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━Autora Independente do Cosmos.
Atualizada em: 24.11.2024

Taeyong.

O dia da morte de Taeyong começou tranquilo.
Os pássaros faziam aquele som sinistro de novo na janela — um guincho irritante que se tornava um gorgolejar à medida que enfiavam o bico no vidro, e então gritavam, batiam as asas desesperadamente e só iam embora quando ele esmurrava uma das palmas na superfície para afastá-los.
Já estava acontecendo há uma semana. E Taeyong não se interessava nem um pouco pelo comportamento animal aleatório.
Naquela manhã, o rapaz acordou com o grunhido tão alto que parecia estar na parte de dentro do cômodo. E estava. Desta vez, a criatura não se parecia em nada com os pássaros pequenos e coloridos que faziam o escândalo matutino.
Era um corvo. E estava parado no meio do aposento, rodeado de uma grande mancha vermelha enquanto seu bico amassava a cabeça de um pequeno camundongo.
Taeyong ergueu as costas em um impulso, prendendo a respiração ao notar o tamanho da ave. Era maior do que a impressão que tinha, quando os via empoleirados nos fios de postes, e ainda mais feios do que as fotos nos livros. Quando se mexeu, ele pôde jurar que o animal parou e ergueu a cabeça, abandonando sua comida para olhá-lo de volta.
Aquele corvo estava olhando para ele.
A cena inspirou ao mesmo tempo curiosidade e o reflexo de vômito em Taeyong. Afinal, aquele bicho voraz tinha decapitado um outro bem no meio de seu tapete.
Com cuidado, o garoto jogou as pernas para fora da cama e começou a se levantar devagar.
— Assim não dá — disse ele, sentindo que a base de sua nuca estava suada — Sei que você precisa comer, mas não aqui, ok? Você precisa parar…
Com um grasnido alto e escandaloso, que arrepiou todos os pelos de Taeyong, a ave simplesmente bateu as grandes asas e saiu pela janela. Uma janela que estava aberta. Taeyong nunca dormia com as janelas abertas.
Claro, sua mãe deve tê-la deixado ali por engano enquanto limpava ontem. Estava tão cansado quando chegou que não viu necessidade de verificar. Com um suspirou, encarou a sujeira de sangue e pêlos e revirou os olhos, saindo para buscar os produtos e limpar a porção que sua visita não havia devorado.

☽☾

A Neo Coffee&Cake estava mais cheia que o normal.
Os barulhos se misturavam entre conversas, correria, aspiradores de pó e os gritos de Jisung quando um cliente pediu uma salada de batatas para viagem. Taeyong quase esbarrou em uma garota parada no meio do estabelecimento, hipnotizada com o televisor preso na parede que passava o mais novo sucesso do maior idol em ascensão do momento, Xiaojun.
No balcão, ele encontrou Renjun limpando a superfície com os olhos cerrados, aumentando a voz antes mesmo de olhar para o novo cliente:
— Eu disse que precisa olhar a massa de duas em duas horas, Jisung! Só isso! Como pode ser tão difícil?! — bufou e, finalmente, ergueu a cabeça — Ah, e aí, Taeyong! O mesmo de sempre?
— Sempre — confirmou ele, com uma piscadinha cômica e seu usual sorriso simpático — E vocês? O mesmo de sempre?
Seu tom era divertido quando apontou levemente para os lados, mas Renjun franziu os lábios e revirou os olhos.
— Sim, os mesmos problemas, mas ele ficou mais de seis semanas, já é uma vitória. Só estou tentando fazê-lo durar por mais tempo.
— Taeyong, você chegou — Jisung se aproximou ao lado de Renjun, agora com o nariz sujo de farinha — Veio mais tarde hoje. Pediu o de sempre?
— É, recebi uma visita desagradável de manhã e tive que limpar a bagunça — respondeu ele com um levantar de ombros. Os dois garotos o olharam em dúvida — Outro dia eu conto. Fora daqui, de preferência, onde ninguém tenha que comer.
Jisung fez uma careta. Renjun batucou os dedos no balcão e puxou a nota que Taeyong passou pelo tampo.
— Aproveita que está aqui e pega o pedido dele e da . Sem derrubar, tá bom? — suspirou, guardando o dinheiro no caixa — E da próxima vez, deixa toda a sua bagunça no andar debaixo — Renjun deu um tapinha amigável no colega e passou o polegar pelo nariz sujo, retirando-se logo em seguida, despedindo-se de Taeyong até o outro lado, onde abriu seu melhor sorriso para atender a uma mesa que tomava seu café da manhã tranquilamente.
Jisung, como sempre, exibia sua melhor gentileza inatingível como resposta. Fazia pouco tempo que trabalhava no lugar, mas nenhuma bronca de Renjun parecia deixá-lo menos feliz. Isso encantava Taeyong. Com um giro, o garoto preparou delicadamente os cafés e os levantou na direção de Taeyong, com um sorriso.
— Aqui está. Coloquei um pouco mais de canela no da porque sei que ela gosta.
— Mandou bem, Jisung, tenho certeza que ela vai. Pode me dizer se Renjun te tratar muito mal, vou fazer questão de ter uma conversa com ele — disse brincalhão. Jisung apenas sacudiu a cabeça e espalmou o ar, como se fosse irrelevante.
— Não precisa se preocupar. Tenha um bom dia, hyung!
— Até mais! — e com um leve aceno, Taeyong deixou a cafeteria.

