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Uma das coisas que mais apreciava em Aegon eram seus olhos. Enquanto os seus próprios eram de um tom claro de verde, elétricos e vivos como tempestades de raios, os do tio eram delicados e brilhantes, num doce tom de lilás que lhe remetia a jacintos.
Faria sentido, pensava consigo mesma. Jacintos eram flores que simbolizavam tristeza, melancolia, e o sentimento era constante nos olhos de Aegon, que sempre parecia estar à beira do choro. Ela nunca conhecera alguém tão triste, tão vazio, e se perguntava se era isso que a atraía para ele como uma mariposa fixada à luz.
O sol de fim de tarde iluminava seu rosto enquanto o príncipe encarava o céu arroxeado e, quando percebeu que o observava, soltou um ronco de riso pelo nariz.
— O que tanto olha, Princesa? — perguntou num tom debochado e quase provocativo.
revirou os olhos enquanto deitava a cabeça na mão sustentada pelo cotovelo na grama úmida. Tinham conseguido roubar aquele momento a sós na comemoração do dia do nome de Viserys, fugindo escondidos do castelo e indo a cavalo até uma parte reclusa de Mataderrei.
— Irá me contar o que lhe deixou tão tristonho mais cedo a ponto de escapar das festividades do dia do nome do rei?
Aegon colocou um sorriso no rosto, mas seus olhos estavam levemente avermelhados. sabia o que aquilo significava. Havia chorado.
— Trouxe morangos. — ela pegou a cesta que havia trazido, abrindo-a e tirando de lá um vidro cheio de morangos açucarados. — Escolhi-os eu mesma dos que Daemon trouxe para mim de sua última viagem.
A expressão de Aegon mudou com a menção de seu tio.
— Daemon traz muitos presentes para você, hein… — disse lentamente, observando o vidro de morangos.
— Claro que sim, sou sua favorita.
Aegon pegou um dos morangos e o mordeu, murmurando algo baixinho para si mesmo, com uma pitada de aborrecimento na voz. pensou que parecia um “aposto que é”, e um pequeno sorriso brincou em seus lábios.
— Agora, ñuha prūmia[1], diga-me por que estava chorando mais cedo. — a princesa limpou um pouco de açúcar do canto da boca de Aegon, sorrindo levemente. Era o quão próximos eles eram.
Aegon congelou por um segundo com a pergunta, perplexo que ela houvesse percebido que ele estava chorando nas festividades, mas aquela era . Nunca deixava de se surpreender com o quão perceptiva a garota era.
Ele suspirou.
— Por que você acha que eu estava chorando?
— Seu nariz estava o dobro do tamanho normal.
Aegon suspirou novamente, sem energia para discutir.
— Promete que não irá pensar menos de mim se eu te contar?
A princesa lhe lançou um olhar de escárnio, jogando um morango aos lábios tão rosados quanto a fruta.
— Sabe que eu nunca pensaria menos de você, não importa o que faça.
Aegon sentiu seu coração encher-se de ternura. Queria ter metade da fé em si que tinha nele. Seus ombros caíram e ele sentou-se na grama, evitando encará-la, comendo outro morango.
— Tive outra discussão com minha mãe.
Ela revirou os olhos verdes, o movimento lembrando ao príncipe a copa das árvores bruxuleando ao vento.
— O que a megera fez desta vez?
Aegon balançou a cabeça, frustrado. Apesar de tudo, gostava da forma como falava sem papas na língua. Não lhe era segredo a antipatia da princesa pela Rainha… na verdade, não era segredo para ninguém, pois, apesar de respeitá-la como regente, não fazia questão de esconder suas emoções.
— Eu realmente tenho que responder sua pergunta? Você já sabe o que ela disse e do que ela me chamou.
— Você sabe que isso diz muito mais sobre ela do que sobre você, certo?
Aegon passou a mão pelos cabelos prateados, frustrado.
— Eu sei... É que... dói. Estou tentando tanto, estou tentando ser melhor, mas sinto que nunca sou o suficiente. Não importa o que eu faça, minha mãe nunca está feliz comigo.
— Aeg... Sua mãe nunca está feliz com nada. Ela é cronicamente miserável. — ela segurou seu queixo, fazendo-o encará-la. — Alicent não tem o direito de tratá-lo assim. Isso só mostra o quanto ela realmente se odeia.
Aegon reconheceu a tentativa da garota de animá-lo e a amou por isso. Ele acenou com a cabeça após suas palavras, encarando seus olhos de verão.
— Eu sei... Mas não consigo deixar de buscar a aprovação dela. Só quero vê-la sorrir, só quero que ela aprecie as coisas que faço, mas nunca é o suficiente. É como se eu não fosse digno do amor dela... ou do amor de ninguém.
