Codificada por: Lua ☾
Última Atualização: 17/12/24Queens, Nova Iorque
Quantos sonhos será que cabem no coração de uma menina de dezoito anos? Planos de uma vida inteira pensados com a certeza de que nem mesmo o céu seria o seu limite. Uma vida planejada pensando no futuro. Boas notas, bons conceitos, boas conexões.
Tornar-se uma bailarina famosa, médica, professora, arquiteta. Esperar um tempo para entrar na faculdade e viajar pelo país. Casar com o amor de sua vida, construir uma família e ter uma casa com piscina e dois cachorros. Nessa idade tudo parece tão fácil, tão simples que nada de ruim poderia acontecer e atrapalhar a perspectiva de futuro garantido. Afinal, o que poderia dar errado na vida de uma garota que havia acabado de completar dezoito anos e que tinha um futuro brilhante pela frente?
E eu respondo: tudo pode dar errado.
Os meus planos, bem, os meus planos tinham ficado em algum lugar do passado, na casa em que havia crescido ou então enterrados no cemitério junto às duas pessoas mais importantes da minha vida. Juntos da ilusão de que nada ruim aconteceria comigo.
"Sinto muito, Alice, mas seus pais não sobreviveram..."
"Desculpe Senhorita, mas isso é uma ordem de despejo"
As palavras do médico misturavam-se à notícia dada pelo advogado de meus pais, estilhaçando o vidro da minha redoma e transformando todos aqueles planos e felicidade em algo ilusório, em um verdadeiro pesadelo. Eu estava órfã e no olho da rua. Longe de tudo que um dia havia sonhado pra mim. Em setenta e duas horas, uma realidade até então desconhecida havia batido em minha porta, me mostrando um lado da vida que nunca pensei que fosse conhecer.
– E então, Alice, o que me diz? O que acha de ir conhecer minha boate? Apenas conhecer, sem comprometimento algum. Durante o caminho eu posso lhe explicar como as coisas funcionam por lá... – a mulher insistiu. – O bordel fica no SoHo, em Manhattan, então teremos bastante tempo para conversar...
Mesmo com a leve iluminação dos focos de luz da praça, eu conseguia ver quase perfeitamente a dona da voz suave, que me persuadia com uma proposta indecente. De longos cabelos castanhos ondulados, que emolduravam perfeitamente seu rosto fino e jovial, ela exalava uma sensualidade apenas vista em atrizes famosas de cinema e fazia-me perguntar se de fato tudo aquilo era verdade.
Margareth era o seu nome e ela me encarava com aqueles olhos castanhos, destacados por uma maquiagem preta, cheios de expectativas como se não esperasse um "não" como resposta. Eu prostituta? Minha boca abriu e fechou sem que conseguisse encontrar minha voz para respondê-la.
Eu esperava que tudo aquilo fosse uma brincadeira de mal gosto ou uma enorme mentira, já que simplesmente não conseguia assimilar que Margareth era, nada mais e nada menos do que uma cafetina, que estava me chamando para conhecer seu bordel. Entre todos os meus planos e sonhos de uma vida inteira, entrar para o mundo da prostituição nunca fora uma opção, mas naquele momento, todo o futuro que um dia havia sonhado para mim, tinha ficado em algum lugar extremamente distante.
– Sem comprometimento? Apenas para conhecer? – eu questionei, fungando em meio ao choro. A mulher ao meu lado assentiu ferozmente.
Era apenas conhecer… que mal isso faria?
– Eu vou com você…
E essas foram minhas últimas palavras antes de Margareth sorrir presunçosamente e me levar até seu carro preto, estacionado logo na esquina.
Manhattan, Nova Iorque
Uma. Duas. Três.
Merda!
Quatro. Cinco. Seis.
Seis badaladas e eu já estava atrasada. Em trinta minutos estourava meu "toque de recolher" para que em menos de duas horas já estivesse pronta na boate. Essas eram as regras da casa: estar de volta antes das seis e meia.
O cemitério já dava indícios de que iria fechar e mais ninguém era visto no campo aberto entre as lápides, além de um senhor de cabelos brancos, um tanto magricela usando um uniforme de segurança e que vinha em minha direção com ar de impaciência.
– Vamos minha jovem, o cemitério já deveria ter fechado em cinco minutos! – ele me apressou, balançando um molho de chaves.
– Desculpe, já estava de saída... – respondi sem me dar o trabalho de encará-lo.
E mais um ano aquela cena se repetia. Já era o quinto que eu perdia o horário naquele dia em especial, sentada sobre o túmulo cheio de folhas de meus pais enquanto enchia meus pensamentos de nostalgia. Eu mal tinha dinheiro e tempo de manter suas lápides em boas condições. Céus, seis anos já haviam se passado e eu ainda não sabia definir o sentimento que me atingia naquela data.
O barulho irritante das chaves balançando começou a ficar mais intenso sob meus calcanhares, obrigando-me a dar meia volta e seguir de cabeça baixa até a saída do lugar, mas não sem antes ajustar a singela coroa de flores entre as lápides de meus pais. Aquele era o único dia do ano em que eu me permitia tamanha melancolia, em que eu me permitia sentir toda a saudade reprimida ao relembrar o que por muito tempo ficou marcado como o pior dia de minha vida.
Nunca era fácil lidar com aquele luto, principalmente quando as lembranças acabavam vindo à tona. Tudo começou com uma viagem a negócio, os dois haviam saído para uma viagem de trabalho representando a empresa onde trabalhavam juntos em uma reunião em Atlantic City, em Nova Jérsei. Seria uma coisa rápida, no máximo três horas de estrada para ir e mais três para voltar. Seria tão rápido que segundo minha mãe eu sequer teria tempo para sentir falta deles e, em suas palavras, se essa reunião desse certo as nossas vidas iriam mudar a partir daquele dia.
As lembranças eram frescas em minha memória. Lembrava-me de ter a abraçado forte enquanto ela mexia em meus cabelos, tentando me consolar com palavras doces, que eu deveria ficar calma pois no outro dia pela manhã eles estariam de volta e que aquela angústia e pressentimento ruim eram apenas besteira. Eles já haviam feito essa viagem muitas vezes nos últimos meses e os dois conheciam o caminho de olhos fechados. Bem, ela estava certa, pelo menos com a parte da mudança.
Segundo os médicos e policiais, o carro de meus pais foi atingido por um caminhão de carga desgovernado e acabou capotando algumas vezes até cair para fora da estrada, deixando o carro onde eles estavam em condições de miséria devido a alta velocidade e o peso do caminhão. De fora os médicos achavam que eles teriam chances, mesmo que ínfimas de eles terem sobrevivido, mas minha mãe, que dormia no banco do carona, acabou falecendo no caminho para o hospital com ferimentos e fraturas graves. Enquanto meu pai não foi capaz de aguentar e o acidente acabou sendo fatal, muito antes do socorro aparecer. Apenas um milagre teria salvado os dois e infelizmente não foi o que aconteceu.
O outro dia nunca chegou, eles nunca voltaram e a realidade era uma: eu estava sozinha. Órfã. Sem saber o que fazer e sem ter alguém que pudesse recorrer.
Dois dias depois dessa notícia, ao término do enterro das duas pessoas mais importantes da minha vida, o advogado dos dois me procurou para uma visita que passava longe de ser amigável. Meus pais estavam com uma dívida astronômica em seus nomes, nossas contas bancárias estavam negativas e segundo Mark, essa tal viagem que eles haviam feito seria o início da salvação para esse débito. Porém, como a reunião não havia dado resultado e os negócios que a empresa em que meus pais trabalhavam não foram bem sucedidos, o dinheiro que eles receberiam não chegaria até a nossa conta, assim como os novos cargos não lhes seriam atribuídos. Mesmo que soubesse que nos últimos meses estávamos passando por algumas dificuldades, meus pais nunca haviam quantificado essa tal dificuldade e ver os dígitos em vermelho em minha frente rapidamente me fez entender as noite em claro dos dois.
Seis anos haviam se passado desde o dia em que um telefonema na madrugada tinha mudado tudo. Seis anos desde a perda dos meus pais, do meu lar e da minha própria dignidade, para tomar um rumo completamente distinto na vida. De repente, a velha história de que fazemos coisas inimagináveis por necessidade batia na porta e me fazia compreender que minhas alternativas, após ter perdido absolutamente tudo, eram inexistentes. Não me deixando escolhas ou chances de pensar duas vezes quando tinha jogado em meus pés um trabalho e um teto sobre minha cabeça. Seis anos depois eu era Nina. Uma garota de programa.
Dizer que o início tinha sido a parte mais difícil seria um ultraje aos seis anos vivendo aquela vida. Nunca tinha deixado de ser difícil e certamente nunca deixaria de ser. Como dizem que tudo na vida é uma questão de costume, a prostituição de luxo me mostrava que infelizmente nós somos capazes de nos habituar a todo tipo de situação. Me doía assumir que era seduzida pelo dinheiro que era bom e vinha fácil e, quando menos percebi, as semanas viraram meses e os meses viraram anos, estendendo-se a um ponto em que não existia mais saída para aquele labirinto. As opções da Alice de vinte e quatro anos eram tão inexistentes quanto aquelas da Alice de dezoito.
E naquele momento, após as seis badaladas do sino da igreja, a Alice – ou melhor, Nina – precisava correr e tentar afastar pelo menos um pouco aquele humor mórbido que havia lhe dominado. O vento gélido de fim de inverno me fazia encolher dentro da jaqueta e cachecol quando saí do cemitério e segui em direção a cafeteria mais próxima, em busca de um café forte. Torcendo para que a bebida me ajudasse a afastar toda aquela melancolia durante a viagem de metrô de um pouco mais de uma hora do Queens ao Sul de Houston.
Era sempre assim, todos os anos. O mesmo café, o mesmo caminho, o mesmo senhor me expulsando do cemitério com seu molho de chaves barulhento. Era claro que a cafeína e as horas de transporte público não seriam o suficiente, mas eu gostava de pensar que talvez naquele ano seria diferente.
Que talvez naquele ano algo aconteceria que me fizesse ter forças para sair daquele estilo de vida que levava.
Setenta minutos depois, um suspiro melancólico inflou meu peito ao me aproximar do quarteirão da boate, me obrigando para o meu próprio bem a melhorar a expressão em meu rosto.
SoHo Dolls.
E ali era onde eu morava.
Ou melhor, no casebre com ar de abandonado, que passava totalmente despercebido ao lado de uma fachada cinza de cunho misterioso. Era ali onde eu morava. Após um portãozinho enferrujado e um jogo de três degraus, que dava a uma varanda pequena com uma porta de madeira envelhecida, cuja fechadura e maçaneta nunca funcionavam de primeira. Inferno! Uma puta boate para não fazer ao menos uma reforma digna para casa de quem realmente mantinha aquele lugar.
O calor de dentro do hall de entrada me acolhia agradavelmente após a luta com a maçaneta velha ser vencida, assim como cheiro de comida que fizera meu estômago roncar, lembrando-me que não tinha nada em meu estômago além do café da manhã. Porém, na poltrona do canto da sala um olhar ríspido me aguardava.
– Hm aí está a bonita! – Margareth me recebeu com azedume, naquele tom prepotente costumeiro dela. – Está atrasada mais de uma hora, garota!
– Eu sei! – respondi igualmente ácida, passando por ela sem me dar o trabalho de encará-la. Incrivelmente minha fome havia desaparecido, mas me obriguei a seguir até a cozinha, na minha parte do armário, em busca de alguma fruta e uma barrinha de cereal.
– Estou avisando Nina, da próxima vez terá que pagar dez dólares de multa para cada minuto de atraso! E eu estou sendo bem gente boa em não cobrá-la por hoje! – ela prosseguiu. – Agora vá se arrumar e espero que não se atrase para descer, ouviu?
Nina. Era como me tratavam daquela porta para dentro devido ao receio do reconhecimento. Ali, todas nós nos esquecíamos de nossos nomes de registro a não ser por Margareth, ou Megg, que assumia sua identidade real por ser irmã do dono daquilo tudo.
Eu me recusei a lhe dar qualquer resposta verbal ou até mesmo a direcionar minha atenção a ela. Após anos convivendo com os seus picos de humor, eu havia aprendido que a melhor forma de lidar com Margareth era como se ela não passasse de um cachorro invocado que latia incansável para qualquer estranho na rua.
– Abusada! Você não era assim quando entrou aqui, garota! Você ainda vai me agradecer por hoje, viu?!
Para meu alívio sua voz distanciava-se à medida em que eu saía da cozinha e seguia pelo corredor estreito em direção ao meu quarto. Era sempre assim.
Apenas dois meses naquele lugar foram o suficiente para perceber que Margareth não era um doce de pessoa como aparentava ser e rapidamente compreendi o motivo pelo qual a maioria das garotas que trabalhavam na boate não gostarem dela. Megg tinha uma personalidade horrível e um humor extremamente instável, sem citar seu complexo de superioridade que nos fazia crer que em alguma outra encarnação ela tivera um pézinho no nazismo.
Um suspiro de alívio esgueirou-se de mim enquanto cruzava o corredor estreito e comprido o suficiente para abafar as reclamações de Margareth que ficavam para trás. Meu quarto ficava ao fim do corredor, longe o bastante do resto da casa e de tudo que acontecia. Era literalmente um porto seguro, ainda que cercado por um chão que rangia até mesmo com o vento.
– E então, qual vai ser a multa dessa vez? – minha melhor amiga brincou ao me ver entrar pelo quarto, deixando o livro que lia de lado.