☽☾

Taeyong já digitava no celular para anunciar sua chegada enquanto dobrava a esquina da casa de .
A garota morava em uma grande área residencial perto da NCIT, com uma distribuição de moradias em formato totalmente ocidental, consistindo de várias casas coladas umas nas outras e quase totalmente iguais. Havia verde de sobra nas calçadas e quintais grandes e pequenos, com carros do ano e motocicletas em construção. O único prédio que se destacava por ser diferente dos demais domicílios era um edifício em cinza, com vários apartamentos para estudantes, onde Hendery, um de seus amigos e colegas de time morava.
Era muito cedo para tocar a campainha e Taeyong não queria apelar para a bondade do pai da namorada. No entanto, em um instante, a cabeça dela já apontava da janela no segundo andar, com o rosto ainda um pouco amassado, demonstrando seu desejo por voltar a dormir. Com um beijo no ar, ela voltou rapidamente para dentro e ele se apoiou no muro enquanto avistava outra pessoa arrastando os pés pelo asfalto na mesma direção.
— Bom dia — Yangyang disse com a voz estrangulada, coçando os olhos e bagunçando ainda mais os cabelos à medida que se aproximava.
Taeyong piscou os olhos e sufocou uma risada, vendo que a camisa do garoto estava vestida ao contrário e um pouco de batom manchava sua bochecha esquerda. Os ombros caídos não se endireitavam de jeito nenhum.
— Noite agitada? — perguntou com ironia, mesmo que a resposta fosse clara.
Yangyang cerrou os olhos pela zombaria.
— Ei, essa é a vida de quem não tem uma namorada, tá legal? Você não precisa se preocupar — o garoto expulsou um suspiro forte, e Taeyong sentiu o cheiro intenso de álcool entrando por suas narinas abaixo.
Antes que ele respondesse com alguma frase engraçada e motivadora, a porta ao lado da casa de se abriu, revelando Kun e seus óculos tortos, com o cabelo tão ou mais bagunçado que Yangyang, mas este com estresse legível.
— Yang, seu desgraçado! — gritou, descendo as pequenas escadas em direção à calçada.
— Fodeu — Yangyang murmurou, quase choramingou, ao ver o primo se aproximar com o maxilar trincado de raiva. Taeyong engoliu em seco, preparando-se para mais uma cena típica entre os dois.
— Onde você se meteu ontem à noite? Tem ideia das desculpas que tive de dar aos seus pais quando quiseram saber se você tinha jantado? Tive que falar que você estava estudando no quarto, e fala sério, eles não são tão burros assim, as chances disso acontecer são sempre pequenas e improváveis, como… Ah, oi, Taeyong! — ele limpou a garganta quando notou o rapaz no muro, claramente envergonhado, ajeitando os óculos no nariz. tinha dito uma vez que não sabia descrever Kun como extremamente fofo ou terrivelmente feio quando fazia aquela expressão.
Taeyong podia jurar que ele podia ser as duas coisas.
— Bom dia, Kun. Noite agitada? — perguntou com a mesma zombaria de antes, e Yangyang sufocou uma risada.
— Quando não tenho uma quando o assunto é esse aqui? — Ele trincou os dentes, encarando o primo por detrás dele, ainda com o sorriso amarelo e a mancha vermelha espalhada no rosto.
— Qual é, Kun, você sabe que o torneio está chegando e esse é o momento ideal em que as garotas decidem chamar outras garotas de fora para o campus, não sabe? Tem as festas das outras fraternidades, a integração com os outros cursos, é o maior esquenta da temporada. Fala pra ele, Taeyong, você é o capitão, sabe do que estou falando.
— Não sei se me convém contar esse tipo de coisa — ele deu de ombros, inclinando a cabeça levemente para a porta da casa de . Kun apenas revirou os olhos e ergueu um dedo antes que o primo recomeçasse a falar.
— Eu não ligo para o motivo que te fez chegar em casa a essa hora fedendo a soju, mas seus pais te deixaram sob minha responsabilidade quando passou na NCIT e só estou tentando cumprir isso. Agora você vai entrar e ficar apresentável para chegar a tempo ainda para a primeira aula.
— Quê?! Qual é, hyung, a minha cabeça…
— Não quero saber. Espero que os cálculos do professor Min te sirvam como lição para aprender a ser mais responsável — Kun agarrou a curva do cotovelo de Yang, que resmungava reclamações, e se virou para Taeyong — Desculpe por isso, Taeyong. Espero que tenha um ótimo início de temporada.
— Pode deixar — o capitão assentiu, agora vendo Kun carregar Yangyang em direção à sua porta, vendo o outro sussurrar para ele um “me salva” enquanto era arrastado agora pelos ombros.
Antes de entrarem, saiu pela sua porta, linda e adorável nos seus jeans e tênis, com a lateral do cabelo presa com uma fita. Ela lembrava a Taeyong todas as características que cultivou na garota dos sonhos. Ela parou por um instante na soleira, vendo a mini discussão que acontecia entre seus vizinhos, mais uma dentre tantas, e sempre pelos mesmos motivos.
— Bom dia, — cumprimentou Kun, com um sorriso constrangido. Enquanto Yangyang dizia “, me ajuda, por favor, ele quer que eu estude”.
Com a frase inacabada, a porta bateu com um pouco de força quando os dois finalmente entraram na casa. Os gritos lá dentro agora era um conjunto desconexo de palavras, como frequentemente acontecia.
riu sozinha ao andar na direção de Taeyong.
— Mais uma terça-feira, não é? — ele riu, estendendo o café em sua direção e lhe dando um leve beijo nos lábios.
— Esses dois só fingem que não se suportam. Mais tarde vão estar rindo e almoçando juntos.
— Mas fiquei sabendo que o Kun o ameaçou com uma pinça. — Taeyong comentou em um falso tom alarmante. gargalhou alto.
— Acho que foi no dia que ele descobriu que o Yangyang tinha experimentado um baseado no telhado, ou foi o que deu para entender daquela gritaria toda — ela encarou a avenida à frente com uma expressão reflexiva — Mas confesso que o Kun consegue ser mais rígido que um pai. Ou pior do que aqueles palestrantes que dizem “ei, cara, fique longe das drogas”. — estalou a língua, e Taeyong passou um dos braços por seus ombros quando entraram no cruzamento. — Então, tem treino hoje?
Ele assentiu enquanto bebia um gole do café.
— Tenho um agora logo cedo. O campeonato está chegando e toda a insanidade também. Você bem sabe.
— Sei. Mas sei também que vocês vão conseguir. Estão trabalhando muito duro nisso.
— Não importa, você já disse que vai dar certo, então vou acreditar e faltar ao treino hoje… — ele sorriu e recebeu um singelo tapa nos ombros — Vamos, estamos atrasados.

☽☾

O ônibus também estava lotado àquelas primeiras horas da manhã.
Não era nada incomum para o começo da semana. O coletivo abarcava pessoas indo para os mais variados destinos, a maioria em silêncio e outras que achavam prudente gritarem um “cala a boca” ao telefone com raiva antes de meio-dia. Taeyong e se seguraram como sempre em qualquer apoio, até que a garota achasse um assento vazio enquanto o namorado se posicionava à sua frente. Depois de dois pontos, um outro garoto se esgueirava no meio da multidão achatada, resmungando desculpas aqui e ali até conseguir se segurar no apoiador do teto e parar ao lado de um conhecido.
— Oh, hyung. E — o garoto sorriu para os dois, que cumprimentaram-no de volta com simpatia.
— Olha só, nosso calouro Nana. Achei que iria mais tarde hoje. — Taeyong parecia feliz em vê-lo. Era fácil se lembrar do nome de Na Jaemin quando sua nota estampava o primeiro lugar dos novos ingressantes do curso de Matemática da NCIT e sua aparência não demonstrava 1% desse fato. Ele era como aqueles caras que dormiam até tarde, jogavam boa parte do tempo e, ainda assim, tinham as notas mais altas de uma maneira apelativa. Taeyong não dizia, mas também estava incluso nessa lista.
O calouro suspirou, um pouco tristonho.
— Era o plano, mas infelizmente vou precisar chegar mais cedo para participar de um grupo de estudos para a próxima prova da professora Young. O resto da turma está morrendo de medo, chamam ela de pássaro da morte.
Taeyong riu alto, balançando a cabeça.
— Pássaro da morte é nova. Há três anos, a chamavam de Motosserra, mas os dois fazem muito sentido — comentou, segurando-se mais firme nas barras quando o ônibus fez uma curva — Infelizmente, não tenho nenhuma mensagem motivadora para dar que não vai fazer você querer se retirar aos prantos da sala, mas acredito que, às vezes, a professora Young só precisa de um sorriso animado pela manhã, vai por mim.
Jaemin franziu o cenho, como se o veterano tivesse falado em outra língua.
— Você ficou em primeiro lugar na turma porque sorriu para ela às 7 da manhã?
— Ei, não duvide do sorriso desse cara — disse com uma risada. Taeyong deu de ombros, enquanto Jaemin ainda continuava estupefato.
— Escuta a minha garota, ela é mais inteligente do que nós dois juntos.
— Para com isso… — colocou as duas mãos nas bochechas, certamente corada. E por vários minutos, Jaemin observou o casal trocar sussurros e declarações fofas em pleno ônibus lotado, parecendo tão alegres como se existissem apenas os dois.
Quando Taeyong estava com , deixava bem explícito o quanto ele não era o Lee Taeyong, capitão do Seul Lynx de baseball, ou um dos melhores alunos de NCIT. Não era nada parecido com a postura respeitosa que mostrava naturalmente a quem convivia. Ele era só mais um tolo apaixonado, com o mesmo comportamento que mostrava desde que havia encontrado a garota pela primeira vez.
Felizmente, Jaemin não precisou presenciar a cena por muito tempo, já que o ponto finalmente chegou e ele pôde se despedir do casal educadamente e colocar seus fones de ouvido enquanto saía e atravessava o campus ao som de gaitas de fole irlandesas.

