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Revisada/Codificada por: Calisto

Última Atualização: 11/09/2024

Se espera por uma narrativa cheia de reviravoltas, personagens destemidos e intrigantes, drama e mistério, definitivamente esta não é a história que procura.
Esta é a história de uma garota exatamente como qualquer outra, com sonhos comuns, um nome pretensioso e uma cidade natal a que jurou nunca mais retornar — mas vai, inevitavelmente, fazê-lo.
Esta é a história de como Monroe, uma década após sua formatura, descobriu que ainda se sentia a mesma adolescente que era no colegial.
(...)




Monroe nascera na pequena cidade rural de Connersville, com menos de 15 mil habitantes, no interior do estado de Indiana. Para ela, permanecer ali após a graduação era declarar a sentença de ter o mesmo destino de pelo menos 90% da turma de formandos de 1998: casar com o namorado do colegial, que herdaria os negócios da família (lanchonetes, mecânicas, pequenas mercearias), ter filhos, ver seu marido engordar e ficar calvo enquanto os anos passam. Não. Isso jamais serviria para .

tinha sonhos maiores que Connersville. Fazer faculdade. Morar numa cidade grande cheia de cultura e gente interessante. Ter um bom emprego, fazer algo que lhe garantisse uma vida confortável. Nenhum homem envolvido no quanto ela pode ou não gastar, se pode ou não pintar as paredes de sua casa da cor mais extravagante e única que encontrar, ou colocando seu detestável material genético dentro de seu útero para transformar em mais uma boca para alimentar.

E para alcançar tudo isto, aos 15 anos, Monroe decidiu fazer uma promessa a si mesma: deveria focar nos estudos, em conseguir uma bolsa na NYU e se mudar. Não deixaria absolutamente nada ou ninguém entrar em seu caminho. Enquanto suas amigas ganhavam pulseirinhas douradas com as iniciais dos namorados, se recusava a dar atenção a qualquer romance adolescente que poderia atrasar sua vida.

Aos 18, quando se formou e se mudou para Nova York, fez todo o possível para se distanciar ao máximo de tudo que remetesse ao ensino médio. Tinha um enorme desdém por aqueles 4 anos e pelos colegas de turma… a única exceção sendo sua amiga Robin, que de alguma forma conseguiu passar pelo filtro minucioso de ghosting que aplicara a todos os residentes de Connersville.

Aos olhares despretensiosos que passarem pelas polaroids pelas paredes de sua sala de estar, a vida de Monroe parecia quase perfeita. Aos 29 anos, ela tem tudo: um apartamento no Village, um café favorito a que ia todas as manhãs, fins de semana espetaculares em SoHo, roupas elegantes de novos designers em evidência na cidade, um grupo de amigas igualmente bem vestidas que parecia estar sempre disponível para um brunch ou uma festa de rooftop. E, é claro, um emprego excelente na área de marketing, escalando os degraus do mundo corporativo com tamanha destreza que nenhum teto de vidro parecia capaz de a segurar.

E aos 29 anos e 7 meses, Monroe estava prestes… a perder tudo.

(...)



— E é por isso que teremos que te desligar da empresa. Sinto muito — dizia Harrison, o homem vestido em um terno Valentino de cabelos grisalhos, seu chefe (ou melhor, ex-chefe) que acabara de tomar a decisão executiva de cortar gastos para dar uma promoção e um cargo claramente inventado para Marcus, seu sobrinho, que basicamente fazia a mesma coisa que na empresa, porém de forma 80% ineficiente e porca.

— É claro, eu entendo perfeitamente. — sorriu cordialmente e acenou com a cabeça, apesar de dentro de sua mente escrachar palavrões para o velho. — Foi um enorme prazer trabalhar nesta empresa, agradeço pela oportunidade.

levantou educadamente e se retirou do escritório do senhor Harrison, caminhou por todo o andar e entrou no elevador, descendo até o 13° pavimento, onde havia passado boa parte dos seus 20 anos trabalhando, fazendo hora extra não remunerada, vestindo a camisa da empresa, buscando o prometido crescimento corporativo, sonhando em ser promovida e, quem sabe, transferida para a filial em Londres quando completasse 30 anos. Apodrecendo. Perdendo sua juventude e saúde mental. Xingando aquele infeliz do Marcus. Maldito Marcus!

