que uma saída daquelas era pouco improvável, quase impossível, visto que ele não tinha tempo nem para respirar. Entretanto, a esperança era a última que morria e ele não seria insensível ao ponto de negar algo para o melhor amigo.
— Seria incrível mesmo. Quem sabe um dia, né? — Iruka deixou a opção em aberto e isso pareceu deixar Gai satisfeito. Após se despedirem, o rapaz encerrou a ligação.
Em seu quarto, Iruka sentia-se em uma daquelas cenas de filme onde o personagem andava de um lado para o outro tentando achar uma solução para o problema. O rapaz tentou de tudo. Escreveu alguns rascunhos, mas acabou deletando todos. Rodopiou pelo cômodo, ficou de cabeça para baixo a fim do sangue descer para o cérebro. Rascunhou coisas à mão, mas ficou tão insatisfeito que fez a lixeira transbordar.
Quando finalmente se cansou das tentativas frustradas e sem sucesso, ele jogou-se na cama, a maciez do edredom acariciando suas costas. Sem ideias e com o peso do mundo sobre seus ombros, o jovem sentiu-se tão perdido quanto Roronoa Zoro em qualquer arco de One Piece.
Após se revirar na cama por alguns segundos, deitou de lado e seus olhos capturaram a imagem do pequeno echo dot em cima da mesinha de cabeceira ao lado da cama. Ele sorriu.
A pequena caixinha multitarefas foi seu presente de aniversário. Ideia de Kushina e comprada por Minato, era um dos desejos de Iruka logo que descobriu poder fazer coisas através do comando de voz. Algo fascinante para sua criança interna, que amava tecnologia.
— Alexa… — Iruka chamou calmamente, observando a borda do aparelho transmitir um bonito azul neon. — Por favor, reproduza o recado de Casal do Ano.
Aqui está o recado de Casal do Ano nas gravações de voz. — O aparelho respondeu mecanicamente. Em segundos, as vozes de Minato e Kushina começaram a ecoar pelo quarto.
Ei, Iruka! Ou deveria te chamar de filho? Ou é muito cedo? AAAAAAH! — Minato disse animado, o jeito brincalhão e ansioso de ser fazendo o jovem rir. — Enfim, eu e sua mãe estamos gravando esse recado para te desejar feliz aniversário e te lembrar de que não importa a maneira, estaremos sempre com você. Sei que não sou seu pai, apenas um simples padrasto que ainda não é nem casado com a sua mãe. Entretanto, a verdade é que te considero um verdadeiro filho. Obrigado por ser um irmão tão bom para o Naruto.
Filhote, agora eu vou falar antes que esse tapado comece a dizer besteiras e acabe com o clima! — Kushina exclamou indignada e o rapaz riu ao ouvir o som do peteleco dado na testa de Minato, que gritou um “Ai!”. — Iruka, meu amor, feliz aniversário. Hoje você completa 18 anos e eu espero que venham muito mais. Obrigada por ser um garoto tão responsável e estudioso. Você honra o sobrenome Umino e faz jus ao legado do seu avô. Eu te amo pra sempre.
Então, as vozes cessaram. Iruka sentiu seus olhos encherem de lágrimas, enquanto seu coração doía de saudade. Não ouvia aquele recado desde seu último aniversário e a verdade era que, naquele momento, não poderia ter tomado uma decisão melhor. Era como se seus pais — pois Minato era sim seu pai e um de seus maiores arrependimentos foi não ter dito a ele antes — estivessem ali com ele. Mesmo longe, eles sempre lhe davam força.
Contudo, abanando o próprio rosto em busca de cessar um possível choro, o rapaz apenas absorveu aquele recado de coração aberto. Não era hora de entrar em prantos, afinal.
— Alexa… Ele tornou a dizer, a voz quebrada por conta das fortes emoções. — Tocar música aleatória.
— Aqui está um álbum que você pode gostar chamado Take Me Home de One Direction.
Dito isso, de todas as músicas do álbum que poderiam tocar, Kiss You foi a escolhida. O som da guitarra estridente e as vozes animadas invadiram o quarto e quebraram o clima triste e melancólico, fazendo parecer que Iruka estava em uma balada adolescente e isso o fez rir alto.
— Ai, Alexa, só você mesmo. — O jovem sussurrou divertido, tomando cuidado para que ela não escutasse e parasse a música. — Eu não tenho tempo e nem vontade de escrever um artigo, imagine beijar alguém. Além disso, eu…
Nesse momento, uma lâmpada da sabedoria desceu sobre a cabeça de Iruka. Antes que pudesse perceber, o jovem levantou-se da cama de supetão, tendo a ideia mais maluca e ao mesmo tempo mais supimpa que sua mente cansada poderia ter com aquela referência.
— E se eu escrever uma matéria sobre uma pessoa que beijou um monte de pessoas e se tornou expert nisso? — Iruka perguntou retoricamente, arregalando os olhos e sorrindo ao perceber a genialidade daquela solução. — Sim, é isso! Quando se trata do assunto beijos, o público adolescente sempre quer saber mais, ansiosos para virar a página. Pronto, decidi!
Contudo, tão rápido quanto a ideia surgindo em sua cabeça, o sorriso do rapaz murchou e o brilho de seus olhos apagou ao lembrar de um mínimo, e quase insignificante, detalhe: Ele não conhecia ninguém que havia beijado horrores. As únicas pessoas que comentaram sobre beijos consigo foram Gai, no dia em que ficou com o Yamato da rua de baixo no parque de diversões e sua mãe, que adorava falar sobre ter ficado com todo mundo, mas nunca contava detalhes sobre isso. Sendo assim, nunca soube se ela estava brincando ou falando a verdade.
Iruka entortou os lábios, jogando-se na cadeira do computador e apoiando o rosto nas mãos. Como um futuro jornalista, mentir sobre alguém era algo que feria sua ética por completo, tanto por conta da profissão quanto por causa de seus próprios valores. Não poderia se dar ao luxo de desviar sua conduta daquela forma, contrariando a si mesmo.
Então, seus olhos desviaram para uma moldura em sua escrivaninha. A foto era do dia em que participou de uma festa de Halloween como Patrick Verona, o personagem principal de “10 Coisas que Eu Odeio em Você”, um dos clássicos favoritos de Kushina. Inclusive, ela tirou a foto.
Naquele momento, um estalo soou em seus ouvidos. Se ele não podia mentir sobre os outros porque feria sua ética, e nem conhecia alguém com uma história concreta sobre sair por aí beijando todo mundo, o que seria perder um pouco de dignidade e escrever sobre si mesmo?
— Mas… eu nunca beijei ninguém. Como vou fazer isso dar certo? — Iruka perguntou a si mesmo, o tom baixinho feito o miado de um gato, como se alguém estivesse ali para ouvir.
Sim, Iruka Umino era BV. Boca Virgem, a categoria mais temida pelos jovens em quase todas as etapas da educação escolar. Entretanto, nunca deu muita importância ao fato. Para ele, a parte mais difícil de sua vida, isto é, sua sexualidade, já havia sido entendida sem que precisasse beijar alguém. Logo, não é como se encostar os lábios nos de alguém fosse um grande feito. Todavia, rapidamente percebeu que, naquele instante, era.
Iruka olhou para o relógio do celular, o qual marcava 01:00 da manhã de segunda-feira. O jovem olhou para a foto, para a tela do computador e para seus dedos. Engoliu em seco.
— É, Iruka Umino. Vamos te transformar no Mestre do Beijo.
Após anunciar seu próximo ato e soltar um longo suspiro, Iruka começou a procurar diversas matérias sobre beijos, desde artigos de sites sobre cultura pop até artigos científicos sobre o assunto. Ao terminar sua curadoria, visitou alguns rascunhos antigos de histórias românticas nunca terminadas e então juntou tudo, tecendo palavras feito uma aranha.
Quando finalmente terminou de escrever, converteu a matéria em PDF e a mandou para Gai pelo aplicativo de conversas junto a uma pequena mensagem.

Iruka Meu Bestie <3: O monstro veio ao mundo, Maito Gai. Só espero que ao invés de destruir o planeta, ele possa ajudá-lo. Obrigado por tudo. <3

Dito isso, o aspirante a jornalista deu um último sorriso e se jogou na cama, capotando em seguida e mergulhando no mundo dos sonhos, comemorando com algodões doces, sorvetes e ursinhos de pelúcia, o incrível fato de ter sobrevivido a missão de criar o artigo perfeito.