☽☾

Quando a deixou na frente da sala, deu um jeito de fazê-lo ficar um pouco mais. Com as mãos ainda juntas, ele caminhou para dentro do auditório oval, sentando-se em cima da mesa bem em frente ao lugar da garota enquanto os outros alunos ainda chegavam. E ficar juntos daquela maneira também significava carinhos e trocas de flertes que já eram mais do que comuns. Os alunos de Álgebra II não conseguiam se lembrar da última vez que não viram o cenário apaixonado que englobava Kwan e Lee Taeyong.
Enquanto as conversas ao redor se dividiam entre o temor da próxima prova e a nova música de sucesso de Xiaojun, um outro aluno surgiu pela mesma entrada, e fez uma careta ao se aproximar da mesa já ocupada.
— Fala sério, vão pra um quarto — resmungou Jaehyun, acomodando-se na cadeira ao lado de . O casal encarou o rapaz com uma risada divertida, e Taeyong olhou para o relógio oval na parede, levantando-se rapidamente.
— Preciso ir. Os meninos já estão me esperando — informou e, em um gesto rápido que sempre acontecia de uma hora para outra, beijou a garota nos lábios. Jaehyun assumiu uma fisionomia de asco — E então, Jeong, conseguiu entender a matéria que te mostrei naquele dia?
— Claro que sim, não sou tão imbecil — respondeu com um tom óbvio, mas carismático. Não dava para simplesmente ser grosso com Taeyong, ele era totalmente imune à mau-humor — Somos da mesma turma, mas você parece estar há anos-luz de todos nós. Vou continuar usando isso a meu favor.
— Para de puxar meu saco na frente da minha namorada, ela não precisa disso — o capitão riu, bagunçando um pouco do cabelo de Jaehyun, que estalou a língua enquanto o afastava — Vai dar tudo certo, Jae, as férias estão chegando. Mas, mais do que isso, sei que vou ganhar três rodadas de cerveja grátis no fim do campeonato. Vou nessa! Cuide de para mim.
Ele estalou um beijo na testa da garota e saiu a passos largos do recinto, desaparecendo em um piscar de olhos.
Jaehyun encarou as costas do amigo com uma risada seca. Taeyong era um cara diferente e, às vezes, era difícil saber o que pensar dele, mesmo que estudassem juntos desde o primeiro ano. Ele parecia ser uma espécie contrária do dito cujo cara popular, e uma espécie muito viva. Lee Taeyong era o cara mais vivo com quem Jaehyun já havia cruzado.
— Ele tem esse excesso de humildade com você também? — ele lançou a pergunta enquanto puxava seu caderno da mochila. puxava um computador.
— Pior que sim. Não adianta o quanto diga que ele é incrível, ele vai dar um jeito de discordar.
— Isso é irritante. Já não basta ser o capitão do time de baseball e ser o melhor do nosso curso, ainda preciso escutar que ele não liga pra nada disso? — Jaehyun revirou os olhos, ainda em choque com a constatação. Aquele garoto era estranho, muito estranho.
— É tão fácil assim ser o melhor na Matemática? — ergueu uma sobrancelha, abrindo a bolsa e pegando um pacote de peppero e oferecendo ao rapaz.
— Vai começar a zombar de novo de nós, garota do TI? — ele ironiza, aceitando um canudo — Não somos tão frágeis ou estúpidos quanto vocês pensam.
Ela balançou os ombros, mordendo um pedaço de seu lanche.
— Me mostre suas habilidades agora então, Jeong — a porta no fim das escadas se abriu, e finalmente o imponente professor de Álgebra II entrou, trazendo sua carranca e sua postura de sempre que não aceitava meios-termos. Jaehyun o conhecia bem, já que era sua segunda vez fazendo a disciplina, o que o obrigou a se misturar com o resto dos alunos de TI e com a colega Kwan , que podia ser tão inteligente quanto seu namorado.
Ele apenas soltou uma risadinha e se recostou no banco acolchoado, vendo a aula finalmente começar.

