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Até o Prólogo, revisada por: Selene
Capítulo Um em diante, revisada por:
Polaris 👩🏻‍🚀

Última Atualização: 28/02/2025

Aquela era a terceira noite em que Marc Spector era compelido a vagar pelas ruas sombrias de New York. Seu manto ondulava banhado pelo luar, enquanto o vigilante permanecia parado no alto de um telhado, seu olhar fixo no horizonte.
Marc não fora recrutado por Khonsu, tampouco Steven foi, e, no entanto, ambos simplesmente despertaram ali, com seus batimentos cardíacos acelerados, seu corpo dando sinal de alerta e uma sensação esquisita de que o lugar era, de fato, onde deveriam estar.
O conflito gritava em suas mentes exaustas. De um lado, aflorava a indignação, porque Khonsu não cumprira sua promessa de libertá-los. De outro, um desejo de justiça tornava quase prazerosa a sensação de mais uma vez vestirem o traje.
Marc só lembrava de ter se sentido daquela forma quando frustraram os planos de Ammit. Antes disso, nunca havia se orgulhado de seus feitos. Ele era um escravo de Khonsu, o guerreiro que deveria ser seu punho de justiça, mas não passou de mero peão.
A máscara do traje impedia que seu ressentimento fosse exposto. No entanto, Steven Grant o via e estava ali, sussurrando palavras de incentivo, para deixar claro que Marc não tinha culpa de nada. Khonsu o usou.
Spector discordava, mas não queria discutir. Não tinha forças para aquilo. Ele só queria entender como ainda acordava em lugares inusitados e qual era o seu propósito. Enquanto isso, tentava recompensar todo o dano infligido por seus punhos. Colocaria a justiça em seu devido lugar, se um dia aquilo fosse possível.
Eu ainda acho que continuar batendo nos outros, mesmo as pessoas criminosas, não recompensa nada, Marc. — O comentário de Steven o fez revirar os olhos.
— Bom, essa é a dança que vamos precisar fazer até descobrirmos a merda que está acontecendo.
Grant estava prestes a retrucar, determinado a mudar a estratégia de Spector, quando algo chamou a atenção de ambos.
Gritos.
O vento frio soprou violento contra o corpo do Cavaleiro da Lua quando, sem hesitar, ele seguiu em direção ao que, em poucos segundos, revelou ser um pedido de socorro.
Marc?
— Quieto, Steven.
Precisava se concentrar para encontrar o lugar certo. Era ele quem estava no controle, não importava quantas vezes Grant protestasse.
Eu só ia dizer que os gritos parecem vir daquele beco ao lado da Dunkin Donuts. — A voz em sua cabeça estava um tanto ressentida.
— Ah, achei que ia reclamar de novo… — Marc ficou ligeiramente sem graça, porém, não tinha tempo para aquilo.
Steven estava certo. Os gritos vinham mesmo do beco ao lado da Dunkin Donuts. A iluminação do local era péssima e ele precisou se esforçar para distinguir as sombras ali, mas, ainda assim, a imagem encontrada era inconfundível. Aquilo era…
Um homem batendo em uma mulher.
Sentiu seu sangue ferver.
— Ainda acha que não se deve bater nesse tipo de gente? — A revolta estava explícita em sua voz.
Steven se sentiu desapontado com a humanidade. Em uma rara ocasião, não soube o que dizer, no entanto, o comentário de Marc chamou a atenção do homem. Este o encarou com o punho no ar, prestes a acertar a mulher mais uma vez.
— Não se mete. Essa vadia me deve tudo o que tem.
— Na verdade, sou eu que te devo — Spector rosnou. O nojo quis subir por sua garganta e ele avançou, impiedoso.
Sem dar chance para o cara responder, ou até mesmo pensar, Marc o puxou com violência, o afastando da mulher. Não mediu sua força porque não fazia questão, e o resultado foi uma porrada violenta do corpo contra a parede.
Aparentemente, o homem parou de respirar. E, mais uma vez, Spector não se importou.
Se aproximou, o pegou pelo colarinho e socou seu rosto com fúria. A sensação de seu punho quebrando o queixo dele era estranhamente satisfatória, ainda mais quando imaginou Steven tapando os olhos com as mãos diante da cena. Gostava de irritá-lo, especialmente quando ia contra os tais princípios que Grant dizia ter.
Pare! Pare, por favor, você vai matá-lo! — Marc achou que estava sonhando quando ouviu a voz feminina em completo desespero.