💋


Iruka estava de bom humor.
Sim, ele verdadeiramente estava de bom humor, sem mentiras ou ironia escondidas entre as entrelinhas da frase. Eram apenas sete da manhã, mas seu rosto ostentava um sorriso brilhante. Usava o cabelo preso em um bonito e enorme coque, uma calça preta com rasgos no joelho, vestia seu moletom favorito e nos pés, calçava seu all star verde surrado de sempre. Para finalizar, estava tão cheiroso quanto um jardim de rosas.
A princípio de curiosidade, o que o levou a estar tão bem assim foi uma maravilhosa sequência de fatos: A entrega do bendito artigo idealizado para estressar qualquer um, o café da manhã que ele finalmente conseguiu comer sem pressa por ter acordado cedo o suficiente e a ajuda que deu para Naruto em seu dever de casa graças a sua disposição, resultando em uma alegria imensa, pois seu irmão entendeu tudo o que ele explicou.
Resumindo, Iruka sentia-se extremamente calmo e andava pelos corredores do Colégio Senju com uma postura leve e despreocupada. E, por um segundo, em sua cabeça ingênua e esperançosa, ele realmente achou que o resto do seu dia seria assim, pacífico, do jeito que ele sempre quis ser.
Todavia, logo que saiu de dentro do seu mundinho verde cor de oliva — sua cor favorita —, Iruka tomou um susto. Todos, absolutamente todos, olhavam para ele. Então, o rapaz foi tomado por um misto de confusão e medo que o fez manter o equilíbrio o máximo que pôde, a fim de que suas pernas bambas não lhe deixassem cair ali no meio do povo.
E como ele era alguém que percebia as coisas por etapas, a resposta para aqueles olhares veio quando seus olhos alcançaram os inúmeros exemplares de jornal presentes na mão de todos. Tal qual o dia em que Hashirama passou o trabalho, seu primeiro pensamento foi somente "fodeu".
Entretanto, antes que pensasse em um de todos os prováveis motivos para a curiosidade das pessoas acerca do artigo e, consequentemente, sobre a sua lascada e esforçada pessoa, alguém apareceu do além, puxando-o e fazendo ele sair do transe enquanto ambos andavam pelo corredor.
— Anda, Iru, o pessoal do jornal quer te ver!
Ao escutar aquela voz animada, nem precisou de muito para Iruka perceber que o misterioso alguém era Gai e que ele o levava em direção a sala do jornal da escola.
— Gai, o que aconteceu? O artigo é uma merda, né? Ninguém gostou e agora acham que eu sou um safado. Deu merda, não deu? Me fala! — Iruka se debandou a perguntar, deixando de ser puxado quando os dois pararam em frente a porta do cômodo escolar, voltando a se preocupar.
Gai revirou os olhos, mas sorriu em seguida.
— Deixa de ser maluco, Iruka! O artigo é maravilhoso! Aliás, deu bom até demais! — Gai respondeu divertido, rindo por conta do trocadilho…
O jovem deu um sorriso aliviado, sentindo o peso sair de seus ombros e lhe deixar tão leve quanto uma pluma. Então, Gai o puxou mais uma vez, lhe fazendo adentrar o clube.
De repente, o aspirante a jornalista se viu na sala onde, durante dois anos, dedicou sua vida a cada matéria que saía daquele lugar. Iruka olhou para os membros restantes, todos em pé e sorrindo para si, lhe dando a certeza de que não estavam magoados pelo seu sumiço.
Contudo, ele sabia que devia grandes desculpas ao seu pessoal. Não só pelo sumiço, mas pela falta de consideração com muitos deles. Então, o rapaz respirou fundo.
— Gente, eu… — começou, mesmo sem saber direito o que falar, mas com muita vontade de ser perdoado.
Todavia, não conseguiu terminar. Isso porque, para sua surpresa, foi interrompido por uma chuva de comentários e elogios sobre o seu artigo.
— Iruka, eu amei a matéria! Coesa, interessante e muito divertida. Eu amo saber mais sobre isso! — Sakura Haruno, do segundo ano, comentou animada.
— Eu adorei as palavras que você usou. Uma mistura de formalidade com linguagem jovem que realmente me prendeu na leitura. — Chouchou Akimichi, a mascote do clube e aluna do primeiro ano, elogiou sorridente enquanto comia um pacote de salgadinhos.
— Eu senti muitas saudades de ler algo seu. Você sabe mesmo escrever coisas boas, Iruka. — Genma Shiranui contou nostálgico, um sorriso genuíno pairando em seus lábios.
Iruka estava chocado. Não sabia que uma matéria daquelas, algo tão simples — embora sendo fruto de tanta pesquisa — poderia agradar um público que, assim como ele, era extremamente exigente com as publicações no jornal da escola. Ainda que tudo escrito ali fosse pura mentira, o jovem se sentiu muito feliz.
— Poxa, gente… Muito obrigado, de verdade. — Iruka agradeceu um tanto sem graça, abrindo um sorriso pequeno e olhando curioso para o melhor amigo. — Mas tem uma coisa estranha nessa história: Eu te enviei esse arquivo hoje de madrugada, como você conseguiu publicar tão rápido?
Gai sorriu animado, batendo palmas. Estava unicamente esperando Iruka perguntar para que desatasse a falar.
— Primeiramente, eu confesso que eu estava ansioso para você desligar a ligação, já que eu queria maratonar Cobra Kai. — Gai sorriu amarelo e fazendo o melhor amigo lhe olhar indignado. — Eu sei, eu sei. Eu poderia ter pedido para você desligar antes, pois somos amigos e você não iria se incomodar, mas esse não é o ponto. O fato é que: Eu estava bem feliz e pleno, pronto para assistir o primeiro episódio e foi então que recebi a sua matéria. Como um bom melhor amigo, decidi ir ler logo para te dar uma força e quando percebi, já tinha devorado tudo. — O chefe do jornal contou e Iruka arregalou os olhos. — Então, eu decidi ir dormir para poder acordar cedo, no pique para minha corrida matinal e também para publicar o seu artigo o mais rápido possível. Falei com o porteiro, ela me deixou entrar e mandei seu artigo para esse bando de corujas — Gai apontou para o restante dos membros do clube e todos começaram a rir. — Eles adoraram tanto que vieram me ajudar a distribuir.
Iruka estava maravilhado e agradecido por aquele esforço enorme. Eles tinham feito tudo aquilo por ele, só porque gostaram do seu artigo. Ao mesmo tempo que sentia uma imensa felicidade, sentia uma vontade gigantesca de chorar pela culpa que a mentira depositava em si.
— Depois de tudo isso, você tem que nos valorizar, né, Iruka? — Chouchou alfinetou divertida e ele concordou prontamente, rindo junto aos outros.
— Mas, Iruka, a pergunta que não quer calar é: Você vai voltar para o jornal?
E diante da pergunta de Shino Aburame, todos olharam para Iruka com uma expectativa fora do comum. Então, ele se viu em um impasse. Não sabia o que responder. Não queria magoá-los, mas como dizer que só escreveu o artigo por conta do pedido de Hashirama?
Entretanto, antes que começasse a pensar em uma fala convincente, o próprio Hashirama o interrompeu, abrindo a porta da sala de maneira calma.
— Bom dia. — O professor desejou sorridente, tendo o jornal em suas mãos.
Subitamente, uma vergonha tomou conta do corpo de Iruka. Ele realmente leu um artigo com 100% de teor adolescente e ainda estava com um sorriso no rosto?
— Iruka. Sabia que te encontraria aqui. — Hashirama tornou a falar e o rapaz engoliu em seco, sorrindo pequeno. — Quando eu pedi para você escrever uma matéria, confesso que esse assunto não é bem o que eu pensava ou até mesmo esperava, embora esteja dentro do que eu pedi.
Assim que ele disse isso, mesmo usando em um tom divertido, Iruka sentiu vontade de se enfiar em um buraco.
— Contudo… — O professor continuou e o jovem levantou o olhar. — A sua habilidade de escrita é tão boa que me deixou imensamente interessado, ao ponto de não conseguir parar de ler até avistar a última linha. Me senti nos anos 90, na época em que eu era adolescente e achava que treinar beijos com frutas não era nem um pouco vergonhoso.
Todos riram alto com o momento nostalgia do professor, que sorriu divertido. Hashirama olhou para seu aluno com orgulho transbordando em seus olhos.
— É, Iruka, parece que você não perdeu o hábito de nos surpreender. Que bom.
Dito isso, ele foi embora, fazendo uma centelha de esperança e felicidade se acender em Iruka. Hashirama estava orgulhoso e ele era o motivo daquele orgulho. Pensar nisso fez com que uma faísca de culpa aparecesse em si. Então, ao olhar para seus companheiros, soube exatamente o que precisava fazer para se redimir.
— Ok, gente. Vocês venceram. — Iruka disse por fim, soltando um leve suspiro e colocando as mãos no bolso. — Eu volto a participar do clube. Todavia, só volto para cá se eu puder escrever uma matéria por semana. Sei que é muito pouco, mas minha vida está uma correria e não estou tendo tempo nem para mim mesmo. O que vocês acham?
Os membros do jornal se olharam por alguns segundos. Eles tinham expressões nada contentes em seus rostos e o jovem engoliu em seco, achando que estava sendo exigente demais para quem acabara de voltar. Contudo, quando eles sorriram em sua direção, sentiu um alívio enorme.
— Claro que te aceitamos de volta, né, Iru? — Gai questionou retoricamente, um sorrisinho no rosto e as mãos na cintura. — Até se você viesse para cá e ficasse só jogado em um dos puffs sem fazer nada, a gente te aceitava. Que saudade de você, melhor amigo!
Logo, o aspirante a jornalista foi rodeado pelos colegas e um abraço em grupo se formou, fazendo o coração do rapaz ficar quentinho e seguro.
— Caramba, gente, vocês me assustaram bonito, hein? — Iruka confessou, soltando um suspiro aliviado e fazendo todos rirem. Rodeado por todo aquele amor e admiração, o rapaz percebeu o fato mais óbvio de sua vida: Sentia-se bem como em nenhum outro lugar.

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Após o fim da segunda aula, Iruka saiu calmamente da sala e sentiu-se como Cristiano Ronaldo em sua viagem para a Eurodisney, de tanta gente que havia lhe reconhecido. Se aquilo continuasse, estava realmente cogitando comprar uma peruca para passar despercebido pelos corredores.
Muitas pessoas vieram falar com ele, até mesmo gente que jurava não saber da sua existência. Todos o elogiavam, agradecendo pelas dicas e comentando sobre sua performance, perguntando porque ele não contou antes sobre seus feitos para a galera do colégio.
"Deve ser porque é mentira, né?". Essa era a resposta mental de Iruka, mascarada por um sorriso amarelo e pela clássica e estratégica fala sobre ter um pouco de vergonha de mostrar esse seu lado para o mundo. Afinal, aquilo envolvia outras pessoas e não era legal divulgar nomes.
Ao finalmente conseguir se desvencilhar daquela multidão de adolescentes e jovens adultos cheios de hormônios, o jovem agradeceu aos céus por chegar ao refeitório vivo, sorrindo abertamente ao perceber que a senhorinha da cantina vendia taiyakis com recheio de azuki.
Feliz da vida, Iruka comprou três daqueles deliciosos bolinhos e para acompanhar, uma coca-cola trincando de gelada. Prevenindo-se de possíveis ataques dos curiosos, ele sentou-se em uma mesa mais escondida. Contudo, como a vida nunca segue os nossos planos, uma sombra apareceu.
Quando ele levantou o olhar, teve a certeza de estar em um filme clichê dos anos 2000. Sim, era Tobirama.
— Então quer dizer que o senhor é O Mestre do Beijo? — Tobirama questionou debochado, o sorrisinho de canto como o de quem não acreditava nem um pouco naquilo. — Nossa, Umino, não sabia da existência de um lado extraordinário na sua vida chata. É interessante saber que um nerd já pegou mais pessoas do que os populares dessa escola.
Iruka engoliu em seco. Sabia que se não fosse convincente, Tobirama poderia acabar com a sua farsa naquele minuto. Por isso, respirou fundo e tentou se manter confiante.
— Bem, é óbvio que não. Afinal de contas, não é algo que eu goste de falar aos quatro ventos. Entretanto, agora que voltei ao jornal da escola, achei interessante compartilhar esse triunfo para comemorar, só isso. Uni o útil ao agradável. — respondeu despretensioso, tomando um gole de sua Coca-Cola e se mantendo o mais calmo possível.
Um silêncio pairou entre Iruka, Tobirama e os capachos do Senju mais novo. O metido a valentão lhe olhava como se o rapaz transbordasse mentiras por cada um de seus poros, o analisando tal qual um scanner de mercado. Iruka se manteve o mais firme possível, mas na sua cabeça, um alerta de cuidado piscava intensamente e ele acabou tremendo.
Então, como um plot twist que muda tudo aos 45 do segundo tempo, Tobirama subiu em cima da mesa, levantou a mão do rival e puxou um coro de gritos e palmas.
— Viva o Mestre do Beijo! — Tobirama gritou, sendo acompanhado pelo resto do refeitório. Iruka o olhou confuso e ele sorriu empolgado. — Temos nossas desavenças, mas depois de saber das suas aventuras, preciso te parabenizar pela coragem. Eu te respeito, Umino.
Naquele instante, rodeado por uma situação atípica e chocante, Iruka desejou que sua vontade de agradar todo mundo não o metesse em sérios problemas.