— Não diga isso. Sabe que não é verdade. — soou séria, seus olhos estudando seu rosto.
Aegon evitou encará-la, seus olhos dirigindo-se para suas mãos em seu colo, puxando a pele do canto das unhas.
— Mas por que eu sinto que é? Não importa o que eu faça, nunca é o suficiente. Meu pai sempre preferiu Rhaenyra, minha mãe sempre preferiu Helaena e só reclama do meu comportamento. Como eu deveria acreditar que sou digno de qualquer amor quando tudo o que pareço receber é ódio?
agarrou-lhe as mãos para que não se machucasse, encarando seus olhos de uma maneira determinada que nunca havia feito antes.
— Vamos embora.
Aegon franziu a testa.
— Já quer ir? Mas nem escureceu ain…
— Não daqui, bobo. De Porto Real. Da corte, da maldita Fortaleza Vermelha. Vamos embora daqui. Pegaremos algumas bolsas de ouro e voaremos para Essos, para… Pentos, ou qualquer outro lugar. Algum lugar alegre e animado.
O coração de Aegon pulou uma batida quando ela agarrou-lhe as mãos, e choque e descrença eram visíveis em seu rosto. Ele nunca sequer considerou que a princesa iria querer fugir com ele, mas a ideia de estar em algum lugar novo, longe do ódio de sua mãe e de sua família, parecia boa demais para ser verdade.
— Quer… fugir comigo? Está falando sério?
— Levaríamos nossos dragões e iríamos a festas, e visitaríamos muitas cidades! Nossa vida seria nada além de diversão, carnavais e música!
Aegon sentiu seu coração começar a acelerar e pôde sentir uma explosão repentina de esperança enchendo seu peito e seus olhos. Uma vida de festas, música e apenas diversão com parecia um paraíso. Ele não ousou sonhar que isso poderia ser possível, mas agora, enquanto ela falava tão empolgadamente, ele pôde sentir que era uma possibilidade real, os sons de suas risadas e imagens dos dois felizes dançando e bebendo tomando sua mente.
— E nós simplesmente... iríamos. Voaríamos para longe em nossos dragões e nunca mais voltaríamos?
— Bem… quero dizer, poderíamos voltar quando nosso ouro acabasse, se não encontrássemos uma forma de ganhar mais. — a princesa deu de ombros.
— Você é louca... Você sabe disso, certo? Estaríamos abandonando nossas famílias... nossas vidas... nossos títulos. Sua família nunca nos perdoaria. Minha família nunca nos perdoaria. Seríamos considerados foras da lei, .
deu uma risadinha, seus olhos brilhando.
— Vamos, Aegon. Vai ser uma aventura! E se acabarmos encontrando Saera Targaryen? Ouvi dizer que ela ainda administra uma casa de travesseiros em Volantis!
Aegon não conseguiu evitar rir junto com a garota; sua excitação e entusiasmo eram contagiantes. A ideia de uma aventura, de se libertar dos limites de suas responsabilidades e encontrar alguém como Saera Targaryen parecia atraente. Ele apertou a mão de , esperança e empolgação visíveis em seus olhos lilases.
— Você está falando sério, não está? Você realmente quer fazer isso... Quer fugir comigo e ter uma aventura como nenhuma outra?
— Estou falando seríssimo. Levaríamos apenas uma bolsa com algumas roupas e um pouco de ouro, e iríamos aprender a nos virar sozinhos.
Aegon sentiu seu coração acelerar com sua determinação, e o fato de ela estar disposta a jogar tudo para cima por ele era um sentimento quase inacreditável. Mas, no fundo, ele sabia que não podia deixar essa oportunidade passar.
— Acha mesmo que eles vão nos deixar levar ouro e roupas? Eles vão suspeitar que estamos indo embora e tentar nos impedir…
— Ninguém saberá, bobo. Nós teremos cuidado. E não podemos contar a ninguém! Jure!
Aegon assentiu, sua excitação crescendo, e ele apertou levemente a mão de em asseguração, encarando-a fundo nos olhos.
— Eu juro. Juro que não contarei a ninguém. Mas temos que ter cuidado. Ninguém pode descobrir o que estamos fazendo, especialmente minha família. Eles não podem saber o que estamos planejando.
A princesa se adiantou, tirando a adaga de Aegon da bainha e erguendo-a, espetando a ponta do dedo indicador, um pequeno rubi de sangue brotando do ferimento.
— Jure.
Aegon observou-a com surpresa, avaliando a seriedade do juramento. Após um instante, concordou com a cabeça, pegando a adaga de sua mão e fazendo o mesmo no dedo, uma careta afetando sua expressão com a mordida afiada da adaga. Ele entrelaçou suas mãos, a sua grande e desajeitada na bela e macia mão de , as duas gotas de sangue tornando-se uma ao colarem os cortes.