— Isso é sério? — Indignado, Spector jogou o homem desacordado no chão.
Ela não respondeu, se aproximou e se debruçou sobre o homem para chorar copiosamente.
Suspirou.
Deixe-me ajudá-la, Marc.
— Steven…
Sua especialidade não funcionou. Deixe eu tentar a minha.
Bufando, Spector assentiu.
Steven se sentiu aliviado ao receber o controle mais uma vez. Seu traje mudou para o terno bem alinhado e, quando ele se aproximou para tocar o ombro da mulher com toda a delicadeza, ainda assim ela se assustou.
— Você pode muito mais do que isso. Não deixe ninguém te tratar como esse homem faz. Eu vou chamar uma ambulância para vocês e a polícia…
Os olhos dela se arregalaram.
— Não! Sem polícia, por favor, eu…
Grant parou de ouvi-los. De repente, se sentiu observado e virou bruscamente, bem a tempo de perceber um par de olhos vermelhos o encarando.
Piscou assustado.
A mulher o sacudiu para que voltasse a olhá-la. Steven se afastou de seu toque e arregalou os olhos.
— Ok, tudo bem! Sem polícia, mas vocês precisam de cuidados médicos, moça…
Marc bufou.
Que merda você está fazendo, Steven? Ela vai voltar para esse merda e ele vai continuar batendo nela. Me deixe acabar com ele!
— Calado! Você já fez o suficiente, olha o estado do homem!? — Fez uma careta ao ver o rosto do homem todo ensanguentado. — Tudo bem, tudo bem. — Ele procurou o celular no bolso do casaco e, trêmulo, discou o 911.
Ao seu lado, a mulher chorava copiosamente, enquanto um filete de sangue escorria do canto de seus lábios inchados.
— 911, qual é a sua emergência?
— Tem duas pessoas muito machucadas aqui. Acho que foi briga, uma delas está desacordada, então sugiro que venham rápido.
Ele aguardou o tempo necessário para pegarem a localização e tentou ignorar o choro da mulher, que ainda implorava para não acionarem a polícia.
— Pronto. Agora só vai vir a ambulância e…
Steven… STEVEN! — A voz ansiosa de Marc o interrompeu e Grant sacudiu a cabeça, como se o gesto fosse o suficiente para tirá-lo dali.
— O que é?
Como ele queria não estar mais envolvido naquelas coisas. Não lidar com ambulâncias e com a culpa horrível de saber que pessoas se machucaram por sua culpa. Queria apenas trabalhar com a equipe de arqueologia que o havia contratado, mesmo sabendo da loucura que aconteceu no Museu Metropolitano de Arte.
Steven, ainda estão nos observando! — O rosnado de Spector deixava clara a urgência que a situação pedia…
Outra vez, Grant se virou em alerta.
Marc estava certo. Era um par de olhos sinistros, e uma sensação horrível percorreu seu corpo. O que era aquilo? Estava lhe seguindo? E se quisesse matá-lo?
Vai investigar, ou vai ficar aí parado que nem um idiota?
Antes, porém, que Steven pudesse tomar uma atitude, os olhos vermelhos desapareceram, e o vulto negro a quem pertenciam se afastou correndo.
— Mas o que é isso? — Grant estava espantado e receoso, porque sabia no que aquilo ia dar.
Eu não sei. Vai logo atrás pra descobrir!
Não. Ele não ia. Se recusava a correr atrás de uma sombra esquisita.
— Não! — Tentou firmar seus pés no chão.
Marc bufou.
Maldita hora que havia cedido o controle para Steven.
Juro que um dia consigo acabar com a sua raça. Mas se não formos atrás da sombra, há uma grande chance de ela vir de novo atrás de nós.
— Como você sabe disso?
Vai, Steven!
Ele suspirou, então obedeceu.
O vento voltou a atingi-lo com força. As vestimentas cedidas por Khonsu o permitiam saltar com destreza de um prédio para o outro, e a velocidade da corrida logo os aproximou da sombra.
Estavam prestes a alcançá-la e descobrir do que aquilo tudo se tratava, e Grant se pegou ansioso. Uma dose de confiança se infiltrou, lhe dando a certeza de que não descansaria enquanto não tivesse respostas.
Até que tudo se apagou.
Quem assistisse de fora, veria os olhos de Steven Grant se revirando nas órbitas enquanto seu corpo se contorcia sem que ele sequer se desse conta daquilo.
Então Marc Spector voltou a despertar em sua cama, ouvindo o som estridente de seu despertador, como se nem houvesse saído dali para começo de conversa.


