Última Atualização: 16/04/2025
Quando eu era criança, meu pai costumava me contar histórias fascinantes sobre a grandiosidade de ter irmãos. Ele dizia que ser parte de uma família da máfia era uma benção, um símbolo de lealdade sagrado que transcendia qualquer coisa. Por um tempo, acreditei nisso com fervor infantil. Contudo, à medida que cresci, percebi que ter irmãos Rossi era como dançar na borda de um vulcão: emocionante, mas sempre à beira da destruição.
Caminhei em passos furiosos em direção ao quarto de , e seus soldados, sabiamente, não ousaram me parar. Com apenas um olhar meu, afastaram-se, permitindo que eu seguisse meu caminho sem obstáculos. Minha aura carregava uma mistura de indignação e frustração. A ira estava exposta em meu rosto e eu sabia que qualquer um que me olhasse, saberia pelo estampar de minhas feições que hoje não era um bom dia.
Meu irmão mais velho, , era brilhante o suficiente para liderar a máfia, mas sua inteligência muitas vezes sucumbia a imprudência, especialmente quando se tratava de mulheres. O maledetto havia se envolvido romanticamente com uma aliada, quase desencadeando uma guerra que poderia arruinar anos de uma estratégia meticulosamente planejada por mim.
Abri a porta do quarto de com força, o rangido das dobradiças ecoaram como uma melodia e o som da porta de madeira contra a parede soou como músicas aos meus ouvidos. Ao adentrar o quarto do meu irmão, fui recebida pela luxuosidade que normalmente eu admirava e lá estava ele, deitado na cama, com uma mulher qualquer ao seu lado. O sorriso convencido dele e a expressão indiferente dela combinavam de uma maneira que fazia o meu sangue inteiro ferver. Ele estava ali, deitado como um rei em seus aposentos, logo depois de quase ter causado uma guerra! Dío mio!
— Bianca, sorellina, que prazer inesperado. — A ironia na voz de era evidente.
— Prazer inexistente, . — Minha resposta foi pontuada pela amargura que borbulhava dentro de mim. A cama que ele compartilhava com qualquer mulher, as alianças perigosas que ele formava sem consultar a mim, a consigliere da família, tudo isso era um lembrete constante de sua imprudência.
A mulher, compreendendo que o seu papel naquela peça já havia se encerrado, vestiu-se apressadamente, lançando-me um olhar amedrontado antes de deixar o quarto. , por outro lado, permaneceu deitado, observando-me com uma serenidade que só aumentava a minha irritação.
— Pelo menos ela sabe quando a festa acabou.
— Alguma vez você já considerou bater antes de entrar, Bianca? — perguntou, seus olhos cintilavam indiferença.
— Você, , é um idiota! Dormir com Agnessa? Você pensa com o quê, exatamente? Certamente não é com a cabeça de cima.
suspirou, provavelmente entendendo que eu não deixaria o assunto morrer facilmente.
— Foi apenas uma decisão estratégica do momento. Agnessa e eu agora somos aliados, nada mais.
— Aliados com base em sexo casual? Que grande lealdade você conquista das pessoas que podem te matar. — O tom irônico saia de minha voz de forma natural, eu não podia conter a minha irritação e tampouco o sarcasmo que vinha dela. — Você ignorou a minha estratégia, fugiu do plano e me deixou em uma posição delicada.
— Você está grávida, Bianca. Pode pegar leve por pelo menos uma vez na vida? — Respirei fundo, tentando manter a calma, mas era impossível mantê-la quando se estava diante de um Rossi.
— Estou grávida, não cega. Além disso, minha gravidez não invalida a sua estupidez, . Você não pode ser impulsivo, nossa família não pode se dar ao luxo disso! Você é o Don e eu te respeito, mas isso não te dá o direito de agir sem pensar nas consequências. Seus passos afetam todos nós.
— Eu assumi a responsabilidade de liderar esta família quando nosso pai partiu. Não vejo isso como um privilégio, eu sei que é o meu dever. Você não precisa me lembrar disso a cada passo.
— Então, aja como um líder, não como um adolescente impulsivo. Ou será que vou ter que cuidar da família e do negócio enquanto você brinca de comer a inimiga?
A troca de olhares entre nós dois permaneceu intensa, sentou-se na cama, com o lençol sobre seu quadril e levou as mãos até a cabeça, bagunçando mais dos cabelos escuros.
— A aliança com a Bratva é crucial para a segurança da famiglia. — A forma como ele tentava justificar suas ações mantinha minha expressão endurecida. Eu sabia que a aliança era importante, mas Dmitri poderia ter considerado uma ofensa e ter iniciado uma guerra. Todos sabiam a fama dos Mozorov. O líder da Bratva costumava utilizar sua filha não apenas como uma peça em seu tabuleiro de xadrez, mas como um símbolo de poder e controle, claro que uma interrupção de nos levaria ao caos imediato.
Além disso, os russos mantinham o sexo como uma legitimação do casamento e das alianças provenientes dele. Agnessa e não tinham casado, eles tinham fodido. Por pouco, quase foderam com tudo.
Essa união imprudente poderia ter desencadeado uma reação em cadeia de consequências catastróficas. Os russos eram conhecidos por sua feroz lealdade às tradições e à honra, e uma afronta como essa poderia levar a represálias impiedosas.
— Crucial para a segurança da famiglia ou para a sua libido? Não me diga que agora você confunde uma aliança estratégica com uma noite de prazer passageira. — Os olhos de fixaram-se aos meus, impaciente, faiscando com uma teimosia característica. — Você não entende o risco que correu? Dimitri é perigoso.
— Eu sei lidar com os russos, Bianca. Não subestime minha capacidade de negociar. — Ele ergueu a sobrancelha, em um tom desafiador e eu ri. Gargalhei.