– Ainda bem que nada, mas não sei como ao julgar o mau humor de agora! É sério, eu juro que aquela não é a mesma Megg de antes de eu sair! – eu respondi revirando os olhos enquanto deixava minha bolsa junto com meu casaco sobre a cadeira da penteadeira, para começar a me arrumar.
– Aquele cara que pinta o cabelo de preto veio procurá-la para que você fosse acompanhante dele em um evento e ofereceu uma grana astronômica por você, Allie, é por isso que Megg está uma fera! Você iria poder ficar a semana inteira sem fazer programa com o dinheiro que ele ofereceu... – ela explicou.
E, bem, aquela era a única, ou melhor, uma das únicas pessoas naquele lugar que se dirigia a mim como Alice e eu ao seu verdadeiro nome. Malie. Minha melhor amiga, minha confidente, conselheira, minha irmã mais velha. A pessoa que tornava toda aquela situação mais leve.
– Não sei se choro de alívio ou tristeza com essa notícia, mas com o humor que estou hoje dificilmente conseguiria ser uma boa companhia para ele! – eu revirava meu armário em busca de algo para vestir, sentindo que meu humor tinha piorado significativamente após ter entrado em casa – Você poderia ter ido no meu lugar, sabe que não me importo.
– Ele queria só você, sabe como é! Disse que queria você e mais ninguém, mas depois que dissemos que você estava no cemitério, ele ficou sentido e prometeu voltar! – Malie respondeu com uma risada e mesmo que tentasse, não conseguia me lembrar de quem se tratava o tal cara de cabelos pintados de preto. – E se eu fosse em seu lugar, Aaron provavelmente ficaria uma fera!
– Falando nisso, você não deveria estar com ele? – perguntei, direcionando minha atenção à moça dos cabelos loiros e olhos azuis esverdeados que tagarelava como sempre.
– Deveria! – foi a sua vez de revirar os olhos. – Mas ele fez a transferência do dinheiro e em seguida ligou desmarcando por ter outro compromisso. Tenho um pressentimento de que é mulher, só pode ser!
– E ainda lhe restam dúvidas, Malie? – indaguei com certo sarcasmo. Aquela não era a primeira vez que conversávamos sobre esse assunto e certamente não seria a última, mas minha amiga já não conseguia mais esconder o ressentimento ao falar dele. Ou melhor, os sentimentos.
– Não, claro que não, mas porque ele pagaria tanto para me ter só para ele enquanto tem outra na fila?
– Bem, essa resposta vale um milhão de dólares! Se eu soubesse lançaria um livro!
Aaron era o sonho de grande parte das garotas de programa. Rico, bonito, educado e gentil – quando queria. E minha amiga teve a sorte grande de tê-lo como um de seus clientes fixos por algum tempo até ele passar a exigir que ela atendesse tão e somente ele. Claro que as coisas não funcionavam daquela forma por ali, mas o cachê que ele tinha se disposto a pagar chegara a fazer os olhos de Margareth e Logan brilharem em cifrões. E então, como em um passe de mágica, Malie havia se tornado a "a garota de Aaron". Tão e somente.
– Gostaria de poder responder essa pergunta, só assim me livraria de toda essa história de exclusividade! – Meiz rolou os olhos de forma que desviava a atenção de mim, olhando disfarçadamente para o livro. E eu não sabia definir se sua intenção era esconder o ressentimento de sua voz ou de sua feição.
– Faz um pouco mais de dois meses que vocês estão assim e você já está com saudades dos clientes? – brinquei, com o intuito de descontrair a conversa.
– Não é isso, é que... – seu tom de voz foi diminuindo gradativamente até que ela se obrigou a parar no meio da frase, suspirando fundo. Mas não era como se minha amiga precisasse terminar para que eu soubesse o final.
– Você está gostando demais dele, não é mesmo? – conclui, sentando-me em minha cama que ficava de frente para a dela.
– Muito! – ela admitiu em um sussurro.
Era assim que as coisas funcionavam entre nós... Uma conhecia a outra talvez melhor do que a si mesma desde o primeiro mês de convivência.
A nossa história era um tanto parecida, ela também estava ali por não ter outra opção, mas diferente de mim, minha amiga foi expulsa de casa pela avó extremamente conservadora após ela ter descoberto que a neta não era mais virgem aos dezoito anos. Sua mãe havia falecido de um câncer severo quando Malie completou quinze anos de idade e com isso seu pai acabou se afundando no álcool, entregando a filha aos cuidados da avó em Hornell.
Ela havia ouvido falar sobre uma casa em Manhattan que contratava garotas tipo ela para dançar e entreter alguns caras, nada sexual e tudo muito sério. Sem opções, minha amiga comprou uma passagem só de vinda para o inferno depois de seu namorado ter dito que a culpa da sua expulsão não era dele e que Malie deu para ele porque quis. E seu real fim foi bater naquela mesma porta apodrecida por onde eu tinha entrado, após uma viagem de trezentos quilômetros, carregando apenas uma mochila com roupas. Um ano antes de mim.
– Quer conversar sobre isso? – perguntei.
– Não, não precisa, é só um momento de fraqueza mesmo... Vai passar! – um sorriso foi arquitetado sem muito sucesso devido a algumas lágrimas que apareciam em seus olhos. – Estou sensível nessas últimas semanas, é isso! Acho que toda essa monogamia de clientes está confundindo minha cabeça, só pode ser isso.
– Você quem sabe! – dei de ombros, colocando-me em pé novamente. – Não vai descer hoje?
Apesar de seu acordo com Aaron, Malie ajudava no atendimento das mesas e também fazia algumas performances no pole dance para ganhar um extra para que não precisasse sobreviver apenas da miséria que lhe sobrava do dinheiro fixo que recebia. Não que fosse algo extraordinário ou se assemelhasse ao que ela ganhava com os programas, mas qualquer dólar que entrasse era válido.
– Não estou me sentindo muito bem ainda, parece que toda vez que me levanto sinto o mundo girar... – ela grunhiu em frustração. – Acho que comi algo estragado.
– É, pode ser. Melhor descansar mesmo... – franzi o cenho em resposta – Será que eu posso assaltar seu armário? Não faço ideia do que vestir!
– Claro, fique à vontade! Agora vá se arrumar logo antes que Megg entre por essa porta e veja que você sequer começou a se aprontar ainda!
Giuliard Vecchiato
Sexta-feira, finalmente. Eu mal podia acreditar que, por algum milagre, estava de folga por ter conseguido trocar meu plantão noturno na UTI e finalmente iria conseguir algum tempo de qualidade para levar minha filha ao cinema como há tempos ela pedia.
"Pai não se esqueça que vamos sair essa noite, você me prometeu. Te amo, Emmy." Emily lembrou-me um pouco depois do horário de almoço. Eu não iria esquecê-la, havia prometido.
Esse era o preço a ser pago por ser pai solo, onco cirurgião e médico intensivista de um dos principais hospitais de Manhattan. Não que estivesse reclamando, não. Minha carreira era uma das coisas mais importantes da minha vida, mas infelizmente minhas prioridades mudaram depois que Chloe se fora há quatro anos, deixando-me nossa filha para criar sozinho.
Bem, na verdade minhas prioridades deveriam ter mudado e tudo o que mais desejava era que conseguisse passar um tempo de qualidade com Emily, mas infelizmente minha casa e minha filha dependiam cem por cento de mim.
O relógio na sala dos médicos atendentes marcava um pouco mais de sete e meia da noite e eu temia quantas mensagens não lidas, de uma pré-adolescente que não tolerava atrasos, me aguardavam em meu celular. Ela era igualzinha à sua mãe nesse sentido. E em muitos outros também.
– Quando vai oficializar sua mudança para cá, Baker? – brinquei, aproximando-me da grande mesa no centro da sala onde meu amigo estava sentado, com uma variedade de papelada em sua frente.
– Logo depois de você! – ele respondeu com um sorriso cansado. Gavin era o médico chefe da oncologia e da UTI do hospital e meu amigo mais próximo da época da faculdade. Com seus 1.83 de altura e um corpo um tanto musculoso, ele era um dos principais assuntos nos corredores do hospital. – O que faz aqui ainda homem? Ou a pergunta certa seria: o que faz aqui tão cedo?
– Vim passar visita em uma paciente que está internada, já estou de saída na verdade, consegui trocar meu plantão de hoje! – respondi, guardando meus aparelhos na maleta.
– Mas que ótima notícia, então você apareceu na hora certa! – ele abriu um sorriso satisfeito, repousando a caneta na mesa. Seu sorriso era inversamente proporcional às olheiras fundas sob seus olhos verdes e faziam com que eu me questionasse de onde ele tirava tanta energia. – O que acha de sairmos para beber alguma coisa?
– Vamos ter que deixar para a próxima, marquei de levar Emily ao cinema. Por isso acabei trocando o plantão de hoje, quero curtir minha filha – expliquei.
– Mas e amanhã? E domingo? Ah cara, ela pode esperar! – ele insistiu. – Você precisa se divertir um pouco, Giuliard, diversão de verdade!
– Olha Gavin, não sei se concordo mais com as suas concepções de diversão, elas normalmente nos colocavam em apuros na época da faculdade! – revirei os olhos antes de seguir em direção aos armários, ciente de que Gavin estava na minha cola. Apesar de extremamente inteligente e responsável, meu amigo tinha um senso bastante distorcido de diversão... sem contar com a fama de mulherengo, que ele explicava existir devido aos seus olhos verdes, cabelos amarelo queimado, maxilar bem marcado e ao tom de pele levemente bronzeado que eu não fazia ideia de como ele conseguia manter.
– Vem cá, o que está te deixando tão mal humorado ultimamente? – ele quis saber, encostando-se ao armário ao lado do meu. – Tirando a falta de sexo, é claro!
Esse era Gavin Baker. Inconveniente demais. Intrometido demais. Observador demais. Mas claro que eu não admitiria isso para ele jamais.
– Eu já falei o quanto você é inconveniente, Gavin? – abri a porta metálica de meu armário, ignorando sua presença.
– Inúmeras vezes, mas falando sério agora, o que está acontecendo, Giuliard? – ele perguntou, ficando sério dessa vez.
– Está acontecendo que eu estou trabalhando demais e não tenho mais tempo para nada. Não sei mais o que é passar um tempo digno com a minha filha sem ter que ficar atendendo o celular o tempo todo no sobreaviso ou ficar exausto durante o final de semana depois de ter começado e terminado o dia nesse hospital. E essa sua escala de plantonistas na UTI também está me acabando, eu tenho uma filha e todos sabem disso por aqui e ainda me colocam justamente na sexta-feira de noite em plantão. Francamente! – respondi, extremamente exaltado sem que conseguisse controlar, suspirando fundo para tentar me acalmar enquanto colocava minhas coisas para dentro da minha mala de rodinhas.
Talvez meu amigo tivesse razão e eu realmente estivesse um tanto mal humorado e ranzinza.
Gavin me encarava como se estivesse segurando uma risada ou evitando um comentário extremamente maldoso, mas ao julgar a coloração levemente vermelha que seu rosto assumia eu tinha certeza que era a primeira opção.
– Olha, não é por nada não, mas você vai explodir cara, isso é estresse demais para uma pessoa só! – ele respondeu, finalmente se entregando. A sua risada era tão alta que eu não duvidava que tivesse chego até a recepção. – Olha se um dos problemas é a escala, eu converso com os outros plantonistas e mudamos o seu dia para outro ou então só para plantões diurnos. Era só ter me pedido antes, cara. Mas agora eu não vou sair daqui enquanto você não concordar em sair comigo, pense bem, todo esse estresse não fará bem para você e muito menos para Emily!
Claro que ele não estava pensando no bem estar de minha filha e tampouco em nossa relação, mas eu detestava admitir que Gavin tinha razão. Meu nível de exaustão e estresse estavam ultrapassando os limites aceitáveis e eu não tinha a menor pretensão de descontar em minha menina, como normalmente fazia. Talvez, mas só talvez eu precisasse mesmo sair para clarear a mente.
– Não sei, Gav... – respondi hesitante.
– Não é 'não sei', Giuliard, você vai! Ligue logo para a menina e avise que você tem um compromisso no hospital comigo e não poderá comparecer! Senão, não irei mudar a escala! – meu amigo revirou os olhos, falando mais como um chefe do que propriamente um amigo.
– Nunca mais me obrigue a fazer isso. Isso é apenas pela mudança na escala, está entendendo bem? Você sabe que Emily sempre vem em primeiro lugar para mim! – avisei a contragosto, apesar de ter me dado por vencido por vencido. – Vou ligar para ela, me espere para eu te seguir...
Gavin assentiu e eu peguei meu celular, já esperando a fúria da minha filha. Com muita razão, diga-se de passagem.
Não demorou muito para que ela atendesse e meu amigo tomasse certa distância, para organizar dentro de sua pasta a tal papelada que estava mexendo quando cheguei.
– Emms?
– Cadê você, pai? Estou já te esperando pronta aqui em casa faz horas... – ela falou impaciente, com aquela vozinha fina do outro lado da linha.
– Filha... – comecei hesitante – Tem como adiarmos esse cinema? Vou ter um compromisso de última hora com Gavin.
– Pai, você prometeu! – falou chorosa a minha mini Chloe.
– Eu sei, meu amor, mas iremos passar o dia juntos amanhã e provavelmente todas as sextas a partir da semana que vem! É realmente importante esse compromisso, ao contrário você sabe que não cancelaria nossos planos, não é? – eu simplesmente detestava mentir para Emily, mas mais do que isso eu detestava Gavin por estar me fazendo mentir a ela. E acima de tudo, tudo mesmo, eu me odiava por estar fazendo isso com ela.