— Eu juro pela minha vida.
[1]Meu coração.


Aquela semana havia sido reservada para planejar a empreitada, e se mostrou ainda mais esperta e sagaz do que Aegon lhe dava crédito. O plano parecia infalível: iriam se disfarçar de servos para fugir do castelo por uma das passagens secretas de Maegor e, quando estivessem perto do Fosso dos Dragões, livrar-se-iam das roupas e seguiriam como se fossem apenas dar um passeio com os dragões, já que os Guardiões de Dragão raramente se intrometiam na vida dos príncipes e princesas valirianos. Quando dessem por falta dos dois, já estariam a meio caminho de Pentos.
E assim, arrumou sua bolsa discreta com apenas algumas peças de roupa e duas bolsinhas com dragões de ouro, prata e bronze, o que conseguira surrupiar em uma semana. Surpreendentemente, isso lhe fora fácil. Pegara uma das roupas das criadas do varal e uma touca para esconder os cabelos prateados, vestindo um couro de voo normal por baixo do vestido de tecido gasto.
Xingou-se ao olhar no espelho. Não tinha feições ordinárias o suficiente para aquilo. Pelo menos não havia herdado os olhos lilases dos valirianos, ou seria descoberta na certa. Certificou-se pela enésima vez se não dava para ver-lhe as madeixas de luar, pegando a bolsa e olhando uma última vez para os seus aposentos antes de pressionar o ponto na parede que se abriria para as passagens. O cheiro úmido de coisa guardada invadiu-lhe as narinas, fazendo uma careta deformar suas feições. Deuses, como fedia ali.
O som de suas botas no chão era a única coisa que podia ouvir, além de goteiras em algum lugar distante. O “tap tap” das solas de couro estranhamente lhe acalmava. Quando chegou ao ponto que Aegon havia lhe instruído a ir, já que ele conhecia muito melhor as passagens por usá-las para ir à cidade no meio da noite, viu que ele ainda não havia chegado. Um calafrio lhe percorreu a espinha. Será que ele havia desistido? Não iria mais? Deixaria-a ali esperando até amanhecer para voltar aos aposentos com a sensação de derrota? decidiu sentar-se no chão, a bolsa escorregando pelo braço enquanto ela podia ouvir os barulhos do castelo começarem a se acalmar, como um bebê no seio da mãe.
Após o decorrer de mais ou menos meia hora, pôde ouvir passos e uma risadinha. Virou-se e deu de cara com Aegon. Sentiu como se o peso do mundo saísse de seus ombros, suspirando.
— Por que diabos demorou tanto? Sete Infernos!
— Está ridícula nessa roupa.
Aegon deu uma rodadinha para mostrar suas próprias vestes, cambaleando. retorceu os lábios numa expressão de desgosto, levantando-se e caminhando até o tio, agarrando-lhe pelas bochechas, aproximando o nariz de sua boca.
— Bebeu? — vociferou, encrespando os lábios, os dentes à mostra. — Francamente, Aegon!
— Apenas um trago para coragem, ! Apenas isso, eu juro! — ela sabia que ele estava mentindo, mas apenas revirou os olhos, empurrando-o para trás pelo aperto de sua mão.
observou a bolsa que ele trazia consigo, muito parecida com a sua.
— Quanto de ouro conseguiu?
— Três bolsinhas. Meu pai nem notará.
Ela suspirou, concordando com a cabeça. Por fim, ajeitou os cabelos de Aegon por baixo do capuz que ele usava para que não aparecessem, assim como havia feito com os dela, avaliando-o de longe para certificar-se que tudo estava no lugar.
— Vamos, idiota.
puxou Aegon pela mão, e os dois caminharam até uma escada que levava para fora do castelo, atravessando o Portão do Rei sem levar nem um segundo olhar dos guardas. A princesa sorriu levemente ao perceber que seu plano, até então, havia funcionado. Os dois desceram pelas ruas até penetrarem no coração da Baixada das Pulgas, avante à Colina de Rhaenys. A cidade ganhava vida ao redor deles. Crianças corriam nas ruas estreitas a brincar, mulheres apertavam os seios contra os vestidos para se venderem, e alguns bardos tocavam por moedas perto de uma estalagem. Uma senhora agarrou a mão de , oferecendo-se para ler seu futuro, e Aegon apenas continuou andando, puxando a princesa.
— Tem de ignorá-los. Senão, vão arrancar-lhe até o último tostão. — ensinou, enquanto colocava uma moeda de bronze no decote de uma das muitas prostitutas que passavam por ali.
— Não chame atenção para si! — sibilou, fazendo-o soltar uma risada jovial.