— Negociar? O que você fez não foi uma negociação, foi uma provocação. Os russos consideram o ato carnal como uma confirmação de compromisso, e você e Agnessa trataram isso como uma simples troca de favores. — Meu tom era impiedoso, eu tentava refletir a gravidade da situação. Por mais que parecesse um exagero meu, não era. Dmitri Mozorov não era apenas um líder sádico da máfia russa, ele seria capaz de desencadear uma guerra que mataria milhares de pessoas, ninguém escaparia, nem mesmo o filho que eu carregava.
Quando estava prestes a rebater, a figura sonolenta de Roman, nosso irmão caçula, apareceu na entrada do quarto.
— Vocês dois podem parar de gritar? Alguns de nós estão tentando dormir, sabem? — Roman murmurou, esfregando os olhos para afastar o sono.
Tanto eu quanto meu irmão mais velho direcionamos os olhares para o mais novo, a incongruência de Roman, com seus cabelos desalinhados e olhos ainda meio fechados trouxe um certo humor à cena.
— Volte para a cama, pupetto. Estamos tendo uma conversa de adultos aqui. — Murmurei, contendo a raiva em minha voz. Roman tinha vinte e quatro anos e, apesar de não ser nenhuma criança, tanto eu quanto havíamos concordado em poupá-lo de situações que poderiam ser evitadas.
Eu e tivemos um amadurecimento precoce, com sacrifícios além do nosso tempo, prometemos que Roman não teria.
— Conversa de adultos ou guerra civil? Porque a gritaria está elevando o meu nível de estresse pré-sono. — Ele bocejou, esfregando a nuca.
— Sorellina, vamos continuar esta conversa mais tarde. — pediu, em um suspiro, o que rapidamente me arrancou uma risada amarga.
— Continuar? Eu mal comecei a expressar minha decepção com suas escolhas, .
— Por favor, se o objetivo é acordar toda a casa, continuem então. Estou pensando em criar uma taxa de perturbação noturna. — Roman bocejou novamente, apoiando-se na porta. Ele nos olhava como se estivesse assistindo a um drama familiar de televisão.
Respirei fundo, acalmando um pouco mais dos meus nervos e caminhei até o loiro, ficando na ponta dos pés para dar-lhe um beijo na testa.
— Dio mio, dê mais juízo a este aqui do que deu ao mais velho. — Roman esboçou um sorriso sonolento, devolvendo-me o beijo na testa.
— Acho que ele só pode fazer milagre com um Rossi por vez.
cruzou os braços, levemente enciumado, enquanto lançava um olhar significativo para Roman.
— Se tem alguém que não tem juízo aqui, Bianca, esse alguém é certamente Roman.
Roman soltou uma risada, aproveitando a provocação.
— Quem diria que o grande Don Rossi tem inveja de mim apenas porque sei me divertir sem gerar uma crise internacional. Você deveria tentar, fratello.
O mais velho suspirou, olhando Roman com impaciência.
— Cala a boca, ragazzo. — Resmungou, antes de voltar sua atenção para mim. — Bianca, eu sei o que estou fazendo, confie em mim. Às vezes é preciso agir por impulso, isso se chama intuição.
— Impulso? , estamos na máfia, não em um romance de verão. — Minhas palavras saíram com uma intensidade que refletia a tempestade de emoções dentro de mim.
O olhar desafiador dele encontrou o meu, e por um momento, ficamos ali, em um impasse silencioso. Eu sabia que não podia mudar meu irmão teimoso, mas precisava fazê-lo entender o peso de suas escolhas. Era a minha função, no entanto, sabendo que não adiantaria continuar neste assunto agora, me aproximei dele e o abracei assim que ele colocou suas roupas. Ele acariciou minha barriga e beijei-lhe o rosto enquanto ele estava se sentando, já que em pé eu não o alcançaria em seus quase um metro e noventa.
— Seja mais cuidadoso, mio sole. Eu não posso consertar todas as suas burradas. — Deixei a ameaça pairar no ar antes de me virar e sair do quarto, deixando-o com sua teimosia e inconsequência.
Roman, ainda de pé na porta, murmurou consigo mesmo enquanto se afastava:
— Ah, alegria de ter uma família normal...
A porta se fechou, deixando Roman sozinho no corredor. Ele suspirou, coçando a cabeça, antes de se virar e se dirigir de volta ao seu próprio refúgio noturno.
Eu amava meus irmãos, mas amá-los também significava trazê-los à realidade quando era necessário. Cada palavra dura era um lembrete do vínculo forte, mas complicado, que compartilhávamos como famiglia Rossi. Enquanto eu caminhava pelo corredor, as emoções tumultuavam dentro de mim, uma mistura de preocupação, frustração e, apesar de tudo, um amor inabalável que eu sentia por esses dois idiotas.
Eu sabia que, no final das contas, estava cumprindo meu papel como consigliere e irmã. As decisões de podiam ser impulsivas, mas também eram movidas por uma lealdade feroz à família Rossi. Eu só esperava que essa lealdade, misturada com a impulsividade, não nos levasse a um abismo do qual não poderíamos retornar.
O som ritmado dos meus passos na esteira ecoava na academia privativa. Gotículas de suor escorriam pela minha testa enquanto eu corria, a monotomia do movimento mecânico contrastava com a turbulência de pensamentos que invadiam a minha mente. A voz de minha consegliera ecoava por minha cabeça, suas palavras eram como punhais afiados.
Ela era insuportavelmente estratégica, meticulosa em suas análises, e eu a admirava mesmo quando discordava. Bianca possuía uma mente afiada que navegava pelo tabuleiro da máfia com uma habilidade impressionante. Eu admirava sua astúcia, embora relutasse em admitir isso. A verdade era que, sob a fachada de indiferença, eu reconhecia a veracidade das suas preocupações.