– Hmm... – ela respondeu com desinteresse.
– Eu prometo, filha! – assenti, fechando meus olhos com força e prometendo a mim mesmo que não iria quebrar o que havia dito daquela vez.
– Não prometa o que não poderá cumprir! – ela respondeu, visivelmente ressentida. Eram muitas promessas, ela tinha razão.
– Emily...
– Está tudo bem, ok? Vou chamar a tia Anna para me acompanhar! – ela respondeu naquele tom amargurado que sempre usava comigo em determinadas situações.
– Claro, faça o que quiser...
– Posso dormir na casa dela, então? Eu disse que não poderia porque iria sair com meu pai, mas ele acabou de furar comigo, então...
– Ok filha, pode ir. – suspirei fundo com aquele sentimento de derrota. Ela tinha razão, eu era um furão de marca maior. – Amanhã eu te pego no treino, ok?
– Uhum...
– Eu amo você, filha.
– Claro, claro... – ela falou por fim, desligando o telefone sem me deixar continuar.
Em minha frente, um Gavin extremamente debochado me encarava, como se estivesse se divertindo com meu sofrimento.
– Eu te odeio! – declarei o fuzilando com o olhar.
– Ué, você que concordou em ir! – ele deu de ombros – Ah qual é Giuliard, compre uma boneca para a menina amanhã e está tudo bem!
– Céus como posso andar com alguém tão idiota?! Boneca? Ela tem doze anos, Gavin!
– Só doze anos e você já come na mão dela desse jeito? Eu adoro as mulheres! Compre um rímel então, sei lá o que elas gostam nessa idade! – meu amigo riu alto empurrando meu ombro com um soquinho. – Agora vamos Giuliard, que diferente da sua filha, a noite é uma criança e nós precisamos curtir.
Eu realmente não fazia ideia de onde Gavin iria me levar, mas a minha experiência traumática com ele me levava a crer que não seria boa coisa. Meu amigo era conhecido no campus por suas noitadas agitadas repletas de álcool e drogas e esse era um dos meus principais motivos de brigas com Chloe. Era difícil confiar no bom senso de Gavin, principalmente quando ele citava aquelas palavras chaves: diversão de verdade. Porém, apesar de ter um pé atrás com esse seu lado, ele tinha mudado ao longo dos anos e no fundo sabia que era exatamente aquilo que eu precisava. Tínhamos trinta e três anos caralho, algum juízo deveria ter sido criado em sua cabeça.
Não conseguia me lembrar da última vez em que tinha saído sozinho para de fato me distrair, no mínimo uns seis meses se minha mente não estivesse me traindo. Mas ao mesmo tempo, não conseguia deixar de sentir uma pontada de culpa por estar me sentindo ansioso em finalmente tirar um tempo para mim.
Após a morte de Chloe, minha vida havia se resumido a cuidar de Emily e deixar que não lhe faltasse nada, desde atenção e carinho até bens materiais necessários somados aqueles que ela gostava. Ainda que estivesse claramente em falta com a primeira parte, era inaceitável para mim que lhe deixasse faltar qualquer outra coisa. Ela era tudo que havia me restado. E mesmo que eu estivesse lhe faltando, todo o resto ela tinha em muita abundância.
O carro de Gavin desaparecia em meio ao trânsito e eu constantemente precisava procurá-lo entre as luzes dos faróis, o que me fazia ficar tentado a desistir daquela história e seguir para meu apartamento no Upper East Side. Foram ao todo vinte e oito minutos costurando carros pelas ruas de Nova Iorque, até que a intensidade do trânsito diminuísse significativamente para então entrarmos em uma rua estreita e sem saída. Quando pensei em ligar para dizer que obviamente ele tinha errado o caminho, Gavin estacionou o carro e desceu à minha espera, me olhando com um ar de impaciência como se tivéssemos acabado de estacionar em frente a sua casa.
– Por acaso você vai me matar e desovar meu corpo nesse fim de mundo? – eu perguntei com sarcasmo, batendo a porta do carro.
– Fim de mundo? Estamos no Sul de Houston, seu perdido! – ele respondeu como se fosse um afronto eu não saber onde estávamos. Às vezes eu me perguntava como Gavin encontrava tais lugares, mas não tinha certeza se gostaria de ouvir sua resposta. – É o melhor bairro dessa maldita ilha! As melhores baladas, melhores bares, melhores tudo!
– E será que tem como me explicar exatamente onde estamos indo? – indaguei o seguindo até o final da rua, obtendo a minha resposta assim que ele parou em frente a um local com fachada cinza e uma enorme porta de madeira pivotante, com dois seguranças um de cada lado. Não havia nenhuma identificação, mas naquela situação não tinha necessidade. – Você me trouxe a um puteiro?!
– Meu Deus, como você é careta! Antes de reclamar, por favor entre e tire suas próprias conclusões!
Alice Raghavan
Take all of me, I just wanna be the girl you like.
The kinda girl you like is right here with me.
Take all of me, I just wanna be the girl you like.
The kinda girl you like is right here with me.
– E então, como estou de Mia? – perguntei, parando em frente a cama de minha amiga com as mãos na cintura. Eu sequer conseguia acreditar que tinha conseguido me arrumar em trinta minutos.
Não era muita coisa, apenas um blazer vermelho sobre um sutiã preto com paetês brilhantes, um mini short de couro preto junto com minhas meias sete oitavos e um salto quinze da mesma cor. Era o que Margareth sempre dizia: mostrem, mas não muito, os deixem curiosos para que paguem o programa.
Diferente de muitos lugares, nenhuma garota tirava as roupas ou andava seminua entre as mesas da SoHo Dolls, a intenção era que eles pagassem caso quisessem ver mais do que estávamos mostrando.
– Maravilhosa, é claro! – Malie respondeu com um tom de obviedade. – Vamos ver se você incorpora mesmo a Mia nessa noite, hein?
– Bom, se isso acontecer irei usar suas roupas para sempre!
E essa era uma pequena/grande diferença entre nós duas. Apesar de ter me acostumado com aquela vida, eu ainda não havia adquirido a capacidade de gostar do que fazia. Propriamente gostar.
Enquanto minha amiga sempre tentava tirar algum proveito dos programas – além, é claro, do dinheiro ao final –, eu não conseguia sentir prazer com eles. E céus, como eu a invejava por isso. Não sabia quanto tempo fazia que não tinha uma noite digna de sexo.
– Eu realmente preciso ir, Meiz. Como você está se sentindo?
– Estou melhorando, provavelmente nos próximos dez minutos estarei dormindo então não precisa se preocupar! – minha amiga respondeu com convicção. – Agora vá logo que tem várias carteiras gordas à sua espera!
Ela adicionou maliciosamente, me fazendo rir.
– Se precisar você sabe onde vou estar, não é? Até depois! – eu atirei um beijo no ar e sai rumo às escadas que davam acesso estrategicamente aos fundos da boate.
Era algo em torno das oito horas e o restante das meninas chegavam aos poucos, Megg normalmente abria a boate um pouco antes de descermos como forma de atrair os clientes que acabavam de sair do trabalho e então utilizava da nossa chegada para mantê-los ali. Era uma tática que funcionava na maioria das vezes e o breve "happy hour" dos amigos ou acabava estendendo-se até um dos quartos da boate ou simplesmente até eles pagarem o equivalente aos nossos programas em bebidas e gorjetas.
Mesmo após cinco anos, a minha reação ao olhar para a boate sempre seria a mesma. O lugar era de tirar o fôlego e gritava luxo e luxúria por todos os cantos. Com o foco no palco com o pole dance logo no centro da boate, o restante das coisas eram encaixadas estrategicamente. As mesas e cadeiras de dois eram dispostas ao redor de maneira que, mesmo de costas, os clientes sentados pudessem se virar para nos ver. O bar ficava no canto esquerdo, com balcão e cadeiras altas para quem preferisse, mas considerando que éramos nós mesmas que atendiam às mesas, aquele era um lugar que ficava quase esquecido por eles.
O vermelho predominava todos os cantos do lugar: nos estofados em veludo das cadeiras, divãs e poltronas; nos focos de luzes espalhados pela boate; e no papel de parede com uma espécie de brasão que cobria as paredes. Enquanto o dourado entrava como secundário, presente nas molduras vitorianas dos diversos espelhos espalhados pela boate, nas pernas das cadeiras e mesas, nos lustres asfour de cristas e candelabros também no estilo vitoriano.
Uma coisa era verdade e precisava ser dita: Logan não havia medido esforços em fazer uma boate maravilhosa.
E logo ao fundo, um jogo de escada com degraus largos de algo que imitava brilhantes e corrimão dourado, nos levava para o segundo andar da boate. Onde tudo acontecia.
– Nina, você abre a noite hoje, ok? – Margareth anunciou, gesticulando para mim e então para a pessoa responsável pela sonorização da boate atrás de um vidro fumê. E eu apenas assenti para as duas pessoas que aguardavam minha resposta.
Antes de subir ao palco, demorei alguns segundos em frente a um enorme espelho na parte de trás da boate, arrumando os últimos detalhes de Nina. Ajeitei meus cabelos longos e ondulados jogando-os para o lado, deixando meus fios escuros caírem sobre meus olhos chocolate, que adquiriam a malícia necessária para aquele momento e que espalhava-se aos meus lábios pintados de vermelho sangue. Desabotoei meu blazer e alinhei meu sutiã evidenciando ainda mais meus seios fartos. Ergui um pouco mais as meias sete oitavos que alongavam minhas pernas... e assim eu era oficialmente Nina.
As luzes da boate foram reduzidas, deixando apenas o palco com o pole dance onde eu subiria iluminado. A minha música começou a tocar alto e, conforme eu subia os breves degraus com as batidas dela, os holofotes eram ligados iluminando gradativamente as partes de meu corpo. Assobios e palmas me receberam, me fazendo erguer a cabeça com um sorriso apimentado nos lábios para minha plateia.
A boate não estava tão cheia, era o baixo movimento habitual da sexta-feira, mas seria o suficiente para as oito garotas de programa da SoHo Dolls.
De olhos fechados eu me encostei ao pole dance e permiti que o ritmo sensual da música tomasse conta dos movimentos de meu corpo, deixando que a sensualidade transbordasse em forma da dança. Em meio a giros e reboladas, investidas contra o cano e as piruetas, eu estudava minha plateia estrondosa até encontrar um par de olhos que passaram a me estudar com fascínio.
Seu olhar não deixava os meus, meu corpo, meus movimentos... Ele parecia hipnotizado, assim como todos em minha volta, mas ele em especial. Em seus lábios havia um sorriso malicioso, deslumbrado, e eu não podia deixar de retribuir o mesmo, piscando maliciosamente para ele.
Ele era lindo, se é que tal elogio fosse cabível a ele. Seus cabelos eram escuros e estavam levemente bagunçados e, independente da distância eu conseguia perceber a intensidade de seus olhos claros em perfeita combinação com a escuridão de seus fios.
Diferente da maioria dos homens por ali, que vestiam terno e gravata, ele usava um jeans de lavagem escura e uma camisa branca simples por baixo de um paletó azul marinho. Não conseguia deduzir qual a sua profissão e muito menos idade, ele parecia um homem sério, mas o modo despojado como se vestia não me dizia muito sobre o que fazia para viver. E isso me levava a pensar que ele realmente não era tão vivido quanto a maioria dos caras que ali se encontravam.
Uns trinta, no máximo?! Filhinho de papai? Modelo? Não saberia dizer.
A música corria e eu não desviava minha atenção daquele homem em especial, nem quando ele se levantou para deixar um "pequeno" agrado de cento e cinquenta dólares pela minha dança na caixinha no canto do palco. Não havia dúvidas de que era ele quem eu queria.
Assim que minha música acabou e que as luzes do palco se desligaram, enquanto a próxima garota esperava ao lado do palco, eu apanhei meu dinheiro para colocá-lo no bolso do shorts. Abotoei meu blazer e então segui em direção ao meu espectador fascinado, intensificando a malícia em minha feição.
Ele me observou aproximando-me dele, sem desviar o olhar dos meus. De mim. Mesmo de longe era possível ver seu peitoral mexendo com as longas lufadas de ar em sinal de que sua respiração já estava ofegante. Conforme me aproximava, pude confirmar que seus olhos eram realmente claros, num tom de azul que nunca havia visto antes… e eles estavam cheios de desejo e curiosidade.
Porra, se de longe ele era lindo, de perto ele era um monumento. Não eram apenas os olhos azuis em contraste com os cabelos escuros que chamavam atenção. Era o combo disso somado a um maxilar marcante, sobrancelhas grossas e um queixo timidamente dividido em dois.
– Você tem talento... – ele falou ao me ter ao seu lado. Me acompanhando enquanto contornava a poltrona onde ele estava sentado até que estivesse em sua frente.
Eu me inclinei sobre ele, usando suas coxas firmes como apoio. Atraindo sua atenção para o meu decote que passou a ficar mais evidente devido a posição.
– Você não viu nada... – eu sussurrei sedutoramente em seu ouvido, sendo atingida por um perfume masculino marcante. Fresco e com um toque cítrico, que gritava caro em cada acorde. – E então, gostou mesmo?
Utilizando daquela liberdade não concedida, eu sentei em seu colo cruzando as pernas sobre ele, envolvendo seu pescoço com os braços. Aproximando nossos corpos daquela forma quase invasiva.
– Eu gostei, mas confesso que fiquei um tanto desapontado. Esperava que você fosse tirar toda essa roupa ali em cima... – ele respondeu daquela forma sacana, subindo com sua mão esquerda pela minha perna até chegar ao botão do blazer. Seu toque era firme e quente em minha pele, assim como todo resto de seu corpo em contato com o meu.