Os dois se aproximaram do Fosso, parando em uma viela escura para se trocarem. Arrancaram os panos de si, dando lugar aos couros de montaria. Aegon observou enquanto ela removia seu disfarce, e não conseguiu deixar de sorrir ao observar sua aparência. As roupas de couro de montaria só serviam para destacar sua beleza, e ele se pegou encarando-a por alguns segundos a mais do que deveria.
Ele limpou a garganta, tentando recuperar a compostura.
— Definitivamente não parece mais uma garota da cozinha. Se é que já pareceu uma.
— Ótimo. Vamos precisar estar com a melhor aparência possível. Vamos. — eles caminharam em direção ao fosso dos dragões, e a princesa sorriu docemente para um dos guardiões de dragão, jogando seu charme. — Vamos fazer um voo noturno. Traga nossos dragões. — ordenou em alto-valiriano, num tom que não abria margem para discussão.
O rapaz concordou com a cabeça.
Dārilaros.[1] — reconheceu respeitosamente antes de se afastar, falando com os outros guardiões para trazerem Sunfyre e Asaprata.
Aegon surpreendeu-se com o quão perfeito era o Alto-Valiriano da garota, já que ele mesmo apenas sabia algumas palavras perdidas, seu conhecimento enferrujado.
— Com quem aprendeu? — perguntou, curioso.
A princesa deu um risinho sapeca, já sabendo que ele não gostaria da resposta.
— Daemon.
Aegon revirou os olhos. Sempre Daemon, Daemon, Daemon.
— Claro que foi o seu precioso Daemon.
— Irá mesmo discutir sobre isso neste momento? Não está em expectativa? E se não trouxerem os dragões? E se mandarem um dos guardiões avisar aos guardas neste exato momento?
Aegon abriu e fechou a boca algumas vezes como um peixe fora d’água, seus olhos lilases se arregalando. E se? Era uma pergunta válida. Sentiu suas mãos começarem a suar.
Em poucos momentos, porém, os guardiões vinham trazer seus respectivos dragões, e Sunfyre soltou um urro animado ao ver seu montador, dando um leve empurrão com o focinho em seu peito. Aegon sorriu, acariciando sua enorme cabeça. Havia poucas coisas na vida que o deixavam mais feliz do que estar com seu dragão.
sorriu levemente, observando-os de longe. Sempre admirara a conexão que o tio tinha com Sunfyre, o belo dragão dourado. Após cumprimentar Asaprata, andou timidamente até Aegon que, percebendo o que ela pretendia, ergueu a mão em sua direção. Quando a pegou, ele colocou-a no dorso de Sunfyre, que soltou um leve zunido em resposta, aceitando sua carícia.
riu levemente, chamando-o pela palavra em Valiriano que significava “lindo” e dizendo o quão majestoso ele era na mesma linguagem, até que Asaprata soltou um ganido exigente, demandando atenção também. Aegon observou a princesa e o jeito que sorria, seu coração dando uma volta que ele não soube como explicar.
— Última chance para desistir. Não irei ficar chateado. — provocou-a, observando sua reação.
riu quase com escárnio, seus olhos esverdeados brilhando com astúcia.
— Eu não perderia isso por nada neste mundo.
[1]Princesa (também pode significar príncipe).


Os dois voaram por algumas horas até chegarem em Pentos e deixaram os dragões do lado de fora da cidade, transpassando seus portões, os olhos guiando-se para todos os lugares. girou o corpo e olhou em volta com um sorriso extasiado no rosto. Era tão diferente de Porto Real! Sentiu a mão de Aegon entrelaçar-se na sua, e o príncipe os guiou pelas ruelas, sempre seguindo as outras pessoas para ter certeza de que não se meteriam em algum lugar perigoso.
Fitas de cores diferentes pendiam dos prédios, dando um visual alegre às ruas. Algumas pessoas os olhavam com curiosidade, porém não engajavam em diálogo, apenas reconhecendo suas presenças.
— Conseguimos, ! Estamos livres! — Aegon soltou, empolgado, enquanto puxava-a para si e abraçava-a pela cintura, girando-a despretensiosamente. soltou um gritinho alegre, rindo e lhe dando tapinhas nos ombros para que a colocasse no chão.
— Conseguimos. Nossa, não acredito que realmente escapamos! — ela escorregou pelo corpo de Aegon, e os dois continuaram o caminho até chegarem a uma estalagem chamada “O Suspiro da Donzela”.
O príncipe riu do nome enquanto finalmente soltava a mão de .
— Parece apropriado.