A conversa recente sobre Agnessa ainda estava em minha mente. Ela era uma russa belíssima, com uma reputação que precedia qualquer tentativa de aliança. A verdadeira questão estava na confiabilidade dela e na aceitação do seu pai em relação a uma aliança que não envolvesse um casamento tradicional. Os russos eram intransigentes em suas tradições, casando-se apenas entre os seus. Russos casavam com russos, italianos com italianos. A verdade doía, e eu sabia que, mesmo que houvesse uma faísca de interesse entre Agnessa e eu, a ideia de uma aliança de casamento era uma quimera.
Eu acelerava o passo na esteira, tentando afastar os pensamentos tumultuados que Agnessa provocava. Uma mulher como ela podia ser um trunfo, mas também uma armadilha.
Aos trinta e dois anos, a expectativa para que eu contraísse matrimonio tornava-se uma sombra crescente em meu caminho. As conversas nos círculos da máfia e até mesmo dentro da minha própria famiglia eram um eco constante sobre a necessidade de uma aliança matrimonial. A escolha da futura donna, no entanto, era um dilema que eu levava com muita incerteza.
Agnessa, a russa que ocupava meus pensamentos, era uma opção impossível. Seu destino já estava traçado, vinculado a um casamento marcado por seu pai para os próximos meses. A máfia russa, impiedosa em suas tradições, não permitiria desvios em seus códigos rígidos.
Casar-se não era apenas uma formalidade; era uma estratégia que moldaria o futuro da famiglia. A escolha errada poderia resultar em desavenças, e a máfia era um terreno fértil para desconfianças e traições.
Enquanto o suor misturava-se às sombras que dançavam na academia, uma certeza se solidificava em minha mente: a decisão sobre meu casamento seria minha e de mais ninguém.
Em minutos a porta da academia se abriu, revelando a figura descontraída de Roman, meu irmão mais novo e capo da famiglia. Seus olhos azuis brilhavam com uma mistura de curiosidade e diversão, como se ele pudesse sentir a tensão dos meus pensamentos no ar.
— Ah, olha só quem está tentando quebrar a esteira novamente. — Roman entrou com um sorriso torto e sarcasmo evidente em sua voz. — Você devia ir mais devagar. Eu não quero ter que explicar pra Bianca como me tornei Don depois de você acabar morto debaixo desse troço.
Eu suspirei, desacelerando a esteira e balancei a cabeça, ignorando a provocação.
— Eu sei cuidar de mim mesmo, Roman. Não preciso de um guarda-costas na academia.
Ele sorriu, pegando alguns pesos.
— A propósito, Bianca mencionou algo sobre escolher uma donna para você. Alguma candidata em mente, ou está esperando um milagre?
Suspirei, sabendo que a questão do casamento estava sempre pairando sobre mim.
— Estou considerando minhas opções. Não é uma decisão que se toma da noite para o dia.
Roman arqueou as sobrancelhas, fingindo surpresa.
— Rossi, o Don, indeciso sobre qual boceta irá foder? Este é um dia histórico.
— Cuide dos seus próprios assuntos, Roman. Eu não preciso de conselhos amorosos de um Capo que evita compromissos como o diabo evita água benta.
Ele riu, erguendo as mãos em rendição.
— Tocou num ponto sensível, irmão. Prefiro deixar os corações para os românticos como você. — O sorriso zombeteiro de Roman desapareceu aos poucos. Seus olhos azuis perderam um pouco da jovialidade enquanto ele suspirava. — Inclusive, temos um assunto a lidar... Amanhã faz três anos que o Lorenzo morreu, e você ainda não colocou ninguém no lugar dele dentro da famiglia. Sei que vocês eram amigos, mas não acha que está na hora de mover a página?
Encarei Roman com uma expressão séria. Lorenzo era um assunto delicado, uma ferida que, mesmo após tanto tempo, não havia cicatrizado completamente. Seu papel na famiglia não podia ser simplesmente substituído, não por mim.
— Eu sei que é um ponto sensível, , mas não podemos deixar esse vazio por muito tempo. A famiglia precisa de alguém para ocupar o lugar dele.
Eu mantive meu olhar fixo no horizonte, relutante em mergulhar nas memórias que a menção de Lorenzo trazia à tona. Ele não era apenas um subordinado; Lorenzo era um amigo, um confidente que compartilhava das mesmas convicções e lealdade à família Rossi.
— Não é algo que eu possa simplesmente substituir. Lorenzo não era apenas um membro da famiglia; ele era um Rossi. Eu não vou colocar alguém no lugar dele apenas por preencher o vazio. A lealdade dele não pode ser replicada.
Roman assentiu lentamente, reconhecendo a verdade nas minhas palavras. Lorenzo era irreplicável, e qualquer tentativa de substituí-lo seria um desrespeito à sua memória.
— Eu entendo, . Mas a famiglia precisa de um braço direito, alguém para assumir as responsabilidades que Lorenzo desempenhava. Não podemos deixar um vácuo de poder por muito mais tempo.
Meus punhos involuntariamente se cerraram.
— Para isso eu tenho Bianca e você, porra.
A resposta saiu mais áspera do que eu pretendia. Bianca, como minha consigliere, já desempenhava um papel crucial nas decisões estratégicas da famiglia. E Roman, como o Capo, tinha sua própria quota de responsabilidades. A sugestão de Roman tocava em um ponto sensível, e eu não estava pronto para admitir que a dor da perda de Lorenzo ainda reverberava em cada decisão que eu tomava.
Roman manteve o olhar firme, sua expressão era um misto de compreensão e determinação.
— Bianca é brilhante, e eu sou um ótimo Capo, mas não podemos cobrir todas as lacunas, . Lorenzo era único, mas a famiglia não pode se dar ao luxo de ter um vácuo de poder por muito tempo.
Eu respirava fundo, controlando a frustração que ameaçava transbordar. A máfia, como sempre, não esperava por lamentos prolongados. O jogo continuava, e eu sabia que Roman estava certo, mesmo que relutasse em aceitar.
— Eu sei, Roman. Darei um jeito nisso quando for o momento certo. Por enquanto, precisamos focar nos negócios e garantir que a famiglia permaneça forte.