— Como essa matéria parece promissora, eu sugiro que a gente imprima pelo menos 25 cópias e distribua entre os pavilhões do colégio. Além disso, irei pedir para a Karui fazer o post no blog hoje mesmo. Do jeito que o pessoal está interessado no jornal nas últimas semanas, não duvido que será o link mais compartilhado nas redes sociais.
Iruka apresentou sua ideia com entusiasmo, as mãos na cintura e uma expressão confiante. Gai, de braços cruzados, assentiu sorridente e pôs o polegar para cima. O aspirante a jornalista também olhou para Tenten Mitsashi, a novata do primeiro ano que em poucos dias conquistou o cargo vago de vice-presidente ao mostrar toda a sua dedicação e esforço. Satisfeita, ela também concordou, abrindo um sorriso enorme.
Após a publicação do artigo intitulado “O Mestre do Beijo”, o clube do jornal do Colégio Senju ganhou uma popularidade imensa, recuperando o reconhecimento de antes e fazendo Tsunade desistir da ideia de encerrá-lo, para a felicidade geral de Iruka e do resto do clube, que comemorou com uma pequena festa regada a choro, refrigerante e risos.
E claro, com todos lendo as matérias e visitando o blog, novos membros começaram a chegar, como foi o exemplo de Tenten e também de Karui Kumo, não só habilidosa na área de mídias sociais — a sua função dentro do clube — como também uma escritora hiper talentosa.
— Vai ser incrível, Iruka! O artigo da Karui sobre o “Top 10: Cantores desconhecidos que vocês precisam escutar!” com certeza vai bombar! — Tenten exclamou animada e o rapaz concordou assentindo. Mesmo ela sendo tecnicamente sua “chefe”, não tinha um ar superior e era sempre enérgica e divertida. Isso fazia com que ele adorasse ajudá-la.
— Porra, prestem atenção, a Canino Branco vem aí!
Tanto Iruka quanto os outros membros do clube arregalaram os olhos ao escutarem aquelas palavras. A fim de confirmar a fala, correram para o lado de fora e se espantaram ao, literalmente, ver a verdade.
Em meio aos burburinhos curiosos e olhares atentos, os membros da gangue de motoqueiros Canino Branco caminhavam pelo longo corredor do pavilhão destinado aos clubes escolares. Conhecidos por serem típicos “bad boys” que sempre ganhavam rachas em Konoha, era a primeira vez que estavam sendo vistos pisando naquele ambiente.
Sasori Akasuna, Gaara Sabaku, Hoshigaki Kisame, Suigetsu Hozuki, Deidara Iwagakure e Zabuza Momochi. Os seis membros cujo nome e sobrenome eram conhecidos em todo lugar daquela cidade transmitiam um ar despojado e ao mesmo tempo misterioso, seus rostos expressando uma mistura de seriedade e calmaria enquanto tinham as mãos no bolso.
Contudo, alguém atraiu toda a atenção para si em poucos segundos, sem fazer esforço: Kakashi Hatake, o líder da Canino Branco. Com seu cabelo grisalho, a máscara estampada com o desenho de uma Kitsune — um símbolo tipicamente japonês que era a marca da gangue — e usando roupas sociais, ele vasculhava o lugar em busca de algo.
Em sua mente, Iruka tentava descobrir o que ele procurava. Não sabia qual era o interesse deles em visitar os clubes, pois Sasori e Deidara eram os únicos participantes de atividades extracurriculares. Todavia, Sasori era do basquete e Deidara, do vôlei. Logo, não havia lógica na presença deles ali sendo que a quadra ficava no outro lado da escola.
Ainda assim, o jovem obviamente não se atreveria a perguntar.
Entretanto, quando ele voltou ao mundo real, sentiu os olhares se voltarem para a sua pessoa. Confuso, ergueu as sobrancelhas e virou para seus colegas em busca de respostas. Nesse momento, o aspirante a jornalista percebeu que Kakashi Hatake finalizou sua busca, pois ele começou a andar em sua direção.
Iruka começou a suar de nervoso. Suas pernas e braços tremiam levemente e sua mente bolava diversas maneiras, vergonhosas ou não, de sair dali naquele exato instante. Entretanto, tentou disfarçar seu medo o máximo que pôde, já que não tinha feito nada para eles. Sendo assim, a possibilidade de sair dali todo retalhado era mínima.
— Amor!
O clima de tensão presente no corredor foi rapidamente cortado pela voz carinhosa de Tenten, que correu na direção de Gaara com os braços abertos. Gaara, por sua vez, sorriu abertamente e a rodopiou, beijando a garota e segurando em sua cintura. Não precisou de muito para o rapaz perceber que eles eram namorados.
— Então você namora, Tenten? Poxa, eu não sabia. — O aspirante à jornalista perguntou calmo, mas com o instinto protetor tomando conta de seu corpo. Embora conhecesse a garota há pouco tempo, já se preocupava.
Tenten, como uma boa observadora, logo notou o receio do amigo e sorriu gentilmente, no intuito de acalmá-lo.
— Sim, o Gaara é meu namorado. Não comentei antes pois não tive nenhuma brecha, mas namoramos desde o mês passado. Não se preocupe, ele me trata muito bem. Pode confiar.
Ao perceber que o olhar admirado e apaixonado de Gaara não saía de cima de Tenten, o jovem percebeu que não havia necessidade de palavras. Logo, se permitiu sorrir um pouco.
— Agora que tem certeza sobre Gaara ser um cara respeitoso e gente boa, eu poderia ter a sua atenção, Iruka Umino?
A voz grave e séria de Kakashi ecoou pelo corredor. Iruka desviou o olhar para o líder da Canino Branco, que estava de braços cruzados. De forma lenta, ele retirou a máscara do rosto, revelando a face pálida como um floco de neve, mas com olhos intensos feito uma noite de luar.
— Eu tenho um assunto de extrema importância, quase um segredo de Estado, para falar com você. Por isso, eu queria saber se podemos conversar em particular. Pode ser?
Obviamente, os cochichos aumentaram com a fala do líder, deixando todos interessados em saber qual era o “assunto importante”. Contudo, Iruka nem conseguiu questionar a si mesmo sobre isso porque estava muito mais preocupado em descobrir como recusar o pedido sem ser indelicado. E principalmente, sem levar um soco.
— Então… Kakashi. — Iruka começou, medindo todas as suas palavras com cautela e clareza. — Veja bem, não sei se poderia te ajudar agora. Sabe o que é? Eu preciso ir trabalhar hoje e não suporto chegar atrasado. Me desculpa, eu até… Gostaria de te ajudar, mas…
— É algo tão simples assim? — Kakashi perguntou retoricamente, descruzando os braços e sorrindo pequeno. — Não esquenta, proletariado. Eu levo você ao trabalho depois.
Embora falasse de forma gentil e divertida, a postura e os gestos do rapaz indicavam que ele não daria abertura para outra possível recusa.
Sem alternativas, Iruka suspirou baixinho e indicou o caminho para a sala do clube. Kakashi tomou a frente e ele o seguiu. Por sorte, as janelas tinham cortinas, as paredes eram isoladas acusticamente e a porta se encontrava devidamente trancada, imune aos possíveis fofoqueiros.
— É o seguinte, Iruka Umino. — Kakashi iniciou, afrouxando sua gravata preta. Por um milésimo de segundo, o rapaz observou aquele gesto com atenção, mas rapidamente disfarçou. — Eu li o seu famoso artigo e fiquei impressionado com as suas aventuras. Também achei interessante a forma como você as descreveu, boa o suficiente para me deixar curioso. Sendo assim, aqui vai a bomba: Nunca beijei.
Como previsto pelo líder da Canino Branco, Iruka arregalou os olhos e deixou seu queixo cair. Kakashi Hatake era justamente a pessoa com mais fama de pegador do colégio. Diziam as más línguas que, em todas as festas, ele ficava com pelo menos dez pessoas. Além disso, todos sabiam das suas maravilhosas habilidades na hora do beijo, e não só nessa hora. Aquela confissão não poderia ser verdade. Contudo, o que ele ganharia ao mentir para um simples camponês como Iruka?
— Como… como assim? — O rapaz perguntou confuso, coçando a própria testa. — Todo mundo nessa escola vive falando das suas qualidades nesse assunto e você sabe como essas coisas se espalham como água. Não é querendo ofender, Kakashi, mas é meio difícil de acreditar.
O líder soprou uma risada e sorriu convencido. Sentado na cadeira da escrivaninha de Iruka, posicionou levemente os pés em cima da pequena mesa.
— Deixa eu te contar uma coisa, meu bem. As pessoas mentem todos os dias. Uma informação falsa, porém bem elaborada, que caia nas mãos da pessoa certa faz toda a diferença. Além disso, não é como se eu ligasse para essa fama inventada de macho pegador, mas no mundo dos jovens, se você quiser ser respeitado, precisa ter uma reputação em relação a esse aspecto. Aliás, você deveria saber disso. Afinal de contas, jornalistas conseguem ser bem convincentes e persuasivos quando querem.
Iruka estava genuinamente chocado. Naquela breve conversa, Kakashi soltou pelo menos umas cinco informações sobre si, todas muito diferentes do que imaginava fazerem parte de sua vida e personalidade. Entretanto, ao ouvir a última parte da fala, engoliu em seco.
— Como você sabe sobre eu querer me tornar…
— Você trabalha no jornal da escola. Não é óbvio que tenha pelo menos um pouco de vontade de seguir carreira? — Kakashi questionou com as sobrancelhas levantadas.
Iruka suspirou aliviado, disfarçando o seu espanto repentino com a possibilidade de ele estar espionando sua vida e tentando assimilar aquelas informações. Nesse momento, algo veio à sua cabeça e ele se controlou para não ficar extremamente envergonhado.
— Então, se você nunca beijou ninguém… Quer dizer que também não fez… Sabe…
— Não, Iruka, eu nunca transei, chupei ou fiz qualquer coisa de cunho sexual com ninguém. — O jovem revirou os olhos, "discreto" e direto como sempre. Iruka quis se enfiar em um buraco e precisou pôr a mão no rosto para disfarçar as bochechas levemente coradas. Não que fosse inocente ou tímido para não ter conhecimento sobre o assunto, mas a forma como o outro falava era muito constrangedora em certos pontos. — Se eu nunca beijei, como poderia transar?
— Vai que, né? — O rapaz deu de ombros.
— Ah, entendo. — Kakashi estalou os dedos e sorriu pequeno. — O que você faz? Tudo. Só não beijo na boca.
Ao ouvir ele repetir a frase de Julia Roberts em “Uma Linda Mulher”, Iruka arregalou os olhos. Aquele era um de seus filmes favoritos no mundo inteiro. Ele e Kushina assistiam sempre que precisavam ter esperança nas pessoas. Percebia-se que sua mãe havia lhe ensinado cultura.
— Você conhece esse filme?
— O quê? O “bad boy” — Kakashi zombou, fazendo aspas na expressão e sorrindo divertido em seguida. — Não pode gostar de clássicos dos anos 90? Para alguém que aparenta ser mente aberta, você é bem ligado aos estereótipos, Iruka Umino.
Iruka imediatamente ficou sem graça e desviou o olhar, coçando a nuca e sabendo que ele estava certo.
— Desculpa.
— Não esquenta. Mas enfim, chega de enrolar, afinal eu não vim até aqui só para explanar os segredos da minha vida amorosa com você. — O rapaz tirou os pés da escrivaninha e se levantou, cruzando os braços novamente. — Quero sua ajuda para dar o meu primeiro beijo. Quero saber como chegar em certas pessoas da maneira correta. Como você sabe, eu não tenho experiência e quero aprender o máximo que eu puder antes de ter alguma.
Ao ouvir aquele pedido, um alerta de "Perigo!" começou a piscar freneticamente dentro da cabeça de Iruka. Era insano e, com certeza, Kakashi iria lhe desmascarar assim que começassem a treinar. Por um milésimo de segundo, pensou em entregar o jogo somente para ele, em troca de fugir daquela situação, mas seus pensamentos voltaram aos eixos.
— Olha… Eu não sei se… — Iruka começou, mas foi interrompido por notas de dinheiro que Kakashi retirou do bolso e quase esfregou em seu rosto. — O…. O quê…?
— Antes que você pergunte, não é dinheiro sujo. Sei que para quem nos observa como plateia e não participa como elenco, pode até parecer que mexemos com coisas ilegais, mas não colocamos nem ao menos um dedo do pé em esquemas como esses. Pense em nós como uma espécie de T-Birds japoneses. — O líder da Canino Branco sorriu divertido e antes que Iruka pudesse comentar algo sobre a referência a Grease, ele tornou a falar. — Eu sou muito sério em relação aos favores que peço. Por isso, por favor, me ajude.
Novamente, aquela frase pairava no ar. Todavia, ele não podia mais fazer isso. Não podia mentir, não podia desgastar-se fingindo ser algo que não era.
Iruka estava decidido. Iria recusar a proposta, por mais consequências que isso lhe trouxesse. Entretanto, antes que falasse, seu celular tocou.
— Alô?
— Oi, Iruka! É o Chouji, pai da Chouchou, do supermercado Akimichi!
— Olá, tio Chouji! — O rapaz cumprimentou sorridente. — Como você está? Aconteceu algo?
— Na verdade, aconteceu sim. A sua conta aqui está passando do valor limite e uma das senhoras da rua de baixo está sabendo. Então, mesmo que eu saiba da sua situação, eu preciso te cobrar, já que além da possibilidade de eu sair no prejuízo, o supermercado pode ficar com uma fama negativa. Você entende?
Iruka entendia, entendia e muito. Em cidade pequena, todo mundo sabia da vida de todo mundo e Konoha não era uma exceção. Assim que o boato de que ele não pagava suas compras se espalhasse, todos iriam querer anotar os pedidos na caderneta do supermercado e o pai de Chouchou iria falir, pois nunca nem veria a cor do dinheiro.
— Sim, tio Chouji, eu entendo. Não se preocupe, eu irei dar um jeito e quitar a minha dívida com o supermercado ainda essa semana, tudo bem?
— Tudo bem, meu filho. Avise a Chouchou para não chegar tarde em casa. Passar bem.
— Vou avisar sim. Passar bem.
Dito isso, o rapaz desligou o telefone e levou as mãos ao rosto, suspirando e pensando em como conseguiria dinheiro suficiente para deixar a conta zerada novamente. Ele olhou para Kakashi, que percebendo a situação do outro, sorriu gentilmente e estendeu o dinheiro.
— Precisamos aprender a interpretar os sinais que a vida nos dá. É pegar ou largar, Iruka. Mas eu quero muito que você pegue.
A sinceridade presente na fala de Kakashi chegava a transbordar, inundando o outro de dúvidas e possibilidades das coisas darem errado.
Iruka fechou os olhos. Precisava do dinheiro. Não era um luxo, era algo necessário. Sendo assim, respirou fundo, abriu os olhos e, enfim, assentiu.
— Eu aceito te ajudar.
Então, com um aperto firme de mãos, um sorriso animado de Kakashi e um sorriso amarelo de Iruka, o acordo que mudaria suas vidas para sempre foi firmado.