— Ugh!

grunhia e tentava respirar fundo enquanto juntava seus pertences por aquela sala espalhados. As 5 plantas, as pastas em tom rosa millennial que organizava todos os arquivos das campanhas que trabalhava, as tranqueiras decorativas, o velho chaveiro da estátua da liberdade na chave do escritório.

E aí vinha a pior parte, a pior das caminhadas da vergonha: passar por seus colegas carregando suas tralhas dentro de uma caixa, todos aqueles olhares de pena e satisfação — já que, é claro, muitos almejavam seu posto.

(...)


Três semanas se passaram e não conseguira sequer uma única entrevista. Desempregada, com aluguel para vencer e, ainda por cima havia descoberto, que todas aquelas interesseiras que chamava de “amigas” na verdade eram apenas companhias para festas. Descobriu da pior forma que a conexão era fraca e, aparentemente, no mundo adulto ninguém se importa muito com amizades.

Pela primeira vez em 10 anos, pegou-se pensando que sentia falta da escola. Sentia falta dos amigos da escola. Sentia falta de como todos os problemas pareciam sumir quando ultrapassava os portões de entrada da Connersville High. Sentia falta de como os outros se importavam em saber se ela estava bem… Droga, sentia falta até das fofocas da cidade-ovo em que vivia e de como todos pareciam querer tomar conta da vida alheia. Porque agora, naquele sábado ensolarado de abril de 2008, nem mesmo seu CD dos Backstreet Boys parecia dar sentido à sua vida.

Chorou por uns bons 40 minutos. Deu replay no CD. Chorou ouvindo All I Have to Give. Replay em All I Have To Give.

E aí, de repente, aquele pensamento intrusivo que tentava ignorar finalmente gritou em seus ouvidos com um megafone: “vou ter que voltar pra Connersville.”

— NÃÃÃÃO! — chorava, jogada em seu tapete felpudo, vestida com uma camiseta gigantesca escrita “I ♡ NY” que havia comprado em Coney Island quando era uma caloura na faculdade.

Eventualmente, é claro, o que era um pensamento intrusivo se tornou realidade: não tinha como pagar o aluguel caríssimo de seu apartamento no Village. Não tinha nem como pagar o aluguel de um muquifo na pior parte do Queens.

Então, no mês seguinte, Monroe estava bebendo a água que jurou que nunca mais beberias: dirigindo um caminhão alugado lotado com toda sua vida em caixotes de papelão na traseira, com destino ao grande estado de Indiana!

(...)



À beira dos 30 anos, Zara Monroe não tinha nada. De volta à casa dos pais, numa cidade rural com menos de 15 mil habitantes, um diploma superior de enfeite, nenhum emprego e… nenhum namorado. Merda, por que pensar nisso agora?! Como se as outras coisas não estivessem ruins o suficiente.

É claro, devia ser culpa daquela revista que folheava, deitada na cama de seu quarto de infância. Até a coleção de barbies na estante e os inúmeros pôsteres de boybands nas paredes cor de rosa pareciam lhe olhar com pena.

— Hum. 10 truques para conquistar o garoto que você gosta! — Zara leu em voz alta de forma sarcástica. — Eu preciso de 10 dicas para conquistar um emprego em Nova York de novo, Teen Vogue!

E então arremessou a revista longe — que acabou batendo bem no rosto de Justin Timberlake no poster do NSync.

— Foi mal, Justin… na verdade, não. Estou pouco me lixando pra você! Você saiu da banda porque é um desgraçado egoísta!

E foi naquele exato momento embaraçoso que a mãe de Zara, Clara, abriu a porta — mantendo o costume que tinha de não bater antes como fazia quando Zara era adolescente.

— Filha?

— Mãe! — Zara enrubesceu com vergonha, logo se sentando na cama e fingindo estar ocupada com… a lista telefônica. — Eu, han… tô procurando o número da pizzaria. Que sabor vocês vão querer?

Clara sorriu como se pudesse ler a filha como uma carta. Sabia exatamente o que se passava na cabeça da mulher. Aproximou-se e sentou ao seu lado na cama.

— É sobre isso que vim lhe falar. Eu e seu pai vamos sair hoje para jantar.

— Jantar? Onde vamos?”

— Não, . Só eu e ele.”

Zara franziu o nariz.

— Tá bom. Vou pedir a pizza só pra mim.

— Não, filha. Nós conversamos e chegamos à conclusão que está na hora de você sair de casa — Clara disse com um sorrisinho compassivo aos lábios, mas Zara logo arregalou os olhos, entendendo tudo errado.

