Codificada por: Lightyear 💫
Finalizada em: Fevereiro/2025O meu caixa era o mais lento de todo o supermercado? Ah, provavelmente o atendente é simpático e iria me atender com muito carisma!
Minha calça jeans favorita rasgou no meio das pernas bem no dia da apresentação no trabalho? Tudo bem, era a chance perfeita para usar aquela calça de alfaiataria que comprei no brechó e nunca tive coragem de usar!
Um homem estranho estava me seguindo durante alguns quarteirões? Tudo bem... Espera, tudo bem? Tudo mal, tudo péssimo! O meu fim de tarde começou assim, comigo andando apressada, a pé, pelo centro da cidade, usando uma fantasia de carnaval e agarrando o mini spray de pimenta que estava na minha bolsinha. Pouco confiante, mas pronta para qualquer ataque.
– ! Querido, quanto tempo! – Agarrei o pescoço daquele pseudo-conhecido como se ele fosse a pessoa mais íntima do meu círculo de amigos.
franziu as sobrancelhas, entretanto correspondeu o abraço desconfiado.
– Esse cara de boné azul está me seguindo há alguns quarteirões. – sussurrei em seu ouvido, e tasquei um beijão em sua bochecha.
– Oi linda! – disse ele, colocando uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha, enquanto seus olhos procuravam o homem esquisito atrás de mim. – Nossa, faz muito tempo mesmo. Como você está, meu bem?
– Eu estou ótima e você? Vamos comigo lá no Rafael, está muito ocupado? – perguntei, segurando sua mão, ele foi mais rápido e passou seu braço por meu ombro.
– Vamos sim, eu já estava indo naquela direção mesmo...
Engatamos um caminhar apressado em direção ao prédio de Rafael que não ficava muito longe dali, volta a meia olhava para trás disfarçadamente tentando ver se o doido de boné ainda estava atrás de mim ou se havia desistido. Depois de alguns metros andando, ele aparentemente havia desistido.
Retirou o braço do meu ombro e perguntou educadamente:
– Você está bem? Ele chegou a fazer algo?
Finalmente consegui suspirar aliviada, olhando a rua movimentada em clima de carnaval, o chão estava coberto de confetes de papel e só agora pareci notar a fantasia dele de ratinho cego do Shrek, camisa e bermuda brancas, óculos escuros redondos, uma bengala e um arquinho com orelhas redondas feitas de E.V.A. Era uma fantasia simples, o famoso “cospobre”, mas ficava bem nele, era divertido.
O otimismo voltou ao meu corpo, me fazendo entender que se aquele cara estranho estava me perseguindo, era porque eu devia encontrar um velho conhecido no caminho.
– Estou bem, puxa, obrigada! Eu estava ficando preocupada.
Ele assentiu, meio perdido sem saber o que fazer, pôs as mãos na cintura e olhou o movimento nas ruas: ainda era cedo e nenhum bloco ou trio elétrico haviam passado, as ruas estavam movimentadas de pessoas perambulando em montinhos separados, a muvuca principal do carnaval ainda não tinha iniciado.
– De boas, você está indo para o Rafael mesmo?
– Sim, combinei de encontrar ele lá, na verdade estou meio adiantada.
– Tudo bem, eu te acompanho. Estou esperando a Joana.
era um amigo distante de Rafael, aquela pessoa que você sabe que seu namorado tem uma amizade mas que acabam se vendo com pouca frequência. Eu conhecia , assim como conhecia sua namorada Joana, porém não o conhecia o suficiente para dizer que ele também era meu amigo. E mesmo assim ele fez questão de me acompanhar até o apartamento do meu namorado, provavelmente ia dar um toque do tipo “não deixa sua namorada dando sopa por aí”, daríamos umas risadas e ele iria embora encontrar Joana.
– Obrigada.
O caminho foi silencioso, aquele silencio constrangedor que faz você olhar a pessoa com um sorriso amarelo, aquele constrangimento de quando você se despede de alguém no supermercado e encontra ela no corredor seguinte. E apesar disso, se manteve firme em sua palavra, mesmo quando entramos no elevador do prédio acompanhados de um casal de velhinhos simpáticos que sorriram para nós por causa das nossas fantasias.
Eu usava um body de abelhinha, preto e amarelo listrado, com uma saia de tule preta e meias arrastão também pretas, nos pés um coturno amarelo que comprei em um brechó próximo da Praça XV e na cabeça, um arquinho com antenas.
Quem era eu para julgar o “cospobre” de ?