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Após se meter em confusões de diversos níveis, Iruka aprendeu que sua cabeça era tal qual um vulcão: Adormecida na maior parte do tempo, mas quando chegasse a hora de explodir, seria no pior momento possível.
Claro que, ao receber aquele dinheiro e conseguir quitar a dívida no Supermercado Akimichi, estava morrendo de felicidade. Contudo, quando voltou à realidade, o desespero bateu forte.
Como ele, Iruka Umino, iria dar aulas de beijo sendo o significado da expressão boca virgem?
Viciado em cultura pop, a única coisa que se passava em sua cabeça naquele momento era a possibilidade de ter alguma versão sua em um universo alternativo, onde fosse mais que um mestre, talvez um verdadeiro rei, do beijo e com a ajuda do Doutor Estranho, conseguiria ir para esse universo para pedir ajuda à si mesmo. Além disso, o Doc de “De Volta para o Futuro” também poderia aparecer para tranquilizá-lo e dizer que tudo deu certo, sendo extremamente otimista.
Obviamente, ambas as possibilidades eram muito boas para acontecer justamente com alguém que andava mentindo demais, e ele acreditava muito na frase “Se você plantar limões, não queira colher maçãs”.
Iruka bufou, saindo de seu mundinho imaginário e descendo as escadas em uma velocidade absurda. Eram nove da noite e, como sempre, Naruto assistia Frozen comendo alguma besteira da despensa, os olhos vidrados esperando a Elsa encontrar a mãe na caverna de gelo.
O jovem sorriu para o irmão e seguiu para a cozinha. Seus pensamentos começaram a aumentar, a casa pareceu encolher e ele iria ficar maluco. Por isso, resolveu preparar um combo que sempre lhe ajudava: Chá de camomila com leite e uma pílula de qualquer calmante.
Tiro e queda. Literalmente.
Entretanto, ao encostar o corpo no balcão para tomar seu chá, ouviu batidas frenéticas em sua porta que quase lhe fizeram derrubar a bebida. Iruka entortou os lábios e balançou a cabeça, se recompondo do susto e indo ver quem era. Quando abriu a porta e deu de cara com Gai e Tenten vestidos com roupas da SHEIN dos pés à cabeça, se assustou.
— Gente, o que vocês estão fazendo aqui na hora da novela das nove? E por que estão vestidos como se fossem para uma festa de arromba?
— Porque nós vamos para uma festa de arromba. E não é só uma, é A festa de arromba! — Tenten respondeu animada, o conjunto de cropped e saia justa brilhando ao mínimo reflexo da luz. — E você também vai!
Iruka se assustou novamente.
— Como assim eu vou? Vocês deviam ter me avisado antes! E a nível de curiosidade, posso saber onde é essa festa?
Nesse momento, Gai, que usava um conjunto de calça jeans, camiseta preta e inúmeros acessórios verdes, arregalou os olhos e colocou as mãos na cintura, tomando a palavra.
— Como você não sabe onde é essa festa? É naquela mansão no fim da sua rua! Lembra do Hiruzen Sarutobi, aquele veterano repetente que era um dos populares do Senju e irmão mais velho do Asuma? Parece que ele passou na Universidade de Konoha e tá dando uma super balada 0800 para comemorar! Vocês são praticamente vizinhos, como você não soube nem ao menos uma fofoca sobre isso?
“Não sabendo, gente! É pecado?” Iruka pensou, atordoado com tantas informações de uma vez. Em seguida, refletiu um pouco e decidiu que deveria ir até lá. Afinal, precisava esfriar a cabeça e tentar se divertir.
— Ok, vocês venceram, eu vou mesmo. Mas só porque é perto de casa e o Naruto pode sair correndo para lá se precisar de mim. — Ele respondeu finalmente, para a felicidade dos dois animados do rolê. — Só esperem eu me jogar uma água e escolher uma roupa decente. Entrem e fiquem a vontade. Juro que não vou demorar tanto assim.
— Os humilhados foram exaltados! — Seus amigos gritaram juntos, fazendo um high five e se jogando no sofá para fofocar com Naruto. Iruka riu soprado, balançando a cabeça e indo para o banheiro.
Após sair do banho, Iruka começou a se vestir. Escolheu um look básico: Seu melhor moletom, uma calça jeans skinny e um tênis básico. Não lavou o cabelo, pois daria um trabalho enorme para pentear, secar e finalizar com o tempo que tinha. Então, apenas passou um gel para seu coque ficar certinho e borrifou o perfume de Kushina em todo o corpo. Ao se olhar no espelho, sorriu e concluiu que estava bem arrumado.
— Tô pronto! — Ele anunciou e apareceu na sala novamente. Naruto e a dupla dinâmica do jornal lhe olharam de queixo caído e o rapaz se preocupou. — O que foi? Tá muito simples?
— Você está lindo, Iruka! — Tenten elogiou, maravilhada e sorridente. — Pessoas bonitas realmente não precisam de muita coisa para brilhar, não é, Gai?
— Com certeza, Tenten. — Gai concordou, cruzando os braços e abrindo um sorriso. — Iru, você tá um gato. Se eu não estivesse indo para lá, você seria o mais bonito da festa.
— Irmãozão, tenho que admitir: Vestido assim, você até fica menos feio do que de costume. — Naruto zoou, divertido, colocando a língua para fora e acabando com o clima motivacional, fazendo todos rirem.
— Obrigado, pessoal, eu fico feliz com os elogios. — Iruka agradeceu docemente, um tanto envergonhado e olhando preocupado para o irmão. — Naru, você vai ficar bem mesmo, né?
Naruto revirou os olhos.
— Óbvio, né, Iru? Eu não sou bebê de colo. Pode ir pra farra, prometo que não vou explodir, queimar ou quebrar nada.
Iruka revirou os olhos, mas acabou rindo junto aos amigos. Então, os aspirantes à Trio de Ouro desceram a rua em direção ao enorme casarão branco dos Sarutobi. O som que vinha do lugar era uma mistura de pop americano com música tradicional japonesa, fazendo o jovem concluir que Hiruzen possuía um gosto musical bem peculiar, de fato. Quando conseguiram entrar na “boate residencial”, Tenten e Gai se misturaram à multidão com a desculpa de que queriam conhecer mais gente e logo voltariam.
Falsos, traíras…! — Iruka murmurou baixinho, xingando mentalmente a habilidade social de seus amigos.
Com medo de se perder naquele oceano de saliva e corpos adolescentes fervendo de tanta excitação, o jovem ficou encostado no balcão da cozinha, protegendo ferozmente um copo de Coca-Cola. Estava ali para se divertir, mas não conseguia parar de pensar no assunto beijos.
De repente, percebendo estar em uma balada, teve a ideia mais maluca — porém pertinente ao momento — possível.
— Hoje, Iruka Umino vai beijar alguém. — Ele declarou, no tom mais decidido que conseguiu. — E vai ser… Aquela menina bem ali!
Dito isso, respirou fundo e caminhou corajosamente até uma garota encostada na parede. Ela usava um vestido azul colado, jaqueta de couro preta, maquiagem forte em tons frios e um longo — longo mesmo — rabo de cavalo que se estendia até a base de sua coluna.
— Moça…? — Iruka a chamou meio incerto, esfregando as mãos em nervosismo. Ela se virou e ele ficou encantado com a sua beleza, percebendo que provavelmente, a moça era mais velha.
— Oi, gatinho! — A mulher abriu um sorriso doce, gentil e atrevido. — Qual é o seu nome?
— I-Iruka. E o-o seu?
— Terumi Mei, ao seu dispor. — Ela se apresentou e piscou toda charmosa. — Você quer algo, meu bem?
— N-na verdade, q-quero sim. — Ele assentiu envergonhado. — Eu q-queria saber s-se… Você… G-gostaria de… ficar c-comigo.
“Muito bem, Iruka. Ótima hora para fazer cosplay de Gaguinho.” O jovem pensou irritado, tremendo feito vara verde. Todavia, Mei pareceu não ligar, pois riu baixinho e se aproximou dele.
— Antes de qualquer coisa, qual é a sua idade?
— 18 anos completos.
— Ufa, que bom. — Mei suspirou aliviada. — Eu tenho 21 e não estou a fim de ser presa hoje e nem nunca. Viva a maioridade!
Iruka soprou uma risada e ela se aproximou. Entretanto, ao invés de fazer o mesmo, ele ficou tão imóvel quanto uma estátua. Quando os lábios dela quase encostaram nos seus, finalmente percebeu que não era de concreto e se afastou, completamente encabulado com a situação.
— Desculpa, Mei, eu não consigo. — O rapaz explicou, sem conseguir olhar para a mulher. — Não é nada com você, mas…
— Iria ser o seu primeiro beijo. — Mei completou e ele a olhou assustado. A garota sorriu de lado e cruzou os braços. — Qual é, gatinho, dá pra perceber que você não tem experiência nisso. E não é um problema, afinal, todos precisamos fazer as coisas no nosso ritmo. Só que você me deixou no prejuízo, né? Antes de você chegar, eu estava de olho em um gostoso do outro lado da festa e agora perdi ele de vista.
— Desculpa… — Iruka pediu sincero e ela suspirou, sorrindo compreensiva. Sendo assim, ele lembrou de algo e teve uma ideia. — Olha, pode parecer que não, mas eu sou muito bom em desenrolar as pessoas. Se você me disser o que gosta, eu consigo alguém pra você. Pode confiar.
Obviamente, Mei o olhou desconfiada. Como aquele garoto todo nervoso poderia ser bom em desenrolar as pessoas? Contudo, era uma mulher curiosa, então deu de ombros.
— Eu gosto de caras com cabelo grande, tatuagens, sejam bons de papo e beijem bem o suficiente para eu não me arrepender no fim da noite. Bem simples, na verdade.
Iruka assentiu e usou sua visão biônica para encontrar alguém que se encaixasse nos critérios. Rapidamente, avistou um possível alvo e sorriu confiante, caminhando até ele.
— Com licença, qual é o seu nome?
— Haru Matsumoto. — O rapaz respondeu confuso, olhando para Iruka. — Desculpa, mas eu conheço você?
— Não, mas sei de alguém que você vai adorar conhecer. — O rapaz piscou divertido e olhou na direção de Mei, sendo copiado por Haru.
No instante em que os olhares se encontraram, Iruka pôde perceber uma faísca de desejo surgindo em ambos. Haru ficou de boca aberta e Mei impressionou-se com a beleza do homem.
— Como… Como eu faço pra ficar com ela? — Haru perguntou rapidamente, olhando desesperado para o outro, que riu baixinho.
— Quantos anos você tem?
— 21 anos completos.
— Viva a maioridade! — O jovem exclamou divertido, abrindo caminho para o outro correr na direção da mulher.
Depois de conversarem um pouco, Mei olhou para Iruka com uma gratidão inexplicável no rosto, puxando Haru pela mão e saindo dali. O aspirante a jornalista ergueu seu copo de Coca-Cola e abriu um sorriso enorme, completamente satisfeito com a sua atitude.
Foi então que Iruka se deu conta: Usando suas habilidades daquela forma, poderia sondar as pessoas e perguntar sobre o que queriam e gostavam no beijo. E aquele era o lugar perfeito para isso.
Mais uma vez, o aspirante à jornalista sorriu confiante e retirou seu celular do bolso, começando sua jornada pirata rumo à Grande Linha dos adolescentes e jovens adultos.
— Então, às vezes, você prefere o selinho e não o beijo de língua?
— Sim. — Uma garota loira, chamada Temari, respondeu. Ela participava de um jogo de verdade ou desafio e observava, com atenção, a garrafa girar. — Se a pessoa não sabe usar a língua, eu prefiro mil vezes que ela me dê um selinho ao invés de encher a minha boca de saliva. É bem mais fácil.
— Eu concordo. — Hinata, uma jovem tímida dos olhos e cabelos perolados, confessou enquanto girava a garrafa. — Contudo, caso a pessoa não use a língua, pode incrementar com mordidinhas nos lábios e mãos na cintura. É algo simples, mas nesse tipo de situação, faz toda a diferença. Olha, caiu em você!
Ao ter a garrafa virada em sua direção, Iruka rapidamente saiu dali e ouviu os murmúrios indignados da roda. Entretanto, já estava em outra ilha daquele vasto mar.
— Cara, o segredo é não beijar com pressa. — Um rapaz mais velho chamado Kakuzu declarou, enquanto despejava vodka sobre o abdômen de um homem chamado Suigetsu, este deitado em uma mesa de sinuca. — Tem gente que quer fazer cosplay de Barry Allen, beijando como se estivesse atrasado para o trabalho. É um porre.
— E uma dica boa é sempre ter algo doce com você. — Suigetsu tomou a palavra, observando uma menina aleatória colocar limão e sal sobre sua barriga. — Um chiclete, uma pastilha, um kitkat. Algo que deixe um sabor marcante na sua boca. Ter higiene bucal é importante, mas sentir gosto de pasta de dente não é bom como todo mundo pensa.
— Mas sentir gosto de vodka é. Quer experimentar? — A menina questionou e Iruka sorriu amarelo com a pergunta, negando com a cabeça e logo dando o fora dali.
Dessa vez, foi parar na entrada do banheiro, fazendo perguntas a um cara coberto de preto dos pés a cabeça que descobriu se chamar Ebisu.
— Mandando a real pra você, beijar não é suficiente. A pessoa precisa ter pegada. Tem que apertar firme, usar as mãos de modo inteligente e não só elas. — Ebisu respondeu e Iruka anotou no bloco de notas do seu celular, sentindo ele se aproximar com um sorriso malicioso no rosto. — Se você quiser, eu posso demonstrar com o maior prazer e…
— Eita, já deu meu horário de ir para casa! Vou recusar, mas obrigado por se oferecer! — Iruka agradeceu rapidamente, saindo dali e voltando para o meio da festa.
Após mais alguns minutos de pesquisa de campo, ele se permitiu sorrir. Havia coletado mais material do que esperava e descobriu coisas muito interessantes que com certeza agregariam em suas futuras aulas.
Aquela festa valeu mesmo a pena.
Se achando o maior futuro sensei de Konoha, ele guardou o celular e foi atrás de Gai e Tenten. Para sua felicidade e sem o menor vestígio de surpresa, a dupla dinâmica apostava dois pacotes de Cheetos sabor Cheddar em um jogo de pôker, exalando competitividade.
— Gente, obrigado por terem me convencido a vir! Vou ter que ir agora, já está tarde e eu preciso terminar umas coisas, mas aproveitem e me contem tudo amanhã no colégio.
— Eu falei que essa era A festa de arromba, não falei? — Tenten perguntou retoricamente, jogando o cabelo para trás e fazendo charme.
— Mais tarde nós vamos pra casa, não precisa se preocupar. Só saímos daqui quando ganharmos esses Cheetos! — Gai respondeu, a chama da esperança brilhando em seus olhos.
Dito isso, todos que assistiam ao jogo começaram a torcer pela dupla, para a infelicidade dos outros jogadores. Iruka riu alto e balançou a cabeça, correndo da mansão de Hiruzen em direção a sua própria casa. Logo que entrou, deu uma rápida olhada em Naruto para ver se estava tudo bem. Confirmando que ele dormia tranquilamente em sua cama, o rapaz subiu para o seu quarto, sentando na frente do computador.
Iruka respirou fundo, olhando para todo aquele material. Segundos depois, começou a digitar e a planejar suas aulas. Enquanto fazia isso, tomou uma decisão: Se fosse para continuar com aquela farsa, então que fosse para o benefício de alguém.
Mesmo esse alguém sendo Kakashi Hatake, o líder da Canino Branco.