— Mas eu acabei de voltar e estou sem emprego e sem dinheiro, pra onde eu vou? Por favor, mãe, eu preciso ficar com vocês por um tempo e-

— Meu Deus, não! — Clara esboçava uma pequena risadinha. — Não estamos te expulsando de casa, filha! Mas achamos que você precisa sair para passear, espairecer, rever seus amigos. Desde que chegou, você está enfurnada aqui, usando esse pijama rasgado. Mal toma banho e agora está conversando com os posters. Considere essa uma intervenção.

A mais jovem franziu o cenho, perplexa e meio ofendida.

— Não é um pijama, é um souvenir da grande maçã! — tentou se defender, mas a mãe apenas riu. Aquela camiseta I♡NY já estava mesmo começando a cheirar a suor de tanto que usava. E estava mesmo descosturando no ombro… mas era uma boa camiseta. Uma ótima camiseta.

Era confortável e grande, quase a engolia inteira. Era como um abraço quentinho… ou um abraço de sucuri que a estava começando a sufocar. Mas não queria desapegar! Qual o sentido de desapegar de uma camiseta perfeitamente boa? Qual o sentido de desapegar da vida que tinha em Nova York?

Chacoalhou a cabeça lado a lado para se livrar daqueles pensamentos indesejados.

— Eu nem tenho amigos aqui, mãe. E não tem nada para se fazer em Connersville. — Soltou um arzinho desdenhoso pelo nariz.

— Ah, que isso, a cidade está bem diferente agora! Temos até um boliche na Main Street. E às terças tem bingo na igreja.

— Mãããe…! — Zara grunhiu.

— O filho da vizinha disse que tem um bar próximo à saída da cidade. Disse que é cheio de gente da sua idade lá. Você devia ir.

Clara se levantou e foi saindo do quarto. Zara rolou na cama, olhando para o teto e para as estrelinhas que brilham no escuro ali coladas. Suspirou.

Costumava olhar para aquelas estrelas toda noite desde que tinha 5 anos.

— Eu sou patética — bufou para si mesma.

Sua mãe — e seu pai, apesar de não ter culhões para a confrontar diretamente e mandar a mãe o fazer sozinha — tinha razão. Precisava sair um pouco dali.

Era uma adulta em plenas capacidades, oras. Apesar de o ambiente não ajudar muito. Ou as músicas que continuava escutando sem parar em seu radiozinho cor de rosa também não ajudarem.

— Caramba, Monroe, tome controle da sua vida! — grunhiu para si mesma, rolando da cama para se levantar.

Talvez a fizesse bem mesmo sair e respirar um ar que não fosse lotado da essência da Zara adolescente. Eca. Chega sentiu um calafrio!

Era isto. Precisava sair para um lugar adulto, beber um cosmopolitan, conversar com gente da sua idade que não estava em um poster e podia respondê-la.

Olhou-se no espelho, com aquela camiseta a lembrando de tudo o que não tinha no momento. Daria tudo por um passeio no SoHo agora. E por seu emprego de volta. E sua vida de volta. Merda.

— Controle o que puder, confronte o que não puder — disse para sua própria imagem ali refletida, logo removendo a camisa e se dirigindo para um bom banho quente.

Tropeçou em duas caixas — ainda não desfeitas e apenas empoleiradas por todo o chão do quarto, porque, claro, isto era apenas um contratempo e seria contraproducente tirar tudo das caixas para em duas semanas encaixotar tudo de volta quando tivesse um novo emprego e novo apartamento em Nova York.

Ao chegar ao banheiro, abriu o chuveiro e se encarou no espelho enquanto a água esquentava. Chegou bem pertinho. E ali, em meio a sua testa cronicamente franzida de tanto chororô por já um mês inteiro, que se deparou com algo que a mudaria para sempre: as temíveis primeiras linhas de expressão.

— Que merda é essa?! — Aproximou-se mais, tentando massagear a pele para ver se aquilo sumia.

Não sumiu.

— Ah, claro, que ótimo momento para isso. Você realmente está me testando, universo?! E isso não foi um trocadilho, inferno!

