Capa principal

Revisada por: Aurora Boreal 💫
Finalizada em: Maio/2025


Capítulo Único

Salem, Massachusetts.

Abracei os meus braços e soltei um suspiro entre os meus lábios, me arrependendo imediatamente. Fazia frio. Meu corpo tremia, mesmo com a quarta sobreposição que eu havia colocado antes de sair de casa mais cedo.
A nevoa densa pairava sobre a cidade, fazendo com que eu mal conseguisse ver no quarteirão seguinte, e por esse motivo, decidi vir andando.
Ótima ideia, .
Ainda com os braços envolta do meu corpo, cheguei à livraria, que ficava no centro não muito movimentado de Salem. Tirei as chaves do bolso, ouvindo o barulho delas todas juntas e ligeiramente a virei na fechadura. Ao entrar, foi como se poeira tivesse entrado em meu nariz, fazendo com que eu o franzisse.
Fechei a porta atrás de mim e corri para ligar o ar quente, que conseguiria esquentar o local em questão de minutos.
— Preciso de café.
Era importante abrir as janelas, no entanto, não queria enfrentar aquele frio novamente. Então apenas liguei o ar quente e deixei que ele fizesse o serviço. Enquanto andava até o balcão e colocava a minha mochila em um compartimento ali embaixo, apertei um botão, ligando o computador, que era o caixa e algumas câmeras.
Foi questão de uma hora para que os meus funcionários chegassem, Ethan e Aria, que eram como meus braços direitos. Colocamos as fofocas em dia, ao passo que a cafeteira fazia o que era necessário, o ar quente predominasse ainda mais e eu conseguisse prender o meu cabelo em um rabo de cavalo.
— Conseguiu terminar de ver? — Aria perguntou um pouco mais alto, ao se aproximar de umas das prateleiras e colocar um livro que havia sido retirado no dia anterior.
— Não. Dormi no meio de mais um episódio. Acho que essa série não é pra mim. — A olhei sorrindo, após ajeitar o local em que as pessoas poderiam se servir de café e biscoitos. — Quer ir ao cinema hoje?
— Adoro noites de terror!
— Aqui parece que são todos os dias — dramatizei.
Mais algumas voltas no ponteiro e eu terminava de mandar uma mensagem a uma cliente, avisando-a a respeito de um livro que havia acabado de chegar. Sorri com a interação, sabendo o quanto ela queria aquele volume. Dei uma olhada pela loja, as cinco prateleiras estavam dispostas lado a lado, separadas por ordem alfabética.
A minha atenção foi tirada quando um barulho da porta estar sendo aberta ecoou. Me virei, vendo um rapaz sorrir simpaticamente ao me ver, compartilhei meu sorriso. Sua barba por fazer, a forma como ele levou as mãos até os fios lisos levemente compridos para trás chamou a minha atenção.
Suas bochechas estavam coradas pelo frio e esse era uma das coisas que eu mais gostava na estação. Talvez a única.
— Olá, bom dia. No que posso ajudar?
— Oi, bom dia. — Notei seu olhar vir até o meu nome que estava estampado na camiseta preta. — . Oi. Queria te fazer um convite. Em troca de... você tem o livro do Stephen King, Salem? Seu nome é bem apropriado para essa cidade.
Dei uma risada fraca, se eu ganhasse dinheiro cada vez que me falassem isso.
— Tenho. Você tem preferência se quer de capa dura, ou...
Sai de trás da bancada e o cheiro do perfume, ou colônia, invadiu as minhas narinas. Era cítrico e fresco. Andei em direção a uma das prateleiras, pude perceber que ele me acompanhava depois de negar que não possuía preferência. Em questão de segundos encontrei o livro.
— Você já leu? — sua pergunta foi rápida ao pegar o livro nas mãos.
— Já. E não posso dizer mais do que isso.
— Ah! — O bico que se formou em seus lábios quase fez com que eu risse.
Minutos depois, finalizava a compra dele e entregava em suas mãos a sacola com o livro, um cartão da loja, marcadores de página e um pacote pequeno de lenços.
— Qual era o convite que você queria me fazer?
— Vim para Salem recentemente, vindo da Itália. Meu nome é — explicou, com calma, e concordei com a cabeça. — Abri um restaurante, na próxima esquina. Não quer almoçar lá? Juro. A comida é boa.
A sua afirmação fez com que eu risse.
— Você jura? Primeiramente, prazer.
— Prazer.
Rimos novamente e trocamos alguns olhares, meu coração palpitou e, ao olhar um pouco para o lado, vi Aria com um sorrisinho nos lábios.
— Massa. Você promete? — Voltei meus olhos até ele e ri.
— Prometo. Daqui a meia hora lá no di Itália.
— Belo nome. — Mordi meu próprio lábio inferior enquanto ria.
Acenei antes que ele sumisse ao abrir a porta e deixei que o ar saísse dos meus pulmões. Levei as mãos até o meu rosto, as sentindo levemente trêmulas.
— Acabei de ver falando com um homem gostoso daqueles? — Ouvi a voz de Aria.
— Quê? Não — respondi rápido ao tirar a mão do meu rosto e fitá-la. — Ele é um cliente. Comprou um livro e nos convidou para conhecer o restaurante dele, já que está começando — expliquei, ao ajeitar algumas coisas em cima da bancada que não precisavam ser ajeitadas.
— Hm.
Direcionei novamente meu olhar em Aria e a morena estava com um sorriso ladino nos lábios.
— Ele tem um restaurante italiano no outro quarteirão e nos chamou para almoçar lá. — Assim que falei isso, Ethan se aproximou com o cenho levemente franzido.
— Quem nos chamou para almoçar e onde?
— O .
Ambos se entreolharam, mas logo voltaram a olhar para mim.
— Eu iria, mas trouxe comida de casa.
— Olha só, eu também — Aria disse, risonha.
Dois idiotas.
Revirei os olhos e suspirei baixo.
— Vou sozinha então?