☽☾

Após um tempo, caminhava animadamente em direção ao vestiário masculino dos Seul Lynx.
O ambiente era sempre caótico. No fim do treino, o cheiro de suor e sabonete estava impregnado nas paredes e, pelas suas contas, ainda não estava na hora de visualizar a nudez masculina zanzando pelo espaço. Com passos leves, ela entrou devagar pela porta, ouvindo as vozes altas como sempre. Uma delas era óbvia, bem mais exaltada do que as outras, enquanto perguntava:
— Você entendeu o que eu quis dizer, Taeyong? Sobre o ataque. Você está arremessando a bola contra o vento das 10, isso diminui sua velocidade em 0,35 segundos e torna ainda mais fácil do time adversário rebater. Não viu como Sungchan nem piscou? Se isso acontecer no campeonato, adeus à nossa entrada no mundial, entendeu?
Doyoung gesticulava enquanto ainda estava ofegante. Taeyong apenas mantinha os olhos fixos e cerrados no vice-capitão, que sempre tinha várias reclamações sobre o time, a dinâmica, o jogo e, é claro, a gestão do líder. Não era por mal, ele realmente tinha olhos mais afiados e uma postura avantajada de autoridade, fora que carregava o título de Ás, mas não era à toa que não vestia a camisa 10.
Sungchan levantou um pouco a cabeça ao ouvir seu nome. Seus olhos se arregalaram em direção à Taeyong com certo desespero, como se estivesse perguntando “então é por isso que consegui rebater a sua bola? Porque você deixou?”.
Taeyong balançou a cabeça em negação, lançando um sorriso simpático para o garoto enquanto Doyoung ainda reclamava, com os músculos rígidos.
— Tudo bem, tudo bem, Kim, e o que você acha de almoçarmos primeiro, hein? — Taeyong interrompeu a enxurrada de palavras de seu vice, dando um tapinha em seus ombros tensionados, abafando um pouco o clima em todo o vestiário. Os demais membros do time já estavam nervosos o suficiente com o início dos jogos; ainda mais Sungchan, o calouro que entraria em campo pela primeira vez.
Doyoung engoliu em seco, assentindo devagar.
— Só estou tentando ser responsável, apontando os erros de…
— Pois que tal apontar os erros depois de uma refeição, Kim Doyoung? — A voz de encheu o ambiente com felicidade, e vários dos olhares presentes se viraram para ela.
— Ora, ora, o que a minha vizinha favorita está fazendo aqui? — Hendery estreitou os olhos enquanto abria seu armário a fim de puxar algumas roupas mais leves que não deixassem suas costas tão inclinadas como se subitamente estivessem carregando peso.
— Essa é uma pergunta muito óbvia — Mark ergueu uma sobrancelha, despejando uma garrafa quase inteira de água goela abaixo.
— Exato. Vim buscar o meu namorado para o almoço, vocês estão esperando uma visita parecida? — ela ironizou, recebendo uma vaia de descontentamento de volta. Taeyong soltou uma risada, aproximando-se dela e despejando um beijo em sua bochecha.
— Você sabe tocar na ferida, Kwan. Cadê as amigas que disse que iria nos apresentar? — Jeno apontou dele para Mark, que também a encarou em espera.
— Acontece que elas não curtem caras mais novos. Mesmo que sejam do time de baseball e tenham uma nota razoavelmente boa.
— Então você está precisando de amigas novas — Hendery levantou os ombros, se retirando para outra porta que levava aos compartimentos dos chuveiros.
considerou a questão enquanto Doyoung soltava um longo suspiro, se aproximando também, incapaz de segurar sua frustração.
— Com amigas ou não, pode dizer ao seu namorado pra colocar um pouco mais de força no braço? Ainda acho que ele está com pena dos novatos, mesmo que não precise… Ei! — o vice grunhiu ao ter o boné arrancado e jogado em seguida em seu peito por Taeyong, que o encarou com a testa franzida pela inconveniência.
— Não acho que você esteja sendo um bom conselheiro agora. Vamos todos almoçar e aí conversamos — ele disse em um tom terno, mas que carregava um alerta. Doyoung revirou os olhos e andou na mesma direção de Hendery, direto para um banho bem gelado.
— Uau. Ele está uma pilha de nervos — comentou em voz baixa, enquanto os outros garotos se concentravam em juntar suas coisas.
— Não creio que seja só por causa dos jogos, mas quem vai entender Kim Doyoung? — O rapaz deu de ombros, suspirando mais uma vez — Espera um pouco até eu me trocar.
assentiu e viu o namorado dar as costas até o canto do lugar, onde Sungchan estava sentado nos bancos largos com os cotovelos apoiados nos joelhos e Shotaro tinha a cabeça baixa, recostado em um dos armários.
— Ei. Não liguem para o que o Doyoung diz, ele só estava falando merda — Taeyong chamou a atenção dos dois garotos, que ergueram as costas de imediato com a proximidade — Ele está preocupado porque não vencemos ano passado e parece ter sempre um mal pressentimento a cada pré campeonato, mas nada vai acontecer, tudo bem? Esse ano temos vocês dois e isso me deixa ainda mais confiante.
Shotaro respirou em um alívio explícito. Seu sorriso era de sincera gratidão ao capitão. Sungchan piscou os olhos para o rapaz, sem palavras legais para dizer, mas demonstrando sua consideração ao assunto com a admiração plena que tinha por Lee Taeyong, desde muito antes de finalmente ingressar no Seul Lynx.
— Acha isso mesmo? — ele perguntou em um fio de voz. Taeyong deu seu melhor sorriso sincero e afagou um de seus ombros.
— Não. Eu tenho certeza.
E com uma piscadinha, puxou uma toalha estendida para fora de seu armário e seguiu para o chuveiro.
— Não acho que ele esteja tentando te conquistar ainda mais, mas bem que ia funcionar, não é, Kwan? — Mark disse brincalhão, observando a garota que seguia as costas do namorado até que sumisse pelo banheiro.
revirou os olhos, mas sorriu, pega em flagrante.
— Ele não precisa de muito para isso, você sabe — os ombros se levantaram.
— Claro, acha que eu não lembro como foi quando você o viu pela primeira vez? Um saco, meus ouvidos não aguentavam mais tanta bajulação.
— Ei, eu não estava bajulando ninguém, eu só disse que ele era bonito.
— Bonito, inteligente, totalmente magnético e até criou uma playlist romântica que ouvia sem pausas naquele aparelho de som, foi isso que aconteceu.
— Minha nossa, como você é brega — Jeno respondeu antes da garota, que sentiu a bochecha esquentar com a exposição.
— Mark Lee, as pessoas não precisam saber das coisas vergonhosas que já te contei — ela disse entre os dentes, sua voz soando fria e desconcertada.
— Eu também passei situações vergonhosas o bastante pra juntar vocês dois, mereço o desconto de pelo menos desabafar.
— Ah, seu…
— Kwan , tô impressionado. Achei que você só se preocupasse com códigos e trabalho. Não sabia que ficou obcecada e deixou Taeyong bagunçar com sua cabeça desse jeito logo de primeira — Jeno soltou uma risada alta, contagiando Mark logo ao lado.
— Ela me enchia o saco, falo sério, me causou muitos problemas na época. Mas ele não era muito melhor, então fiz o possível pra sair do meio desse fogo cruzado o quanto antes.
— Ainda bem que você saiu da frente bem rápido, Lee — Taeyong surgiu logo em seguida, com os cabelos molhados e usando suas habituais roupas civis: jeans rasgados e moletons canguru — Se não, demoraria ainda mais para que eu estivesse com e eu te denunciaria como o pior tipo de cupido que já existiu.
— Vai começar a melação. Bom almoço pra vocês — Jeno se despediu com uma continência e seguiu para o banheiro, apoiando a toalha na base da nuca.
Mark respirou fundo e se levantou.
— Eu também vou nessa. Ninguém vai costurar um castiçal na minha mão desse jeito.
— Ei, você costumava aguentar…
— Tempos passados! Amigos idiotas fariam isso, mas hoje sou um novo homem. Adeus! — Mark andou de costas até virar na mesma direção de Jeno. Taeyong riu, virando-se para .
— Eu juro que ele costumava aguentar.
— Não vou aguentar a minha fome daqui a pouco, Lee Taeyong. Vamos logo — disse ela, oferecendo sua mão, que foi agarrada por ele em um instante.
— Ok, ok, vamos te alimentar — com um sorriso, os dois seguiram em direção à saída.

☽☾

O caminho para o refeitório era tomado de muito verde e faixas de pedras. Normalmente, vários pássaros aproveitavam a luz do sol à pino nos galhos mais altos das árvores, cantando alegres como em seu próprio mundo. Naquele dia não havia nenhum.
Havia apenas um corvo empoleirado no alto, olhando para o garoto sorridente passando logo abaixo, paralisado em seu lugar.
No trajeto, Taeyong acenou para algumas pessoas, e contou suas preocupações sobre as broncas de Doyoung com os novatos, e em como aquilo o fazia pensar em coisas que não queria pensar. Era confortável dizer coisas daquele tipo para , porque com ela não existia a implicação de parecer tão forte. A vulnerabilidade não era mais um tipo de problema.
Alguns metros à frente, o barulho ao redor começava a mudar à medida que se chegava à área das quadras conjugadas, onde o som dos tênis deslizando pela superfície sintética se misturava com o impacto das pequenas bolas nas raquetes.
Naquela situação específica, as bolas eram arremessadas de uma grande máquina, a Wiseball Tênis, onde Yuta se desdobrava para acertá-las em tempo hábil, totalmente concentrado em pontuar e treinar seus reflexos e entre outras habilidades, ainda que estivesse sozinho. Aliás, era o único horário onde podia treinar um pouco mais e arrumar alguma vantagem sobre os estrangeiros que enfrentaria dali há pouco menos de um mês.
Quando acertou uma delas com tanta força em direção à grade que o separava do pátio externo, ele ouviu um assovio estupefato, e virou-se para trás, encontrando o casal agora diminuindo os passos.
— Uau, vai com calma, Nakamoto! Assim vai atravessar seu adversário.
Yuta incorporou um sorriso sincero no rosto, pondo uma das mãos na cintura enquanto se deixava relaxar.
— Como vai, capitão? Ansioso para os jogos?
Taeyong freou os passos, coçando o queixo.
— Não, mas vou começar a ficar — disse pesaroso — Espero que você também tenha um ótimo início de temporada.
— Vou ter. Como vai, ?
A garota levou um tempo para perceber que ele falava com ela. arregalou um pouco os olhos, sorrindo nervosamente, acenando de forma débil e envergonhada. Yuta franziu o cenho com o comportamento, pensando imediatamente que ela devia estar reparando em sua pele mal barbeada e seu jeito irritadiço de alguns segundos atrás.
— Bem, estou bem! — ela respondeu, um pouco distraída — Você vai conseguir, Yuta!
Ela sorriu com as palavras. Ele retribuiu, sentindo-se mais aliviado com o apoio, como se repensasse sobre a necessidade de atacar aquelas bolas daquele jeito.
— Se aqueles idiotas não te aceitarem, vou movimentar um protesto inteiro. Até mais! — Taeyong gritou perto da grade, acenando logo em seguida, fazendo Yuta rir antes que voltasse a seguir o caminho.
— Ele ainda está crescendo nas pesquisas, não é? — perguntou quando se afastaram o suficiente — Digo, das olimpíadas.
— Sim, o cara ainda vai ser gigante. Ele continua sendo seu atleta favorito? — Ele levantou uma sobrancelha, com um sorriso sugestivo.
— Não, esse é você. Mas no tênis? Ah, sim!
— Então relaxa, ele vai se dar bem. É a maior aposta da universidade de Seul, mas acho que consegue lidar com essa pressão.
— Acho incrível como ele controla aquela coisa. Tão feroz e rápido.
— Ainda tem curiosidade sobre aprender tênis? Posso pedir pra ele te ensinar quando a temporada terminar.
virou a cabeça para Taeyong, com a fisionomia um tanto chocada e apreensiva.
— Mesmo? Quer dizer… Ele é muito ocupado.
— Ele não vai estar nessa por muito tempo, o treinamento pesado das olimpíadas é só daqui há três meses. Desde que o conheci naquele campeonato do primeiro ano eu sabia que ele era um cara legal. Aposto que vai adorar te mostrar como as coisas funcionam — Taeyong deu de ombros, confiante — Posso tentar também.
estreitou os olhos.
— Aí vai ser apelação, mas vou aceitar, senhor Lee.
— Mas um dia, você e o baseball…
— Vamos comer agora, vamos — a garota o interrompeu, puxando-o com mais rapidez para a fachada do prédio do refeitório, ouvindo o namorado soltar uma gargalhada pela brincadeira.