Apesar dos quase 30 anos habitando este planeta, tendo visto, conhecido e amado diversas pessoas de mais idade que a sua — como sua mãe, avó e algumas amigas de mais de 40 anos que conhecera na aula de cerâmica (composta por 60% de mulheres da faixa etária, obcecadas pelo filme Ghost — o que, diga-se de passagem, também era o caso de Zara. Fala sério, quem faz aula de cerâmica sem ter visto esse filme?) — e tendo presenciado em primeira mão que nenhum, repetindo-se, absolutamente nenhum ser humano conseguia dobrar o envelhecimento e se safar das rugas, se vivesse o suficiente para adquiri-las… apesar de todos estes fatores, Zara, intimamente e por algum motivo, sempre acreditou que rugas eram coisas para as outras pessoas. Não para ela. Isso jamais aconteceria a ela. Não tão cedo. Nunca.

Certo que eram apenas finíssimas linhas que nem sequer eram percebidas por quem a via de fora, mas a imagem no espelho refletia todos os pavores de Zara em duas crateras do tamanho do Grand Canyon que dividiam agora sua testa!

— Eu não tenho nem 30 ainda!

Faltavam 5 meses.

Mas agora, aos 29 anos, já estava velha demais para qualquer coisa. 29 anos e desempregada. 29 anos e morando com os pais em Connersville. 29 anos e enrugada como um maracujá. 29 anos e nem sequer um namoradinho para exibir para as tias nos churrascos de família. Inaceitável.

Com uma imagem distorcida e um errôneo senso de si, em adição ao desmoronar de seus planos e a lembrança de que guardou uma tesoura na segunda gaveta do banheiro, vinda da única caixa que desfez, Zara Monroe se deparou com a mais profunda questão humana:

— E se eu cortar a franja?

(...)




O sol banhava o campo com seus últimos raios alaranjados quando estacionou o carro de seu pai em frente ao famoso bar que, aparentemente, o filho da vizinha recomendou e sua mãe semeou a ideia na mente de Zara.

Importante salientar que levara 45 minutos para fazer um trajeto de 20. Em parte por ter perdido a entrada que leva ao estabelecimento, localizado aos arredores da cidade — entre o meio do nada e a Fazenda Hopkins, onde Judas perdeu as meias. Em parte porque, desde que se mudara para Nova York aos 18 anos, Zara nunca mais tinha dirigido um carro, andava apenas de metrô, o que não existia em Connersville. Talvez em lugar nenhum em Indiana.

Agora o céu já estava escuro, o estacionamento surpreendentemente cheio, o letreiro neon com o nome L.U.R.K na fachada do bar refletindo sobre seu rosto enquanto Zara insistentemente penteava sua nova franja com os dedos, tentando domá-la da melhor forma.

— Merda.

Suspirou, tentando fazer as pazes com o fato de que cortou, sem querer, uma franja cortininha em vez da estilosa franja de lado que todo mundo que é alguém estava usando.

Fechou a pala do motorista, guardou seu gloss labial e seu BlackBerry cravejado em strass na bolsa e se retirou do carro num ímpeto de coragem.

E lá ia ela, em direção ao bar mais badalado… de Connersville. Trajando seu mini vestido Ralph Lauren de paetês dourados, meia calça preta e suas fiéis ankle boots rosa choque, seus olhos pretos esfumados mostravam que Zara Monroe não estava para brincadeira quando o assunto era estilo! Você a podia vencer nos quesitos carreira, sucesso, quantidade de amigos e vida amorosa, mas no estilo? Não tinha para ninguém!

Marchava com seus saltos agulha na grama não asfaltada do exterior da L.U.R.K. como se estivesse indo para mais uma balada no SoHo.

— Ai!

Tudo bem, foi só um tropeço. Acontecia quando se usa salto agulha na terra, ele inevitavelmente afundava. Como era que as mulheres andavam aqui? Caramba, eles precisavam mesmo reformar esse lugar. Mas tudo bem! Se as modelos da Victoria Secret conseguiam seguir após tropeços e problemas com os saltos, Zara Monroe também conseguiria!

Com um mindset renovado, distribuiu o peso do corpo para a ponta dos pés e finalizou o caminho até as portas de entrada, pronta para o que quer que a noite a trouxesse! Podia não ser Nova York, mas a festa não começava até ela chegar, onde quer que Monroe fosse, a diversão seguia, certo?!

— Meu Deus — Zara sussurrou baixinho para si mesma ao se deparar com o ambiente.

Esperava um pub requintado, meio rústico, mas ainda sim moderno. Pensou que a localização se devia ao fato de buscarem uma clientela mais exclusiva e exótica… Encontrou um bar nada glamuroso, pisos de madeira desgastados e uma penca de pessoas vestidas de calça jeans e camiseta.