Reparei o Sol travando uma batalha incansável contra as nuvens, alguns raios chegavam até o meu rosto, causando uma sensação agradável. Mas, ainda assim, mantive minhas mãos dentro do bolso do agasalho mais pesado e tentei respirar fundo poucas vezes para que o ar mais frio não entrasse em meus pulmões.
Alguns passos depois, cheguei ao di Italia. Notei o letreiro em uma letra cursiva e mesas do lado de fora. Abri a porta de vidro, que era um pouco pesada, e o ambiente quente fez com que eu quase sorrisse.
O ambiente era agradável e aconchegante. As mesas dispostas lado a lado para apenas quatro pessoas eram de madeira escura. Os quadros na parede mostravam imagens de pratos que pareciam ter sido feitos por pintores talentosos. Ao meu lado esquerdo, notei uma bancada e uma moça sorrir para mim, parecia que tínhamos a mesma idade.
— Olá, boa tarde — ela disse, sendo simpática.
Apenas duas mesas estavam ocupadas, o que julguei ser normal, tendo em vista que pelo que me disse, eles abriram há pouco tempo. Fui acompanhada até uma das mesas, o cheiro era delicioso, o que fez com que meu estômago roncasse. Pedi um suco e expliquei que conhecia .
Em determinado momento, meu celular anunciou uma mensagem nova, e peguei o aparelho do bolso do meu agasalho. Suspirei ao ver quem era, e principalmente o conteúdo.
Ryan.
— Babaca.
O nosso relacionamento acabou há pouco mais de 6 meses, mas ele ainda me mandava mensagens, perguntava como eu estava e sempre queria saber se poderíamos nos ver. Na maior parte do tempo, eu o ignorava.
Deixei o aparelho sobre a mesa, com a tela virada para baixo, e foquei em um casal que se encontrava há duas mesas de distância, um sentado na frente do outro com as mãos dadas.
Memórias invadiram a minha mente, fechei os olhos momentaneamente, pois elas nunca terminavam de um jeito bom.
— Oi. Você veio!
A voz de pareceu fazer carinho em meu corpo, levantei o rosto a fim de olhá-lo e concordei com a cabeça sorrindo.
— Oi. Quando você falou em comida italiana — ri — não resisti.
— Você não vai se arrepender. Vou buscar o seu almoço.
A piscadela que ele deu antes de sair fez com que meu corpo se arrepiasse, mas ainda assim, memórias do meu último relacionamento não saíam da minha mente, por mais que eu Ryan tivéssemos terminado há um bom tempo.
Foi questão de segundos para que chegasse com o meu prato e no mesmo instante um sorriso brotou em meus lábios, ao passo que meu estômago ecoava um barulho contido.
— Uau!
Buon appetito!
O sotaque fez com que minhas bochechas esquentassem de uma forma que não acontecia há algum tempo. Dei uma risadinha, observando-o me deixar sozinha, provavelmente indo resolver algo importante na cozinha.