Céus, ele era grande em todos os lugares e meu corpo pequeno perto do dele parecia ficar ainda mais delicado. Ombros largos, pernas compridas e braços fortes que se destacavam mesmo cobertos pela roupa.
– Você esperava um strip ali em cima? – provoquei, o observando assentir com um tom óbvio. – Não, querido, aqui nós não fazemos isso. Eu gosto das coisas mais privadas, se é que me entende.
Era sempre assim, todos ali esperavam que fizéssemos um strip-tease no palco ou então que tirássemos nossas roupas em meio a um lap dance e até mesmo meninas andando nuas e seminuas pela boate como em outros lugares. E isso apenas me mostrava que era sua primeira vez por ali.
– Bem, uma parte de mim fica bem aliviado ao ouvir isso. Não saberia como lidar com todos esses caras babando por você… eu também gosto das coisas mais privadas – ele assegurou. Seu polegar brincava despretensiosamente com o botão da minha roupa. – Se eu levá-la para um lugar privado, quer dizer que vou poder tê-la nua para mim?
– Há! Se quiser me ver nua tem que pagar... – a minha voz era algo macio e suave ao falar com ele. Delicadamente tirei sua mão intrusa que tentava me desabotoar para colocá-la novamente sobre minhas pernas. – Já que você quer me ver nua, qual o nome que devo chamar quando estivermos dentro do quarto entre lençóis, hun?
Uma gargalhada alta vibrou em seu peito ao ouvir minha pergunta, prendendo minha atenção em seu pomo de Adão proeminente que movimentou-se levemente pela inclinação de sua cabeça.
– Giuliard... – o homem respondeu por fim com um sorriso sorrateiro, satisfeito.
Ele me encarava faminto e seus olhos azuis haviam assumido uma lascívia que transbordava e contagiava, num desejo quase tão palpável quanto aquela rigidez em sua calça jeans.
Como era possível ele já estar ficando duro?
– Giuliard... Gostei! – repeti em provocação, mordendo sutilmente meu lábio como se seu nome fosse um gemido a ser contido.
E na verdade ele era, era aquele nome forte que impunha presença, fazia jus ao dono, aquele tipo de nome gostoso de ser gemido entre quatro paredes.
Giuliard observava minuciosamente os meus lábios, não deixando escapar nenhum movimento. Ele parecia já estar explodindo de tesão pela forma que sua respiração acelerava e seus olhos me estudavam, o que me estimulava a intensificar minhas provocações.
– E eu gostei ainda mais dele quando dito por você... – as suas mãos passaram a me envolver, uma em minha coxa e outra na cintura, me apertando com força e arrancando de mim um sorriso presunçoso com seu desespero.
Foi a minha vez de rir. Aproximando meu rosto do ponto onde havia feito o primeiro contato com ele, sussurrando manhosamente em seu ouvido.
– Se você quiser eu posso gemer a noite toda ele no seu ouvido... – eu acariciei seu rosto seguindo até os cabelos de nuca, emaranhando seus fios em meus dedos.
Tendo, assim, mais duas constatações da noite: seus cabelos eram extremamente macios e sua barba para fazer pinicava a palma de minha mão... pinicava de uma forma gostosa que fizera meu corpo esquentar com o fato recém descoberto.
Na verdade, havia mais uma constatação que precisava ser dita: seu corpo exalava uma onda intensa de calor por todos os seus poros, por cada parte descoberta de sua pele, a ponto de me atingir através de minhas roupas. Não que eu tivesse muita roupa me cobrindo.
– Você está quente, sabia? Não está com calor?
E naquele momento começava a minha deixa, o tempo passava e, no meu caso, tempo significava dinheiro. Quanto menos melhor. Quanto menos tempo melhor, quanto menos roupa melhor. A ousadia já havia tomado conta de meus atos e de minhas mãos que desabotoaram despercebidamente o paletó de Giuliard, me agarrando às lapelas ao mesmo tempo em que a afastava sutilmente.
Ele já estava duro, eu só precisava levá-lo para os quartos.
– Se eu estou com calor?! Muito! Mas só vou tirar minha roupa se você tirar a sua! – Giuliard desafiou, dando uma risada gostosa. Era impressão minha ou ele estava flertando comigo?
– Ah, é assim? Você está jogando comigo, Giuliard? – eu sorri com o desafio, entrando em sua brincadeira. – Podemos jogar, mas eu não costumo perder...
– Ah, não?! E o que você quer apostar?
– O que acha de apostarmos quem aguenta mais todo esse calor sem tomar a iniciativa de arrancar a roupa do outro? – eu propus no mesmo tom de desafio com que ele havia começado.
Obviamente que eu ia ganhar, mas ele não precisava saber disso. Principalmente quando eu sabia exatamente o que faltava para ele perder de vez o controle.
Um sorriso glorioso espalhou-se nos lábios do meu cliente, que apertava fortemente minha coxa de novo.
– Eu aceito, mas quem vencer ganha o que? – Giuliard sussurrou, umedecendo os lábios com a língua em um movimento que prendeu minha atenção mais do que eu desejava. Como era possível que até mesmo os mínimos detalhes daquele homem exalavam sensualidade?
– Uma noite incrível comigo em um dos quartos daqui… se eu perder, você não precisa pagar e eu te dou o melhor sexo da sua vida com tudo o que você me pedir. – a minha resposta foi em forma de um sussurro convencido ao pé de seu ouvido, o local que mais tinha gostado naquele homem e onde parecia ser seu ponto fraco.
– E se eu perder? – ele perguntou com uma voz rouca de desejo.
– Eu te dou o melhor sexo da sua vida, mas você terá que pagar os quatrocentos dólares por hora. E posso pensar se vou lhe dar o que me pedir.
– A sua proposta acabou de ficar ainda mais tentadora, mas acho que deveria ao menos saber o nome da pessoa com quem estou competindo, certo? Ou melhor, que nome devo chamar quando estiver me dando o melhor sexo da minha vida?
Sim, definitivamente ele estava jogando comigo. Jogando e flertando. E eu não sabia exatamente o motivo de estar gostando tanto desse nosso jogo de provocações.
– Nina, eu me chamo Nina! – eu respondi com um sorriso deliciado pela sua provocação.
– Então, Nina, por que você não me leva para beber alguma coisa? Esse lugar está começando a ficar quente...
A largada havia sido dada e sabia que do bar, o próximo lugar para onde levaria Giuliard seria escadas acima.
Eu não o respondi, apenas tomei a liberdade de me levantar de seu colo de forma que meu decote ficasse a milímetros de seu rosto e então o puxei pelas mãos, o ajudando a colocar-se de pé, aproveitando a deixa para envolver seus braços em minha cintura. Era como se minha vida naquele momento dependesse de provocá-lo.
Eu o guiava em direção ao bar, driblando os sofás com clientes até chegar ao nosso destino. O calor de seu corpo emanava e envolvia o meu, aquecendo o meu interior de uma maneira que não deveria. De uma forma que eu não queria que acontecesse. Era possível sentir o formato de seu corpo másculo mesmo sob a roupa, assim como a sua ereção marcante contra minhas nádegas, que insistiam em atiçá-lo, reivindicando atenção. Reivindicando, provocando e recebendo. Recebendo o pouco de controle que ainda havia naquele homem.
Havia um magnetismo forte entre nós que eu não saberia explicar, nunca havia provado disso com um cliente que acabara de conhecer e ao mesmo tempo que queria me jogar de cabeça naquilo, eu temia e muito aquela sensação.
Como eu poderia chamar isso? De tesão à primeira vista?
– Você costuma ignorar desse jeito os caras que falam com você? – ele perguntou ao pé de meu ouvido.
– Eu sou apenas sua essa noite, querido... – eu respondi em um tom presunçoso e quando menos notei, já havíamos chegado ao bar – O que vai querer beber?
– Só uma água mineral mesmo, estou dirigindo.
– Certo... Susi, você pode me alcançar uma água mineral para o meu homem careta, por favor?! Ele está dirigindo…
Eu me debrucei no balcão para fazer o pedido, ficando na ponta dos pés enquanto arqueava minha bunda para que conseguisse tal feito. Ciente demais de que o corpo de Giuliard ainda estava colado ao meu e de uma forma que seria considerada inadequada se não fosse pelo ambiente onde estávamos.
– Água mineral? Eu nem sei se temos água para vender! – disse a garota ruiva do outro lado do bar, muito ocupada com seus afazeres para que pudesse olhar para mim. – Ele sabe onde está?
– Nós não temos água mineral, querido, vai ter que escolher outra coisa… – eu o avisei, o olhando por cima de meu ombro.
Entretanto, o homem atrás de mim estava muito mais preocupado em olhar para a forma com que as minhas pernas estavam tensionadas e como minha bunda ficava a mostra pelo shorts curto de couro que eu usava, do que pensar no que gostaria de beber.
Sim Susi, ele sabia exatamente onde estava e o que ele queria. E não se tratava de água mineral.
As duas mãos firmes que estavam em meus quadris subiram por debaixo de meu blazer até chegarem a minha cintura, jogando meu corpo em uma onda de torpor e desejo que eu não estava habituada. Giuliard apertava minha cintura e me puxava para si, causando uma fricção gostosa de minha bunda empinada em sua virilha. Provocando uma sensação que pesava em minhas pálpebras e me fazia rebolar sutilmente contra ele, aumentando a pressão e o ritmo de minha respiração.
– Céus, Nina! Chega, eu preciso de você completamente nua para mim! – ele pediu, ou melhor, ele implorou, me virando então de frente para si.
– Quer dizer então que eu ganhei? – perguntei vitoriosa, rindo internamente do quão fácil havia sido conseguir fazê-lo perder.
– Sim, só me leva para esse maldito quarto!
– Você é muito fraco, Giuliard, nem teve graça jogar com você!
Eu deslizei as mãos pelo seu peitoral, por debaixo do paletó, sentindo todas as ondulações de seus músculos e seu calor que parecia ter dobrado de intensidade.
– Diga isso por você, eu estou querendo arrancar suas roupas desde o momento em que a vi montando no pole dance… – ele respondeu, amassando minha bunda com as mãos. Seu pau apontava firme contra meu abdômen, descrevendo com perfeição o desespero que ele sentia.
O caminho até os quartos foi feito quase da mesma forma que fizemos até o bar: com um Giuliard ávido grudado ao meu corpo e distribuindo beijos pelo meu pescoço enquanto eu procurava com dificuldade meu cartão-chave para conseguir abrir a porta do quarto mais próximo. Certamente eu já estava acostumada a caminhar com homens desesperados colados em mim daquela forma, mas por algum motivo desconhecido aquele em especial estava acabando com meu equilíbrio naqueles saltos finos altíssimos.
A porta do quarto foi aberta para logo ser fechada e da mesma maneira afoita, meu corpo foi pressionado com força contra a madeira fria por uma massa firme de músculos. E eu estudava minuciosamente sua feição de homem excitado, que tinha a promessa de uma noite quente no olhar.
Será que seria pedir demais que tal promessa fosse realizada?
– Essa é a hora em que podemos arrancar as roupas um do outro e que você geme meu nome daquele jeito manhoso? – a sua voz era rouca de tesão e eu apenas assenti, mordendo meu lábio inferior maliciosamente.
Puta merda de onde havíamos tirado tanta tensão sexual?
Tudo começou a acontecer muito rápido para que minha mente lentificada pudesse captar: as duas mãos firmes agarraram minhas coxas, erguendo-me para o seu colo e encaixando a região que latejava entre minhas pernas no seu membro rijo.
Céus, eu definitivamente não saberia dizer há quanto tempo não desejava ir para cama com um homem como estava desejando Giuliard naquele momento.
– Giuliard! – eu gemi em surpresa, tanto pelo seu movimento rápido quanto pelo prazer em senti-lo pressionando a parte mais sensível de meu corpo. – Você não vai me deixar aliviar a tensão disso aqui para você? – indiquei rebolando lentamente em sua ereção, apoiando-me em seus ombros largos.
– Ainda não, temos que lidar com o problema das roupas, não se lembra? – ele contrapôs.
Eu sorri presunçosamente em resposta, levando as mãos ao botão de meu próprio blazer, afastando em seguida as lapelas pelos ombros o máximo que a nossa proximidade permitia e atraindo inevitavelmente o olhar faminto de Giuliard para o meu decote. Seus lábios atacaram a parte exposta de meus seios, afundando o nariz no vão entre eles e aprofundando-se nos limites de meu sutiã à medida em que investia os quadris em mim, num ritmo lento.
Sua respiração ofegante pinicava minha pele sensível enquanto a minha transformava-se em gemidos baixinhos de aprovação, tirando todo o foco e controle que ainda me restavam. Eu me desfiz com pressa do paletó e de sua camisa branca, o obrigando a afastar-se de mim apenas o suficiente para que desse lugar àquele peitoral e braços, que definitivamente deveriam ser considerados um atentado ao pudor mostrá-los publicamente. Ele tinha tudo definido e delineado na medida certa… na medida certa para as minhas mãos tocá-lo.
– Tira tudo para mim, tira… – Giuliard pediu soando como um homem faminto.
Assim que meus pés tocaram novamente o chão, eu retomei as rédeas da situação, espalmando minhas mãos em seu peitoral quente para empurrá-lo em direção a cama no centro do quarto. Sem nunca desviar nossos olhares. Seus joelhos cederam ao encontro com o colchão nos fazendo assumir a mesma posição da boate: ele sentado me mantendo entre suas pernas.