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— Pela milésima vez, porque as aulas não podem ser na minha ou na sua casa? É bem mais prático do que andar pela escola inteira só para chegar até esse lugar que você tanto fala.
Ao ouvir a pergunta de Kakashi, Iruka revirou os olhos e apressou o passo, fazendo ele dar alguns pulinhos para ficar novamente ao seu lado.
— Pela milésima vez, sua casa fica no último bairro da cidade e eu não me sinto confortável para receber pessoas na minha porque ela está sempre bagunçada! — Iruka respondeu em um tom levemente irritado, se recompondo em seguida. — Sei que está preocupado com a possibilidade de alguém descobrir sobre o seu segredo, mas eu garanto que só nós dois sabemos onde essa sala fica. Portanto, estamos livres de possíveis espiões.
Kakashi bufou e cruzou os braços, mas se contentou com a resposta do outro. Após alguns segundos, finalmente chegaram ao misterioso local: Uma porta localizada no final de um corredor escuro e empoeirado. Entretanto, antes que Kakashi pudesse questionar o motivo de estarem ali, Iruka rapidamente o puxou para dentro do cômodo, trancando a porta por precaução. Assim que viu a sala, o líder tomou um enorme susto.
O cômodo estava perfeitamente limpo e arrumado. Haviam livros com aspecto antigo organizados em estantes coloridas, um quadro branco e escrivaninhas. Além disso, o ambiente era iluminado através de uma enorme janela e possuía um atraente cheiro de rosas do campo.
— Caramba, que lugar é esse?
— Bem-vindo ao antigo clube do jornal, Kakashi Hatake. — Iruka anunciou sorridente, deixando suas coisas em cima da mesa próxima ao quadro, achando graça na expressão confusa do líder de gangue. — Antes do pavilhão de atividades extracurriculares ser construído, a sede do jornal da escola funcionava aqui. Não cheguei a pegar essa época, mas os veteranos contam muitas histórias sobre essa sala. Todavia, ela foi esquecida com o tempo e por isso, quase ninguém que estuda aqui atualmente sabe da existência dela. Então, eu pedi a chave ao Hashirama com a desculpa de precisar ficar sozinho para poder me inspirar melhor. Obviamente, ele não pensou duas vezes e aqui estamos.
— Uou. — O líder da Canino Branco exclamou boquiaberto e em seguida, bateu palmas. — Você é realmente o cara, Iruka Umino. Agora entendi o motivo de você ser o favorito da família Senju. Afinal de contas, o Hashirama praticamente te idolatra e confia em você de olhos fechados, a Tsunade reconheceu o seu valor graças a publicação do artigo e o Tobirama só não fica de recuperação em todas as matérias por causa de você.
Iruka arregalou os olhos ao ouvir a frase final do outro, que o observava de modo divertido. Quando pensou em perguntar como ele sabia de Tobirama, lembrou que ele tinha fontes para isso e pôs as mãos na cintura, completamente indignado.
— Você é uma Maria Fifi desgraçada, sabia?
— Com muito orgulho. — Kakashi fez uma pequena reverência e pôs a língua para fora rapidamente. — Caso você não saiba, eu sou um membro oficial da AFB. Associação das Fofoqueiras de Bairro. Minha mãe e minhas tias me iniciaram e hoje possuo um dos cargos mais importantes: Compartilhador de informações sênior. Pode não parecer, mas saber da vida das pessoas requer muito esforço. Fico muito cansado, mas o trabalho dignifica o homem.
— E a língua de chicote injeta o veneno nele. — Iruka retrucou com sangue nos olhos, negando com a cabeça ao ouvir aquela resposta.
Kakashi apenas sorriu de lado, sentando na cadeira e pondo os pés sobre a mesa, satisfeito por ter provocado o outro. Irritar Iruka estava na fila prioritária para se tornar um novo hobby.
Vendo que o líder não iria responder, o aspirante à jornalista revirou os olhos e pegou seu pincel atômico, começando a escrever no quadro.
— Bem, chega de enrolação. Vamos começar logo. — O aspirante a jornalista anunciou, mostrando a frase escrita em um tom brilhante de azul escuro e cruzando os braços. — Senhor Kakashi Hatake, seja bem vindo ao curso de Como Beijar Alguém da Melhor Maneira Possível. Suas aulas serão ministradas por mim, o experiente sensei Iruka Umino. Alguma pergunta ou podemos seguir adiante?
— Você é parente da Annalise Keating? — Kakashi questionou divertido, se segurando para não dar uma risada de hiena com aquele nome tão ridículo e que parecia ser algo digno de um fã da série criminal criada por Shonda Rhimes.
Iruka bufou envergonhado, cobrindo o rosto com as mãos. Foi ingênuo ao pensar que o Senhor Cultura Pop não reconheceria a origem de sua inspiração.
— Você teria alguma pergunta séria no seu repertório, senhor Hatake? — Iruka perguntou com uma expressão irritada, sorrindo de lado ao vê-lo corrigir a postura rapidamente.
— Ok, parei. Desculpa. — Kakashi pediu em um tom sincero, unindo as mãos em cima de sua mesa. — Preciso mesmo chamar você de sensei ou posso dizer o seu nome?
— Ah, bem… — Iruka murmurou encabulado, coçando a nuca. Esqueceu por um instante que não estavam em uma sala de aula de verdade e ele não tinha formação nenhuma. Como diria Minato: “Se empolgou demais, hein?”. — Se você ficar mais confortável, pode ser pelo nome.
— Ah, não. Eu não fico desconfortável. Perguntei porque gostei da ideia de te chamar assim. Iruka-sensei. É bem sonoro e divertido de falar. — Kakashi respondeu com um olhar sapeca, dando ênfase na alcunha usando uma voz baixa e lenta.
Iruka não soube o porquê, mas engoliu em seco ao presenciar aquela atitude. Contudo, logo se recompôs, balançando a cabeça e fingindo não ter sido afetado pelo conjunto voz e olhos.
— Sendo assim, com as suas dúvidas iniciais esclarecidas, vamos dar início a aula. — Iruka voltou a assumir a postura de professor e, utilizando uma régua, apontou para seu aluno. — Primeiramente, responda a seguinte pergunta: Que tipo de pessoa você quer ser beijando?
— Ora, que pergunta mais fácil, sensei! — Kakashi respondeu brincalhão, apoiando o rosto em suas mãos e sorrindo interessado. — Para a sua felicidade, eu tenho a resposta na ponta da língua. Primeiramente, eu não quero ser o tipo de pessoa que só chega, olha e pá! Tasca o beijo. A ideia de ficar com alguém dessa forma não faz o meu estilo. Eu prefiro conhecer a pessoa antes. Nem que seja uma conversa simples, daquelas onde só dá tempo de saber a cor favorita e o que faz no tempo livre. Quero poder observar a pessoa falando sobre si, dando detalhes que eu com certeza lembrarei para sempre. Quero uma aventura digna de contar para os meus futuros netos. Quero fazê-la nunca esquecer dos meus lábios. Essa, com certeza, é o tipo de pessoa que eu quero ser beijando.
Iruka estava impressionado com a resposta do outro. Não esperava algo tão poético e intenso e não imaginava que pensassem de maneira semelhante. Isso o fez sorrir.
— Essa é uma maneira interessante de pensar, Kakashi. Eu concordo com muitos dos aspectos que você trouxe na sua fala. — O rapaz disse sincero e sorriu gentilmente, observando o olhar do líder tornar-se provocativo.
— Hm… Sendo assim, você deve atrair muitas pessoas, sensei. Arrisco a dizer que há muito mais pessoas do que aquelas dos momentos citados no seu artigo. Afinal, gentil desse jeito, é capaz de deixar qualquer um aos seus pés…
Kakashi sussurrou em um tom indecente demais para quem estava fazendo um simples comentário sobre a sua pessoa, fazendo o jovem novamente engolir em seco e bancar o garoto sonso e confuso, ainda que realmente não entendesse o que se passava em seu corpo.
Por ser a primeira aula, não houve muito conteúdo a ser passado. Ao invés de pedir para Kakashi copiar um texto enorme sobre atitudes que se deve ter para poder ficar com alguém, Iruka preferiu conversar e escutar a opinião dele sobre o assunto, começando a debater com ele na mesma proporção em que dava dicas, essas sendo absorvidas rapidamente e seguidas de vários obrigados. No final das contas, Kakashi Hatake até que era um bom aluno.
— Concluindo: A melhor forma de chegar em alguém com o intuito de ficar é com educação e gentileza. Se ela lhe permitir, você pode tentar algo mais provocativo, como toques corporais ou palavras carregadas de desejo. Para ajudar a lembrar, aqui vai um macete: Chegue com um gato e depois solte o leão. — O jovem sensei explicou em um tom divertido, fazendo o outro rir alto e levar as mãos ao rosto. — Prontinho! A nossa primeira aula está encerrada. O que achou?
— Acho que no final do curso, estarei apto a entrar no mercado de trabalho. — O líder da Canino Branco brincou, e dessa vez foi Iruka quem riu. Em seguida, o rapaz levantou e fez a clássica reverência japonesa aos professores. — Obrigado pela aula, sensei!
— De nada!
Iruka respondeu cordialmente, feliz por poder ajudá-lo e ainda ter se divertido no processo. Todavia, antes que os dois pudessem ir embora, Kakashi pareceu lembrar de algo, pois antes de abrir a porta, rapidamente virou o corpo na direção do jovem sensei.
— Sensei, posso tirar uma dúvida rapidinho?
Ao ouvir aquele pedido, um tiquinho de medo invadiu o corpo de Iruka, pois a dúvida poderia ser justamente algo que ele não tivesse como responder. Mesmo assim, o jovem sensei deu um sorriso gentil e balançou a cabeça positivamente.
— Claro!
Então, Kakashi caminhou lentamente até estar muito próximo do corpo alheio. Graças ao gesto, o aspirante a jornalista sentiu o perfume de baunilha com notas de cereja inebriar seu olfato e arrepiou levemente. Encurralado, paralisou instantaneamente.
— Se eu chegar perto de alguém da mesma forma que estou fazendo agora e ele não conseguir me responder, eu posso tocar na mão dele para tentarmos conversar melhor? — Kakashi perguntou em um tom falsamente inocente e em seguida, acariciou o pulso, a palma e os dedos do outro com delicadeza, porém levemente firme em alguns pontos. O corpo do rapaz aqueceu de uma forma tão boa e relaxante que lhe fez sair do transe e voltar a realidade.
— Bem… sim? — Iruka mais perguntou do que respondeu, ainda desnorteado pelos efeitos do toque de Kakashi, que soprou uma risada baixa.
— Obrigado, sensei, era só isso. Bom trabalho pra você.
Assim que o líder pôs os pés para fora da sala, Iruka soltou o ar que nem percebeu estar prendendo. Não soube como e nem porque sentiu-se tão afetado com a atitude simples, porém, verdadeiramente, intensa de Kakashi. De todas as que haviam acontecido, essa provavelmente seria a qual ele ficaria remoendo por horas, pensando em um motivo plausível para sua existência. Entretanto, como a vida não era um morango, talvez nunca descobrisse.
Contudo, o jovem tinha certeza de algo: Dali para frente, uma longa, curiosa e completamente maluca jornada começaria. E como um aventureiro apaixonado que continua seu caminho mesmo receoso, Iruka estava sedento para descobrir o destino final.