☽☾

O movimento no refeitório estava como de costume quando Taeyong e chegaram. As mesas do local pareciam lotadas ao se dividirem entre os diferentes grupos de universitários. começara a se sentir meio perdida até enxergar um de seus amigos caminhando com uma bandeja até uma das mesas.
Pegou Taeyong pelo pulso, puxando-o consigo até a mesa onde vira Lucas sentar.
— Obrigada por ser tão alto — comentou com um sorriso ao se aproximar, fazendo com que o rapaz se virasse em sua direção. — Estava doida procurando por um ponto de referência.
Lucas abriu um sorriso antes de responder:
— É para isso que servem os amigos — se sentou de frente ao amigo, e Taeyong a acompanhou sentando-se ao lado dela. — ‘Tava no treino, Tae?
— Está tão visível assim a minha cara de cansaço? — respondeu enquanto mexia a cabeça, assentindo.
— Um pouco.
— Qual o cardápio de hoje? — interrompeu a conversa dos rapazes enquanto cruzava os dedos das mãos sob seu queixo, apoiando a cabeça em seguida.
Lucas observou o próprio almoço, se esforçando para lembrar de tudo que estava disponível na hora de servir. Esticou a cabeça na direção da enorme fila que se formava do lado balcão, tentando, inútilmente, enxergar alguma coisa.
— Além do que eu servi, só me lembro de macarrão de arroz com pasta de soja.
bateu palmas, animando-se com o cardápio. Sem dizer mais nada, levantou-se e olhou para Taeyong, que permanecia parado.
— Não vai almoçar?
— Não agora, eu ‘tô meio enjoado do treino — ele sorriu para a namorada, apoiando o rosto em sua mão direita. — Vai lá aproveitar o macarrão de arroz.
A garota pressionou os lábios, logo assentindo com a cabeça e seguindo seu rumo até a fila. Taeyong e Lucas a observaram caminhando até próximo do balcão.
— Tae, posso te perguntar uma coisa? — Lucas perguntou baixo, chamando a atenção do mais velho.
— Claro — respondeu enquanto se virava para encarar o rapaz.
Taeyong cruzou os dedos sobre a mesa, e Lucas observou aquele movimento com cuidado.
— Como você reagiria caso a te traísse?
A pergunta foi certeira. As expressões de Taeyong foram rápidas e precisas; inicialmente, seu rosto demonstrou uma surpresa, depois, suas sobrancelhas se mexeram e ele acabou piscando algumas boas vezes, processando a pergunta.
Lucas soltou uma risada.
— Não precisa responder — se apressou em dizer, deixando o mais velho ainda mais perdido. — Eu só queria testar com alguém o que aprendi hoje.
A expressão de Taeyong se aliviou imediatamente, e ele até mesmo soltou um suspiro. Seus olhos se fecharam e sua postura relaxou por um tempo.
— Desculpa, hyung — Lucas se pronunciou depois de reparar nos movimentos de alívio do mais velho. — Eu não quero colocar nenhuma pulga atrás da sua orelha, foi realmente apenas por conta da aula e…
— Fica tranquilo, eu confio na — Tae deu um meio sorriso. — Mas não deixa de ser desconfortável ouvir uma pergunta desse tipo.
Os ombros de Lucas se encolheram.
— O que está acontecendo aqui?
Ambos os rapazes levantaram o olhar para a garota que havia acabado de se aproximar da mesa com seu almoço.
descansou sua bandeja com cuidado sobre a mesa, empenhando-se para não derramar nem mesmo um pedacinho da pasta de soja de seu macarrão, que quase transbordava.
Assim que ela ameaçou se sentar, seus ouvidos escutaram um nome muito bem conhecido por si em outra mesa e, automaticamente, seus olhos buscaram a primeira televisão pendurada nas paredes do refeitório que pudesse encontrar.
— O Lucas estava me usando de cobaia e–
— Meu Deus, o Xiaojun — interrompeu ao namorado, deixando de se importar com tudo que estava acontecendo ao redor ao ver o idol na pequena televisão. — Meu Deus, que homem lindo.
Os olhos de Taeyong se reviraram e sua postura murchou. Lucas percebeu e apenas segurou a risada, logo se virando para assistir a televisão junto da amiga.
— Nosso repórter Moon Taeil esteve na coletiva de imprensa na qual Xiao Dejun, mais conhecido como Xiaojun, está falando de seu mais novo sucesso: Miracle!
— Miracle é minha primeira música completamente em inglês
— Xiaojun explicava no microfone enquanto imagens e vídeos seus na coletiva passavam na televisão. — É uma música estilo R&B pop medium e eu, particularmente, gosto muito dela também.
— Essa música é ótima — Lucas comentou ainda prestando atenção na entrevista.
nem ao menos se deu ao trabalho de concordar, já que estava estampado na cara dela o quanto era viciada naquela música.
— Quais são seus planos com seu comeback?
Assim que a voz soou na entrevista, Taeyong virou seu rosto na direção da televisão, visualizando ligeiramente o perfil de seu velho conhecido.
— Por Deus, quem deixou com que Moon usasse esse sobretudo horroroso ? — comentou baixo, indignado por vê-lo vestindo um sobretudo marrom felpudo.
— Miracle foi apenas um single, mas eu estarei voltando com um mini álbum assim que minhas férias terminarem. — Xiaojun respondeu com um sorriso relaxado.
— E você já sabe seu destino para essas férias? — Taeil perguntou mais uma vez.
— Sim, mas será segredo por enquanto — ele riu. — Quero ir para um lugar que me deixe inspirado, estou com vontade de escrever músicas novas para meu próximo álbum.
Os ombros de subiram em animação, criando uma expectativa alta de como seriam as novas músicas que Xiaojun lançaria. Ela ansiava por músicas calmas e apaixonantes, mas sabia que ficaria extasiada com qualquer farofa que o rapaz lançasse.
Taeyong, percebendo a excitação da namorada, soltou um riso meigo. Ele adorava a forma como Kwan se animava por coisas aleatórias, era agradável ao seu coração.
Ele era, realmente, muito apaixonado por aquela garota.
— Bem, obrigado pela companhia no almoço de hoje, gente, mas eu já vou indo — Lucas se levantou, pegando a bandeja com uma das mãos. — Preciso correr ‘pro estágio.
— Meu Deus, o estágio — finalmente tirou a atenção da televisão. — Eu preciso passar lá o mais rápido possível.
Na mesma hora, a garota começou a se levantar apressada. Pegou a bandeja e olhou rapidamente para Taeyong, que permanecia em sua calmaria de sempre.
— Eu vou com você — ele respondeu enquanto a olhava. Lucas já havia saído com suas coisas.
— Beleza, mas a gente precisa ir rápido.