– Vou precisar de ajuda com essas meias... – assim como ele, a minha voz excedia os limites da excitação. Sussurrando manhosamente, eu coloquei meu pé na cama na beirada da cama, deixando minha perna quase na altura de seu rosto devido aos saltos.
Giuliard sorriu maliciosamente com meu pedido e então assumiu sua posição. Tirando primeiramente meu sapato e em seguida levando mãos e boca até a barra rendada da meia no início de minha coxa. Ele repetia o que havia feito em meu busto, beijando, arrastando o nariz e a ponta dos dedos pela minha perna à medida em que abaixava minha meia sete oitavos, causando-me novamente aquele torpor que pesava em minhas pálpebras. Eu era como um caminho de pólvora enquanto ele ateava fogo em mim, lentamente, gradativamente, queimando meu corpo por onde tocava e aquecendo meu ser de luxúria.
Minhas mãos, que serviam de apoio em seus ombros, abandonaram seu corpo apenas para que eu retirasse meu sutiã enquanto ele repetia o processo de veneração em minha outra perna, e aos poucos nossas roupas se espalharam pelo chão do quarto. De minhas meias para o meu sutiã, de meu sutiã para a sua surpresa ao me ver seminua em sua frente e daquela surpresa para o gemido sôfrego quando eu me virei de costas e comecei a rebolar em sua frente, retirando a última peça de roupa que cobriam meu corpo.
O silêncio entre nós era pesado, mas parecia tremendamente certo quando nossos olhares diziam muito mais do que nossas bocas poderiam proferir. Os suspiros em deleite e os sons causados pela nossa movimentação eram tudo o que podíamos ouvir, nem mesmo a música alta vinda de fora do quarto se fazia escutar. A nossa conexão fora instantânea e era tão intensa que eu sentia que estava enlouquecendo.
– Nina... – ele mordeu os lábios em meio a um sorriso, apreciando a visão de meu corpo nu diante de si. – Eu estou desde o momento em que você colocou os pés no palco imaginando como seria te ter rebolando assim no meu pau.
– Giuliard... – sussurrei em provocação, sorrindo em deleite com meu falso nome em sua voz excitada. Eu me ajoelhei na cama de forma que seu corpo ficasse entre minhas coxas e eu pudesse guiá-lo até o centro do colchão.
O contato de nossos corpos nus foi mais do que pudéssemos aguentar, mais do que sua ansiedade pudesse suportar. Aquele par de mãos curiosas faziam questão de conhecer os detalhes do meu corpo sem desviar o olhar de minhas feições de prazer. Giuliard percorria o perímetro de minha silhueta pressionando meus seios expostos para ele, até que chegasse ao meu pescoço, onde sua boca assumia a tarefa de maltratar minha pele e aproximava-se perigosamente da minha.
E naquele momento eu tive certeza de que ele nunca havia estado por ali ou em qualquer outro bordel antes.
– Giuliard, não... – a sua barba para fazer arrastando em meu rosto transformava toda minha convicção em um gemido sôfrego. Eu podia sentir seu hálito fresco e seus lábios macios no canto da minha boca. – Sem beijos! Eu não beijo na boca!
– Você está brincando, né?! – ele perguntou, afastando-se apenas o suficiente para que pudesse me encarar. – Vamos transar e não posso beijar você?
A intimidade de um beijo era mais do que podíamos, ou melhor, do que eu podia aguentar. Para mim o beijo era muito mais pessoal que o sexo em si, era muita intimidade para uma pessoa que sequer conhecia. Era liberdade demais concedida a alguém que já tinha muita autoridade sobre mim.
– O que são beijos na boca perto do que vamos fazer aqui? Tenho certeza de que você não vai sentir falta... – com o intuito de desviar seu foco para longe dos meus lábios, eu empurro seu corpo o fazendo cair deitado na cama. – Agora será que eu posso aliviar essa tensão aqui?
– À vontade...
Com seu corpo jogado no largo colchão da cama de lençóis vermelhos, eu me coloquei sobre ele sentindo sede de atacá-lo e de arrastar meus lábios por cada centímetro daquele corpo másculo. Seu sorriso esbanjava desejo e me fazia querer transformar tudo aquilo em puro prazer. O contato de meus lábios úmidos em seu abdômen o fez estremecer e só então me permiti provar do sabor da sua pele, que estava tão quente como se ele estivesse febril.
Quente, sim, era exatamente isso que ele era, tão quente quanto a chama de desejo que lambia meu corpo à medida que eu o tocava e conhecia sua anatomia. Ele era tão quente que exalava virilidade e como qualquer mulher sedenta por sexo e pelo prazer que ele poderia favorecer, não consegui deixar de me afetar.
– Me diz o que você quer... senão vou me aproveitar do jeito que quiser de você. – eu falei sem reconhecer a minha própria voz e a maneira como agia naquele programa.
– Eu queria te beijar... – Giuliard respondeu, me fazendo sorrir de uma maneira travessa para ele, contra seu abdômen. Seus olhos procuraram os meus em busca de uma resposta que eu limitei a balançar negativamente a cabeça, sem abandonar a malícia do olhar ou do meu sorriso. – Droga. Eu não consigo pensar direito… só faça o que quiser.
A malícia em meu sorriso foi intensificada ao constatar que ele estava à minha mercê. Havia um quê de nervosismo e inexperiência nele que me intrigava, a maneira com que ele não sabia lidar comigo e até o jeito mais rígido que ele agia me fazia levantar algumas suspeitas sobre ele e uma delas era de que meu carinha estava apenas na mão amiga há bastante tempo. E a de que ele nunca sequer havia visto uma garota de programa na sua frente antes.
No momento em que suas calças e a boxer branca foram parar no chão do quarto, eu pude concluir com convicção de que ele era inteiramente lindo. Por mais que tivesse uma coleção de caras bonitos em minha lista, Giuliard era de tirar o fôlego.
Lindo daquela forma que me fazia sorrir e querer provar cada detalhe dele, desde seu pescoço extremamente cheiroso aos vãos definidos em seus quadris, que faziam um caminho tentador até sua ereção. E, por Deus, que ereção. Grande a ponto de encostar em seu umbigo, mas era a sua grossura e as veias salientes que me chamavam atenção. Ele claramente poderia ser considerado “fora da média”.
E foi exatamente isso que eu fiz. O provei.
Começando pelo seu peitoral, seguindo ao seu abdômen e chegando até seu membro, de onde escorria os sinais de seu desejo em me ter ali. Eu o envolvi no aperto de minha mão e no calor de minha boca, escutando meu nome ecoar pelo quarto como um estímulo para continuar. Deixei que minha língua fizesse o trabalho de estimular a coroa inchada de seu pênis enquanto subia e descia a mão ao longo dele, espalhando toda saliva e sua lubrificação ao longo de sua extensão. Intercalando chupões fortes e mais leves, mas sem tirá-lo de minha boca.
Giuliard me encarava extasiado, mordendo seu lábio em meio a um sorriso sacana que ora desmanchava-se com uma feição de puro prazer e ora intensificava-se, em especial quando nossos olhares se encontravam. Em seu peitoral formava-se uma fina camada de suor que me causava uma sensação estranha de água na boca para lamber a região, mas que eu descontava na maneira com que minha boca trabalhava nele.
Seus dedos compridos se infiltraram entre os meus cabelos quando o tirei dos meus lábios, atraindo suas bolas para o calor da minha boca. Usando minha língua para acariciar e chupar, uma de cada vez enquanto masturbava seu pênis e provocava a coroa inchada dele com o polegar. Era possível senti-lo ficar mais firme contra o meu toque, o que me fez voltar a envolvê-lo em minha boca enquanto minha mão acariciava o local onde havia chupado. Seu abdômen contraia-se a cada giro de minha língua ao redor de seu pênis e assim que sua cabeça se tombou para trás com uma lufada longa de ar, Giuliard me afastou de si pelos cabelos com uma feição faminta que fez meu corpo arrepiar.
– Assim não. Quero gozar com você montando e rebolando no meu pau... – ele declarou em um tom firme, parecendo transtornado pelo desejo de um jeito delicioso de ver. Quebrando completamente a pose durona e careta que eu estava começando a formar dele.
Eu estava fascinada. Não tinha outra explicação.
A sua imagem lânguida sob mim, com olhar escuro da mais profunda lascívia; o calor de seu corpo consumindo o meu, seu perfume e o cheiro de sua pele... e quando menos notei meus lábios provavam mais uma vez dele, de seu peitoral e pescoço suados. Mas que raios aquele homem tinha demais para me deixar daquele jeito?
Eu sequer o conhecia a ponto de sentir tanto desejo.
– Eu quero você e eu quero agora, Nina! Pelo amor de Deus! – ele disse com autoridade, apanhando um daqueles milhares de pacotinhos prateados que ficavam em uma grande taça de acrílico na mesa de cabeceira. Me fazendo sorrir em deleite pela forma que ele havia se imposto.
Porém, um estalo de consciência quase me fez recuar: eu tinha feito sexo oral nele sem camisinha. Pela primeira vez em cinco anos eu tinha feito isso com um completo estranho sem proteção. Isso era basicamente regra da casa e se ele contasse para alguém, eu ficaria em péssimos lençóis.
E quanto a minha consciência, bem, eu teria que lidar com isso depois.
– Nina… – ele pediu mais uma vez.
– Como é mesmo que você me quer? Não consegui entender… – provoquei, na tentativa de colocar meu surto de consciência para o lado.
– Quero você cavalgando no meu pau e de preferência com esses peitos pulando na minha cara! – ele pediu mais uma vez.
Eu peguei o preservativo de sua mão, mas minha lentidão proposital para retirar a camisinha dali o fez arrancar o mesmo das minhas mãos e abri-lo afobado. Nos instantes seguintes, Giuliard já havia nos separado apenas o suficiente para se proteger e me puxar novamente para si.
– Eu estou morrendo de curiosidade... será que você é tão gostoso quanto parece? – sussurrei em seu ouvido, puxando seu lóbulo da orelha entre meus dentes e o fazendo gargalhar alto.
Eu percorri minha intimidade com seu membro protegido, sentindo a lubrificação do preservativo se misturar aos sinais tímidos do meu desejo. Sim, por Deus, sim! Eu estava molhada. Molhada o suficiente para que não precisasse usar o lubrificante que ficava nos quartos e isso também era novidade para mim.
Minha boca fazia de alvo o seu pescoço, sem me importar com o batom que certamente já estava mais do que borrado pela sua pele, sentindo suas mãos grandes me segurarem com força pela cintura enquanto meus seios sensíveis roçavam em seu peitoral.
E mais lentamente ainda, eu o posicionei na entrada apertada de minha intimidade, rebolando para encontrar o melhor ângulo para o seu tamanho avantajado, o fazendo me invadir deliciosamente devagar. Daquele jeito que me fez contorcer os dedos dos pés de um prazer inesperado e morder o lábio inferior em meio a um sorriso de olhos fechados.
Céus... eu já tinha me esquecido de como era bom sentir um corpo quente e firme contra o meu. Da invasão gostosa em meu interior apertado e molhado, me mostrando que estava precisando exatamente daquilo.
– Pelo jeito que você está quente e me apertando gostoso assim, quer dizer que fui aprovado... – Giuliard provocou, acariciando a lateral do meu rosto com o nariz até chegar ao meu queixo onde deixou uma mordida leve.
– Você é apressado, querido. Vamos com calma que eu sou difícil de agradar.
Eu o sentia por inteiro dentro de mim, o acomodando até o fundo para então rebolar os meus quadris, mexendo em movimentos largos com o seu pau me acariciando por dentro.
– Santo Deus, Nina… – ele ofegou alto, tombando a cabeça levemente para trás.
Não me importei em começar devagar ou fazer algo calmo, não estávamos ali para romance ou para intimidade. Ou melhor, ele não estava ali para isso. Ele queria prazer e eu iria lhe entregar isso do início ao fim.
Com apoio dos joelhos, eu me movi sobre ele sem pudor algum. O retirando por completo para então retornar em uma investida funda, que roubou meu ar e me arrancou um gemido manhoso de prazer.
– Retiro o que disse… você é sim gostoso demais! – falei entre gemidos. Suas mãos me agarravam pela cintura, afundando os dedos em minha pele a cada movimento e me forçando cada vez mais para ele. –Tão fundo, você consegue sentir como é bom?
Eu sentia meu prazer se fazendo cada vez mais presente, aumentando de intensidade como se meu corpo finalmente estivesse entendendo que aquilo era bom.
– Giuliard… – eu gemi despudorada, o encarando com os olhos semicerrados. Caramba como ele era lindo e conseguia ficar ainda mais com o meu corpo montado ao dele.
O suor escorria pelas suas têmporas transformando sua feição contorcida de prazer ainda mais erótica. Ele franzia o cenho em agonia enquanto seus lábios inchados separados soltavam lufadas pesadas de ar. Grunhindo sob o fôlego e soltando aqueles gemidos de homem com tesão, que vociferavam muito bem o que seus olhos azuis escuros expressavam.
Ele me percorria com minúcia, estudando meu corpo com as mãos e beijando meu rosto e mandíbula, tentando se aproximar cada vez mais dos meus lábios, o que me fez empurrar seu tronco para longe e deitá-lo no colchão.
– Era assim que você me queria, hun? – provoquei, com um sorriso sacana.
Giuliard se limitou a me responder, apenas me dando um sorriso sacana e entreabrindo um pouco mais as pernas, me jogando mais para frente.