Roman assentiu, parecendo satisfeito com minha resposta. Ele compreendia que a dor da perda de um amigo não podia ser apressada ou resolvida por meio de decisões apressadas. Eu não me permitia demonstrar os sentimentos, mas meus irmãos conseguiam percebê-los sem esforço.
— Você é o Don, . O momento certo é quando você decidir que é.
Agradeci a compreensão do meu irmão com um aceno de cabeça antes de caminhar até o frigobar e pegar uma garrafa de água mineral. Eu gostava da sinceridade que meus irmãos tinham, apesar de encherem o saco, às vezes.
— Vai viajar amanhã? — Roman perguntou, com os olhos curiosos.
— Sim, não negligencio as minhas promessas.
— Quer companhia?
— Não, preciso fazer isso sozinho. — Respondi, fechando a porta do frigobar. A solidão da jornada até o cemitério era uma parte do meu compromisso anual.
Roman assentiu mais uma vez, respeitando a decisão. Os laços familiares entre nós eram fortes, e a confiança mútua permitia que cada um de nós enfrentasse os desafios à sua própria maneira.
Antes de me retirar, Roman deixou escapar um sorriso leve.
— Cuide de si mesmo, irmão. E, se precisar de alguma coisa, sabe onde me encontrar.
— Cuide da Bianca e daquela criança, per Dio.
Um aceno de agradecimento foi a minha resposta enquanto saía da academia. A noite avançava, e eu sabia que as próximas horas seriam dedicadas à preparação para a viagem. A máfia não descansava, mas em meio às sombras dos negócios e do poder, sempre haveria espaço para honrar as promessas feitas no silêncio das lápides. Principalmente quando a morte de um amigo tinha passado por minhas mãos. A culpa pesava sobre meus ombros como um fardo inescapável.
A liderança tem seu preço, mas o custo pessoal é algo que nenhuma posição de poder pode amenizar.
O eco silencioso da mansão Rossi parecia intensificar-se à medida que eu me movia pela escuridão da noite. Era o aniversário de morte de Lorenzo, um compromisso anual que eu mantinha como uma promessa silenciosa a um amigo perdido. A rotina de arrumar a mala antes do amanhecer tornara-se uma tradição, uma jornada pessoal para honrar a memória daquele cuja vida fora ceifada por minhas mãos.
O chiar dos zíperes cortava o silêncio enquanto eu organizava minhas roupas e pertences necessários para a viagem ao cemitério. O traje formal era a vestimenta de respeito que eu usava para enfrentar as sombras do passado, enquanto carregava o peso das decisões que me trouxeram até aqui.
Ao sair do quarto, o corredor escuro se estendia à minha frente, cada passo ecoando nas paredes ornamentadas. As sombras projetadas pela luz da lua filtravam-se pelas janelas, dando um tom melancólico à mansão que era, em sua essência, um palco de tramas familiares.
Descendo as escadas com passos medidos, me deparei com Bianca. Seus olhos, penetrantes e perspicazes como sempre, encontraram os meus. Ela conhecia a tradição que me levava para longe na escuridão da noite. O silêncio entre nós carregava a compreensão não dita das responsabilidades e dos fardos que carregávamos como líderes da máfia Rossi.
— — disse ela, sua voz contendo uma seriedade que só se intensificava na penumbra da noite.
— Bianca — respondi, no mesmo tom.
Ela estudou-me por um momento, como se pudesse decifrar os pensamentos que eu guardava cuidadosamente atrás de uma expressão imperturbável.
Bianca é uma presença constante e complexa em minha vida. Nascemos no seio da escuridão Rossi, fomos criados sob as mesmas sombras que moldaram o destino do nosso pai, no entanto, ela sempre foi mais firme. Ela é a voz que ecoa em minha mente quando a escuridão ameaça consumir-me. Nossa relação é um emaranhado de conflitos, mas principalmente lealdades.
Bianca é a única que ousa desafiar minhas decisões, questionar meus motivos e, de certa forma, manter-me ancorado à humanidade que a máfia muitas vezes tenta corroer. No entanto, isso não significa que nossos caminhos não tenham sido permeados por tensões.
Lembro-me vividamente do momento em que Bianca me revelou sua gravidez. Uma notícia que, mesmo para um líder como eu, reverberou como uma bomba na tranquilidade aparente da mansão Rossi. Eu não queria minha irmã grávida, menos ainda sem que houvesse um casamento. Mesmo que eu matasse qualquer um que a julgasse, a ideia de tê-la como mãe solteira me abalou profundamente. No entanto, Bianca sempre esteve fora de quaisquer padrões.
A notícia quase me levou à loucura. Lembro-me de ter contemplado a ideia de eliminar todos os homens que se aproximaram dela nos últimos meses, uma reação visceral ao instinto protetor que despertava em mim. No entanto, fui impedido por ela mesma. Bianca sorriu e, com uma calma que contrastava com a tempestade em minha mente, me acalmou.
Antes.
Bianca, com sua típica calma que tantas vezes me desconcertava, decidiu que era o momento certo para compartilhar uma notícia e nos reuniu na sala. Um sorriso sutil curvou seus lábios, como se ela estivesse ciente do impacto que suas palavras teriam sobre mim.
Eu estava sentado em uma poltrona, a tensão no ar se intensificando conforme percebia a seriedade em sua expressão. Roman parecia tenso, como se antecipasse uma tempestade que se formava no horizonte.
— Estou grávida — anunciou ela, sem rodeios, e as palavras pairaram no ar como uma bomba prestes a explodir.
Roman desviou o olhar, sua expressão era uma mistura de apreensão, mas não havia surpresa. Eu, por outro lado, senti uma fúria ardente borbulhando dentro de mim.
Grávida.
— Grávida? — Minha voz soou mais áspera do que eu pretendia. O choque inicial deu lugar à irritação. — Bianca, quem é o pai? Quando vai ser o casamento? — A fúria tomou conta de mim quando ela gargalhou, mantendo-se tão calma que irritava.