E sem sombra de dúvidas, foi a melhor massa que comi em toda a minha vida. Nada se comparava em todas as vezes que eu havia feito em casa. Como algo podia ser tão bom?
— Oi. Está tudo bem?
Levantei meu rosto para olhá-lo depois de limpar meus lábios e minha cabeça iniciou movimentos concordando no mesmo instante, tanto que ri, e ele também.
— Não tenho nenhuma crítica. Perfeito. Eu nunca comi uma massa tão boa. Você é muito bom no que faz, de verdade.
O sorriso dele de orelha a orelha fez com que eu sorrisse também e ficamos nos olhando por longos segundos até que momentos com Ryan brotassem novamente em minha mente.
— Fico feliz que tenha gostado.
— Bom, você me verá por aqui muitas vezes. E farei a propaganda para todas as pessoas que conheço.
— Farei o mesmo a respeito da sua livraria. Ela é incrível.
Senti o perfume dele quando o vi se sentar na minha frente e não consegui tirar os olhos dele por nenhum segundo.
— Você nasceu na Itália e veio morar aqui? Justamente em Salem? — Soltei uma risada fraca.
— Sim. Mas Salem é uma cidade maravilhosa. Os locais místicos para se visitar, toda a história que envolve as bruxas. Eu já amo esse lugar. Você não gosta? — Seu olhar era gentil e pisquei algumas vezes antes de responder.
— Meu nome é . Eu tenho que amar essa cidade. — Apontei pra mim mesma e arranquei uma gargalhada dele.
Queria fazer isso mais vezes.
Infelizmente, tive que ir embora logo, já que o horário de almoço estava terminando. Passei o restante do dia alheia a realidade, respondendo Aria ou Ethan de forma monossilábica e eu não era assim. Mas pensava em . Em seu perfume. Na forma como suas covinhas apareciam quando estava sorrindo e em como ele era cavalheiro o tempo inteiro.
À noite, eu e Aria pegamos uma sessão por volta de 19h no pequeno cinema da cidade, que estava passando As Bruxas de Salem. Bem óbvio. Compramos uma pipoca grande e resolvemos dividi-la, e duas garrafas de água. O filme era antigo, de 1996, por isso o cinema contemplava pessoas acima dos 20.
— Ai que saco. — Coloquei meu celular dentro da minha bolsa, após desligá-lo.
— Ryan de novo? — Aria me olhou, ao pegar um pouco de pipoca.
— Sim.
— Você precisa falar com ele, .
— Eu já falei. Acha que preciso falar novamente? Ele parece que não entende — falei de forma ríspida, mas não era a minha atenção. — Depois de me trair, dias antes do nosso casamento, o que mais ele quer? Eu? De volta?
Suspirei pesadamente e abri a garrafa de água, bebendo goles e fiz uma careta com isso, já que estava gelada.
— Ele é um idiota. Homens são uns idiotas. — Aria olhou para frente, mas logo voltou a atenção para mim.
— Por isso que você gosta de mulheres. — Soltei um risinho.
— Acredite, mulheres podem ser idiotas também. Mas a minha não é.