A mudança de posição alterava o ângulo com que eu o abrigava dentro de mim, me permitindo que ele fosse ainda mais fundo em mim. Aquela altura, eu já estava tão molhada que a mudança de posição criava um atrito delicioso de meu clítoris contra a pele de sua púbis
– Diz para mim, diz! – eu insisti, parando brevemente o que fazia. Meu sorriso era um misto de provocação e deleite enquanto mexia em meus cabelos os jogando para o lado, montada em seu colo.
– Era... mas agora eu já quero de outro jeito... – ele respondeu sem desviar o olhar do meu. Suas mãos voltaram para os meus quadris logo após terem servido de apoio para que ele se sentasse novamente. – Por que parou, hein?
Eu tentei mantê-lo deitado na cama com as minhas mãos espalmadas em seu peitoral, porém, Giuliard mostrava-se resistente com a ideia de meu domínio. E bem, não era difícil ceder aos seus comandos, principalmente quando sua vontade era tão parecida com a minha. Suas pernas haviam deslizado para fora da cama, nos levando até a beirada dela onde me manteve em seu colo, com as pernas levemente afastadas.
Ele me segurava perto, grudada a ele naquele aperto ao redor de minha cintura, permitindo que ele beijasse meu pescoço e tocasse meu corpo enquanto eu cavalgava em seu colo presa em seus cabelos suados. Causando a sensação mais gostosa que recordava já ter sentido. Nossos corpos suados em movimento, meus seios pesando e roçando levemente em seu peitoral, implorando por atenção.
Nós já estávamos completamente nus um contra o outro, com os corpos suando em contato… mas nunca havia desejado tanto um toque específico antes.
Eu estava me entregando completamente a ele enquanto brigava com o eco em minha mente que lembrava-me de que o meu prazer não era prioridade, mas sim o dele. Era assim que funcionava, era assim que Margareth havia me ensinado: “se você gozar com ele será ótimo, mas a prioridade é fazê-lo gozar. Nem que para isso tenha que fingir”. E pelas suas feições, Giuliard estava cada vez mais próximo do fim.
– Goza para mim, goza... – eu sussurrei em seu ouvido, rebolando nele em estímulo. – Eu consigo ver que você está louco para gozar…
Eu poderia lidar comigo depois que ele fosse embora e que estivesse sozinha no quarto.
– Eu gozo, mas não antes de você! – ele respondeu com firmeza, segurando meu queixo da mesma maneira. Me forçando a olhá-lo nos olhos. – Eu posso estar pagando, mas você vai gozar comigo. Não importa quantas vezes vamos fazer isso essa noite, mas você vai gozar comigo todas elas! Entendeu?
Ele acariciou meu queixo com o polegar, subindo até meu lábio inferior, que estava entreaberto pelo suspiro fundo de tesão que ele me roubou. Eu assenti positivamente com a cabeça, totalmente atordoada.
– Você realmente pensou que fôssemos terminar assim?
A próxima coisa que eu sabia era que suas mãos passaram a envolver meus seios em um aperto firme para então levá-los ao calor de sua boca. Finalmente. Deus, finalmente.
O calor de sua boca e suas mãos firmes era tudo o que eu precisava em meio ao vai e vem frenético de meus quadris. Chupando, lambendo, deliciando-se em meus seios. Massageando meus mamilos úmidos com o polegar e me provocando com apertos sutis. Eu me segurava em suas coxas separadas, buscando apoio e expondo ainda mais meu corpo para ele… eu queria mais, eu precisava de mais. Daquela boca, daquelas mãos, de tudo que pudesse me oferecer.
– Gostosa demais! – ele grunhiu entre dentes, chupando meu mamilo para dentro de sua boca. – Sua buceta está me apertando tão gostoso, porra!
Com a palma da mão aberta em meu ventre, Giuliard levou seu polegar ao meu clitóris inchado, o massageando com maestria arrancando de mim os gemidos mais altos daquela noite. Céus, eu realmente havia esquecido de como era tão bom. Meu corpo estremeceu em resposta, obtendo de Giuliard a mesma resposta de prazer. Ele estava tão fora de si quanto eu.
– Agora sou eu quem falo para você gozar para mim... vem, dá para mim, Nina! – ele disse entredentes, com um tom autoritário quase que severo fazendo-me sorrir com aquilo. – Eu estou louco para te sentir gozando ao meu redor.
Meu corpo pingava a suor assim como o dele e eu o puxei pelos ombros para mim, me agarrando a ele como se meu orgasmo dependesse daquele contato entre nossas peles. Seu polegar seguia me masturbando, no ângulo e da forma exata que fazia meus olhos revirarem. Céus, eu estava ali, com um pé para fora do precipício.
– Giuliard… – gemi em desespero. As minhas investidas ficaram mais frenéticas e meus seios saltavam diante de seu rosto exatamente como ele havia pedido.
– Goza, linda, eu vou logo após de você! – ele garantiu, aplicando mais força em seu polegar me masturbando.
Como se meu corpo obedecesse a ele, após uma investida longa, eu fui tomada por aquela rara sensação deliciosa que me fez gritar com o prazer que partia daquela região abaixo ao meu ventre e me fazia contorcer por inteiro. Meus dedinhos dos pés, panturrilha, músculos internos. Era aquela mistura gostosa de calor e prazer e deleite que emanava por cada partezinha do meu corpo. Era alucinante.
Tão alucinante quanto observar o homem lânguido sob mim e suas feições ao atingir seu orgasmo.
Nossos corpos caíram suados entre os lençóis desarrumados da cama e eu não soube dizer quanto tempo havia se passado até que retomássemos um pouco do fôlego. Poucos segundos? Alguns minutos? Não sabia dizer. Ele estava em êxtase, eu estava em êxtase. Tanto que mal sabíamos como reagir depois do que havia acontecido ali.
Contudo, Giuliard foi o primeiro a se mover para longe para se livrar do preservativo usado e então retornar para a cama, onde eu estava deitada de bruços, abraçada a uma almofada.
– Você é muito linda, sabia? – ele declarou, acariciando meu rosto com o dorso do indicador, fazendo um rubor subir pelo meu pescoço. – Me disseram que é a melhor daqui...
– Sou mesmo! – eu sorri de maneira convencida, sentindo minhas pálpebras pesarem em resposta a carícia gostosa que ele fazia em mim. – Você não concorda?
– Não sei, não conheci as outras... – Giuliard respondeu em tom de brincadeira, descendo com seus toques para então acariciar meus lábios entreabertos com o polegar.
– Ah, é assim? Saiba que eu sou ciumenta, não quero mais ninguém daqui em cima de você. Esteja avisado! – respondi, entrando em sua brincadeira. Meus lábios se fecharam ao redor do seu dedo, chupando lentamente até tirá-lo da boca.
– Justo! – ele deu uma risada rouca, atraindo mais uma vez minha atenção para seu pomo de Adão e para os locais de seu pescoço onde eu havia manchado com o meu batom. – Eu não queria ter vindo hoje e quando cheguei, jurei que fosse ficar apenas para o seu show... o que é que você fez para acabarmos desse jeito aqui?
Ele parecia infinitamente mais leve e descontraído, como se um peso tivesse sido tirado de suas costas e um mundo de tensão de seus ombros.
– Olha só... você aproveitou bastante para quem estava tão contrariado a ficar! Acho que isso responde a sua pergunta sobre eu ser a melhor daqui... – respondi com um sorriso e um piscar sedutor.
Giuliard riu mais uma vez e então colocou-se sobre mim, me encurralando com seu corpo quente e imenso contra o colchão e a almofada em que estava abraçada. Ele mantinha seus braços apoiados no colchão, sustentando uma parte do peso do seu corpo, até que sua mão direita se embrenhasse entre meus cabelos, jogando meus fios para o lado oposto, liberando meu pescoço para ele.
Foi como um passe de mágica que meu corpo mergulhou em um mar morno de sensações, sentindo os lábios marcantes dele beijarem e chuparem meu pescoço, minha nuca, a região sensível atrás da minha orelha. Arrastando os dentes pela minha pele hiperestimulada enquanto ele acariciava meu couro cabeludo e puxava meus fios.
Por Deus, quem era esse homem e de qual porta do paraíso ele havia saído? E o mais importante: o que ele tinha demais para estar me fazendo sentir essas coisas?
A sua respiração ofegante deixava aquela sua exploração ainda melhor e já era possível sentir a rigidez de seu membro criar forma novamente contra as minhas nádegas.
– Você está com cara de quem quer mais... – afirmei e minha voz era um sussurro pesado de desejo.
– Eu? – ele brincou, mordiscando o lóbulo da minha orelha.
– Sim... – respondi entre suspiros, dando um sorriso extasiado. – Estou sentindo seu pedido de mais.
– Dança para mim? – Giuliard pediu, descendo seus beijos para o meu ombro e então minhas costas.
– Você não vai me perguntar o que eu faço?
– Não… o que eu realmente queria você não faz. Não vou forçá-la a fazer algo para me agradar só porque estou pagando. Independente do que fizermos aqui, vai ser ótimo para mim! – ele confessou, encolhendo os ombros. – E então, dança para mim?
– Eu posso fazer mais do que dançar, sabe…
– É mesmo? Então me mostre…
E eu mostrei, o colocando sentado na beira da cama, de frente ao espelho que cobria a parede inteira. Rebolando e sentando em seu colo de frente para o nosso reflexo. Fazendo suas mãos percorrerem meu corpo enquanto nos levava aos céus pela segunda vez.
E então pela terceira vez, no aparador perto da porta do quarto, após Giuliard ter se vestido e tentado se despedir.
– Giuliard! – eu gemi alto, fazendo seu nome ecoar entre aquelas quatro paredes, cumprindo a promessa que eu havia lhe feito no início do programa.
Meus calcanhares afundaram em sua bunda no momento em que suas investidas certeiras me fizeram chegar ao terceiro orgasmo daquela noite, arqueando meu tronco todo para ele e acarretando em uma batida brusca do móvel contra a parede.
Eu me sentia no cúmulo da vulnerabilidade inteiramente nua com ele completamente vestido em meio às minhas pernas, apenas com as calças abaixadas e sendo pressionada contra a parede e o aparador. Alguns longos segundos se passaram até que seu braço firme deixasse minha cintura e ele se livrasse do preservativo para colocar novamente suas calças no lugar.
Giuliard encarava-me com um sorriso sacana e com os olhos repletos de satisfação, distribuindo beijos pela minha mandíbula e fazendo uma carícia gostosa em meu rosto com a ponta dos dedos e do nariz.
Tão dolorosamente perto dos meus lábios que seria necessário apenas uma alteração no ângulo do meu rosto para que finalmente nos beijássemos.
– Como eu faço para ir embora, garota? Você é viciante…
– Volta? – e foi quando eu duvidei que aquele sussurro havia realmente saído de mim. Pelo convite para voltar, pelo sussurro de desejo. Pela noite incrível que havíamos tido e que, mesmo que ele não tivesse partido ainda, eu já sentia vontade de mais.
– Se você quiser, eu volto! – ele respondeu com um sorriso.
– Eu quero... – eu assenti baixinho ainda um tanto envergonhada, duvidando de mim mesma.
– Então eu volto! – mais uma vez ele sorriu e eu pude ter a certeza de que ele cumpriria o que dizia.
Sem mais delongas, Giuliard sacou a carteira do bolso de seu jeans retirando de sua carteira o que eu contava ser dez notas de cem e mais oito de cinquenta dólares para deixar ao meu lado, sobre o aparador. Porra, quem tinha tanto dinheiro assim na carteira?
– Isso vale muito mais do que meu programa... – eu disse em sobressalto, com os olhos esbugalhados em choque.
Segundo o cronômetro sobre a porta, que começou a contabilizar o tempo no exato momento em que havíamos fechado, nós tínhamos ficado apenas duas horas naquele quarto e considerando que a hora do programa valia quatrocentos dólares, ele tinha me pagado quase o dobro do que deveria.
– Não posso querer te dar um agrado? – Giuliard deu de ombros, explicando-se. Naquele momento eu queria ainda mais que ele voltasse. – Até mais Nina...
– Até mais, Giuliard! – eu respondi, o observando sair do quarto depois de piscar para mim.
A minha cabeça girava e minhas pernas tremiam e eu tentava similar o que havia acabado de acontecer ali. O que ele homem tinha demais? Será que apenas o fato de ele ter me tratado diferente tinha sido o suficiente?
Não que ao longo dos anos eu nunca tivesse cruzado com caras gentis, mas havia algo diferente em sua gentileza. Ele era muito diferente dos gentis e o completo oposto dos brutamontes… a suposição de que ele estava na mão amiga se confirmava fortemente, assim como aquela sobre ele nunca ter visto uma garota de programa em sua frente antes. Porém, havia algo que nem mesmo meus seis anos de experiência sabia como explicar.
Balancei minha cabeça negativamente obrigando-me a afastar aquela linha de pensamentos que previa seguir e então levantei-me do aparador para ir atrás de minhas roupas espalhadas pelo quarto. Segui o protocolo combinado de substituir os lençóis usados por novos, os deixando no cesto escondido no canto do quarto e então retornei para a boate. Antes de voltar a ativa, precisava dar um jeito em minha aparência pós-foda e para isso precisava dar uma passada rápida no banheiro direcionado a nós nos fundos da boate.
Minha noite estava muitíssimo longe de acabar.
Agitação, lençóis vermelhos, vozes, sussurros, gemidos.
Aqueles olhos azuis.
Até que a realidade me atingisse como um balde de água fria. Ao fundo, o barulho que havia se tornado frequente pelas manhãs na última semana me tirava do melhor sono que eu lembrava já ter tido. Malie. Virei-me lentamente na cama, ainda um tanto sonolenta, para que conseguisse olhar o relógio digital da penteadeira em frente às nossas camas: 08:30 da manhã e meu despertador natural havia se adiantado naquele dia. Era cedo demais para acordar depois da noite anterior na boate e eu me sentia exausta, porém, a poucos metros dali alguém precisava de mim. Aquilo já estava virando rotina.