O sol queimava implacável sobre as dunas douradas do deserto egípcio. conseguia sentir as gotas de suor escorrerem por suas costas. O calor era insuportável e ela quase não conseguia respirar direito, enquanto seus pés cansados faziam a areia ceder levemente a cada passo dado, porém nada seria capaz de interrompê-la naquele momento. A arqueóloga, com seus cabelos presos de qualquer jeito, estava focada em um conjunto de hieróglifos desbotados gravados na entrada de uma tumba recém-descoberta. Seu coração retumbava no peito, a sensação de que estava prestes a encontrar algo realmente excitante após semanas de escavações a deixava ainda mais ansiosa.
Aquele lugar parecia inóspito a qualquer um que não compartilhasse sua paixão pela história. O calor ali de dentro parecia ainda mais sufocante, haviam insetos por todos os lados e a poeira se agarrava ainda mais à pele de . No entanto, ela era apaixonada por aquele mundo, por cada símbolo e cada inscrição que trazia a promessa de mais mistérios do passado a serem desvendados.
limpou o suor da testa com as costas da mão e a regata que vestia pareceu grudar ainda mais em seu tronco quando a mulher se abaixou ao lado de Layla Faroux, sua jovem assistente.
Seus dedos passaram por cima dos hieróglifos que tomavam forma conforme Layla escavava sem o tocarem de fato. Os olhos de brilharam em excitação.

— Concentre-se aqui. — Indicou um ponto específico e sua voz mal escondia o quanto estava animada. — Caramba, isso é fascinante! Veja só, eles mencionam Seth, o deus do caos.
Farouk ajustou seus óculos e se aproximou um pouco mais.
— Seth? — Sua voz soava intrigada. — Eu sempre achei que ele fosse evitado até mesmo nos textos religiosos.
— Ah, sim. Ele é. — Os olhos de brilharam ainda mais. — Mas aqui… Aqui é diferente, Lay. Parece que tem algo a mais. Algo importante que foi escondido, e essas inscrições parecem estar alertando sobre ele e o venerando ao mesmo tempo. Se é que isso faz algum sentido.