— Anda, estou exausta. Preciso de comida e cama. — os dois entraram na estalagem, sendo invadidos pelo cheiro de bebida e suor, apenas alguns poucos gatos pingados em mesas isoladas ainda ali. Ao caminharem até a estalajadeira — uma mulher de meia idade de olhos estranhamente esbugalhados e uma grande verruga acima do lábio —, notou os olhares de Aegon para as moças que ali estavam a se oferecer para os homens restantes. Ela revirou os olhos discretamente com um meio sorriso. O tio não mudaria nunca.
— Um quarto ou dois? — a estalajadeira questionou, olhando-os de cima a baixo curiosamente.
Aegon e se entreolharam, de repente constrangidos. Haviam conversado sobre aquilo, precisavam economizar o ouro que haviam trazido. Se ficassem sem nada, iriam ter duas opções: voltar para Porto Real com o rabo entre as pernas — o que Aegon já explicitamente dissera que não faria —, ou terem de recorrer a… métodos inortodoxos que nenhum dos dois gostaria de pensar.
— Nós vamos… um quarto. — Aegon disse, por fim, após limpar a garganta e se enrolar todo na resposta, o que arrancou uma risadinha sincera de .
A estalajadeira concordou com a cabeça, sua expressão não entregando nada, e caminhou pela estalagem num pedido silencioso para que a seguissem. Os dois jovens pegaram as bolsas, que agora pareciam ser mais pesadas do que realmente eram, e a seguiram até um quarto pequeno com uma lareira, uma cama não muito espaçosa, uma pequena mesa de carvalho gasta e descascada e duas poltronas puídas.
— Bem… não é a Fortaleza Vermelha, isso é certo. — murmurou, olhando em volta. Aegon soltou uma risadinha debochada.
— Já vi piores.
— Você não é parâmetro para nada.
Aegon novamente riu e encostou seu ombro no dela num humor brincalhão. Jogou a bolsa ao lado da cama, já se sentindo à vontade.
— Ainda tem jantar? — perguntou à estalajadeira, que ainda os observava, serviente.
— Temos um caldo grosso de coelho, um pouco de pão fresco e um pouco de queijo para esta noite. Se preferirem algo mais pesado, temos carne assada com crosta de ervas. Para beber, temos cerveja.
Aegon escolheu a carne e a cerveja, o caldo e o pão. A mulher concordou com a cabeça e a princesa catou algumas moedas de cobre, lhe pagando. Após parecer satisfeita com a quantidade de dinheiro, a estalajadeira acenou com a cabeça e anunciou num tom monótono que traria a comida logo, logo.
Quando a mulher saiu, suspirou e colocou a bolsa do lado oposto da cama, se jogando no colchão. Ela soltou um grunhido de desagrado ao sentir a falta das penas a qual era acostumada.
— Não gostei. — resmungou, arrancando uma risada de Aegon, que sentou-se ao seu lado, testando o colchão.
— Esperava penas, princesa? Não, não. Apenas palha para nós. Já deseja voltar para Porto Real?
— Vá à merda.
Aegon sorriu e deitou a cabeça no travesseiro.
— Ora vamos, não é tão ruim.
não respondeu, apenas suspirou e afofou o travesseiro o máximo que conseguiu antes de deitar sua cabeça. Não era nada como sua cama na Fortaleza Vermelha, mas obviamente não esperava que fosse. Era o suficiente. Melhor que dormir no chão.
— Sem arrependimentos, então? — Aegon estudou seu rosto, quase desafiando-a a dizer o contrário.
deu de ombros e ergueu uma sobrancelha muito loira.
— Nenhum.
Eles riram juntos até a estalajadeira voltar ao quarto com uma travessa cheia de comida. Ela colocou-a na mesa e os dois se levantaram depressa. Atacaram a comida assim que a mulher se retirou, se banqueteando em temperos e sabores desconhecidos.
— Deuses, isso tem um gosto muito melhor do que a comida que nos davam na Fortaleza Vermelha... Estou morrendo de fome. — A princesa lambeu os dedos ao pegar um pedaço da carne de coelho, devorando-a em uma só bocada. Aegon surpreendeu-se com a voracidade da garota enquanto sorria levemente para ela.
Ele dedicou-se a devorar a carne assada e a cerveja na mesma empolgação, o que não lhe foi muito difícil, pois também estava faminto. Logo, os dois estavam de barriga cheia, prontos para irem para a cama após um dia cansativo e cheio de tensão. Após a estalajadeira voltar e retirar os pratos, foi até a porta, trancando-a e colocando uma das cadeiras contra a maçaneta, certificando-se de que estava bloqueada.
— O quê? Sou neurótica, não quero ninguém entrando no meio da noite e roubando nosso ouro — acrescentou após uma encarada de Aegon, que a observava com um meio sorriso confuso. Ele não conseguiu evitar achar suas tendências neuróticas adoráveis, porém admiráveis, considerando que estavam em uma terra longínqua com pessoas estranhas. Cuidado nunca era demais.