Por conta de tudo que aconteceu com Ryan, era como se as borboletas no meu estômago não voassem mais. Por mais que eu achasse lindo, além de carismático e gentil, eu não sentia nada mais além disso. Era apenas meu coração palpitando e não tendo aquelas misturas de sensações quando estamos prestes a gostar de alguém.
Semanas se seguiram e recebi alguns convites para sair com . Ele ia praticamente todos os dias na livraria e às vezes eu gostava de almoçar no restaurante dele. Conversávamos, ríamos e trocávamos olhares, mas nada mais do que isso.
Cerca de quase um mês depois, aceitei sair com ele para que pudéssemos passear e tomarmos um sorvete juntos. O frio já havia diminuído bastante e o sol deu uma esquentada nas ruas de Salem.
No fim do encontro, depois de não conseguirmos parar de falar durante toda a tarde, ele me trouxe até em casa. O que eu achei fofo. Com um sorriso nos lábios ele me olhou e sabia que ele queria me beijar.
Meu coração batia velozmente em meu peito.
... — me afastei ao sussurrar.
... — A forma como ele falava um dos meus apelidos fazia com que eu me corasse, sempre.
— Eu não posso. Eu... Sei que está frustrado por eu não te deixar me tocar, e — olhei para o lado ligeiramente e passei a língua pelos lábios, logo voltando a minha atenção a ele — eu não posso. Você...
— Você é a pessoa mais linda que já conheci, . — Sua mão segurou meu queixo de forma delicada e ofeguei baixo com o elogio.
Engoli seco, fitando seus olhos.
— Eu não quero dificultar mais. Eu poderia... — Neguei com a cabeça.
— No seu tempo, ok? Sei que você sente uma atração por mim também — o ouvi sussurrar.
Idiota, como ele sabia? Quis rir.
E naquele momento, olhando nos olhos castanhos de , entendi que não precisava mais tentar me afastar. Que estar dificultando as coisas só iria adiar o inevitável que seria eu e ele tentarmos alguma coisa.
Ele me fazia rir.
Ele fazia com que eu me sentisse bem. Que meus sentimentos eram valiosos.
Que o que eu fazia era algo incrível. Que eu era inteligente, batalhadora. Que sabia o que queria. Sempre.
E naquele momento, eu sabia. Na verdade, eu tinha certeza.
Dei um passo pra frente, ainda com os dedos de segurando meu queixo e diminuí a distância entre os nossos corpos, fechei os olhos e uni meus lábios aos dele. De início, apenas aproveitei a sensação dos seus lábios macios contra os meus. Então, levei uma das minhas mãos até a sua nuca, entrando entre os seus fios e acariciando a região.
As mãos de me pegaram pela cintura e quis dar um gritinho assim que ele me puxou para mais próximo a ele. Meus seios tocaram seu peitoral definido, no mesmo instante em que nossas bocas se abriram em sincronia e um beijo intenso se iniciou.
Quis soltar um gemido com a mordida que ele deu no meu lábio inferior, mas acabei soltando um risinho e passei as unhas pela sua nuca. Ao nos afastarmos, demorei alguns instantes para recobrar a consciência, pois ele havia me levado até a Lua. Me sentia aérea.
— O que você quer agora? — Seus dedos colocaram uma mecha do meu cabelo atrás da orelha e passei a língua pelos lábios.
— Quero que você faça uma massa pra mim. Hoje. Na minha casa — respondi num sussurro e mordi meu lábio inferior.
Não resisti, roubei um selinho rápido dele enquanto dava um sorrisinho.
— Não poderia ser difícil, né?

FIM!

Nota da autora: Sem nota!