As expressões da assistente demonstraram que não, não parecia fazer sentido.
O vento soprou levemente e fez com que mais grãos de areia invadissem a entrada da tumba, e Layla pôde jurar ter visto algo reluzir nos hieróglifos, no entanto, foi por uma mera fração de segundos e ela duvidava que acreditariam nela. Provavelmente diriam que estava delirando, ou criando situações para não adentrar a tumba.
deu uma olhada ao redor para se certificar de que o restante da equipe estava em suas posições. O Dr. Khaled, seu parceiro de pesquisa, supervisionava um grupo de trabalhadores locais e acenou positivamente, em um incentivo para que seguissem em frente.
Quando os pés de por fim cruzaram a entrada da tumba, a atmosfera parecia diferente. O cheiro de terra úmida e poeira impregnava o ar e, ao erguer a lanterna à sua frente, uma exclamação de surpresa e satisfação escapou de seus lábios.
Nas paredes, estavam gravadas cenas de batalhas entre os deuses e estas pareciam quase vivas sob a luz oscilante da lanterna. Os olhos da arqueóloga brilharam ainda mais de excitação enquanto analisava cada desenho e era como se de repente ela tivesse aberto um livro.
Seth era o personagem principal e, em meio às batalhas que travava com seu exército, um guerreiro parecia ser seu escolhido. No entanto, seu rosto estava coberto por um capuz negro e apenas seus olhos vermelhos podiam ser vistos.
ficou curiosa. Quem era a figura por baixo do capuz? Precisava saber… Precisava de respostas!
Ansiosa, ela apurou seus passos. Layla, atrás dela, mal conseguia acompanhá-la, porém não se importava. Sentia a própria respiração falhar, tamanha era sua necessidade de desvendar aquele mistério.
Chegaram então ao que parecia ser o centro da câmara e antes mesmo que sua lanterna iluminasse o local ela o viu. Aparentemente, não era o desfecho da história nas paredes, porém algo ainda mais fascinante.
Em um pedestal baixo, sem sequer um vestígio de poeira o cobrindo e com um brilho dourado inconfundível, estava o cetro Was. O artefato parecia completamente intocado pelo tempo e mesmo a alguns metros de distância era possível sentir a aura de autoridade e poder que exalava.
Com cautela, se aproximou. Cada passo parecia ecoar suavemente pela tumba, e a equipe ao seu redor assistia à cena com um misto de curiosidade, excitação e apreensão.

— É isso… — murmurou para si mesma. Seus batimentos estavam acelerados, as mãos tremiam. Nunca se sentiu tão animada com uma descoberta. — Você está vendo isso, Khaled? — chamou por ele, sem tirar os olhos do cetro.
O egiptólogo estreitou o olhar enquanto também se aproximava. Seus passos eram firmes, mas a hesitação estava presente em seu semblante.
, cuidado. Isso parece ser perigoso. Se realmente é o cetro Was… — Engoliu a seco, o tom de preocupação presente em cada palavra. — Você não sabe o que está tocando, olhe esses símbolos. — Apontou para inscrições ao redor do cetro que até então sequer havia se dado conta. Ela estava concentrada demais no artefato encontrado.
— Khaled, você não pode estar falando sério. É o cetro de Seth! — Sua voz ecoou quase esganiçada.
— Mas olhe… Leia os símbolos! Eles alertam sobre o caos e a destruição — insistiu com urgência. — O cetro parece estar amaldiçoado, .
— Que idiotice, Khaled. Você sabe que eu não acredito em maldições. — Soltou uma risada baixa, no entanto, sua voz parecia carregar uma nota de incerteza.
O olhar da arqueóloga voltou a se fixar no artefato. Logo atrás deles, o restante da equipe parecia prender a respiração, e Layla Farouk chegou a fechar os olhos e os apertar para não ver mais nada. Conhecia a chefe o suficiente para saber que a curiosidade venceria .
ignorou a voz que repetia dentro de si que precisava se afastar e que não acreditar em maldições não a impediria de sofrer com uma.
— Que besteira — resmungou para si mesma, e, antes que qualquer um pudesse impedi-la, estendeu a mão e tocou o cetro.