Abri a porta do apartamento de Rafael com a chave extra que ele havia me dado no início do ano para “simbolizar o nosso compromisso” (palavras dele mesmo), e a cena que eu e nos deparamos era difícil de descrever.
Rafael, meu namorado, estava sentado no sofá de costas para nós. Em seu colo, uma garota gemia alto quicando com uma maestria digna de um filme pornô, as duas mãos de Rafael apertavam seus seios fartos que haviam sido puxados para fora do decote do vestido sem retirá-lo do corpo. A garota estava de olhos fechados e seus lindos cabelos louros estavam jogados por seus ombros, espalhados como uma bela cachoeira.
– Joana?
A voz de me retirou do transe. Percebi que eu estava de boca aberta.
Joana?
Quais eram as chances?!
Quais eram as chances do meu namorado estar me traindo com a namorada do cara que acabei de esbarrar na rua e que por acaso havia me acompanhado até meu destino final?
Joana parou de gemer e de quicar ao mesmo tempo. Seus olhos nos encontraram e ela desceu do colo de Rafael, enquanto ele virava o rosto para ver quem estava atrapalhando aquele momento tão íntimo. De boca fechada e olhos abertos, a reconheci.
– Por favor, não parem só porque nós chegamos. – Só agora percebi o nó em minha garganta, tentei engolir, porém o nó não descia.
– , eu posso explicar. – Consegui ter o vislumbre indelicado dele enfiando seu membro de volta na cueca, enquanto Joana enfiava seus peitos no vestido azul-claro de Alice no País das Maravilhas.
– Pode mesmo, Rafael? Tem certeza?
– Eu... É que... – gaguejou ele, vindo na minha direção. Dei dois passos para trás, e observei Joana tentando se aproximar de da mesma maneira.
– Não precisa se explicar, está tudo certo. Toma. – Joguei a cópia da sua chave na sua cara e saí antes de ele falar mais alguma coisa. debateu algumas palavras com sua namorada, ao mesmo tempo, em que fui até o corredor apertar o botão do elevador com uma força desnecessária.
Meu cérebro nem havia assimilado o que eu havia acabado de presenciar quando passou por mim como um furacão e se enfiou no elevador que tinha chegado ao mesmo instante, entrei e apertei freneticamente o botão de fechar a porta quando Rafael e Joana chegaram, não deu tempo de eles interromperem nossa saída dramática.
Quando a porta fechou por completo, soltei a respiração que estava presa em meu peito e deu uma risada alta e nervosa, a risada se transformou em uma gargalhada e ele olhou para mim antes de dizer:
– Eu realmente acabei de presenciar a porra do Messi comendo a Alice no País das Maravilhas? Rafael estava usando o uniforme de Lionel Messi, de quando ele jogava no Barcelona.
Acabei me contagiando com a sua risada e descemos todo o percurso do elevador em um mar de risadas desesperadas, quando a porta se abriu, eu enxugava minhas lágrimas e me olhou sem saber o que fazer.
– Você quer beber algo? – perguntei erguendo os ombros, tentando fingir que estava tudo bem.
Ele pareceu pensar por alguns segundos, eu só não estava afim de passar o carnaval chorando, ou tendo que explicar o que aconteceu para todas as minhas amigas e, muito menos, sozinha.
– Não sei se é uma boa ideia, .
– Nem eu, vamos lá , você quer mesmo passar o carnaval na fossa?
Ele olhou para o chão chutando algo que eu tinha certeza que nem existia. Se o destino quis tanto que estivéssemos juntos nesse momento, aposto que é por algum motivo.
– Tá bom, onde você quer ir?
– Vamos fazer um esquenta no Tião e quando o trio elétrico passar, nós vamos beijar tantas bocas que o meu hidratante labial vai ficar só o sabugo.
Um sorrisinho escapou por seus lábios.
– Como você consegue ficar tão calma? – perguntou ele quando estávamos cada um com um copo plástico gigantesco em mãos. A barraca do Tião era famosa na região pelos drinks de procedência duvidosa em quantidades exorbitantes e preços baixíssimos, a mistura perfeita para o carnaval.
– Não sei... Estou tentando ver pelo lado positivo, pelo menos não estávamos casados, não é? De qualquer maneira, não estou com raiva, só estou decepcionada. – Tomei um gole da minha bebida.
– É estranho, né? Você passa quatro anos da vida com alguém e você acha que conhece... – Ele me imitou, sentando-se em um banquinho de plástico ao lado da barraca. – Eu ia pedir ela em casamento no nosso próximo aniversário de namoro.
– É sério? Que merda. – Me sentei ao seu lado.