— Não terá casamento, irmão.
— O filho da puta te abandonou? Quem é o desgraçado, sorellina?
— ... — Roman iniciou, mas foi interrompido por Bianca.
— Eu escolhi fazer isso sozinha. Eu não fui abandonada, mas quem abandonou. — respondeu ela, e seu sorriso tranquilo desafiou a tempestade que se formava em meu interior.
A fúria dentro de mim crescia, uma onda implacável que ameaçava engolir tudo em seu caminho. Em um impulso, levantei-me da poltrona, determinado a tomar medidas extremas para proteger a honra da famiglia Rossi.
Sem hesitação, dirigi-me ao lugar onde guardávamos as armas. Pegando duas pistolas, frias e letais, que se tornariam minhas aliadas na busca por justiça, pelo menos aos meus olhos naquele momento. Carreguei-as com munição, meu olhar fixo no objetivo de eliminar qualquer homem que tinha ousado se aproximar de Bianca nos últimos quatro meses.
A sala estava impregnada de tensão quando retornei, as armas em minhas mãos indicando a tempestade que rugia dentro de mim. Minha irmã, no entanto, não demonstrou medo. Ao contrário, ela riu, uma risada que cortava o ar e desafiava a ferocidade que eu sentia.
— , per Dio, você não pode resolver isso assim. — Sua voz, embora calma, continha uma força inabalável. Minha ameaça de vingança pairava no ar, mas Bianca, com uma serenidade admirável, aproximou-se de mim. Com determinação, ela estendeu a mão para retirar as armas de minha posse, uma tentativa de acalmar o furor que me consumia. — Você acha mesmo que matar alguém resolveria alguma coisa? — indagou ela, olhando diretamente nos meus olhos. — Isso só traria mais problemas para nossa família. Essa não é a solução.
— Não é a solução? — Minha voz era um rugido, a sala parecia encolher com a intensidade da minha ira.
A resistência de Bianca em aceitar a violência como solução começava a penetrar a névoa de raiva que obscurecia meu julgamento. Ela retirou as armas de minhas mãos, depositando-as em um lugar seguro, e em seguida, com gentileza, segurou meus braços.
— Você é meu irmão mais velho, eu entendo a responsabilidade que carrega. Mas não precisa resolver isso dessa maneira. — Seu tom era calmo. — , eu escolhi trilhar esse caminho sozinha, e não quero que você sufoque essa escolha com raiva e impulsividade. Aceite minha decisão sobre minha gravidez, assim como aceita meus planos, e também aceita que sua vida, muitas vezes, fique em minhas mãos. Se confia em mim para entregar-me sua vida, confie em mim sobre minhas decisões a respeito da minha própria.
As palavras dela ecoaram na sala, desafiando a tempestade interna que rugia dentro de mim. Olhei nos olhos de Bianca, buscando compreender o significado mais profundo de suas palavras. Ela não estava apenas afirmando sua independência, mas também clamando por compreensão e apoio.
Após um breve momento de silêncio, minha expressão endurecida começou a ceder. A raiva que me consumia lentamente se transformava em uma aceitação relutante.
— Bianca, eu... — minha voz saiu mais branda, e percebi que a resistência estava se desvanecendo. — Eu confio em você, sorellina. Se confio minha vida em suas mãos, devo também confiar em suas escolhas.
Agora.
— Cuide-se, mi sole. — As palavras dela carregavam uma preocupação genuína, e eu assenti em reconhecimento, antes de continuar meu caminho rumo à noite sombria que me aguardava. O cemitério, com suas lápides silenciosas, esperava para testemunhar mais uma vez a promessa feita na escuridão.
— Espero que, de onde quer que esteja, veja que cumpri minha promessa. Estou cuidando dos seus irmãos, . — Murmurei, afastando-me da lápide em seguida.
Contudo, a serenidade da noite foi abruptamente interrompida pelo estampido de um tiro, um clarão de dor que se irradiou de meu ombro. A emboscada atingira seu alvo, e instintivamente, busquei abrigo atrás de uma lápide robusta, ignorando a dor enquanto conseguia, abri o meu paletó, retirando dali duas armas de pequeno porte, mas o suficiente para minha defesa.
O zumbido do disparo ainda reverberava quando me deparei com a escuridão que escondia meu atacante. A lua, indiferente à violência, iluminava os contornos das lápides, mas o agressor permanecia nas sombras. Cada som se intensificava, o farfalhar das folhas, o ranger distante de uma porta, tudo dificultava os movimentos enquanto eu tentava discernir a posição do inimigo.
As armas pesavam em minhas mãos, minha respiração era controlada, e a dor persistente no ombro servia como lembrança de minha vulnerabilidade.
Os segundos se desdobravam como horas, e a decisão de agir era iminente. Com uma mira precisa, atirei na direção do vulto que se movia sorrateiramente. O som do disparo rompeu o silêncio noturno, ecoando entre as lápides, mas meu adversário, mesmo ferido, conseguiu escapar de minha mira.
Com passos cautelosos, afastei-me do campo de batalha improvisado, guiando-me pela intuição até a casa de Lorenzo. A dor persistia, mas a determinação me impelia adiante. Adentrando o refúgio familiar, mergulhei na escuridão.
Ao me aproximar da casa de Lorenzo, a silhueta imponente de dois dobermans emergiu das sombras, delineando suas formas musculosas e o brilho intenso de seus olhos. Os cães, lançaram um coro de latidos estridentes, como um aviso ressoante que ecoou pela quietude da noite.
A princípio, os rosnados indicavam desconfiança, antecedendo o ataque, uma resposta instintiva à presença desconhecida. No entanto, à medida que meus contornos se tornaram mais visíveis na penumbra, os dobermans, reconhecendo-me, interromperam abruptamente sua manifestação vocal.