No mesmo instante em que seus dedos o envolveram, uma onda de energia percorreu todo seu corpo. Foi como se o tempo parasse por um breve segundo e as pessoas ao seu redor simplesmente evaporassem.
A luz ao seu redor pareceu vacilar, uma brisa inexplicável percorreu toda a câmara, e arregalou os olhos, surpresa, mas não soltou o artefato, muito pelo contrário, ela o segurou com ainda mais firmeza.
À sua volta, o restante da equipe encarava a cena petrificada, quase como se esperasse o pior acontecer com a arqueóloga.
No entanto, da mesma forma que a onda de energia veio, ela foi embora, e, de repente, tudo estava de volta ao seu lugar. tornou a sentir que não estava só e, após engolir a seco, olhou em volta e abriu um pequeno sorriso para Khaled.

— Viu? Falei que era besteira.
A poucos metros dela, Layla soltou a respiração que prendia.
— Pelos deuses! — exclamou baixo, porém ainda assim atraiu a atenção de , que riu e negou com a cabeça.
— Não foi hoje que você se livrou de mim, Farouk. Agora anda, vamos levar essa belezinha para a base.
A assistente arregalou os olhos.
— Você tá falando sério? Vai levar isso conosco?
— E deixar uma descoberta dessas para trás, Lay? Depois eu que sou a louca aqui. — Negou com a cabeça.
Ninguém parecia muito seguro sobre aquilo, porém, ainda assim, obedeceram a arqueóloga, e, em alguns minutos, o cetro Was estava devidamente armazenado, enquanto eles davam a escavação do dia por encerrada.

🌙

O restante da equipe já havia se recolhido às suas tendas há algumas horas, porém sabia que não conseguiria fazer o mesmo. Sua mente trabalhava a mil, ela precisava de respostas e não descansaria sem obter ao menos uma parcela delas.
Na penumbra da tenda principal, a arqueóloga ajustou a iluminação do pequeno espaço e a luz amarelada criava sombras que dançavam nas paredes, o que destacava os artefatos dispostos em mesas improvisadas.
Encarou seu reflexo em um pequeno espelho que guardava consigo e ajeitou os cabelos como pôde antes de sentar à frente de seu laptop e iniciar uma chamada de vídeo com Steven Grant.
O rosto familiar dele não demorou a surgir na tela. Pilhas de livros e papeis espalhados o cercavam e seus óculos estavam um pouco tortos. sorriu quando o notou ajeitá-los e pigarrear antes de retribuir de forma desajeitada.

— O-oi, ! Você não deveria estar dormindo? Que horas são aí?
— Já está me dispensando logo de cara, Grant? — Ela ergueu uma sobrancelha, e ele arregalou os olhos e imediatamente negou com a cabeça.
— O quê? Claro que não! Só estou preocupado. Você parece cansada e animada.
— Ah, valeu. — rolou os olhos e o notou suspirar envergonhado.
“Sutil como uma pena, Grant”, Marc murmurou na mente de Steven, que precisou controlar a vontade de revirar os olhos.
— Droga. Não! Espera, vamos começar de novo… — Ajeitou a postura, e a arqueóloga conteve uma risada. — Oi, ! O que você encontrou desta vez?
Aceitando a proposta, sorriu e se inclinou um pouco para frente.
— Steven, você não vai acreditar! — A empolgação estava mais do que evidente em seu tom de voz. — Demos de cara com algo simplesmente incrível… — Tentou fazer mistério, porém não conseguiu se conter. — Um cetro Was intacto!
— O quê?
— Sim! Isso que você ouviu. O encontramos em uma tumba que não era aberta há séculos, e as inscrições ao redor dele são fascinantes e perturbadoras.
Grant estreitou os olhos, intrigado, embora a animação dela fosse um tanto contagiante. Adorava vê-la entusiasmada daquela forma.
— Perturbadoras como?

Como se estivesse esperando por aquela pergunta o tempo todo, virou a câmera do laptop para mostrar o artefato disposto em uma mesa separada dos demais, seu brilho se ressaltava de forma sobrenatural. À sua volta, havia fotos dos hieróglifos que o cercavam.
Steven prendeu a respiração.