Iruka nunca pensou que daria aulas em sua vida. E, com certeza, também não havia imaginado que tais aulas seriam tão engraçadas, informativas e em todos os sentidos da palavra, quentes.
Durante duas semanas, o jovem sensei e seu aluno atrevido estavam se reunindo para discutir técnicas, teorias e tudo o que podia ser aprendido e revisado sobre como beijar. E como uma espécie de costume misterioso, Kakashi estava sempre com um sorrisinho de lado, fazendo Iruka começar a se questionar a fim de entender o motivo daquilo.
Sendo um bom observador e, principalmente, curioso como ninguém, Iruka coletou diversos momentos em que ele sorria daquela forma. Quando falava algo que dava margem para um duplo sentido, detalhava algum gesto ou até mesmo passava a mão pelo cabelo para abaixar os fios arrepiados, o curvar de lábios estava presente na face do líder.
Após muitas análises e nenhuma conclusão concreta tendo a ciência como base, Iruka concluiu que Kakashi era meio maluco da cabeça.
— Na aula de hoje, vamos falar sobre os famigerados toques físicos. — Iruka anunciou, escrevendo o tema no quadro branco. Ao olhar para Kakashi, percebeu a presença do sorrisinho. Contudo, revirou os olhos, já que daquela vez, o motivo do gesto era bem óbvio. — Como já sabemos, um bom beijo não é composto apenas por lábios e língua. Isso só mostra que você está ciente do significado do ato de beijar. Mãos, pernas e voz também necessitam estar presentes no momento, pois são capazes de fazer um simples encostar de lábios se tornar inesquecível. Senhor Hatake, o que você acha dessa informação?
— Eu acho ótimo, meu caro sensei. — Kakashi respondeu divertido, apoiando o rosto nas mãos. Então, seu tom de voz tornou-se baixo e intenso. — Eu creio que coisas como pegar na cintura, sussurrar no ouvido e pressionar o joelho em pontos específicos podem tornar o beijo muito melhor. Claro, nunca experimentei, mas nos filmes, livros e fanfics, as pessoas parecem gostar bastante.
Algo importante sobre Iruka era que, assim como seu aluno atrevido, ele também adquiriu um costume curioso durante as aulas. Todas as vezes que o líder falava coisas daquele tipo usando aquele tom de voz, o jovem sensei sentia seu estômago esquentar e seu coração acelerar como se houvesse ingerido uma pequena dose de adrenalina.
Discretamente, Iruka engoliu em seco e assentiu, concordando com seu aluno antes de partir para uma importante parte da aula.
— Demonstre.
Ao ouvir Iruka dizer aquela simples, porém poderosa palavra, o sorriso de Kakashi aumentou ainda mais. Adorava quando ele pedia para demonstrar, pois era a parte na qual mais se divertia.
Calmamente, o líder juntou as mãos atrás das costas e se aproximou de Iruka, este que se mantinha sério e fazia um esforço enorme para não desmanchar tal postura. Ali, o objetivo era fazer o outro rapaz se sentir confiante e, para isso, qualquer reação ou emoção precisava ser fruto de gestos dele, o que, convenhamos, não era nem um pouco difícil.
Kakashi sorriu gentilmente e tocou o queixo do rapaz com delicadeza, sem desviar o olhar intenso e carinhoso. A outra mão parou na cintura do jovem sensei, trazendo ele para si com um aperto firme. Nesse momento, o coração de Iruka já estava acelerado. Então, a cereja do bolo brilhou quando o líder levou a boca até o ouvido do outro.
— Nunca vi alguém tão bonito quanto você, meu bem… — Kakashi sussurrou em um tom charmoso e maravilhoso de se escutar.
Iruka prendeu a respiração, contendo um suspiro. O líder da Canino Branco podia nunca ter beijado ninguém, mas a sedução parecia correr pelas veias daquele filho da mãe.
Então, antes que os toques ficassem mais intensos, o rapaz se afastou de supetão e sorriu amarelo.
— Bom, parece que você aprendeu o conteúdo da aula com maestria, não é mesmo? A demonstração não é mais necessária. — Iruka explicou, tentando disfarçar o nervosismo.
Kakashi bufou feito uma criança cujo doce foi tirado de suas mãos, interrompendo um possível vício em açúcar de começar.
— Você sempre acaba com a diversão na melhor parte. — O líder resmungou de braços cruzados. — Sendo assim, a aula de hoje acabou, Iruka-sensei? Tenho um compromisso daqui a pouco.
— Já, senhor Hatake. — Iruka respondeu igualmente debochado, também cruzando os braços. — Até a próxima aula.
— Estarei ansioso. — Kakashi disse piscando e se aproximando da janela. — É mais fácil sair por aqui, dá direto na rua do QG da gangue e ninguém percebe. Até semana que vem, sensei.
Dito isso, como em uma cena de filme de ação, o rapaz pulou da janela e Iruka arregalou os olhos, correndo para a janela.
— Ficou preocupado, foi? — O líder questionou sapeca, sorrindo divertido ao avistar a silhueta do outro. O outro revirou os olhos.
— Só não queria ser acusado de homicídio. — O jovem sensei respondeu, secretamente feliz por ele ter aterrissado em segurança. Kakashi riu e negou com a cabeça, pulando o muro do colégio.
Iruka negou com a cabeça, mas não escondeu o sorrisinho que deu graças a artimanha do outro. O aspirante a jornalista arrumou suas coisas e olhou para os lados antes de sair, observando se tinha alguém por perto. Contudo, assim que começou a caminhar, uma silhueta surgiu em sua frente e o fez, literalmente, pular de susto.
— Cacete, Gai! Do nada! — Iruka exclamou com a mão no peito, tentando se acalmar. O chefe do jornal riu alto com o gesto.
— Desculpa, Iru. Eu vim pegar um objeto antigo para a aula de História com a professora Kaguya no depósito. — Gai explicou, analisando o outro e levando os dedos ao queixo. — Aliás, o que você estava fazendo dentro da antiga sala do clube? Quase ninguém tem mais acesso a esse lugar sem ser o Hashirama.
O aspirante à jornalista arregalou os olhos e engoliu em seco, sentindo o medo lhe consumir. Mesmo que estivesse frente a frente com seu melhor amigo, se contasse a ele, quebraria a promessa feita a Kakashi.
E embora os dois não fossem exatamente amigos, Iruka não quebrava promessas.
— Ah… Eu… É…. Eu estava me inspirando! — O rapaz respondeu rapidamente, falando a primeira coisa que veio em sua cabeça e sem necessariamente mentir. — Eu tenho a chave daqui há muito tempo, o Hashirama me deu, você sabe como é e…
— Inspirando? — Gai perguntou animado, com um brilho intenso surgindo em seus olhos. — Já que você está tão inspirado, pode me ajudar em um artigo para o jornal? Por favor!
“Merda.” Iruka pensou, mordendo os lábios. Então, olhou para a tela de bloqueio do celular e abriu um sorriso ao pensar na desculpa perfeita.
— Agora não vai dar, amigo. Eu preciso muito ir para o trabalho, estou mega atrasado e o Ichiraku já deve estar cheio de clientes.
Feito um verdadeiro gênio, o presidente do jornal sorriu confiante e levantou o dedo, indicando que falaria algo super inteligente.
Errado. Pelo que você me contou esses dias, você pega o turno a uma hora da tarde e ainda são 11:30. Ou seja, tempo suficiente para me ajudar e correr até o Ichiraku. — Gai explicou calmamente, fazendo uma carinha pidona. — Por favor, Iruka, eu preciso muito terminar esse artigo hoje e ter a sua opinião é essencial.
Iruka tentou relutar, mas no fim, deu um soquinho no ombro do melhor amigo e abriu um sorriso conformado.
— Eu e minha boca grande. — Iruka lamentou e Gai soprou uma risada, balançando a cabeça enquanto caminhavam para o clube.