A tensão no ar dissipou-se quando os olhares intensos dos cães se suavizaram. Conheciam-me, sabiam que eu não era um intruso indesejado. Seus corpos majestosos, antes tensos e alertas, relaxaram quando, em um gesto de respeito, deitaram-se no chão.
— Bons garotos. — Sussurrei, mantendo o tom de voz baixo para que ninguém me escutasse.
Caminhei pelo interior da casa, guiado pelo instinto e pela memória dos anos compartilhados com Lorenzo. O caminho familiar me levou até o banheiro, onde a luz, ao ser acesa, revelou a extensão do estrago causado pelo ataque noturno.
Ao fitar o espelho, deparei-me com minha própria expressão séria. O ombro ferido pulsava, latejante com a dor aguda. A camisa manchada de sangue denunciava a intensidade do confronto, mas minha atenção se voltou para o espelho, refletindo a resolução nos olhos determinados.
Com cuidado, retirei a camisa, expondo o ferimento que marcava meu ombro. A ferida, agora visível na luz do banheiro, revelou-se profunda, e a bala alojada nela era uma testemunha do que acontecera. Algum filho da puta tinha tentando me matar. Meu semblante impassível escondia a dor física, mas a mente sempre estratégica já trabalhava para decidir os próximos passos.
Respirei fundo, ciente da necessidade de agir com cautela e eficiência. A bala, precisava ser removida para que a cura pudesse começar. Com as mãos firmes, iniciei o processo delicado de extrair o projétil, cada movimento executado com a precisão que a situação demandava.
A luz do banheiro destacava a tensão no meu rosto enquanto eu trabalhava, e a água corrente ajudava a limpar a ferida. O toque da água gelada era um contraste bem-vindo à ardência que persistia.
A bala, agora removida, descansava na palma da minha mão, um artefato que seria guardado como lembrança. Após limpar e cuidar do ferimento da melhor forma possível, permaneci sem camisa.
A sensação de fraqueza era evidente à medida que eu permanecia na casa de Lorenzo. O ferimento em meu ombro, embora tratado superficialmente, ainda pulsava com uma intensidade que denunciava a perda de sangue. Consciente de que não seria seguro sair imediatamente, decidi permanecer no refúgio conhecido, pelo menos até ter certeza da ausência de ameaças externas.
Caminhei pelo corredor da casa, guiado pela memória e pela necessidade de encontrar um local para me recompor. Cheguei ao quarto de Lorenzo. Ao adentrar o quarto, meu olhar percorreu os móveis familiares, agora resguardados pela poeira do tempo. Em um gesto instintivo, dirigi-me ao guarda-roupa e busquei entre as peças de vestuário, procurando uma camisa que pudesse substituir a minha manchada de sangue.
— Coloque as malditas mãos para cima ou irei estourar todos os seus miolos. — A voz feminina cortou o silêncio do quarto com uma ordem firme.
A dor pulsante em meu ombro tornava difícil o movimento, mas ergui as mãos na altura do peito, mais devagar do que a ordem exigia. A presença imponente dos dobermans, agora lado a lado da mulher, adicionava uma camada extra de tensão à situação.
Ao fechar a porta do guarda-roupa para encará-la, a mulher permaneceu como uma sombra, seus olhos iluminados por uma intensidade feroz sondavam cada movimento meu. A expressão de descontentamento se refletia em meu rosto impassível, enquanto o sangue no meu ombro continuava a ser uma lembrança viva da emboscada anterior.
— Traidores filhos da puta. — murmurei, mirando fixamente os animais, que agora me encaravam quase com desdém, o xingamento, no entanto, era mais para mim mesmo do que para ela ou para os cães.
O cheiro familiar da casa de Lorenzo acolheu-me ao chegar. Havia anos desde que ela fora entregue a mim após a morte do meu irmão, e ainda era difícil lidar com a saudade que aqueles cômodos carregavam. No entanto, a luz acesa no banheiro despertou um alerta dentro de mim, incitando-me a agir com cautela.
Silenciosamente, alcancei a arma que mantinha escondida, preparada para qualquer eventualidade. Os passos eram como sombras na penumbra enquanto me aproximava furtivamente do quarto de Lorenzo. Minha mente reconhecia a importância de sempre estar um passo à frente, de antecipar o inesperado.
Ao empurrar a porta entreaberta, a cena revelou-se diante dos meus olhos. Um homem, sem camisa, permanecia próximo ao guarda-roupa, onde uma poça de sangue denunciava a violência que ali ocorreu. A surpresa estampou-se no meu rosto, mas não hesitei.
Mirando a arma na direção do intruso, fiz-me presente.
— Coloque as malditas mãos para cima ou irei estourar todos os seus miolos. — ordenei com firmeza, meu olhar expressando a determinação necessária para enfrentar o desconhecido naquele momento tenso. O brilho frio da arma refletia a seriedade da situação, enquanto eu aguardava, pronta para reagir conforme as ações dele moldassem o desenrolar daquele encontro inesperado.
— Traidores filhos da puta. — O ouvi murmurar, direcionando o xingamento para os meus cachorros.
— Três passos para trás. Agora.
O homem ferido permaneceu onde estava, mas obedeceu às ordens, dando os três passos para trás que eu exigira com firmeza. Seus movimentos eram lentos, marcados pela dor que o afligia pelo ombro que ainda sangrava.
O silêncio pesado, interrompido apenas pelo som abafado dos meus passos recuando, dominava o ambiente. A arma permanecia firmemente direcionada ao intruso.
— O que está fazendo aqui? — indaguei, a voz mantendo-se firme e inquisitiva. A necessidade de compreender as intenções daquele homem guiava minha determinação em proteger a casa que um dia fora lar do meu irmão.
A resposta, no entanto, foi uma pergunta inesperada.
— Foi você que tentou me matar no cemitério?
Arqueei uma sobrancelha, surpresa. Neguei com a cabeça, mantendo a arma direcionada.
— Não, mas posso conseguir fazer isso agora.
O homem continuava a encarar-me sem expressão, como se a dor que devia estar sentindo não deixasse transparecer em seu rosto.