☽☾

— Eu ainda não entendi porque toda essa pressa — Taeyong comentou assim que adentrou ao prédio da NCDC, trabalho de .
— Hoje é meu dia de folga, mas eu esqueci meu pendrive com um dos meus trabalhos da faculdade — a garota o olhou rapidamente, ainda com o passo apressado até chegar no elevador e chamá-lo.
Taeyong assentiu, sem mais comentários.
Assim que escutou o apito, indicando que o elevador havia chegado no andar, ela se virou ao namorado.
— Pode me esperar aqui se quiser.
— Eu não — o rapaz respondeu, já entrando no elevador junto da namorada. — Me pergunto qual será o comentário que seu chefe fará assim que me ver.
A garota deu um sorriso amarelado, prevendo um clima levemente desconfortável em sua sala caso seu chefe resolvesse aparecer naqueles dois minutos em que estivesse ali.
Assim que o elevador parou mais uma vez e as portas se abriram no segundo andar, saiu com pressa, andando aceleradamente pelo pequeno corredor e entrando na primeira porta à direita.
Era sua sala.
Seu plano inicial era de entrar em sua sala, tirar o pendrive do USB de seu computador, e sair o mais rápido que pudesse, sem se esbarrar com ninguém.
Ela conseguiria se não fosse por Taeyong e Chenle terem se esbarrado naquele corredor nos únicos 10 segundos nos quais virou as costas.
— A real é que ele só pega leve com a Kwan mesmo — a garota conseguiu escutar enquanto se aproximava, fechando a porta de sua sala atrás de si.
— Por que você já está falando de mim, Lele? — ela riu quando o garoto se assustou com sua presença.
— Você não sabe o que o nosso querido chefinho disse para mim hoje quando fui entregar o nosso documento à ele — Chenle entortou a boca à medida que sua voz ia soando mais irônica.
— O que aconteceu?
— Ele endoidou de vez, Day! — as mãos do garoto se dirigiram até sua cabeça. — Primeiro, ele disse que estava péssimo e começou a detonar o meu trabalho como sempre. Depois, ele começou a ler as partes que ele achou que estavam incoerentes ou sei lá o que.
Taeyong e se olharam ao perceberem o quanto Chenle estava irritado com a situação. Seus olhares cúmplices deram uma imensa vontade de rir na garota, que encurvou o corpo para mascarar sua risada.
Chenle não pareceu perceber.
— Quando ele começou a reclamar da tabela, eu avisei que iria corrigir os erros e falar contigo, já que foi você quem fez aquela parte — ele continuava a reclamar, agora ajeitando os óculos com raiva. — Foi só eu citar o seu nome que o tom de voz dele mudou, cara.
A expressão de indignação do garoto era tão nítida, que fez não aguentar mais e rir alto. Chenle ajeitou a postura, dirigindo seu olhar para a amiga.
— Você ri porque você é queridinha, né, mas eu juro que não ‘tô ficando louco.
e Taeyong riam de toda a linguagem corporal de Chenle, que gesticulava exageradamente.
Enquanto Lele tentava demonstrar as caras e bocas que seu chefe havia feito algumas poucas horas antes de chegar na empresa, a garota enrijeceu a postura.
— E daí ele ainda me lançou um: “Ah, mas certeza que a Kwan deve ter errado por falta de atenção, pois ela deveria estar pensando em algum trabalho da faculdade” — afetou a voz enquanto seus olhos se reviraram a cada palavra.
deu um chute de leve no amigo e, assim que ele a olhou confuso, ela apenas arregalou os olhos e abriu um sorriso.
— Boa tarde, Jungwoo.
Taeyong jurou que Chenle ficou verde.
— Olha só quem está por aqui — Jungwoo sorriu na direção da garota, olhando rapidamente de soslaio para Lee. — E veja quem veio junto como um carrapato.
— Eu esqueci meu pendrive no meu computador e tenho um trabalho de Analítica para entregar essa semana — se apressou em justificar sua presença, antes que Taeyong respondesse ao seu chefe e ambos começassem a discutir. — Tae estava comigo, mas já estamos de saída.
Jungwoo olhou para a garota mais uma vez, dando um sorriso terno antes de concordar com a cabeça:
— Não se esqueça da nossa reunião amanhã.
As sobrancelhas de Chenle se curvaram em confusão. Ele não se lembrava de nenhuma reunião marcada para o dia seguinte.
No entanto, assim que ele abriu a boca para perguntar, Jungwoo o cortou.
— A sua reunião foi hoje, Zhong.
O garoto fechou a boca com um bico, assentindo e abaixando a cabeça sem jeito.
Taeyong pensou em dizer algo, visto que achava Chenle um dos amigos mais divertidos de , mas optou por não se meter. Ele podia, sem intenção, causar ainda mais dor de cabeça no coitado.
— Ok chefinho, até amanhã — a garota continuou com o sorriso meigo no rosto, rapidamente pegando na mão de Taeyong e cruzando seus dedos. — Tchau, Lele.
Chenle se limitou a apenas levantar a cabeça e dar um tchauzinho rápido com uma das mãos, aproveitando para se enfiar em sua sala o quanto antes.