– Malie... – adentrei pela porta entreaberta do banheiro, deparando-me com a minha amiga debruçada no vaso sanitário. – Hey...
– Humm... – sua resposta foi em forma de um resmungo seguido por uma feição de ânsia.
– De novo isso, Meiz... – a repreendi enquanto procurava uma toalhinha no armário e a molhava na pia para entregá-la.
– Não precisa ver isso, Allie, pode voltar a dormir! – ela respondeu envergonhada, sentando-se no chão do banheiro, mas aceitando a toalha úmida que eu alcançava.
– Claro que não, eu não me importo, sabe disso!
– Eu não sei o que está acontecendo, pensei que estivesse melhorando, mas parece que só faz piorar. Está insuportável hoje – ela resmungou, levando a toalha até a testa e limpando o suor que escorria em seu rosto. Minha amiga estava horrível, pálida, sem cor nos lábios e era evidente sua perda de peso naquela semana em que nada parava em seu estômago.
– Malie, você sabe que precisa ir ao médico, não tem como continuar passando mal desse jeito. Precisa ver o que está acontecendo! – disse ainda em repreensão, encostando-me a pequena pia no banheiro.
– Não é nada demais, tenho certeza de que é apenas uma virose mesmo. Minha mãe sempre dizia que piorava para melhorar, é isso que está acontecendo! – Malie explicou rapidamente, dando de ombros. Era todos os dias a mesma justificativa.
– Quanto mais terá que piorar para melhorar, hein? Se você não estiver melhor até segunda-feira, eu vou levá-la arrastada até o hospital, está ouvindo?
– Tenho certeza de que vou estar melhor, só preciso de um banho... – ela adicionou rapidamente, esticando sua mão para que eu a ajudasse a levantar.
– Tudo bem, vou comer alguma coisa e te espero na cozinha, ok?
A tentação de me enrolar novamente nas cobertas era grande, mas até que caísse no sono novamente, eu já teria perdido muito tempo do meu sábado.
– Claro, claro!
Enquanto minha amiga tomava banho, eu me adiantei em trocar de roupa e organizar o quarto para então cruzar o corredor estreito e mofado até a cozinha. As cinco outras portas estavam ainda todas fechadas, com exceção da última ao fim do corredor, o que me indicava que Margareth já estava de pé. Como todos os dias.
– Bom dia, Nina! – Megg sorriu simpática, erguendo o olhar de sua revista para me receber. Ela e suas oscilações de humor que eu não conseguia acompanhar. – Caiu da cama?
– Não, na verdade, Mia me acordou... Vomitando! – revirei os olhos.
– De novo? – ela indagou inconformada e eu apenas balancei a cabeça positivamente. – Já a mandei ir ao médico, isso está ficando sério.
– E quem disse que ela obedece? – eu respondi, seguindo em direção à cozinha para me servir da salada de frutas que minha chefe religiosamente fazia todos os dias para todas nós e me debrucei ao balcão para conseguir respondê-la. – Disse a ela que se isso não passar até segunda-feira nós vamos ao médico, não tem condições, nada pára no estômago dela, sem falar na falta de disposição.
– Para mim isso tem outro nome... – ela refletiu, prosseguindo logo em seguida. – Gravidez...
E foi então que um estalo percorreu minha espinha, fazendo-me paralisar. Não, minha amiga não poderia estar grávida.
– Eu... eu realmente espero que você esteja enganada. – suspirei fundo optando por mudar de assunto, sentindo de repente uma inapetência apenas com aquela possibilidade. Como eu havia deixado passar os sintomas que tão bem conhecia? – Marquinhos está aqui?
– Como se eu vivesse sem vocês, né?! Ouvi sua voz de longe e vim ver minha garota favorita! – a voz conhecida e fina de meu amigo me fez sorrir abertamente assim que ele se colocou em meu campo de visão.
Marcos, ou Marquinhos para os mais íntimos, era nosso personal, psicólogo, melhor amigo, alicerce meu e de Malie, e o segundo e último membro de minha pequena família. Ele era basicamente mais um morador do bordel e, assim como eu e Malie, Marquinhos era sozinho no mundo.
– Hey! Como você está se sentindo? Mais um pouco e eu ficava doente, mas de saudades de você! – eu falei, o abraçando e sendo fortemente envolvida por um par de braços musculosos e extremamente fortes.
Nossos caminhos se cruzaram em seu aniversário de dezenove anos quando seu pai o levou até o bordel para que Margareth tirasse sua suposta virgindade, porém, a única coisa a ser perdida naquela noite foi sua vergonha e o temor de assumir sua orientação sexual para os pais. Infelizmente a notícia acabou não sendo nem um pouco bem recebida pela família conservadora e algumas horas depois, meu amigo apareceu todo machucado na porta da SoHo Dolls, após ter sido agredido pelo pai e irmãos, pedindo ajuda por ter sido mandado embora de casa. E, bem, como Margareth dizia, Soho Dolls sempre teria espaço se fosse para agregar.
Sem ter muitas opções, Marquinhos foi morar nos dormitórios da faculdade e para conseguir sustento, conseguiu trabalhar em nossa boate como segurança e de garçom em outros bares aleatórios.
Alguns anos mais tarde, meu amigo se tornara um dos personal trainers mais requisitados – e lindo – de Manhattan, com seus músculos extremamente bem definidos, olhos verdes e cabelos negros, que viviam presos em um coque frouxo. Além, é claro, de todos os cargos a mais que eu e Malie lhe outorgamos com o passar do tempo e que ele exercia com a maior paciência e senso de humor possível.
– Estou melhor, gata, foi só uma gripe forte mesmo. Pronto para outra! – ele respondeu afagando minhas costas nuas pelo top de ginástica que usava. – O que faz de pé tão cedo em um sábado e toda vestida para malhar a bunda na academia?
– Mia me acordou passando mal de novo e eu preciso me distrair um pouco... – expliquei por cima.
– Mia está mal ainda? – ele perguntou e eu apenas gesticulei disfarçadamente com a cabeça, em direção à Margareth, para que tratássemos depois daquela questão. Gravidez era um assunto delicado por ali desde quando o último, e primeiro, teste que havia dado positivo naquela casa. – Você já comeu, mocinha? Podemos pegar no pesado?
– Podemos, seu ogro! – eu assenti, empurrando seu ombro com um soquinho. – Megg, você pode avisar a Mia que estou na academia com Marcos?
– Sim! – ela assentiu sem desviar sua atenção da revista.
Nós seguimos caminho até o local, indo para os fundos daquela casa antiga que se tratava friamente de um quintal fechado e improvisado com aparelhos de academia, onde passávamos boa parte do nosso tempo quando não estávamos ensaiando no pole dance. Logan, o verdadeiro dono de tudo aquilo, insistia que nos mantivéssemos em forma para ser um atrativo ainda maior para os clientes.
– Você sabe que eu não aguento esses seus mistérios, o que diabos está acontecendo com Malie? – Marquinhos perguntou assim que eu liguei uma música em um volume alto o suficiente para que não pudessem nos ouvir.
Apesar de convivermos todas em paz, as paredes naquela casa pareciam ter ouvidos e era preciso tomar o máximo de cuidado com o que se falava para que não caísse em ouvidos errados.
– Marcos, eu acho que a Malie está grávida... – anunciei sem muitos rodeios.
– Puta merda, eu realmente precisava de um aviso para esse banho de água fria, gata! – sua boca carnuda formava um "o" de espanto e eu apenas assenti. – Por favor, agora que começou, termine de abrir essa caixinha de pandora.
– Os sintomas... Não sei como não percebi antes, eu os conheço bem... – dei de ombros. – Ela não consegue comer quase nada que acaba vomitando, faz uma semana que não desce para a boate de tanto enjoo e indisposição, sem falar que uma vez ela me disse que ela e Aaron frequentemente "esquecem" de se proteger.
– Meu Deus do céu, eu fico uma semana doente e sem dar as caras por aqui e uma me aparece grávida enquanto a outra começa a acordar cedo... – Marcos refletiu e eu pude perceber que ele tentava encontrar certo humor naquela situação. – Alice, mas ela falou alguma coisa com você sobre isso? Ela sequer suspeita que pode estar grávida?
– Ainda não, jura que foi alguma coisa que ela comeu, mas está fugindo do médico como o Diabo foge da cruz, talvez até mais. Impus um prazo de segunda-feira para ela melhorar, mas vou acabar a fazendo ir ao médico de qualquer forma. Estou começando a ficar preocupada.
– Alguma coisa que ela comeu... o certo seria: algo que comeu ela! – ele refletiu, revirando os olhos. – Depois disso tudo aí que você falou, não restam muitas dúvidas não, a não ser de quem é esse filho!
– Se ela estiver mesmo grávida, certamente o bebê é de Aaron. Ele é o único que ela atendeu nesses últimos meses e pelo que sei ele é o único que ela já fez sem proteção... – expliquei, seguindo até a esteira onde começaria minha maratona de exercícios.
– Não sei nem o que pensar sobre isso, só que ela vai precisar tanto de nós... – ele lamentou, apoiando-se no painel da esteira onde estava.
– Posso saber quem é que vai precisar de vocês? – a voz conhecida de minha amiga preencheu o ambiente fazendo com que eu e Marcos nos entre olhássemos.
– Você, se continuar vomitando as tripas todas as manhãs, é claro! – Marcos respondeu com um tom de obviedade, olhando para nossa amiga que adentrava pela pequena academia improvisada.
– Ah, então Alice lhe contou? – ela perguntou novamente.
– Mas é claro, como não iria contar quando você passando mal no banheiro virou o despertador dela? – Marcos rebateu.
– Seu grosso, não fala assim comigo que eu estou sensível! – minha amiga choramingou, empurrando o ombro dele com o mesmo soquinho que eu havia dado mais tempo em um gesto típico nosso. – Não sei porque eu gosto tanto de você!
– Porque eu sou demais, meu amor! – ele respondeu, puxando ela para seus braços de Hulk, que se aconchegou manhosamente entre eles. – Como você está se sentindo, coisinha? Só não vou lhe passar mais sermão porque imagino que a Alice já esteja puxando suas orelhas o suficiente!
“Coisinha”. Frequentemente usávamos o diminutivo para falar com ela, considerando sua estatura pequena e delicada que a fazia parecer como a Tinker Bell.
– Hmmm... Marquinhos vou contratá-lo como meu namorado de aluguel só para você me abraçar desse jeito enquanto eu durmo... – Malie continuava com aquele tom manhoso, claramente desviando o assunto e ignorando o último comentário de nosso amigo. Parecendo um daqueles gatos que ronronavam e aconchegavam-se em nossos colos ao receber carinho.
Na verdade, eu sempre achei que minha amiga era a reprodução de um gato em forma humana, em especial nas últimas semanas: independente, porém, manhosa e carente, daquelas pessoas que não demonstram muito carinho, mas que quando gostavam de alguém, simplesmente não media esforços em expor. E bem, eu adorava isso nela principalmente porque era o oposto de mim.
– Eu hein, o que aconteceu com seu Lord que não está dando conta de toda essa sua carência? – ao se tratar de Aaron, Marcos forçou o sotaque britânico carregado devido a sua nacionalidade.
– Meu Lord? Bom se fosse – Malie riu com sarcasmo. – Ele estava sumido, mas me ligou ontem logo depois que Alice desceu e nós vamos sair para jantar hoje à noite.
– Ah, que ótimo! – foi minha vez de se manifestar. – É um passo, não? Sair para jantar...
– Bom se fosse, na língua de Aaron sair para jantar é apenas um jeito bonitinho de falar que eu vou virar a janta no final da noite!
– E isso é ruim por qual motivo? – Marcos perguntou, inconformado.
– Marcos as vezes eu acho que você é uma máquina de sexo insensível! É ruim por que ele só quer sexo e eu quero algo a mais... eu queria mesmo sair apenas para jantar com ele, mas ao mesmo tempo isso é melhor do que nada, né? – ela revirou os olhos, suspirando fundo. – Argh essa situação está me deixando louca!
– É, estou sentindo!
Já não era mais segredo para ninguém o tanto que Malie estava apaixonada por Aaron, mas por outro lado, também era evidente que o principal interesse dele era o status e prazer em ter uma garota novinha e bonita ao lado e na cama. Em jantares, festas, reuniões e todos os tipos de aparições públicas que ele tinha que fazer e que se tratava de sua empresa e amigos, minha amiga lhe servia de acompanhante como um troféu bonito a ser exposto.
O motivo de ele pagar tão caro em Malie era claro. Costumávamos a dizer que éramos as mulheres perfeitas, afinal, não tínhamos crise de ciúmes, não ligávamos ou cobrávamos ligação no dia seguinte, não nos magoávamos em não ter massagem antes do sexo ou de não dormir de conchinha depois e os satisfazíamos na cama independente das situações. Era sexo certeiro e sem comprometimento ou sentimentos. Quente e sem muito pudor. Como não gostar? Eu costumava a dizer que a prostituição era como uma droga para ambas as partes; o dinheiro nos viciava e nós viciávamos nossos clientes. Um ciclo sem fim.
– Vocês já conversaram sobre isso? – eu perguntei, mesmo já sabendo sua resposta.