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Iruka e Gai riam como se estivessem em um show de stand-up.
Na verdade, a ajuda tão necessária pelo chefe do jornal não demorou meia hora. Por conta disso, o resto do tempo que passaram no clube foi recheado de conversas, risadas e fofocas, com ambos tagarelando e colocando as novidades em dia como há muito não faziam. Ali, tiraram a prova de que a conexão única entre os dois não mudou nem um pouco.
Continuavam os mesmos doidos de sempre, falando besteira com o alívio de não serem julgados e sorrindo ao mínimo sinal de graça.
— É por isso que eu sempre digo: Você precisa avisar alguém antes de sair de casa com a intenção de sumir por horas. Quase que a mãe da Mizu fica louca sem saber onde ela estava, antes de encontrá-la no bar da esquina bebendo saquê e jogando pôquer com os velhos de lá. E olha que ela já é adulta! — Gai riu alto, narrando a mais nova aventura de sua vizinha para Iruka, que tentava não espocar de rir com os detalhes.
— Eu concordo. — Iruka suspirou ofegante, limpando uma lágrima que surgiu em seu rosto depois de tanta emoção. A dupla estava deitada nos puffs do clube, deitados um ao lado do outro e bem mais leves do que antes, principalmente Iruka. — Obrigado por isso, Gai. Eu tô com tanta coisa na cabeça, precisava mesmo descontrair. É bom lembrar que ainda existem momentos bons na minha vida.
Gai sorriu, dando um peteleco na testa do melhor amigo e deslizando a mão pelos fios castanhos unidos em um coque dele.
— De nada, Iru. É a nossa promessa, lembra? Eu sempre vou estar aqui para você. Pode me contar tudo e pode me pedir tudo, vou fazer o que estiver ao meu alcance pra te ajudar.
Ao ouvir o amigo pronunciar aquelas palavras, simples, sinceras e fortes, Iruka sentiu vontade de contar. Sentiu vontade de revelar o que tanto lhe afligia, falar sobre os detalhes do plano, ouvir ele rir alto e então pedir para guardar segredo, do mesmo jeito que faziam quando contavam coisas do tipo um para o outro.
Todavia, ainda era Iruka ali. O Iruka que odiava preocupar os outros, embora fosse somente um pingo de preocupação. No fim das contas, ele quem decidiu ajudar. Logo, naquele momento, ele teria que lidar com aquilo sozinho, embora seu coração doesse por precisar esconder algo tão simples e ao mesmo tempo tão complexo.
O rapaz sorriu, devolvendo o peteleco.
— Sendo assim, vou deixar o Naruto com você e dormir até a bunda fazer bico. Você não vai aguentar meia hora com ele te pentelhando.
Gai riu alto, assentindo com a cabeça.
— Sem problemas, eu aceito. Sou acostumado a ser pentelhado, afinal, você é o meu melhor amigo, né?
Iruka lançou um olhar mortal para Gai, que deu um sorrisinho de canto e empinou o nariz. Em seguida, os dois riram, buscando aproveitar cada momento da leveza criada simplesmente por estarem juntos.

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— Amo tanto passar tempo com você, irmãozão!
— Toma vergonha na sua cara, moleque. Você gosta mesmo é de ficar comendo às custas do Teuchi. Pensa que me engana?
Naruto mandou para dentro do estômago outra tigela cheia do Ichiraku Miso, seu tipo de lámen favorito. Em seguida, deu de ombros e sorriu malandro, um gesto claro o bastante para Iruka entender que aquela era uma resposta a sua pergunta. O atendente negou com a cabeça, colocando as mãos na cintura e soprando uma risada.
Era um fim de tarde de sexta-feira, justamente o dia em que Rin tirava suas folgas e o turno de Iruka se estendia até a hora do restaurante fechar. Por conta disso, Naruto se acostumou a fazer companhia para o irmão depois do colégio, tanto por querer se encher de lámen quanto para não ficar sozinho em casa após às 23:00.
Sexta era um dia interessante para Iruka. Às vezes o restaurante tinha muita gente, às vezes pouca. Às vezes fazia frio e as janelas ficavam embaçadas, perfeitas para as crianças desenharem casas, animais e outros elementos do imaginário infantil. Às vezes fazia calor e ele corria para ligar todos os ventiladores, se refrescando com uma latinha de coca-cola que Teuchi sempre insistia para ele tomar e sorrindo por isso.
Apenas… costumeiro. Uma das únicas partes da sua vida que não haviam mudado. E isso alegrava Iruka.
— Mais uma tigela de lamen no capricho para o meu melhor cliente! — Teuchi anunciou animado, mal deixando o pequeno terminar de digerir a anterior, deixando Naruto com os olhos mergulhados em puro brilho. — Aproveite, pirralho, hoje é tudo por conta da casa.
— Esse é o melhor emprego que você poderia ter, Iru! — Naruto exclamou feliz da vida, voltando a devorar o macarrão macio envolto em um reconfortante caldo quentinho.
Iruka riu baixinho com a cena, olhando para Teuchi com gratidão. Quando se tratava do irmão mais novo, ele sempre ficava mais vulnerável. Sendo assim, não recusaria ou reclamaria se o pequeno estivesse feliz.
— Valeu, chefe. De verdade.
Com um sorriso calmo nos lábios, Teuchi bagunçou o cabelo de seu jovem funcionário.
— Tudo por vocês.
Iruka sorriu e voltou a organizar o balcão, limpando e aproveitando a onda de calmaria que invadia o restaurante. Então, a sineta da porta tocou e ele se preparou para cumprimentar o novo cliente.
— Olá, seja muito bem-vindo ao Ichira…
Assim que o atendente reconheceu a face da pessoa, interrompeu a si mesmo e tomou um pequeno susto.
Kakashi sorriu divertido, e se dirigiu ao balcão, sentando-se ao lado de Naruto e observando o local. Em seguida, soltou um suspiro satisfeito e olhou para o atendente.
— E aí, Iruka! Esse lugar continua aconchegante, como sempre. — O jovem líder comentou, olhando profunda e intensamente para o outro.
Iruka se permitiu abrir um pequeno sorriso. Estavam fora do ambiente e da dinâmica aluno e sensei naquele momento, e ele não parecia estar ali para provocar. Logo, acabou por baixar a guarda.
— O que você gostaria de pedir hoje?
— Eu gostaria de uma tigela de Shoyu Lámen, por favor. Ah, e com bastante carinho seu. — Kakashi respondeu doce, soltando uma piscadinha e fazendo o atendente revirar os olhos, mas sorrir pequeno enquanto anotava o pedido e o levava para Teuchi na cozinha.
Logo que Iruka se afastou, Kakashi olhou para o lado e finalmente percebeu que havia uma criança ali. Uma criança que inclusive entornou uma tigela inteira de lámen como se fosse água. Ao terminar, o pequeno soprou o vapor do macarrão e abriu um sorriso satisfeito, dando pequenas batidas em sua barriga de modo suave.
— Nada melhor do que quatro tigelas de lámen para esquentar o estômago.
— Quatro tigelas? — Kakashi exclamou, arregalando os olhos e chamando a atenção da criança. Então, riu surpreso. — Caramba, baixinho, você é peso pesado. É o irmão mais novo do Iruka, não é?
— Eu mesmo, Naruto Namikaze Umino! — O pequeno se apresentou sorridente e pôs as mãos na cintura, assumindo uma postura de confiança. Embora não tivesse o sobrenome do irmão e da falecida madrasta oficialmente, gostava muito de usá-lo. Era como um orgulho para si. — E você?
— Sou Kakashi Hatake. Prazer, Naruto Namikaze Umino, é uma honra conhecer um campeão devorador de lámens em pessoa. — O rapaz respondeu divertido, estendendo a mão. Naruto riu da frase e a apertou.
— Uma tigela de Shoyu Lámen no capricho! — Iruka anunciou com um sorriso divertido, voltando ao balcão e servindo o pedido para o líder junto aos hashis. — Bom apetite.
— Ah, que maravilha dos deuses! — O rapaz esfregou as mãos e depois as juntou, murmurando um “itadakimasu” bem baixinho e começando a comer, ficando tão feliz quanto Naruto. — Comer é a melhor coisa que se pode fazer em uma sexta à noite, né? E fica ainda mais legal se você estiver acompanhado de um filme e alguém legal.
Iruka riu alto, balançando a cabeça para o lado e soltando um suspiro.
— Eu até poderia concordar, mas faz um tempo desde que eu fiz isso pela última vez. Acho que nem lembro direito como foi, na verdade.
Kakashi parou de comer e olhou para Iruka com um ar sereno, sorrindo pequeno e se debruçando sobre o balcão.
— Sei o quanto é difícil se esforçar para dar conta de tudo, principalmente quando esse tudo depende quase integralmente de você. Mas saiba que você está fazendo um ótimo trabalho, Iruka. Você é uma das pessoas mais responsáveis e doces que eu já conheci, e considerando o meio onde eu estou inserido, dá pra saber que o que eu digo é completamente sincero. Não se esqueça disso, tá bem?
Iruka ficou sem reação com a fala de Kakashi. Cada palavra, cada frase construída, se encaixava perfeitamente com aquele momento de sua vida. Claro que quase o colégio inteiro sabia do que tinha acontecido, mas o líder parecia estar imerso em cada detalhe oculto dos olhos e ouvidos de todos. E, conhecendo Kakashi, era provável que ele soubesse mesmo.
Contudo, Iruka apenas sorriu. Não estava preocupado com aquilo e sim com o fato de ele estar sendo verdadeiro e empático. O atendente nunca comentava sobre, mas adorava ouvir palavras como aquelas.
— Obrigado, Kakashi.
— De nada, meu bem. — O líder da Canino Branco respondeu divertido, mas com um toque de doçura felizmente percebido pelo outro, trazendo um tom coral às bochechas de Iruka.
— Valeu por dizer isso ao meu irmãozão, Kakashi. Eu até tento dizer, mas não consigo usar essas palavras bonitas. Quem sabe ele acredite agora que é o melhor do mundo. — Naruto comentou, sorrindo ao ver o irmão sorrir e fazendo os outros dois perceberem que ele observava aquela cena cheia de entrelinhas que nem mesmo eles entendiam.
Iruka engoliu em seco, voltando a limpar o balcão e Kakashi pigarreou, se abanando por conta do leve calor e resolvendo tirar a jaqueta de couro preta que usava para ficar mais confortável.
Assim que ele fez isso, Naruto imediatamente arregalou os olhos. O líder da Canino Branco vestia uma camiseta azul escuro estampada com os quatro personagens principais de Frozen, estes usando as roupas atualizadas do segundo filme. O pequeno ficou tão eufórico que não conteve o enorme sorriso surgindo em seus lábios.
— NÃO ACREDITO! — Naruto soltou um grito animado, assustando seu irmão, Kakashi e alguns clientes. — Você também gosta de Frozen?
Kakashi o olhou surpreso, percebendo que ele encarava sua camisa e sorriu abertamente, tão animado quanto.
— Eu amo Frozen! É uma das minhas animações favoritas. Nem acredito que encontrei outro fã. Achei que gostasse de animes ou de coisas do tipo. Não é isso que as crianças estão viciadas hoje em dia?
Naruto pôs as mãos na cintura, indignado com tamanho ultraje.
— Ei, que preconceito é esse? Eu posso muito bem gostar de animes e de Frozen! Os dois são desenhos e… Aliás, isso nem faz sentido!
Kakashi riu alto pela facilidade com a qual ele caiu em sua provocação. Crianças eram muito fáceis de encher o saco, principalmente quando se tratava de seus desenhos favoritos.
— É mesmo, não faz o menor sentido. Mas e aí, qual é o seu personagem favorito? — questionou, fazendo Naruto voltar a sorrir.
— A Anna! Ela é muito incrível e fofa! E o seu?
— A Elsa, é claro! Nós dois temos cabelos platinados lindos e somos da realeza. — Kakashi respondeu confiante e jogou o cabelo para o lado, transbordando um charme divertido e rindo junto ao pequeno.
Ao observar a interação dos dois, Iruka ficou surpreso. Surpreso pois nunca imaginou que Kakashi gostasse de Frozen tanto quanto Naruto e parecesse uma verdadeira criança falando sobre teorias, poderes e até mesmo o clima de Arendelle. Aquilo dizia muito sobre um lado do líder que ele ainda não conhecia e, por alguns segundos, desejou descobrir.
Com tanta doçura e simplicidade envolvendo aquela cena, Iruka não resistiu e abriu um pequeno sorriso, suspirando feliz e sentindo seu coração incrivelmente suave e quentinho.