Ela certificou-se que as janelas estivessem trancadas e voltou-se para o príncipe. Observou-o com escrutínio, pronta para trocar de roupa e se jogar na cama.
— Então, como faremos isso? Irá se virar ou…?
Ele foi arrancado dos pensamentos de como ela era mais preparada e cuidadosa que ele jamais seria e ergueu as sobrancelhas em surpresa.
— Ah… sim, sim. Irei me virar. Avise quando estiver pronta — pediu e virou-se de costas, coçando a nuca envergonhadamente.
certificou-se de que ele não iria olhar antes de pegar uma camisola da bolsa e começar a remover seus couros de montaria. O tecido macio da peça escorregou pelo seu corpo como as águas de uma cachoeira, e ela segurou uma risada ao ver Aegon parado como se houvesse engolido um cabo de vassoura.
— Pode olhar. — Ela guardou as roupas na bolsa e começou a destrançar o cabelo.
Aegon a encarou por alguns momentos, surpreso com a peça que ela escolhera. A seda acentuava as curvas da princesa, e ele nunca cansava de se surpreender com a beleza de . Os cabelos caíram à sua volta como prata líquida e ele precisou conter um suspiro, tirando a camisa enquanto ela penteava-os com os dedos.
— O que está fazendo? — ela questionou ao vê-lo deitar na cama apenas com a peça de baixo da roupa.
— Eu durmo nu. Não consigo dormir com muita roupa — justificou enquanto fazia uma careta. Conseguira ao menos manter a peça de baixo para não desrespeitá-la, mas se sentia preso dormindo com muitas roupas.
soltou um resmungo e puxou os lençóis ao deitar-se na cama. Virou-se então de barriga para baixo e assoprou a vela de sua mesa de cabeceira, a luz da lua vinda das janelas lhe jogando em uma penumbra.
— Então… Acho que seguiremos partilhando a cama, não é? — Aegon puxou conversa enquanto encarava o teto.
— A não ser que deseje dormir no chão — a princesa respondeu, sempre astuta.
Aegon soltou uma risada de deboche e negou com a cabeça.
— Não, não. Aqui está bom, obrigado, prefiro o conforto.
Ela soltou um suspiro de prazer ao abraçar o travesseiro e fechar os olhos, pronta para descansar. Aegon sorriu levemente, o som estranhamente reconfortante. Ele pôde sentir o calor do seu corpo ao lado dele, e sua frequência cardíaca começou a acelerar. O príncipe tentou se distrair ao encarar o teto e contar as travas de madeira, mas não conseguiu evitar olhares furtivos para . Seus lábios se entreabriram ao notar como a luz suave acentuava as curvas do seu corpo.
A hora se passou, e Aegon ainda estava bem acordado. Ele tentou ficar confortável, mas a cama parecia muito apertada e as memórias do corpo torneado da princesa continuavam a dançar em sua mente como uma cortesã voluptuosa. Ele podia ouvir sua respiração suave e isso não o estava ajudando a relaxar. Olhou para a princesa, e observou-a enquanto ela estava deitada de bruços, suas pernas enroladas nas cobertas. Ele não pôde deixar de notar como a camisola subiu, revelando a pele lisa de suas pernas e coxas.
O príncipe sentiu um arrepio percorrer sua espinha enquanto olhava para as pernas e coxas expostas de . Sua frequência cardíaca acelerou e ele sentiu um calor se acumular na boca do estômago, como se houvesse levado uma rajada de fogo de dragão. Não conseguiu de jeito nenhum desviar o olhar, e pensou em como seria fácil estender a mão e tocar a pele macia de .
Ele cerrou os punhos e tentou lutar contra o desejo crescente dentro dele. Lembrou-se de que ela estava dormindo, confiando nele, e que ele não deveria estar tendo esses pensamentos.
Porém, quanto mais ele tentava resistir, mais forte o desejo se tornava. Pôde sentir suas roupas íntimas ficarem desconfortáveis enquanto seu corpo começava a reagir à visão do corpo torneado de . Com um pequeno suspiro frustrado, tentou encontrar uma maneira de se distrair dos pensamentos que inundavam sua mente. Esfregou o rosto abruptamente e desviou o olhar, tentando se concentrar em qualquer outra coisa, mas a imagem da garota, num sono pesado e tão perto dele, estava gravada em sua mente.
Era como se sua mão coçasse, uma coceira desagradável que o incitava a estendê-la e tocar a pele cremosa e imaculada da princesa. Aegon umedeceu os lábios e pressionou-os juntos. Seus dedos se estenderam até a garota devagar e pararam a milímetros de distância, pairando sobre sua pele como nuvens em um céu de tempestade. Sete Infernos! Por que não conseguia seguir em frente? Faria com qualquer garota, mas… era diferente.