☽☾

— Hey, Haechan!
O garoto tirou os fones de ouvido, virando-se na direção da porta e encontrando uma sorridente na porta.
— Day! — ele andou até onde a garota estava parada, abraçando-a. — Há quanto tempo.
— A faculdade me consumiu tanto que não pude nem mesmo vir ver os vinis novos.
— Eai, Tae!
— Eai cara — ambos se cumprimentaram com um toque de mãos. — insistiu muito para que passássemos aqui.
— ‘Tá é certa — Haechan soltou uma risada alta, virando-se suavemente na direção da garota, que já passeava os dedos pelas capas de vinis. — Chegou uma coleção nova.
— Agora eu posso entender porque de toda a pressa mais cedo — Taeyong encarou a namorada com as mãos na cintura, mas Day nem ao menos se virou para olhá-lo.
Haechan mexeu os ombros com graça, ainda risonho. já parecia concentrada em analisar todas as capas dos novos vinis, e logo, logo passaria a olhar todas as fitas cassetes. Assim, Taeyong seguiu para o canto da loja, onde tinha uma guitarra pendurada.
Seus dedos percorreram a mão da guitarra, tocando brevemente nas tarrachas e seguindo para o capotraste. Encarou com cuidado as cordas de aço, que seguiam por todo o braço até o corpo da guitarra.
— Espera ai… — disse baixo enquanto se aproximava da parte de madeira da guitarra ao enxergar um escrito nela.
— É isso aí que você está pensando, essa é a Les Paul SG assinada do Jung Hyeon, fundador da Add4 — Haechan disse com um sorriso enorme no rosto. — Nem eu sei como consegui essa relíquia, mas confesso que é a melhor em toda minha coleção.
— Você tocou?
— Claro que não, eu não tinha coragem nem de tocar com as minhas próprias mãos quando a ganhei — o mais novo soltou uma risada alta, que foi acompanhada pela de Taeyong. — Eu limpo ela todos os dias.
— MEU DEUS — gritou surpresa, chamando a atenção dos rapazes. A garota se virou para Haechan, apontando para a fita cassete rosa em suas mãos. — COMO VOCÊ TEM ISSO?
O garoto apenas tombou a cabeça para o lado, sem entender exatamente o porquê daquela gritaria eufórica da amiga. Haechan olhou na direção de Taeyong, mas ele estava tão perdido quanto.
, percebendo que não receberia nenhuma resposta, continuou apontando para a fita enquanto explicava:
— Essa aqui é a edição Cassete do Pink Tape do f(x) — disse como se fosse óbvio.
— Acho que todas as fitas vieram do mesmo fornecedor — Haechan deu de ombros enquanto se aproximava. — Mas porquê toda essa euforia?
— É um item colecionável e raro, ridiculamente raro.
O garoto pegou a fita da mão de com cuidado, analisando brevemente a situação da fita. Devolveu-a nas mãos da garota, virando-se para voltar a conversar com Taeyong.
— Para você eu faço a preço de fita clássica.
Os olhos de brilharam e sua boca se abriu em um ‘o’ perfeito. Ela encarou as costas de Haechan, que já conversava com Taeyong sobre a guitarra animadamente, e depois encarou a fita em suas mãos.
Não conseguiu prestar atenção em mais nada que havia chegado na loja. A Pink Tape havia prendido toda a sua atenção e ela nem mesmo tentava se concentrar em ver as novas fitas e CDs que Haechan comprara para a lojinha.
Ela precisava ouvir aquela fita o quanto antes.
— Você por acaso vende aqueles leitores de fita cassete? — ela perguntou depois de um tempo, chamando a atenção de ambos mais uma vez.
Haechan concordou com a cabeça, apontando com o indicador para um armário que ficava no canto, próximo de onde fitava as fitas sobre a mesa.
A garota agradeceu com o olhar, descansando a fita rosa sobre a mesa e seguindo até o armário amarronzado – e que cheirava a móvel velho.
Esticou-se tentando alcançar o toca-fitas na última prateleira, mas não obteve sucesso. Apesar de não ser exatamente baixa, sua altura não era suficiente para alcançar aquela estante específica.
Pensou em chamar pela ajuda de algum dos garotos, uma vez que eles provavelmente alcançariam o aparelho, mas ficou com receio de atrapalhar a conversa animada que eles estavam tendo a alguns metros dela. Ela odiava atrapalhar.
Sentiu um calor bem conhecido atrás de si e um braço se esticando até alcançar a última prateleira do armário.
— Valeu… — ela agradeceu assim que recebeu o toca-fitas em mãos.
Taeyong deu um meio sorriso, logo se afastando e olhando pela janela, notando que o Sol estava começando a baixar. Virou-se na direção de , apontando com a cabeça para o lado de fora, fazendo-a finalmente notar a altura dos raios solares.
— Haechan, a gente está com um pouco de pressa — ela começou a dizer, chamando a atenção do amigo. — Quanto fica?
Haechan tombou a cabeça para o lado, aproximando-se para conferir quais aparelhos tinha escolhido levar. Seus olhos ficaram encarando o nada por alguns segundos enquanto seus dedos das mãos levantavam e abaixavam, indicando que ele estava fazendo contas.
Subitamente, Haechan levantou o rosto enquanto estalava a língua no céu da boca.
— Eu tenho que conferir os preços, mas como vocês já precisam ir, eu posso olhar na agenda do meu pai e te mandar o valor no Kakao — ele sorriu com os lábios fechados.
Os olhos de se arregalaram e suas sobrancelhas arquearam. Ela ficava contente em saber que Haechan confiava nela naquele nível.
— Tem certeza? — preferiu confirmar se ele não estava tomando uma decisão não pensada, mas o rapaz apenas sorriu ainda mais aberto antes de responder:
— Você já é da casa.

☽☾


O Sol já estava baixo quando abriu a porta do terraço. O céu estava pintado de tons alaranjados e rosados, além dos raios batendo nas nuvens e fazendo um show de diferentes luzes.
— Como sempre… — Taeyong comentou baixo, encostando a porta atrás de si.
deu um risinho enquanto observava os outros três rapazes também no terraço de um dos prédios do campus. Seguindo até o cantinho com mesas e cadeiras descartadas das salas de aula, a garota se sentou e começou a encarar o namorado, sorrindo à medida que ele se aproximava cada vez mais.
Era todos os dias daquele jeito: os dois subiam até o último andar do prédio e assistiam o pôr do Sol juntos, às vezes com uma trilha sonora no fone de ouvido compartilhado ou apenas com a música que os outros garotos escutavam.
— Não acredito que vou assistir o pôr do Sol escutando f(x) — o rapaz deu uma risada enquanto estendia o toca-fitas para a namorada.
Ela o olhou com uma das sobrancelhas arqueadas.
— Você está reclamando do meu gosto musical por acaso?
— Jamais! — colocou as mãos para cima, rindo da careta de .
Com um sorriso, a garota relaxou a postura e colocou a fita no toca-fitas, escutando a música logo em seguida. Seus olhos se fecharam com a melodia tão bem conhecida por seus ouvidos, e sua mente mergulhou dentro de um universo pessoal cor de rosa.
Percebendo que já viajava dentro de sua imaginação ao som de Rum Pum Pum Pum, Taeyong se sentou ao seu lado de forma silenciosa, apreciando cada centímetro do rosto pacífico da garota.
Deixou de lado seu objetivo inicial de assistir o show de luzes celestes e virou seu rosto na direção dos três rapazes que lá estavam.
Eram rostos conhecidos por ele. O mais baixo era tailandês e tinha o nome complicado para se lembrar, mas Taeyong o conhecia como Ten – assim como quase todos naquela universidade.
Ten estava sempre acompanhado de Sicheng, ou Winwin como todos o chamavam. Diariamente, Taeyong e se encontravam com ambos no terraço na hora do escurecer, quando os dois garotos ensaiavam para audições de diferentes empresas.
E, junto dos dois, estava Johnny.
Taeyong sabia que Johnny e Ten eram amigos e, vez ou outra, andavam juntos pelo campus, mas o estadunidense nunca pisara no terraço. Pelo menos não quando Tae estava lá.
Uma sensação esquisita remexeu o estômago de Taeyong, provocando uma onda de lembranças em sua mente que ele desejou apagar. Não gostava da ideia de estar no mesmo ambiente que Johnny, mesmo que eles não tenham nem ao menos cruzado os olhares.
— O que foi? — escutou a voz de ao seu lado e relaxou sua expressão tensa, tentando não preocupá-la com seus problemas com outro cara.
— Nada, só estava vendo a coreografia deles — deu de ombros, sorrindo para a namorada.
Ela piscou algumas vezes antes de se aproximar mais do namorado e apoiar sua cabeça em seu ombro. Ele sentiu os ombros da garota subirem e descerem, respirando fundo.
Virou o rosto em sua direção, sorrindo abobadamente.
A música continuava a tocar no toca-fitas e, para sorte deles, os outros três rapazes pareciam estar saindo do terraço mais cedo que o esperado.
Taeyong riu baixo.
— Se você me disser que está rindo do nada também, eu vou realmente achar que você está louco — afastou a cabeça, rindo do namorado.
Ele negou com a cabeça.
— Eu só estava me lembrando da conversa de louco que tive com Lucas hoje — Taeyong riu, recebendo um olhar de questionamento. — Ele fez uma pergunta bem… Intrigante.
— Tenho até medo de perguntar — riu, cruzando as pernas. — Vai me dizer que foi de uma das aulas de psicologia dele?
Taeyong assentiu e a garota revirou os olhos, negando com a cabeça.
— Deus, o que foi que ele te perguntou?
— Hmm… — Taeyong colocou a mão no queixo, como se pensasse. — Não sei se devo contar a você.
O queixo de quase caiu no chão.
— Eu não consigo acreditar que você vai fazer isso comigo — suspirou com força, sentindo um nervoso subir em seu peito. Encarou o namorado e segurou em sua mão. — Você sabe que vou te encher o saco até você me contar, não é?
O rapaz fez um leve carinho na mão da namorada, dando um sorriso em resposta e assentindo brevemente.
— Eu só quero que você saiba que confio em você, Day.
Ela sorriu, sem saber exatamente o que responder.
— Obrigada, eu também confio em você — retribuiu o carinho. — Mas ainda quero saber.
Taeyong soltou uma risada pelo nariz.
— Sei disso, mas por favor, vamos mudar de assunto por agora.
Um sorriso mútuo entre ambos encerrou o tópico iniciado pela pergunta inconveniente de Lucas. optou por olhar para o céu quase escuro, para virar para o namorado em seguida e dizer:
— Acho que a gente poderia ficar mais um tempinho, não é? — deu um sorriso amarelado, pegando na mão do namorado mais uma vez. — Já que finalmente estamos sozinhos e…
Não conseguiu continuar sua linha de raciocínio, visto que Taeyong avançou em sua direção e pressionou os lábios contra os dela.