— Quem é você? — indaguei, mantendo a voz firme, enquanto o encarava com olhos inquisitivos. Ele demorou um instante antes de responder, como se avaliasse a relevância da informação que estava prestes a fornecer.
— .
— , hein? — murmurei, mantendo a postura ameaçadora, embora uma pontada de curiosidade tenha se infiltrado em minha voz. — Você deve saber que invadir a casa de alguém não costuma ser bem recebido.
— Essa é sua casa? — Ele perguntou, expressando surpresa pela primeira vez.
— Sua, com certeza, não é. Eu posso atirar em você, sabia? Alegar que você é um tarado, louco, assassino e ladrão.
— Não sou ladrão.
— É só isso que você vai negar?
— É só isso que é mentira.
Sua expressão permanecia inalterada, como se as minhas ameaças fossem apenas zombarias irrelevantes. Era desconcertante como ele parecia não se abalar.
— Então, se não é ladrão, por que estava sendo atacado lá fora? Inimigos? Aposto que tem muitos, considerando seu charmoso comportamento — provoquei, mantendo a postura defensiva, ainda com a arma apontada para ele.
O homem que agora eu sabia que se chamava , olhou-me nos olhos, uma faísca de desafio presente em seu olhar.
— Eu não sou alguém que precisa se esconder atrás de ameaças ou armas. — A voz dele era firme, revelando uma confiança que me irritava profundamente.
— Bem, parece que você está precisando de alguma coisa, considerando o estado em que se encontra. — Ele não respondeu.
— Você ao menos sabe usar essa arma?
Sem pensar muito, direcionei-a ao abajur do lado da cama de Lorenzo e disparei, fechando os olhos com o estrondo antes de voltar a atenção para o homem à minha frente.
— Isso responde sua pergunta?
Minha voz carregava um desafio. O disparo ecoou no quarto, o som reverberando nas paredes enquanto eu reabria os olhos.
A fumaça se espalhou lentamente, acrescentando um elemento visual ao nosso embate silencioso. No entanto, a expressão de permaneceu inabalável, como se aquela demonstração não fosse mais do que um simples gesto insignificante em sua realidade.
O som do disparo ainda ecoava no ar quando , em um movimento rápido e preciso, se aproximou de mim, desarmou-me e prendeu minha mão contra a parede. O contato brusco fez-me soltar um grito surpreso, mas ele manteve a expressão inexpressiva, advertindo-me para ficar quieta.
— Cazzo! O que você está pensando? — Minha indignação escapou em um sussurro furioso enquanto tentava me libertar de seu domínio, mas quanto mais eu tentava me soltar, com mais força ele segurava.
aproximou-se, seu rosto a centímetros do meu, sua expressão inabalável. Ele sussurrou ameaçadoramente:
— Fique quieta. Um tiro pode atrair mais problemas do que você pode lidar.
Engoli em seco, meu desafio se transformando em cautela. A sensação do toque frio da arma ainda persistia, enquanto ele mantinha uma postura dominante.
— Quem diabos é você, e por que alguém estaria atirando em você?
Ele permaneceu em silêncio por um momento, como se estivesse ponderando sobre a resposta adequada. Finalmente, com um tom sério, respondeu:
— Não é da sua conta.
Meu olhar encontrou o dele, uma mistura de indignação e curiosidade.
— Parece que é da minha conta agora. Esta é a minha casa, afinal.
soltou um suspiro audível, como se a minha presença fosse um incômodo.
— Você realmente não tem ideia do que está acontecendo, não é? Uma garotinha brincando com armas.
A raiva ferveu dentro de mim, e minha resposta foi impulsionada por um desejo de desafiá-lo.
— Pelo menos eu sei em qual direção atirar.
O olhar penetrante de intensificou-se, um sorriso sutil brincando em seus lábios.
— O que quer dizer com isso?
— Quero dizer que, ao contrário de alguns, eu sei o que estou fazendo. Se eu atirasse em você, não o acertaria no ombro com uma mira de merda.
O sorriso de desapareceu, substituído por uma expressão mais séria. Ele soltou minha mão, afastando-se com a graça de um predador.
— Você está brincando com fogo, garota. Não sabe com quem está lidando.
Revirei os olhos, ignorando a ameaça não dita. podia ser um mistério, podia também estar com a minha arma agora, mas eu não estava disposta a ceder à sua aura intimidante.
— Eu não tenho medo de você. — Desafiei, cruzando os braços.
Ele se aproximou, seu rosto agora a centímetros do meu. O calor da sua respiração misturou-se ao meu desafio.
— Talvez devesse.
O impacto da sua resposta ecoou em meu íntimo, mas eu não estava disposta a admitir qualquer reação a ele. Em vez disso, decidi mudar o tom da conversa.
— Se você não quer compartilhar quem é, pelo menos me diga por que alguém está atirando em você. Eu não gosto de estranhos feridos entrando na minha casa.
franziu o cenho, ponderando sobre a minha proposta. Parecia que ele estava avaliando o quanto poderia confiar em mim.
— Há pessoas que gostariam de me ver morto. Não é algo incomum na minha linha de trabalho.
— Linha de trabalho? Você é um criminoso ou algo do tipo?
Ele soltou uma risada breve, um som áspero que reverberou no quarto.
Embora a situação estivesse longe de ser apropriada para avaliações físicas, não pude evitar notar a presença marcante de . Seu corpo esguio, mas claramente musculoso, parecia esculpido, cada linha delineada com precisão. Os músculos do seu ombro, onde o sangue escorria, denotavam força e resistência.
Seu rosto, com traços firmes e expressivos, era quase hipnotizante. A barba por fazer adicionava uma intensidade que era difícil de ignorar. Os olhos, por trás da máscara de seriedade, possuíam uma profundidade intrigante, como se escondessem segredos indecifráveis.