Não havia ninguém vestido como ela.

Olharam-na com estranhamento.

Zara se sentiu pequena, mesmo com seus saltos enormes.

Não se identificava nem sequer se encaixava em sua própria cidade natal. Sentia que estava regressando todo o progresso que havia conquistado durante os quase doze anos fora de Connersville.

Doze anos. Não era mais a adolescente que nasceu aqui. Sentia-se velha demais para recomeçar. Não sabia o que fazer.

Sentou-se no banco alto em frente ao balcão, o barulho da alça de corrente de sua bolsa soando alto demais, o que chamou a atenção do bartender.

— Um Cosmo, por favor — pediu. Era tudo o que precisava, sua bebida preferida para a distrair um pouco.

O rapaz, que enxugava um copo com um pano de prato, cerrou os olhos com o pedido.

— Tem certeza que está no lugar certo? — perguntou o bartender.

Não. Definitivamente não.

— Pode ser um Blue Hawaii, então.

Ele esboçou um sorrisinho e soltou uma risadinha.

— Moça, nós temos cerveja ou chope. Qual vai querer?

Zara suspirou. É claro. Já devia saber.

— Alguma chance de ter cerveja de cereja…?

O barman sorriu e balançou a cabeça, logo enchendo um copo com cerveja comum e pondo a frente dela.

— Quer um caviar para acompanhar?

Zara rolou os olhos, mas agradeceu pela bebida. O rapaz foi atender outros clientes e a deixou lá para chorar suas pitangas em paz.

E que gosto horrível era esse?! Bleh!

Tendo prometido a si mesma que sairia e aproveitaria a noite, viu-se sem muita opção além de ficar e tomar esse copo inteiro… muito divertido, mesmo. Fisgou seu BlackBerry dentro da bolsa.

Havia poucas coisas em que Zara se achava realmente boa. A velocidade em que conseguia digitar um SMS no teclado do celular era uma delas.


Para: Clara Monroe

Mãe, esse bar é muito mequetrefe. Acho que o bingo da igreja é possivelmente mais divertido.


Para: Robin Bennet

Oi, Robs, alguma chance de você estar livre essa noite? Estou na cidade >-<


Ai! Essas carinhas com símbolos gráficos eram tão ridículas. Nota para a Zara de 30 anos: pare de usar carinhas nas suas mensagens, pensou.

Outro pensamento que teve era se Robin, sua amiga de escola, iria querer a rever… ela era a única com quem mantinha contato, mas “manter contato” é um termo muito forte. Respondia alguns SMSs que chegavam em raras ocasiões, deixou um depoimento no orkut dela uma vez… Robin a mandava algumas bandas que encontrava no MySpace para Zara e elas conversavam no MSN vez ou outra.

Tomou mais um gole daquela cerveja. Odiou o gosto. Fingiu costume.

O bar começou a encher mais.

O celular vibrou com um novo SMS.


Robin Bennet: “você está em Connersville?! aaaaah *-*”

Robin: “meu Deus, não acredito! Quanto tempo vai ficar? E sim, estou livre, totalmente livre lol”

Robin Bennet: “so dizer onde e que horas”


Zara sorriu. Abertamente. Finalmente um sentimento quentinho em seu peito.


Para: Robin Bennet

Conhece o LURK? O bar na saída da cidade? Já estou aqui, quando quiser/puder vir…


Assim que Zara apertou o botão enviar em seu SMS, um barulho estrondoso soou atrás dela, fazendo-a imediatamente se virar para ver o que era.

Tratava-se de… música ao vivo. E não era das melhores.

(...)




Uma banda de quatro integrantes se dispunha no pequeno palco improvisado do bar, que na verdade era apenas um tablado de pallets sobreposto por tapumes como piso e vários tapetes velhos, daqueles com cara de anos 70, cobrindo tudo. Até que o conjunto da obra dava uma vibe underground e, se fosse em Nova York, as pessoas iriam engolir tudo aquilo e dizer “que sabor!”, falando por aí que era algo super exclusivo e rústico, tornando o lugar 3 vezes mais caro.

O problema mesmo era que, pelo trepidar do baixo já na introdução da música, sabia que era metal ou algo do tipo. Algo que não era pop. amava música pop. Até country ela apreciava de vez em quando. Mas rock? Não. Aí já era demais… Mas quando o vocalista finalmente se virou para o público nas mesas, seu coração errou uma batida.