– Alice, eu sou uma prostituta e ele um bilionário, o que ele vai querer comigo além de sexo? – Malie revirou os olhos. – Eu não posso simplesmente chegar e falar; "viu estou loucamente apaixonada por você, vamos namorar?". É tipo chamar o cachorro para o veterinário ou falar para o gato que ele vai tomar banho... é fuga na certa! Prefiro ter que lidar com tudo isso em silêncio do que simplesmente não tê-lo mais comigo.
– Malie, se vocês nunca conversaram, como vai saber? E se ele sente o mesmo? O que justificaria ele pagar para te ter exclusivamente para ele? Tem tanto gato estranho por aí que ama água... – eu repeti o que sempre lhe dizia quando tentávamos falar sobre ele.
Aaron era o sonho e ao mesmo tempo o pesadelo de todas as garotas de programa. Ao mesmo tempo em que gostaríamos de ter exclusividade com um cliente, sabíamos que era o cúmulo do masoquismo manter essa relação uma vez que a probabilidade de criarmos uma ligação mais forte era ainda maior.
– Eu não sei, eu só sei que estou exausta de pensar sobre isso e me iludir cada vez mais. Nessas últimas semanas tudo o que eu faço é pensar nele e em quantas maneiras posso me declarar para ele e desistir de ser sua garota de uma vez... – Malie falou com a entonação de quem queria dar um basta no assunto, seguindo em direção a bicicleta ergométrica ao lado da esteira onde eu estava.
– Alou, o que você pensa que vai fazer, Malie Windsor? – Marcos se antecipou, fazendo a pergunta que estava na ponta de minha língua.
– Tirar a poeira do corpo, é claro! – ela respondeu apontando para o aparelho onde estava prestes a se sentar. As roupas que ela usava já me deixavam claras suas intenções ao entrar ali, mas esperava fortemente que fosse apenas força do hábito. – Eu preciso me mexer, não aguento mais essa indisposição e só o dinheiro do Aaron não está sendo o suficiente. Quero voltar para o bar e para as apresentações.
– Olha amiga, eu acho que você não deve fazer esforço, mal consegue comer, segue indisposta e sem citar esses seus enjoos... – aconselhei, trocando olhares discretos com Marcos.
– Não faz assim comigo, estou me sentindo imprestável nesses últimos dias. Preciso urgentemente me colocar em forma de novo, sem falar que daqui a pouco Margareth vai começar a me encher o saco... – ela insistiu, choramingando.
– Oh garota, pare de ser uma velha teimosa! Senta essa bunda ali nos bancos e fique aqui conversando conosco! Espere até estar um pouco melhor e não acordar a casa inteira vomitando de manhã para poder se cobrar dessa forma! – e bem, essa era nossa relação, entre tapas e beijos, conselhos e sermões, e nós duas nos provocando devido a nossa diferença de um ano de idade.
– Acho bom você acatar, Malie, sabe como a Alice fica quando é contrariada... é bom obedecer a novinha invocada! – e claro que assim como Malie, Marcos também não ficava fora das provocações.
– Se eu não estivesse tão exausta, iria pensar em algo a altura para lhe responder, Marcos! – foi minha vez de reprimi-lo.
– Falando nisso, você chegou cedo ontem, o que houve? – Meiz quis saber, seguindo meu conselho e sentando-se em frente a nós.
– Ah sim... não tinha muito movimento ontem e dos três caras que eu levei para o quarto, os dois últimos não demoraram nem meia hora. – eu expliquei dando de ombros e decidindo desviar meu olhar para o cronômetro da esteira. Refletindo se deveria ou não dividir com eles sobre meu primeiro cliente, afinal, eu havia apenas gozado com um cara desconhecido, sexo normalmente funcionava assim.
Menos comigo.
Havia sido uma noite anormal na boate, não apenas pela maneira com que ela havia começado, mas principalmente porque os dois últimos não pediram por sexo completo, ficando apenas em preliminares e uma conversa fiada sobre suas vidas.
– Os últimos é? Quer dizer que o primeiro deu mais trabalho? – minha amiga perguntou, sustentando um sorriso interessado.
– É, digamos que sim... só que não foi um trabalho no sentido ruim. Não sei explicar... demorou mais, isso que eu quero dizer. – eu tentei explicar, mas sentindo que havia me complicado ainda mais.
– Opa, então quer dizer que foi de um jeito bom, hun? Que sentido "não ruim" você se refere hein, Dona Nina? – Marquinhos investiu, trocando um olhar cúmplice com Malie. Eles não deixavam escapar absolutamente nada.
– Digamos que aconteceu uma coisa bem incomum ontem de noite... – franzi o cenho, aproveitando da deixa para parar com aquela tortura que era correr na esteira. – Eu atendi um cara que, meu Deus, eu nunca tinha visto um homem como aquele.
– Caramba então deve ser "O" homem porque cá entre nós, você já viu muito homem nessa sua breve vida, né amiga?! – meu amigo prosseguiu com a provocação.
– Ele era tipo aqueles atores altos de cinema com aqueles olhos azuis e cabelos pretos, o maxilar largo com ar de macho alfa, sabe? Aquele olhar sério, pesado... – o descrevi brevemente, contendo um suspiro de deleite. – E foi muito estranho porque nós nos conectamos apenas com o olhar. Com ele me assistindo dançar.
– Se conectaram apenas com o olhar, amiga, você quer enganar a quem? – eu adorava e odiava ao mesmo tempo a simplicidade e a forma de ser franco do meu amigo. – Vai, fale mais sobre essa conexão de olhares!
– Teve química ali, entende? Como duas pessoas na balada que ficam, estendem a noite para outro lugar e depois cada uma vai para um lado.
– Então quer dizer que a minha roupa lhe deu sorte? – Malie comentou maliciosamente, piscando para mim. – Nossa, se eu soubesse que minhas rezas eram tão fortes, já teria rezado para ganharmos na loteria.
– Se as suas roupas me deram sorte? Sorte é pouco! – eu respondi.
– Sua roupa rendeu orgasmos a ela pelo jeito, Meiz! Mas conte mais, conte mais que eu estou curioso! – a malícia e animação do meu amigo se fez presente, misturada a curiosidade genuína deles dois. – Vocês se conectaram com o olhar, ele te viu dançar... e o que mais? Foi bom? Ele realmente foi tudo isso?
"Foi ótimo, ele era incrível em todos os sentidos, em todas as partes." foi o que eu pensei.
– No início ele me pareceu uma pilha de nervos e receio e era claro para mim que era a primeira vez dele em um bordel. Além de estar escrito na testa em letras garrafais: “estou sem transar há décadas, por favor, me ajude!”. – eu comecei, me sentindo uma adolescente narrando seu primeiro beijo. – Mas foi tão incrível... Ele foi surpreendentemente gentil e quente ao mesmo tempo, e céus, ele gemeu meu nome! Até mesmo flertar nós flertamos, parecia mesmo um sexo casual e nada mais.
O tom de minha voz transmitia toda a intensidade que aquele programa havia sido para mim e eu não me importava em demonstrar o tanto que aquilo me afetara, pois sabia que aquele era um lugar seguro para isso.
– Mulher, eu estou vendo que você vai ter um orgasmo só de falar dele daqui a pouco! – Marcos falou boquiaberto, provavelmente por nunca ter me visto falar dessa forma sobre algum cliente.
– Eu acho que ela ficou molhada só de falar dele... – Malie adicionou, trocando mais um olhar cúmplice com Marquinhos. – Amiga, você realmente estava necessitada!
– Eu estava necessitada mesmo, sinceramente não consigo me lembrar quando foi a última vez que eu tive uma noite de sexo que chegassem aos pés de ontem.
Muito provavelmente, nunca. Ainda que contasse sim com ótimas experiências, nunca havia sido tão intenso e íntimo ou logo de cara. Pela primeira vez com um cara completamente desconhecido
– E você conseguiu gozar mesmo? – Marquinhos indagou e eu balancei a cabeça em afirmação.
– Três vezes para ser mais exata! – eu respondi me vangloriando, mas preferindo manter os detalhes apenas entre nós dois. – E o melhor de tudo é que foi impossível não gozar com ele. Parecia que nos conhecíamos há muitos anos, tamanha química e sintonia que rolou.
– E como é o nome desse Deus maravilhoso que daqui a pouco vou começar a achar que foi um sonho seu! – minha amiga quis saber, curiosa.
– Giuliard... – respondi, seu nome em meus lábios despertava memórias libidinosas em minha mente e corpo.
– Que nome delícia, já gostei ainda mais! – Marquinhos celebrou. – Você não pegou mais nenhuma informação, não?
– Não, a não ser que aparentemente ele tem muito dinheiro e acabou me dando o dobro pelo programa.
– Uau! Usava aliança? – as perguntas continuavam e Malie fez a que eu tanto aguardava. Em resposta, eu apenas balancei negativamente a cabeça ainda com aquela feição presunçosa.
– Não tinha nem mesmo marca de aliança em seu dedo. Eu sei que é besteira, mas ainda não consegui tirá-lo da cabeça. Até sonhei com ele essa noite... – eu choraminguei baixinho, escondendo o rosto em minhas mãos para poder assumir o que havia feito. – Quando tudo acabou, eu acabei pedindo para que ele voltasse...
– Meu Deus, a trepada foi séria mesmo então! – Malie apontou, boquiaberta.
– É claro que foi! Eu acabei de encontrar um cliente que sabe onde fica meu clitóris e que me pagou uma grana fudida para que eu goze com ele, o que eu mais quero é que ele volte aqui toda semana! – eu me defendi.
A intimidade entre quatro paredes, para mim, era extremamente necessária para que pudesse relaxar. Talvez fosse por algum bloqueio em relação ao assunto, principalmente se considerasse a forma como minha vida sexual havia começado e a maneira que Margareth nos doutrinava. Ou talvez o motivo para isso era que eu via aquilo tudo tão somente como trabalho, como forma de sobreviver. Não gozar e não sentir aquele prazer esperado não era algo que me causasse extremo incômodo ou falta… porém, ao mesmo tempo, eu não era de ferro e algumas vezes me via sentindo falta de sentir minhas pernas tremerem. Muita falta, diga-se de passagem.
E talvez esse fosse o motivo pelo qual a minha fama tenha sido criada ali. Meu foco era eles. No prazer, no desejo, nos fetiches. Deles.
– Ok, é mais sério do que eu imaginava. E ele, o que disse? – Marcos questionou, ainda mais boquiaberto.
– Que voltaria... – eu respondi ao meu amigo que me encarava com seriedade. – Mas não sei, pode ter sido da boca para fora.
– Allie, eu acho que você tem que esperar. Se ele disse que volta é bem possível que ele volte mesmo. Você sabe como esses homens são e considerando que ele te deu três orgasmos e ainda pegou o dobro pelo programa, quer dizer que gostou tanto quanto você. – minha amiga respondeu, com mais calma e seriedade, naquele tom de total compreensão.
– Malie tem razão, amor, vamos esperar até semana que vem e se o seu ator de cinema não aparecer eu rodo essa Nova Iorque inteira até encontrar o seu Giuliard! Não é um nome tão comum, afinal... – Marcos adicionou. – Eu posso ver nos seus olhos e no tom que usou para nos contar que você está se sentindo mal pelo que aconteceu, então vou lhe dizer: tire essa culpa das costas porque ela não tem cabimento, você mais do que ninguém nesse lugar estava precisando disso. Poxa, sexo tem que ser gostoso e nos deixar exatamente assim como você está. Não faz sentido o que Margareth fala, sempre disse isso.
– Você é demais, sabia? – eu saí de cima da esteira, o abraçando forte e descansando a cabeça em seu ombro largo.
Apesar de ter um jeito brincalhão e descontraído, Marcos conseguia ser a pessoa mais séria e sensata que conhecíamos quando preciso, ele tinha aquele poder de conseguir deixar mais leves todos os assuntos e em especial as questões que nos deixavam desconfortáveis. Não só ele como Malie também. E, além desse poder de compreensão, ele também contava com um corpo tão delicioso que eu e minha amiga sempre tentávamos tirar uma casquinha dele, como naquele momento.
– Marcos, eu acho que esse é o dia perfeito para você nos sequestrar e só nos devolver de noite, em cima do toque de recolher...
– Olhe aqui querida, nós só saímos daqui depois de você ter terminado seu treino, estamos entendidos? Estou vendo que você só está me enrolando, vamos logo começar a malhar a bunda para darmos o fora daqui o quanto antes! Você sequer se alongou ainda…
"Dar o fora daqui" era exatamente isso o que precisávamos fazer. Os finais de semana, e em especial os sábados, eram de longe os melhores dias de toda a semana, os dias em que Margareth nos liberava – até às seis e meia, é claro – de todas e quaisquer tarefas que precisávamos fazer naquele lugar. Cada uma ali dentro havia uma válvula de escape e eu tinha a impressão de que Margareth agradecia aos céus todas as noites antes de dormir por isso. O clima entre dez mulheres conseguia ficar bastante pesado quando a convivência e a competição eram frequentes, como em nosso caso, e muitas vezes apenas um ou dois dias na semana não eram o suficiente para acalmar o ânimo em casa.
"São muitos hormônios juntos" era o que Megg costumava a falar, mas sabíamos que os motivos eram caros e iam muito além das justificativas de nossa chefe.
Aquele dia na semana parecia que nunca tinha sido tão desejado como naquela ocasião e a junção de uma Nova Iorque levemente fria não conseguia ter outro fim a não ser um amontoado de cobertas no refúgio do apartamento de Marcos. "Idosas", era o que ele havia nos apelidado, mas naquela tarde foi sua vez de aproveitar do nosso colo e desabafar sobre seus casos de desamor, até que o relógio marcando cinco e meia nos fizesse seguir caminho para o lugar de onde tínhamos fugido.