Por fim, cedeu aos instintos. Seus dedos traçaram levemente a pele macia da coxa da princesa. Como se houvesse sido queimado por fogovivo, removeu-os e finalmente puxou os lençóis. Cobriu-a, escondendo sua nudez. Era o mínimo que podia fazer por ela, que havia se desprendido da vida que tinha para ir embora com ele.
Daria tudo por , faria tudo por ela. Era um juramento que fizera a si mesmo no momento que os dois deixaram Porto Real.


A manhã veio e, com ela, a perspectiva de explorarem a cidade. ) acordou com o coração batendo forte de excitação, apenas a imaginar as coisas que descobririam naquele primeiro dia em terras novas.
Um pequeno sorriso brotou em seus lábios, porém ela não foi longe, sentindo-se acorrentada. Quando olhou para baixo, viu um dos braços de Aegon fortemente envolto em sua cintura, prendendo-a contra si enquanto ressonava baixinho. ) grunhiu e tentou se soltar, mas aquilo apenas fez com que Aegon a apertasse mais forte e resmungasse levemente. Seu rosto se retorceu em uma careta de desagrado enquanto dormia.
— Está me sufocando — ela avisou enquanto se mexia novamente para acordá-lo.
Aegon resmungou novamente enquanto soltava um suspiro sonolento e seu braço afrouxou o aperto em volta da garota. Ele esfregou os olhos e encarou-a, grogue, seu rosto ainda meio enterrado em seu cabelo.
— Desculpe. Devo ter me agarrado a você enquanto dormia.
— Velho hábito? — ela perguntou em deboche, também levemente grogue.
Aegon assentiu devagar, seus olhos ainda quase fechados.
— É, acho que sim. Sou conhecido por me agarrar a travesseiros e cobertores enquanto durmo.
O príncipe deixou escapar um pequeno bocejo e a puxou para mais perto dele, seu corpo ainda quente e firme contra o seu. Esfregou então seu rosto no pescoço de , e ela sentiu um arrepio. Ainda assim, a garota não se afastou, mas soltou um som de agrado. Seus corpos se alinharam novamente.
Aegon suspirou levemente enquanto a princesa soava satisfeita e se aconchegava mais perto dele. Ele pôde sentir o calor irradiar do corpo de e saboreou a sensação de pele contra pele. Inalou profundamente e o cheiro do seu cabelo invadiu suas narinas. Soltou outro pequeno bocejo.
Mmm... Isso é gostoso.
— Bem, não se acostume. E lembre-se de abaixar o braço, está esmagando minhas tetas — ela brincou, embora não fosse tão mentira assim.
Aegon soltou uma risadinha e sua mão se moveu para baixo para descansar em seu estômago em vez de seu peito. Ele gentilmente deu um tapinha no estômago da princesa em brincadeira, um meio sorriso ainda em seus lábios.
— Desculpe por isso. Não percebi que estava apertando. Serei mais cuidadoso da próxima vez.
Ele soltou outro pequeno suspiro, seu corpo ainda pressionado confortavelmente contra o dela. Ele pôde sentir sua respiração suave e quente contra seu braço enquanto estavam deitados juntos, e aquilo lhe deu confiança para tornar a pegar no sono, assim como .
Eles acordaram novamente quando o sol brilhou alto no céu e uma batida na porta ecoou pelo quarto, o que fez os dois soltarem um grunhido de desagrado.
— Deve ser a criada com o desjejum. Vá checar, sim? — empurrou Aegon em direção à porta, e o garoto teria caído da cama se não houvesse se segurado na cabeceira.
— Está bem, está bem.
Aegon levantou-se e esticou as costas. Bocejou e ajeitou a peça de baixo para se mostrar mais composto, seus cabelos prateados jogados para todos os lados enquanto ele abria a porta com um olhar cansado e sonolento.
Uma jovem criada loira se encontrava de pé do lado de fora, enquanto equilibrava uma bandeja com vários itens de café da manhã. Ela abaixou a cabeça respeitosamente quando ele apareceu na porta.
— Bom dia, meu príncipe. Trouxe desjejum. Por conta da casa — disse a menina, sua voz suave e educada.
se mexeu na cama e soltou um som de deleite. Estava faminta. Porém, as palavras da criada adentraram seus ouvidos e invadiram seu cérebro, e ela hesitou, perguntando-se se havia ouvido direito ou se era apenas um hábito.
Quando deu-se conta, deu um pulo da cama.
— Do que o chamou? — questionou ao ir até a porta e quase atropelar Aegon com a bandeja de comida, que parecia não ter percebido nada de estranho.
A empregada olhou para , surpresa em seu rosto com a explosão repentina da garota. Ela olhou de volta para Aegon, sem saber como responder.