— Isso é… Isso é realmente inacreditável — por fim, ele murmurou e ajeitou os óculos novamente. — O cetro Was sempre foi um símbolo de autoridade e poder divino, mas essas inscrições…
voltou a câmera para si e seu sorriso oscilou.
— É aqui que as coisas ficam estranhas, Steven. Tanto os hieróglifos à volta do cetro como os das paredes descrevem Seth controlando um guerreiro. Um ser humano, se não estou enganada, que ele transformou em uma extensão de sua própria vontade. Os desenhos contam que esse guerreiro subjugava os inimigos de Seth sem piedade, completamente sob o controle do deus.
Grant ficou em silêncio por um momento, enquanto absorvia aquelas informações, então pegou um dos livros ao seu lado e começou a folheá-lo freneticamente.
… — iniciou, enquanto continuava com sua busca. — Isso não é comum, você sabe, não é? Seth raramente é retratado como tendo um avatar humano. Ele era o próprio caos agindo diretamente. Você tem certeza dessas traduções?
— Absoluta. — Seu tom era confiante. — Khaled ficou me enchendo a paciência o tempo inteiro sobre como isso é perigoso e eu deveria deixar para lá, mas, Steven… Tem noção da descoberta que fizemos? Isso… isso é grande demais. Não pode ser ignorado. Eu preciso de respostas, a ciência precisa, e não podemos simplesmente nos deixar levar por superstições.
Marc, na mente de Steven, soltou um muxoxo em alerta. Grant se inclinou para mais perto da câmera, como se desejasse atravessar a tela naquele instante.
, isso não é só superstição. Às vezes as histórias possuem mais verdade do que gostamos de admitir, não é assim? — Engoliu a seco ao perceber que havia de alguma forma captado a atenção dela. — Um guerreiro controlado por Seth? Isso soa como algo além de uma metáfora. Me parece mais uma advertência.
— O que está dizendo, Steven? Que acredita mesmo que esse cetro é mágico e pode, sei lá, controlar humanos?
A hesitação de Grant era palpável. Ele sabia que sua resposta soaria completamente absurda, mas, ao mesmo tempo, Marc tinha razão em estar preocupado.
— Só estou dizendo para você tomar cuidado. Esses símbolos, essa história… Eles não são apenas registros do passado, entende? Eles têm peso.
“Diga logo a ela que está brincando com fogo”, Spector interveio, e Steven fechou os olhos por um momento, numa tentativa de ignorar sua presença.
— O que mais dizem esses hieróglifos? Alguma menção ao que aconteceu com o guerreiro?
— Difícil dizer… A identidade dele também é um mistério. As paredes retratam apenas uma figura encapuzada, mas os olhos vermelhos sugerem que ele foi consumido. Como se o controle de Seth fosse tão absoluto que o guerreiro perdeu completamente sua humanidade. As últimas linhas dizem algo como: o servo do caos não é mais homem, mas o caos em si.
Steven estremeceu.
— Isso é horrível.
A arqueóloga soltou uma risada nervosa, numa forma de tentar aliviar a tensão.
— Do jeito que você fala, até parece que o cetro vai sair andando sozinho para atacar alguém, Steven. É só um pedaço de história. Fascinante, é claro, mas inofensivo também.
— E se não for? — A voz de Grant soou mais firme do que o normal. — E se o cetro for exatamente como os hieróglifos dizem? Um instrumento de controle. Você sabe disso tanto quanto eu, , Seth não era apenas o deus do caos. Ele era traiçoeiro, manipulador. E se esse cetro realmente fosse usado para controlar alguém, quem sabe o que ainda pode fazer?
Alguns segundos de silêncio reinaram entre eles. A tensão era palpável. nunca tinha o visto tão sério. Normalmente, Steven ficaria tão empolgado quanto ela, porém naquele momento a arqueóloga podia sentir a preocupação sincera por trás de suas palavras.
— Eu… — Ela respirou fundo e fixou seus olhos nos dele. — Eu prometo que serei cuidadosa, tá bom? — Um sorriso suave brotou em seus lábios. — Não vou fazer nada imprudente.
Grant pareceu relaxar um pouco, embora uma parte dele, aquela que Marc ocupava, desconfiasse, porque conhecia muito bem.
A preocupação ainda estava em seus olhos quando ele tornou a falar.
— Tudo bem então, mas se você sentir qualquer coisa estranha, qualquer coisa mesmo, me ligue na hora. Não importa o horário, .
O sorriso da arqueóloga se ampliou.
— Você é um bom amigo, Steven. — Sua voz carregava gratidão.