Ele era bonito. Muito bonito. Cabelos escuros e ondulados, um pouco longos, nada daquele descolorido espetado com gel que os caras estão usando. Seus olhos castanhos brilhavam como os de um cervo frente aos faróis do carro. Um corpo esguio adornado por roupas escuras e largas à la Kurt Cobain.

ficou paralisada. Ele era familiar, de alguma forma.

E por um lapso momento, ele a viu também.

E sorriu.

E exibiu as covinhas mais lindas do mundo para a . Ele tinha o sorriso juvenil que ela gostava num homem…

Ai, meu Deus, aquele é o…? — pensou alto e logo desviou o olhar, focando em seu drink. Até deu um gole maior do que o que poderia engolir. Engasgou e tossiu. Ergueu os braços para lidar com o engasgo.

O rapaz sorriu mais abertamente e soltou uma das mãos de sua guitarra por um segundo para acenar de volta, sem que isso sequer comprometesse a música. Impressionante.

Mas, espera, ele pensou que estava acenando? FRUTA QUE PARTIU! Se esconde, ! Vira de volta pro balcão! Finja que nada aconteceu e que você não o conhece! Finja que você não está sentindo uma revoada de borboletas se agitarem em seu estômago!

Ai, baralho, estava agindo como uma adolescente! Se controla!

Mas ele acenou mesmo? Ele lembrava dela? Até que foi fofo…

Não! Se controla, não era como se ele lembrasse. Ele só pensou que você estava amando a música. Pff, era o que faltava! Monroe, de coordenadora de marketing de uma grande empresa na metrópole mais cosmopolita do mundo à groupie de uma banda amadora de… emo? Quem vai saber o gênero disso que estavam tocando. Pop é que não era.

Quando a primeira música terminou, já havia um impressionante público de umas 15 pessoas e 5 bêbados agrupados em frente ao pequeno plateau aplaudindo e curtindo a performance. Parecia que eram populares por aqui. Bom, na medida do possível para uma cidade como Connersville.

O vocalista fez um gesto com as mãos para a banda, que parou o set. Ele então aproximou a boca ao microfone e, com um sorrisinho ao canto dos lábios, começou a falar:

— Temos a casa cheia hoje, rostos familiares. É muito gratificante pra gente ver vocês voltando toda quinta, pessoal, obrigado…

Os olhos do rapaz vagaram pelo estabelecimento e pararam direto na figura de , sentada ao balcão pastoreando o copo de cerveja em suas mãos. Ela enrubesceu.

— E hoje temos a presença ilustre da filha pródiga de Connersville, diretamente de Nova York, Monroe!

Ai, meu Deus… Ai. Meu. Deus!

— Ai, meu Deus — disse num suspiro que escapou de seus lábios.

A multidão de 20 pessoas toda se virou para ela, aplaudindo.

Ela ficou embasbacada, sem saber para quem olhar ou o que fazer com as mãos. Tal qual quando lhe cantavam feliz aniversário ao redor do bolo.

Queria se esconder dele, mas ao mesmo tempo… havia um sentimento quentinho aflorando rápido pelo seu peito, o sentimento de ter encontrado seus olhos de cervo brilhantes no meio da multidão.

— Nós somos o Estrela Decadente, a próxima música se chama Sex On Fire, se conhecerem, sintam-se livres para cantar junto. Esperamos que se divirtam essa noite.

O set seguiu, as pessoas voltaram a olhar para a banda, a cerveja nas mãos de esquentou intocada enquanto ela se aproximava de uma peculiar ruga no tempo que quase nunca acontece fora dos filmes.

(...)


Continua...


Nota da autora: Finalmente chegou quem estavamos esperando! Bem-vindo, ! Espero que vocês gostem dele tanto quanto eu. E obrigada Els por enviar att no meu aniversário - enquanto eu surto tal qual a mesmo sendo mais nova que ela. Uma curiosidade: eu escrevi a fic e depois de finalizar fiz as contas de quando seria o aniversário da e absolutamente sem querer ela é virginiana, setembrina, tal qual a autora. Então feliz aniversário pra nós duas e pra quem mais tiver nascido sob a lua de primavera. Não deixe sua vida se basear no que o mundo acha que você devia ter feito até certa idade. (Auto critica) - Z

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