O cabelo escuro caía desalinhado sobre a testa, dando-lhe um ar ainda mais selvagem. Era difícil determinar se a desordem era intencional ou resultado da situação em que se encontrava.
Sua altura, evidenciada quando estávamos tão próximos, transmitia uma presença imponente. Eu sempre havia apreciado homens altos, mas ultrapassava qualquer padrão que eu tivesse em mente.
A postura dele, mesmo ferido, era digna e confiante. Cada movimento, cada gesto, emitia uma aura de controle e poder. Mesmo diante de um possível perigo, ele mantinha uma calma perturbadora.
Não pude deixar de sentir um formigamento de admiração diante da figura intrigante que se encontrava diante de mim. Era como se a periculosidade que emanava dele apenas intensificasse sua atração, uma combinação complexa de beleza e ameaça que, de alguma forma, despertava minha curiosidade.
Não de uma forma saudável, ele despertava minha curiosidade da maneira impura que levaria qualquer mulher ao inferno.
— Shh. — Sussurrou em um tom baixo, se mantendo perto demais de mim.
No entanto, antes que eu pudesse pressioná-lo com mais perguntas, um ruído vindo do corredor chamou nossa atenção. Os dobermans começaram a rosnar, alertando-nos de que algo estava prestes a acontecer.
— Não estamos sozinhos aqui. — murmurou, e ambos direcionamos nosso olhar para a porta.
, ainda ao meu lado, pareceu se movimentar com uma agilidade surpreendente, apesar do ferimento no ombro. Seu olhar se intensificou, a seriedade nele ecoando a gravidade da situação. Ele fez um gesto para que eu ficasse quieta, indicando a necessidade de silêncio.
No corredor, as sombras pareciam ganhar vida, dançando ao ritmo de passos cautelosos. Os dobermans permaneciam alertas, mas a tensão no ar cresceu à medida que a aproximação se tornou mais evidente.
Foi então que percebemos a figura se materializando na penumbra. Um homem, vestido com roupas escuras e uma expressão determinada, avançava em nossa direção. Seus olhos, frios, fixaram-se em nós com uma intensidade que arrepiou minha espinha.
O desconhecido continuava avançando em nossa direção, seu semblante decidido contrastando com a tensão que preenchia o corredor. Foi quando agiu, com uma rapidez inesperada para alguém com um ferimento no ombro. Ele puxou uma arma escondida em sua cintura e disparou contra o intruso que caiu no chão em um baque surdo. Os dobermans avançaram em cima do homem caído.
Apesar do tiro que o derrubara inicialmente e das frequentes mordidas, o homem ainda estava longe de se dar por vencido. , no instante seguinte, foi surpreendido por outro disparo, desta vez atingindo-o no abdômen. O impacto o fez recuar, e a dor transpareceu momentaneamente em seu rosto.
Instintivamente, ele revidou, atirando novamente contra o agressor, ouço os cachorros gritarem com o disparo, mas percebo que eles não foram machucados. O silêncio abrupto que se seguiu foi a confirmação de que a ameaça havia sido neutralizada. , embora ferido, manteve-se firme, sua postura revelando uma determinação inabalável. O desconhecido jazia imóvel no chão, a luz do corredor revelando os contornos da cena caótica.
Eu, presa entre o choque e a urgência de agir, fui arrastada de volta à realidade quando , com um semblante tenso, segurou seu abdômen ferido. Sua respiração era forçada, e a expressão de dor estava evidente em seus olhos.
— Pressione aqui. — Ele indicou a ferida em seu abdômen, e eu, superando a hesitação, coloquei minhas mãos sobre o local. O sangue escorria entre meus dedos em uma visão perturbadora que evidenciava a gravidade da situação.
— Maldito seja... — rosnou, mais consigo mesmo do que comigo. A dor parecia arder em cada parte de seu corpo, mas ele não permitiria que isso o enfraquecesse. — Precisamos dar um jeito nisso. Preciso de uma maleta de primeiros socorros, você tem? — Balancei a cabeça rapidamente. — Vá buscar. — Ele pediu com o tom de voz duro, mas o obedeci.
Corri pelas escadas em direção à cozinha, onde sabia que guardávamos um kit de primeiros socorros. O coração acelerado ecoava em meus ouvidos, impulsionado pela urgência da situação. Agarrei a maleta e retornei ao corredor, encontrando ainda de pé, mas claramente afetado pela dor.
Ao entregar-lhe a maleta, percebi que seus olhos, normalmente impassíveis, agora carregavam uma intensidade que revelava a batalha que ele travava consigo mesmo. aceitou a maleta com um aceno de cabeça, abrindo-a rapidamente para acessar os suprimentos necessários.
Enquanto ele trabalhava em sua própria recuperação, me vi em um estado de inquietação. O homem desconhecido permaneceu caído, provavelmente morto. Minha mente oscilava entre a preocupação com a segurança de e a incerteza sobre como proceder diante de tudo.
O silêncio tenso foi quebrado apenas pelos sons suaves dos suprimentos médicos sendo manuseados. Observei agir com uma destreza surpreendente, sua expressão séria e focada a cada movimento, revelava uma habilidade que transcendia a mera brutalidade de conhecimentos adquiridos por acaso.
Após alguns minutos, fechou a maleta e se afastou do local onde tratou de seus ferimentos. Seus olhos encontraram os meus, e o peso da situação se refletiu em sua expressão.
exalou um suspiro profundo, como se o fardo da decisão pairasse pesadamente sobre seus ombros. Ele parecia mais pálido agora, a palidez de seu rosto revelava a perda significativa de sangue.
— Agora, temos que decidir o que fazer com ele.
Minha pergunta escapou antes que eu pudesse ponderar as implicações.
— O que porra você faz?
não respondeu de imediato, seus olhos fixos em algum ponto distante enquanto considerava as opções disponíveis. Seu silêncio era desconcertante, e o peso da situação nos envolvia como uma névoa carregada de incerteza. Finalmente, ele quebrou o silêncio.
— Você não gostaria de saber.