“Amigo…” Marc zombou em sua mente, e Grant desviou o olhar em uma tentativa de esconder o rubor que subiu às suas bochechas.
fingiu não notar, porém estava mais do que evidente que seu comentário havia gerado um desconforto nele.

— Por favor, tome cuidado, sim? E tente não ficar sozinha com esse artefato.
— Pode deixar. Vou só fazer mais umas anotações e caio na cama, prometo. — Piscou para Grant.
— É sério. Que horas são aí? Duas da manhã?
riu.
— Por aí.
— Então vai logo. Nós dois sabemos como você é de manhã quando não consegue dormir direito na noite anterior. — Abriu um sorriso meio sem jeito para ela, que negou com a cabeça.
— Até mais, Steven.
— Até, .

Depois que a chamada foi encerrada, Grant permaneceu sentado em silêncio, enquanto olhava para a tela escura de seu laptop. Uma inquietação crescia dentro de si, algo que não conseguia explicar.
“Ela não vai ouvir, Steven”, Marc finalmente se pronunciou, e Grant pôde vê-lo em seu próprio reflexo. “Mas tem algo de errado com esse cetro. Você sabe disso”.
Um suspiro escapou de seus lábios.

— Eu sei, mas… O que eu posso fazer a essa distância toda?
Spector ficou em silêncio por alguns segundos.
“Não temos tempo, Steven. Você sabe exatamente o que precisamos fazer”.
As batidas aceleradas de seu coração apenas evidenciaram a urgência. Grant fechou os olhos, numa tentativa de abafá-las, porém foi totalmente em vão.
— Tem razão. O tempo está se esgotando.
O homem se levantou bruscamente.
“Espera, você está mesmo concordando comigo?”

🌙

A noite havia caído sobre o acampamento da escavação, e o silêncio envolvia as tendas como um cobertor pesado. O vento do deserto soprava de maneira inquietante, sussurrava entre as dunas e agitava a lona das barracas. estava sozinha em sua tenda de trabalho, a luz da lanterna oscilando suavemente enquanto ela revisava suas anotações.
Seus olhos pousaram, mais uma vez, na imagem do cetro Was na tela do laptop. Algo sobre o artefato não a deixava em paz. Não era só a sua beleza impecável ou sua importância histórica. Havia algo mais, algo que ela não conseguia explicar, mas que parecia puxá-la para ele, como se o cetro tivesse vida própria.
desviou o olhar para o canto da tenda onde o cetro estava guardado, envolto em um tecido de linho para protegê-lo. De repente, um brilho fraco e dourado atravessou o tecido, iluminando levemente a lateral da tenda. congelou, piscando várias vezes para ter certeza de que não estava imaginando.

— O que...? — sussurrou e se levantou lentamente.
O brilho aumentou, pulsando como um coração batendo. E então, ela ouviu.
Sussurros.
Eram baixos, quase inaudíveis, mas inconfundíveis. Palavras em uma língua antiga que a arqueóloga não conseguia compreender ecoaram na tenda, como se viessem das próprias as paredes e mergulhassem diretamente em sua mente.
Engolindo em seco, se aproximou do cetro, cada passo pesado e hesitante. As palavras de Steven misturadas às suas próprias ressurgiram como um protesto.