– Faz parte, é uma merda mesmo. – Tomou mais um gole da sua bebida.
– É fodido pra caralho, isso sim. Eu sempre achei o Rafael meio... heterotop demais, sabe? Mas quando estávamos sozinhos ele era um amor e isso acabou me conquistando. E agora minha cabeça está me trazendo à tona todos os sinais que eu ignorei.
– Como o que? – Ele usou o canudinho para mexer a bebida.
prestava a atenção no que eu dizia, porque havíamos criado um laço indestrutível de galhos trocados que seria difícil de esquecer, e eu queria falar tudo, assim como queria ouvir tudo que ele tinha a dizer, simplesmente parecia certo. Era certo um apoiar o outro naquele momento.
– Ah, sabe, curtidas de fotos de mulheres na academia, senhas no celular... Detalhes que eu acharia bobo se não tivesse visto com meus próprios olhos.
– Isso é uma merda... – suspirou bebendo um longo gole da sua bebida.
– Eu nunca fui ciumenta, não me arrependo de ser uma pessoa “de boas”.
– Não deveria mesmo, você não fez nada de errado... A não ser que tenha sido chumbo trocado. – disse ele, querendo saber se eu já tinha traído Rafael.
– É claro que não, credo, .
– Desculpe. – deu uma risadinha. – Eu precisava saber se era o único corno de mão única aqui.
– Não precisa ficar com ciúmes do seu galho, , estamos no mesmo barco. – falei e ele riu novamente. – Mas e você?
– Eu o que?
– Não vai falar nada? Já tinha encontrado algum vestígio?
– Não parei para pensar nisso ainda, estou com medo de abrir essa caixa na minha cabeça e encontrar muito mais coisa do que gostaria... Entende?
– Entendo. Então não vamos mais falar sobre isso.
Mudamos de assunto, conversamos sobre a nossa vida, sobre o trabalho e estudos, sobre seus animais de estimação e até em qual loja ele gostava de comprar roupas. Compartilhei algumas inseguranças, contei algumas piadas e depois do terceiro drink, já estávamos calibrados para o próximo round.
As músicas já começavam a se misturar, saindo de um carro ou uma caixa de som em outro lugar, encontrei um grupo de amigas e apresentei , informei sobre meu término e pedi para não falarmos sobre isso, indiquei com muito entusiasmo que precisava ocupar a cabeça também, e deste modo, fomos pulando de grupo em grupo, esbarrando em pessoas, bebendo coisas duvidosas, tropeçando em paralelepípedos soltos e fazendo cabaninhas para o outro fazer xixi escondido, o puro suco do carnaval de rua.
Eventualmente um de nós se agarrava com alguém e o outro tinha que esperar a pegação terminar.
estava se divertindo e eu também, era um verdadeiro carnaval em nossas cabeças confusas, mas nada disso importava enquanto houvesse álcool em nosso sangue, música alta zumbindo em nossos ouvidos e perder o outro de vista estava fora de questão, já que no início da noite fizemos uma promessa pouco confiável de que não íamos nos separar já que estávamos ligados pela união abençoada do chifre trocado, amém.
Quais eram as chances de eu virar parceira do por causa de uma traição dupla?
Me peguei percebendo o quanto ele era charmoso e engraçadinho meio tarde demais, notei seus olhos castanhos bondosos quando ele ajudava alguém que tinha dado PT no meio do rolê, ou sua boca bonita quando ele vinha me perguntar se tinha ficado sujo de batom.
Oh, merda.
Quais eram as chances daquilo ali terminar em algo bom?
– Vocês deviam ficar! – Fernando, um amigo de insinuou em certo ponto da noite, agarrando nossos pescoços com os braços e puxando nossas cabeças para perto da sua boca, de modo que só precisasse falar uma vez e o meu nariz quase encostasse no de .
– O que? Não cara, você está bêbado. – disse , tão bêbado quanto ele.
– Qual é, mano! É a vingança perfeita. Feita sob medida. – argumentou Fernando sorrindo ladino. – Você não acha, ? Que é a vingança perfeita?
nem fazia o meu tipo, eu nunca olharia para ele daquele jeito em um momento comum, mas... a situação era outra. Não era?
– A vingança perfeita seria eles nos encontrando transando em algum lugar impróprio, mas como eu sou uma boa moça, acho que um beijo está de bom tamanho. – respondi compartilhando um sorriso ladino junto com Fernando que arqueou as sobrancelhas virando o rosto para , que me encarava com a boca aberta. Seus olhos vagaram para minha boca e voltaram a encarar meus olhos novamente, ele engoliu seco e fechou a boca.