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Conforme a cartilha mandava, o sensei Iruka Umino e o aluno Kakashi Hatake contemplavam o antigo clube do jornal — agora conhecido como Escola Iruka Umino de Beijos e Romance, um nome que obviamente só poderia ser escolhido por Kakashi — com suas presenças em mais uma interessante, explicativa e atrapalhada aula.
— Bom, senhor Kakashi… — Iruka começou a falar, terminando de escrever algumas palavras no quadro e observando o líder. — Durante os dias que passamos dentro desta sala, eu ensinei a você quase tudo sobre os princípios de como beijar bem. Todavia, ainda falta a parte principal: Prática. Sendo assim, hoje nós finalmente iremos testar a teoria.
Ao ouvir aquela frase saindo da boca do outro, Kakashi arregalou os olhos, genuinamente espantado e transbordando de curiosidade.
— Espera… De verdade? — O rapaz questionou incrédulo. — Nós vamos mesmo pôr os seus ensinamentos em prática?
— Claro que sim! — Iruka respondeu em um tom firme, cruzando os braços e olhando para o outro como quem dizia “Não é óbvio?”. — Se você não exercitar o conteúdo, sua mente logo vai esquecer tudo o que absorveu. E graças ao exercício, poderemos observar e entender onde você pode melhorar acerca das suas habilidades não só de beijo, mas também de flerte, seja usando palavras, gestos ou atitudes.
Então, o rapaz sorriu animado. Um sorriso daqueles que iam de orelha a orelha, combinados com uma cena barulhenta e divertida dele fazendo uma dança da vitória dentro da própria mente.
— Quando começamos?
— Primeiramente, penso que precisamos decidir qual será a pessoa que você vai beijar. Afinal, é necessário você já conhecer ela, não é? — O aspirante a jornalista explicou calmamente e percebeu o brilho dos olhos do líder desaparecer. — Você está bem? Aconteceu algo?
— Eu pensei que… — Kakashi iniciou, olhando fixamente para Iruka, mas balançou a cabeça e deu um sorriso amarelo. — Esquece, eu estou bem. E sim, eu concordo. Precisamos pensar primeiro na pessoa.
No exato momento em que o líder lançou aquele olhar em sua direção, a leve possibilidade de ele estar pensando que seria Iruka a lhe beijar fez o rapaz sentir arrepios por todo o corpo. Entretanto, o curioso é que eles não davam uma sensação ruim. De qualquer forma, o jovem sensei tratou de afugentar aquelas imagens da sua cabeça.
Foi então que, em um timing perfeito, o sinal do intervalo tocou. Lançando um olhar confiante para Kakashi, Iruka sorriu cúmplice.
— Vamos lá, querido aluno. O seu momento chegou.

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Como dois ninjas saindo de seu perfeito esconderijo, eles trancaram tudo e se dispersaram para que ninguém os visse chegando ao refeitório juntos. Iruka foi o primeiro a aparecer e escolheu uma mesa nos fundos, começando a comer seu lanche: Um sanduíche de carne, rolinhos de tamagoyaki e um copo de suco de uva.
Kakashi chegou depois e quando avistou Iruka, fez o sinal que haviam combinado e recebeu o mesmo gesto em resposta. Embora mantivesse sua postura inabalável de bad boy, tremia de medo por dentro. Afinal de contas, era seu primeiro beijo. Tinha de ser ao menos um pouco legal, apesar de tudo.
Após procurar por alguns segundos em meio a imensidão de alunos, os olhos do líder da Canino Branco pousaram em Himika Sato, uma menina que fazia parte do clube de artes e a qual se recordava de já ter visto conversando com Deidara algumas vezes. Kakashi respirou fundo e caminhou até a mesa onde ela estava sentada.
— Com licença. Himika? — O rapaz quis confirmar, recebendo um tímido aceno de cabeça da moça e tendo não só os olhos das amigas dela, como também do resto do refeitório em sua pessoa. Era uma situação completamente diferente das que havia vivido e por isso, se sentiu nervoso. — Posso falar com você em particular por um instante?
— C-claro. — A garota respondeu, tentando parar de tremer e extremamente curiosa sobre o que Kakashi queria falar justo com ela.
Sendo assim, os dois caminharam para fora do refeitório e seguiram para o jardim da escola, ironicamente ficando embaixo de uma cerejeira como em uma cena de filme clichê sobre a primavera japonesa.
— Bem, Himika, quero começar dizendo para não se preocupar. O assunto que tenho para tratar com você não é ruim. — O líder a tranquilizou, vendo ela ficar um tanto aliviada. Com calma, ele se aproximou, colocando uma mecha do cabelo castanho para trás da orelha dela. — Você permitiria que eu te desse um beijo? Por favor?
Os olhos de Himika arregalaram levemente e sua boca entreabriu, indicando seu genuíno espanto com aquele pedido. Por alguns segundos, ela se manteve em silêncio, com seus pensamentos lhe fazendo companhia. Por fim, acabou sorrindo, um tanto envergonhada. Kakashi era bonito e estava lhe tratando tão bem, tão diferente do que as pessoas normalmente falavam dele… Por que não dar uma chance ao líder?
— Eu permito. — Himika respondeu baixinho, esfregando as mãos uma na outra e olhando doce para o líder da Canino Branco, que sorria satisfeito com a resposta. — Mas tem uma coisa… É o meu primeiro beijo.
Assim que ouviu a garota dizer aquela simples, porém impactante frase, Kakashi sentiu uma tremenda culpa. Naquele momento, começou a repensar sobre o porquê de estar ali. Himika era fofa e gentil, mas não queria beijá-la de fato. Poderia suportar a perda daquela “oportunidade”, mas será que ela suportaria perder o BV justamente com ele?
Em um sopro de coragem, ele cuidadosamente tocou as mãos da bela moça e as beijou, sorrindo calmo como um verdadeiro cavalheiro.
— Me desculpe, Himika, mas não posso fazer isso. Não pense que é por conta da sua falta de experiência, mas sim porque podem começar a falar mal de você ou até mesmo te excluir se souberem que você ficou comigo. Nós da Canino Branco não somos más pessoas, mas todos nos vêem assim e é difícil mudar a cabeça da maioria. Então, peço para que esse momento entre nós fique em segredo e novamente, peço desculpas. Você merece ter o seu momento especial com alguém melhor que eu.
Himika estava um tanto triste pela recusa do rapaz. Naquele breve espaço temporal, ficou realmente animada para ter o seu primeiro beijo. Todavia, entendeu os motivos dele e percebeu ser o certo a se fazer.
— Está tudo bem. Eu entendo e agradeço por ser sincero comigo. — Ela deu um pequeno sorriso, transbordando a doçura presente em seu ser.
Kakashi sorriu aliviado pela compreensão dela e retirou de seu bolso uma singela embalagem de Kit Kat sabor Chocolate Branco, estendendo-o na direção de Himika, que o olhou confusa.
— Toma. Vai se sentir melhor tanto pelo que acabou de acontecer quanto pelas cólicas que deve estar sentindo.
Em seguida, o rapaz deu uma piscadinha cúmplice e ela corou mais que um tomate maduro, porém sorriu em agradecimento e caminhou de volta para o colégio, com o rapaz há apenas alguns metros atrás de si.
Quando Iruka viu Kakashi voltando a pôr os pés no refeitório e vindo em direção a sua mesa, a atenção geral foi rapidamente direcionada aos dois. Entretanto, dessa vez, o líder lançou um olhar mortal aos colegas que logo voltaram a cuidar de suas próprias vidas. Aquilo era o suficiente para ninguém perguntar ou comentar nada. Afinal de contas, todos sabiam que qualquer informação desagradável que chegasse aos ouvidos dele ou de alguém da Canino Branco teria consequências irreparáveis.
Obviamente, isso também era bom para Iruka, já que a pior informação que poderiam inventar sobre ele era que estava fazendo coisas ilícitas a mando do líder e não podia sonhar em recusar.
Sendo assim, ninguém desconfiaria de nada.
Assim que Kakashi se sentou, Iruka logo percebeu pela expressão cabisbaixa que o plano não havia se concretizado.
— O que aconteceu?
Kakashi suspirou, compreensivo e ao mesmo tempo frustrado.
— Era o primeiro beijo da Himika. — O líder contou, deitando a cabeça na mesa e escondendo o rosto entre os braços. — Não queria que ela tivesse essa experiência justamente comigo, não quando posso trazer tantos problemas a uma garota tão doce. Eu nem ao menos me interesso por ela direito. Himika merece coisa melhor, Iruka. Me desculpa.
Ao invés de também se frustrar — tal qual Kakashi imaginava que seria sua reação, afinal o jovem sensei estava quase dando a vida naquela missão —, Iruka abriu um dos sorrisos mais gentis que ele já tinha visto.
— Não há problema em você ter tomado essa decisão, Kakashi. Na verdade, estou muito orgulhoso de você por ter pensado tanto no bem estar da Himika quanto no seu. É algo ótimo.
Kakashi não conseguiu segurar o sorriso aliviado que surgiu em seus lábios com aquela fala. Contudo, não demorou muito para ele recordar da situação em que os dois se encontravam e bufasse irritado.
— Sabe, talvez o problema não seja o beijo em si, e sim o ambiente. Se quisermos exercitar a teoria, precisa ser em qualquer lugar, menos em um colégio. Principalmente se for o Colégio Senju. — Kakashi explicou, tocando o queixo com o indicador e começando a pensar. De repente, seus olhos brilharam. — Já sei! Vamos ao Uchiha’s Bar!
Ao ouvir o nome do local, Iruka arregalou os olhos.
— Como assim? — O jovem sensei perguntou, curioso e assustado na mesma proporção. — Esse bar não é da gangue Sharingan? Se me lembro bem, o território deles começa na fronteira de Konoha com Suna.
— Sim, é isso mesmo. — O rapaz confirmou, apoiando o rosto nas mãos. — Contudo, a Sharingan e a Canino Branco possuem um acordo graças a amizade que meu pai tinha com Fugaku, criador da Sharingan e pai do Itachi, o atual líder. Como uma das metades do bar fica no começo do nosso território, podemos frequentar quando quisermos, desde que a gente não incentive brigas entre as gangues e nem arrume confusão com os clientes. É um lugar incrível demais, de verdade.
— Entendi. — O aspirante a jornalista assentiu calmo, finalmente desembaralhando o baralho de cartas confusas em que sua mente mergulhou. — E você está pensando em testar a teoria lá?
— Nós vamos lá. — Kakashi respondeu firme e Iruka quase se engasgou com um gole de suco de uva preso na garganta. — Não precisa ficar com medo. Você é meu sensei, já fez coisas piores e inclusive não teve vergonha de expôr pra escola inteira. Precisa estar lá pra observar no que eu preciso melhorar. Você quem disse isso.
Iruka soltou um suspiro, cobrindo o rosto com as mãos. Seu papel era ajudá-lo a se preparar para o primeiro beijo e unicamente isso. Não queria se meter na parte misteriosa da vida de Kakashi.
— Não sei se é uma boa ideia eu ir. Alguém pode querer me bater e, além disso, eu ainda corro o risco de algum fofoqueiro desse bendito colégio me dedurar pro Hashirama. Já estou até vendo o sermão preocupado e as perguntas desconfortáveis. Desculpa, Kakashi, mas não tô com muita vontade de bancar o James Dean.
Kakashi revirou os olhos com a frase, fazendo biquinho e cruzando os braços pela recusa que, em sua opinião, era um tremendo ultraje.
— Nem vem com essa, Iruka! Ninguém vai te bater e nem contar que te viu, ainda mais com você estando sob a minha proteção. Além disso, você finalmente vai entender um pouco mais sobre o ambiente em que eu vivo e perceber que, de fato, não é tão ruim. Fora a música boa, comida boa e vários jogos. Vamos, por favor. Vai ser legal.
Iruka suspirou, inclinando a cabeça para trás e gemendo encurralado. A verdade era que estava com muito medo de alguém implicar com a sua cara dentro do bar e acabar desencadeando uma verdadeira guerra entre a Sharingan e a Canino Branco. Em momentos como aquele, o azar e a predisposição para confusões sempre tratavam de achá-lo.
Contudo, devido a sua incrível habilidade de não conseguir negar nada a ninguém combinada com a vontade de ajudar, o jovem sensei assentiu suspirando e erguendo seu copo de suco.
— É isso, vamos entrar no território alheio. — Iruka brincou, tomando tudo de uma vez e contendo um arroto nervoso que quase escapou. Observando a cena, Kakashi riu, ansioso para o sábado chegar logo.




Continua...


Nota da autora: Olá, pessoal! Eu sou a A.L. Funnie, mas podem me chamar de A.L., Akane ou Akaneiro. Espero muito que gostem de OMdB, esse universo Kakairu que pensei e estou escrevendo com tanto carinho! Agradeço a André Quelson, meu príncipe beta e também a Sial (Vênus) por codificar minha humilde fanfic. Adoraria que deixassem um comentário para que eu pudesse saber o que estão achando. Animada por fazer parte da família Ficsverse! <3


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