☽☾


Quando colocou os pés na soleira da porta, ela agarrou o rosto de Taeyong entre suas duas mãos. O rapaz entendia o gesto. Era como um ritual do fim do dia, consistindo em encarar seu rosto por pelo menos dois minutos inteiros a fim de guardar cada detalhe dele para limpar a mente e, quem sabe, encontrá-lo nos sonhos.
Naquele dia, por nenhum motivo, o encarou por mais tempo.
Delicadamente, Taeyong pegou os dedos da namorada e depositou um beijo nas costas da mão direita. Ela riu, balançando a cabeça enquanto estalava a língua.
— Você sabe que isso deixou de ser bacana no século XIV ou sei lá quando a Maria Antonieta viveu.
— Vai fingir que você não gosta dessas coisas bregas a essa altura do campeonato? Só tem nós dois aqui, senhorita Kwan — ele zombou. revirou os olhos e olhou por sobre o ombro, verificando se os olhos furtivos de seu pai não escapavam por nenhuma fresta da janela e se inclinou para beijar Taeyong. Ele correspondeu na mesma intensidade, exibindo toda a sua vontade guardada de beijá-la que crescia a cada hora do dia.
Um barulho ínfimo no arbusto alto do meio-fio fez se afastar de susto, apertando os olhos para enxergar o local. Não parecia ser nada. Só um corvo que batia as asas e acabava de pousar em um dos galhos fracos das árvores grossas da vizinhança.
Taeyong segurou o riso, colocando uma mecha dela atrás da orelha.
— Infelizmente, vamos ter que parar com isso agora. Preciso voltar antes que meus pais pensem que voltei a jogar videogames na casa de Jaehyun.
Ela suspirou em um muxoxo, assentindo devagar.
— Queria que você pudesse ficar mais.
— Eu também, mas lembre-se que os jogos vão começar e quanto mais cedo terminarem, mais vamos poder passar tempo juntos. Tudo bem? — sorriu, estalando um beijo em sua testa — Boa noite, . Prometa que vai sonhar comigo.
— Isso é jogo sujo. Não posso prometer uma coisa dessas.
Ele revirou os olhos e riu.
— Tudo bem, prometa que vai tentar.
Ela assentiu.
— Prometo que vou tentar, Lee — deu de ombros, como se o assunto não tivesse tanta relevância. Mas não tinha importância, ele sabia que era uma figura esperada no imaginário da garota.
Quando começou a se afastar, virou-se para entrar em casa, mas voltou-se logo em seguida na direção dele e gritou:
— Ei, Lee Taeyong! — chamou. Taeyong se virou, já na calçada. Ela hesitou por um momento e disse, em voz mais baixa: — Eu amo você.
As palavras foram totalmente ouvidas, e pareciam crescer entre as sombras. Foi como se o envolvesse por inteiro. E, naquele momento, Taeyong realmente não quis ir embora.
Mas a sensação de realidade se apoderou dele rápido demais.
— Também te amo, . Até amanhã.
Ele acenou para ela de longe, segurando a vontade de voltar e abraçá-la mais uma vez e seguiu seu caminho para casa.
Taeyong jamais chegou lá.
Como um dos acontecimentos pequenos e fadados a acontecer naquela noite, o outono se aproximava com ventos frios e restos de folhas entulhando os cantos da calçada. Ele andou devagar, aquecendo as mãos nos bolsos do moletom e chutando algumas folhas alaranjadas para o canto, com o queixo baixo. Uma dupla de crianças passou por ele aos risos, ainda com uniforme escolar e a mochila nas costas balançando de lá para cá. Uma mulher de meia idade lia uma notícia no celular enquanto aguardava que o sinal abrisse para atravessar a rua. Os carros passavam a uma velocidade mediana no fim do horário de pico, e faltavam alguns quarteirões para que chegasse em casa, apenas alguns.
As crianças continuaram correndo até a borda da rua, gritando coisas como “você não me pega” ou “estamos muito atrasados” enquanto riam sem parar. Uma delas repetiu algo sobre ir embora e segurou nas cordas da mochila até atravessar a faixa de pedestres até o outro lado, correndo como um furacão.
O garotinho que ficou para trás nada disse. Apenas engoliu em seco e observou o outro gritar da outra extremidade, abanando com as mãos e mandando-o fazer o mesmo, com pressa. A mulher não desviava a cara do celular. Não havia mais pedestres. E o sinal continuava verde para o tráfego.
Quando ele respirou fundo e tocou os pés no asfalto, tudo aconteceu rápido demais.
Primeiro, Taeyong ouviu o barulho. Era mínimo e discreto; o som abafado de um motor velho, gasto, desanimado. Mas vinha rápido, muito rápido. Estava correndo para se aproveitar dos últimos segundos do sinal verde. E então, do outro lado, tinha o garotinho que se aproximava cada vez mais do meio da rua.
Taeyong não pensou em momento nenhum. Talvez, em algum segundo débil e maluco, ele tenha se lamentado que, se não agisse logo, aquele garotinho nunca chegaria à puberdade. Sua barba nunca iria crescer lindamente e ele nunca entraria na faculdade. Talvez. Era impossível saber. Toda a sequência depois incluía seus pés se movendo por conta própria, um empurrão e o som tremendo do choque de seu corpo contra o pára-brisa da caminhonete, lançando-o há vários metros de distância da avenida.
Não se sabe se ele sentiu dor. Com o baque, sua cabeça sofreu as consequências primeiro e, ao ter o corpo estendido no chão como um maldito tapete, demorou apenas um minuto para morrer. Não deu tempo de pensar, lembrar, se despedir. De casa, da sopa de sua mãe, dos colegas do time, dos amigos espalhados pela cidade, de . Não foi uma despedida digna. Nenhuma delas foi.
E agora era tarde demais, porque seu sangue se espalhava pela rua e era filtrado pela entrada do bueiro conjugado ao meio fio mais próximo. Houve gritos e confusão. Luzes vermelhas e azuis, faixas amarelas e um grande saco preto e pesado, cobrindo o corpo de um jovem bom, gentil e inteligente, que tinha sonhos e uma vida inteira pela frente.
E ali, parado em cima de um fio fino do poste mais próximo, o corvo encarou a cena por vários minutos até finalmente bater suas asas e desaparecer pelo céu escuro.




Continua...


Nota da autora: Olá! Espero que você tenha gostado, e obrigada pela sua leitura. Até a próxima!


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