— Ah, e-eu peço desculpas, princesa — gaguejou, suas bochechas ficando vermelhas enquanto ela se perguntava mentalmente o que havia feito de errado. — Eu simplesmente o chamo de “Príncipe” porque... bem, ele é o Príncipe de Westeros. É apenas uma forma de respeito.
Os olhos de se arregalaram, e Aegon pareceu se dar conta naquele exato momento do que estava fora de lugar, suas sobrancelhas se erguendo em surpresa.
— Como sabe quem somos? — ela questionou novamente, cruzando os braços de maneira desconfiada enquanto Aegon colocava a bandeja na mesa.
A criada hesitou e seus olhos terrosos se moveram nervosamente de um lado para o outro entre Aegon e . Ela pôde ver a desconfiança na expressão da mais nova, e abaixou a cabeça, mexendo nervosamente nos dedos.
— E-eu sinto muito, minha senhora, — gaguejou novamente, sua voz agora cheia de uma pitada amarga de medo. — Eu reconheci o príncipe pela descrição. Muitas pessoas aqui em Pentos estão cientes da realeza de Westeros... E não é difícil reconhecer o cabelo prateado dos Targaryen.
suspirou e abriu a bolsa. Tirou de lá dois dragões de ouro e caminhou até a garota.
— Pedimos por discrição. Pode fazer isso? — perguntou enquanto tomava a mão da jovem. Enfiou as moedas nela e as fechou enquanto mantinha-a em seu aperto. — Negue todos os rumores. Diga que somos de Lys. Mesmo que ninguém acredite, já é um começo.
Os olhos da criada brilharam ao ver as duas moedas, decerto mais do que ela já ganhara na vida. Ela acenou com a cabeça freneticamente, os lábios entreabertos em choque.
— Claro, minha senhora — respondeu, sua voz cheia de gratidão. — Não mencionarei uma palavra a ninguém, e negarei todos os boatos. Sei como discrição é importante, seu segredo está a salvo comigo.
Aegon e agradeceram com um aceno de cabeça e a criada curvou-se obedientemente antes de se retirar. O príncipe fechou a porta e virou-se para a sobrinha com um rabo de olho enquanto se apoiava na mesa, seus músculos do braço flexionando-se.
— Bem, isso foi interessante. Acha que ela contará a alguém? Devemos confiar que manterá a palavra?
— Manterá se sabe o que é bom para ela — retrucou , que nunca machucara sequer uma mosca. Seus olhos moveram-se freneticamente enquanto ela mordiscava o canto da unha nervosamente.
Aegon notou seu nervosismo e caminhou até ela. Tirou-lhe os dedos de alcance, e entrelaçou a mão na sua.
— Ei, está tudo bem. Lhe deu moedas, ela pareceu ansiosa para ficar de boca fechada. Tudo ficará bem.
— Deveríamos mudar de estalagem a cada semana.
Aegon concordou enquanto compreendia a necessidade de cautela.
— Sim, provavelmente é uma boa ideia. É melhor não ficar muito tempo em um lugar.
Ele esfregou a mão de suavemente numa tentativa de acalmar seus nervos.
— Podemos nos mudar para uma pousada diferente amanhã de manhã, se isso fizer você se sentir melhor. Não temos pressa. Viemos para viver uma vida de diversão, não de nervosismo.
— Temo o que pode acontecer se nos encontrarem. O que se passaria a nós? Seríamos obrigados a voltar? Você se casaria com Helaena, e eu… O que fariam de mim? Achariam que eu estava arruinada, que fugimos juntos para nos casarmos ou algo assim, e eu não conseguiria um casamento. Não quero viver sob olhares de deboche e ser alvo de fofocas uma vida inteira, não tenho temperamento para isso.
— Ei… — Aegon puxou-a contra si e a abraçou, seu queixo no topo da cabeça de . — Não seremos encontrados. Nada acontecerá. Eu tenho a você, e você a mim. É tudo que precisamos, .
Ela fungou, o cheiro de Aegon acalmando-a. Ele cheirava a lar.
— Promete?
— Eu juro. Nunca deixarei nada de mal acontecer a você, . Deve acreditar nisso.
ergueu os olhos úmidos que brilhavam como pequenas pedras de jade, encarando os seus de ametista.
— Eu acredito. — Foi tudo que disse enquanto encostava a cabeça no peito de Aegon novamente, permitindo que ele a consolasse. Confiava nele com sua vida. Afinal de contas, o que lhe restava agora?




Continua...


Nota da autora: E vamos de mais uma fic de HOTD! Confesso que é meu hiperfoco atualmente, como já disse, esperem mais trocentas fics KKKKKKKKKKKKK espero que gostem da jornada dos meus bebês!


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