– , eu não vou me arrepender disso. – Seu tom era de aviso, como se estivesse me alertando de que aquilo podia ser um problema no futuro.
Quais eram as chances de isso não ser um problema no futuro?
O álcool ainda berrava no meu sistema, era fisicamente impossível negar uma ideia como aquela.
Nos encaramos por alguns segundos, pensando se aquilo realmente iria acontecer e Fernando soltou nossos pescoços.
– Vou deixar vocês a sós por um minuto, não façam nada que eu não faria.
– Como se existisse algo que você não faria, seu puto. – resmungou sorrindo.
Ele voltou a me encarar, agora com nossas posturas normais sem o braço de Fernando nos puxando, sua cabeça ficava um pouco mais alta do que a minha.
– Eu também não vou me arrepender disso, .
Seu sorriso contido foi o suficiente para eu ficar na ponta dos pés e unir nossas bocas. Se engana quem pensa que o beijo foi curto e suave, porque o negócio foi outro. As mãos dele me puxaram para perto com tanta rapidez que perdi o ar, sua boca se abriu e um beijo fervoroso foi iniciado, um beijo digno de carnaval, com língua, música e álcool, minhas mãos passeando por seus ombros largos que eu não imaginaria que fossem tão torneados e firmes. Separamos nossas bocas por um segundo.
– É impressão minha ou isso pareceu certo pra caralho? – perguntou ele, tirando as mãos da minha cintura e levando ao meu rosto.
– Não é impressão, não é impressão, o bagulho é sério. – Minha cabeça estava em outra dimensão com aquele beijo e eu precisava de mais. E ele prontamente me deu, puxando meu rosto para um beijo que tirou meus pés do chão. Nossas línguas estavam sincronizadas, os lábios querendo engolir um ao outro, aquilo era mais do que um beijo de carnaval, era algo além, era a porra do destino, era o sabor da vingança, era doce, gostoso e febril. sabia me beijar, sabia onde pegar e sabia o que eu queria, parecia qualquer coisa menos o ratinho cego do Shrek, e aquilo estava me deixando doida. Não sei dizer quanto tempo ficamos nos beijando, mas foi mais do que eu esperava e menos do que eu realmente queria. Só parou porque sabíamos que estávamos em um lugar público e aquilo não seria bonito, só sei dizer que beijei a sua boca mais de uma vez aquela noite, nos beijamos nos blocos, no meio das árvores da Praça XV, depois nos agarramos na porta de metal que fechava o bar do Tião, no beco próximo do lugar onde nos encontramos pela primeira vez no dia.
me levou até a porta de minha casa, eu dividia um apartamento com mais duas amigas, foi por esse motivo que Rafael havia me dado a sua chave.
– Obrigado por ficar comigo essa noite. – Ele sorriu de maneira tímida, como se não tivesse quase sugado a minha alma pela boca algumas vezes essa noite.
– Não precisa me agradecer por te beijar, fofinho. – brinquei, passando a mão pelo seu rosto e dando-lhe um tapinha leve.
– Eu quis dizer me acompanhar, engraçadinha. – Ele riu, empurrando meu ombro.
– Ah, claro. É isso que os amigos fazem, você me salvou mais cedo, lembra?
– Nós somos amigos, então? – perguntou ele, me olhando de cima a baixo, flertando.
Eu devia estar nojenta, suada, fedida, mas o seu olhar fez eu me sentir uma tremenda gostosa e aquilo bastou para mim.
– Somos amigos de galhos trocados. – falei dando um passo em sua direção e beijando-o mais uma vez, suas mãos pousaram em minha bunda, um limite que já havia sido liberado há alguns beijos atrás e nos agarramos mais uma vez na porta do meu apartamento para fechar o trajeto completo do dia, tipo um triatlo da pegação de carnaval.
Depois de alguns minutos, separei nossas bocas e toquei a campainha com o cotovelo ainda com minha mão enfiada em seu cabelo, enquanto beijava meu pescoço.
– Cadê a sua chave, vadia? – Milena, uma das minhas colegas abriu a porta com cara de sono.
– Perdi no rolê. – expliquei e ela deu as costas sem nem se dar ao trabalho de olhar na cara dele, como se não se importasse se eu estivesse com alguém que não era Rafael. – Boa noite, .
– Boa noite, .
– Viva a união abençoada do chifre trocado. – falei entrando em casa, unindo as mãos e abaixando a cabeça de forma pouco religiosa.
Ele imitou a minha idiotice e completou:
– Amém.
Quais eram as chances de isso parecer tão certo?