A mulher parou, com o coração prestes a saltar pela boca. O som parecia trazer seu nome, mas não havia ninguém ali. Sua única companhia era o vento que batia contra a lona da tenda.
Com a respiração cada vez mais acelerada, ela estendeu a mão para o cetro. O brilho pareceu responder à sua proximidade e pulsou com mais intensidade.
Os sussurros ficaram mais altos, agora carregados de urgência, e sua cabeça começou a latejar como se tivesse acabado de receber uma pancada.

...

Ela girou bruscamente, sua alma parecia prestes a saltar de seu corpo e arrepios percorreram sua espinha quando teve a certeza de vislumbrar algo pelo canto de seus olhos. Um vulto negro parecia se mover na borda da luz da lanterna, uma forma indisdinta, mas que a causou uma certa sensação de familiaridade antes de desaparecer. A aparição havia sido curta demais para que a mulher conseguisse focar em algum ponto.

— Quem está aí? — Sua voz ecoou esganiçada pela tenda, mas a única resposta recebida foi o silêncio do deserto.

Se aquilo tudo fosse alguma pegadinha dos outros pesquisadores, ela os faria pagar.
No entanto, no fundo sabia que não era o caso. O medo e a urgência eram reais.
Tremendo, mas ainda atraída pelo cetro, voltou sua atenção para o objeto e respirou bem fundo.

— É só a minha imaginação. — Tentou enganar a si mesma, como se aquelas palavras pudessem afastar a inquietação crescente, e soltou uma risada quase descrente.

Talvez estivesse sonhando. Era totalmente a sua cara acabar dormindo deitada na mesa de trabalho, e provavelmente estaria até mesmo babando no cetro.
Sim. Fazia sentido. E quem sabe se tapasse o artefato a realidade a chamaria de volta.
Perfeito, estava decidido.
No entanto, quando estendeu a mão novamente, o brilho dourado se intensificou até preencher a tenda. A luz ofuscante queimou os olhos, mas, de repente, não podia mais recuar. Algo dentro dela dizia que precisava ir adiante, precisava tocá-lo.
Os sussurros se transformaram em um coro, reverberando em sua mente. Palavras desconhecidas pareciam se entrelaçar ao seu nome e atravessar seus pensamentos, a empurrando para frente.
Toque-o.
Toque-o.
Toque-o.
E então, finalmente, seus dedos envolveram o cetro.
O mundo pareceu parar.
A luz explodiu em um clarão ofuscante, estava em todo o lugar, atravessava cada um de seus poros. sentiu uma onda de energia percorrer seu corpo, como se cada célula fosse incendiada e congelada ao mesmo tempo. Tremeu como nunca na vida e tentou gritar, mas nenhum som saiu.
Atrás dela, o vulto voltou a aparecer, agora mais claro sob o brilho dourado. Era uma figura parcialmente humana, mas distorcida, quase como uma sombra viva, com olhos que pareciam vazios e famintos. A cabeça se distinguia em um formato que ela sentia que deveria reconhecer, mas estava atordoada demais pela luz para distingui-la de fato.
O vulto se aproximou lentamente, enquanto permanecia imóvel, paralisada pelo impacto do cetro e a onda de poder que circulava dentro de si.
Precisava se mexer. Precisava parar com aquilo, precisava…
Mas antes que pudesse reagir, antes que pudesse sequer se mover, o brilho dourado se tornou insuportável e consumiu tudo ao seu redor, carregando consigo.
O som de algo pesado caindo no chão foi a última coisa que ecoou pela tenda.
E então, o silêncio e a escuridão tomaram conta novamente.


Continua...


Nota da autora: Finalmente eu trouxe uma att dessa história que mal começou e eu já amo. Essa temática é uma das minhas favoritas e está sendo um grande desafio escrever algo assim. Espero que estejam gostando!
Comentem muito pra eu saber, tá?
Beijos e até a próxima.
Ste a.k.a. Saturno. ♥

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