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Revisada por Aurora Boreal 💫
Atualizada em: 28/03/2025

olhou para cima quando seu editor apoiou o quadril na mesa. Os olhos dele não encontraram seu rosto; estavam cravados em seu decote.
— Trabalhando até tarde outra vez, Sid?
— Olá, Tom. Não deveria estar em casa? — retrucou, sabendo bem que ele era casado há mais de quinze anos.
— O que está fazendo? — perguntou, inclinando-se para espiar o monitor dela.
— Redigindo mais um artigo irrelevante que você colocou na minha lista de tarefas.
— Sabe, essas matérias geram mais cliques do que qualquer outra coisa no site do jornal.
voltou a digitar, ignorando-o, mas não resistiu à provocação:
— Pensou no que eu disse na reunião de ontem? Estive na delegacia hoje cedo e falei com um contato. Eles continuam se recusando a investigar as mulheres que estão desaparecendo misteriosamente na zona leste da cidade.
Tom inclinou a cabeça, mantendo o sorriso cínico.
— Você deveria continuar com as matérias pequenas, Sid. Deixe a polícia lidar com os crimes sérios... ou o Batman — ele sussurrou o nome do vigilante com ironia. — Não queremos que algo aconteça a esse rosto bonito.
O olhar dele se concentrou nos lábios da jornalista, e teve que respirar fundo para não revirar os olhos. Desde que chegou a Gotham City, ouviu falar sobre o Batman e de como ele ajudou a reduzir a violência na cidade. Mas ele parecia se importar com mulheres vulneráveis tanto quanto a polícia: nada.
— Quer que eu a leve para casa?
Nem morta.
— Não, obrigada. — virou-se para o monitor e voltou a digitar rapidamente.
Tom a observou por alguns segundos antes de finalmente se afastar, provavelmente indo ao bar onde os repórteres do jornal costumavam se reunir depois do expediente. Gotham City não era exatamente o melhor lugar para uma jornalista buscar oportunidades, mas estava determinada a escrever a maior matéria de sua carreira. Porém, desde que começou no The Gotham Times, seu chefe lhe dava apenas reportagens pequenas e irrelevantes, o que a irritava profundamente.
Colocou um ponto final no último parágrafo daquele texto inútil e clicou no botão "enviar". Olhou o relógio mais uma vez e começou a juntar suas coisas. Já passava das 20h, e logo seria complicado chegar em casa sem ser importunada.
Quando pisou na calçada, sentiu um vento frio que a fez estremecer. Era fim de julho, o verão estava acabando, e logo precisaria comprar novos casacos para se preparar para o outono e o inverno. Caminhou alguns passos pela rua estreita, sentindo o estômago roncar. Não lembrava a última vez que tinha comido, mas pouco importava. Com sorte, encontraria algo que ainda não tivesse estragado na geladeira.
Cinco meses haviam se passado desde que chegou à cidade, mas já conhecia bem aquelas ruas — e os melhores atalhos para chegar ao seu prédio de apartamentos sem ser assaltada, ou pior. Gotham era escura, mesmo durante o dia. Seus becos sujos, à noite, pareciam buracos diretos para o inferno. O clima era frequentemente sombrio, como se uma ameaça constante pairasse no ar. A umidade fazia o ar denso, geralmente acompanhada de uma leve garoa que deixava o pavimento escorregadio. Um lugar onde as sombras escondem segredos. Apesar dos esforços da polícia, a cidade era dominada pelo crime organizado.
Passou por um bar, onde gemidos abafados competiam com a música alta. Um pouco mais adiante, havia um restaurante que servia um ótimo hambúrguer, mas, àquela hora, só os viciados estavam por lá. De longe, ouviu assobios e apressou o passo. Não queria ter que usar o spray de pimenta naquela noite. Estava exausta e precisava de uma taça de vinho antes que seu cérebro desligasse.

**


A água morna da banheira relaxou seu corpo imediatamente. Não tinha sais de banho, mas acendeu uma das velas com fragrância de pêssego que ganhou na festa de fim de ano de seu último emprego. O cheiro adocicado se misturou com a umidade do banheiro e espalhou-se por todo o apartamento pequeno, criando uma atmosfera estranhamente confortável. Tentou não pensar em nada, mas era inútil. Não conseguia tirar da cabeça a situação na redação do jornal.
Queria a posição de repórter investigativa, e não estava disposta a desistir dela tão fácil. Só precisava de um grande furo.
Apanhou a taça de vinho do chão ao seu lado e deu um grande gole no líquido vermelho. Aquele vinho valeu cada centavo, mesmo que tivesse deixado de comprar comida para levá-lo para casa.
Após quarenta minutos de molho, saiu enrolada em uma toalha em direção ao único cômodo do apartamento. Preparou uma porção de pipoca, pois era a única coisa que tinha para comer, e encheu novamente a taça de vinho. Sentou-se no sofá, dobrando as pernas, com a bacia de pipoca posicionada entre elas. Não ligaria a TV para evitar reclamações dos vizinhos no dia seguinte, então apanhou seu bloco de notas na bolsa e revisou suas anotações.
Nos últimos dois meses, três mulheres sumiram na região da zona leste. Todas eram garotas de programa. A polícia se recusava a investigar por esse motivo. precisava de mais pistas. Teria que ir fundo se quisesse convencer seu chefe a deixá-la escrever sobre o assunto. Com uma matéria grande no jornal, talvez a polícia fizesse algo por aquelas mulheres.
O celular vibrou dentro da bolsa e o susto quase fez com que ela derrubasse o vinho na camiseta velha que usava para dormir. Àquela hora, só poderia ser trabalho. não conhecia ninguém na cidade.
Quando olhou a tela piscando, identificou o nome de Alex, seu informante na polícia. Um detetive jovem, mas tão ambicioso quanto ela.
— Alô?
— Melhor correr até aqui. Um cara foi baleado na frente do Phoenix. O corpo está fresco.
Ela queria dizer que não iria. Queria deitar a cabeça no travesseiro e dormir a noite toda. Mas seria impossível pegar no sono sabendo que algo estava acontecendo a algumas quadras dali.
— Chego em quinze minutos.
chamou um táxi, vestiu um jeans velho, apanhou o casaco e o telefone e desceu para a calçada do prédio.

**


Quando o táxi deixou na frente do Phoenix, o lugar já estava cheio de policiais, mas nenhum repórter. Ela era a primeira no local e sabia que precisaria ser rápida.
Carros da polícia bloqueavam o acesso à cena do crime. O veículo do legista ainda não tinha aparecido, mas a movimentação era intensa. Policiais andavam de um lado para o outro enquanto uma pequena multidão de curiosos começava a se formar, iluminada pelas luzes vermelhas e azuis que piscavam incessantemente das viaturas. A entrada da boate, sempre vibrante com suas luzes de néon, estava agora isolada por uma fita amarela.
sabia exatamente porque Alex havia ligado. O Phoenix era o ponto comum entre todas as mulheres desaparecidas; todas haviam sido vistas pela última vez ali. Alex achava que o que aconteceu ali naquela noite tinha algo a ver com isso.
Avançou pela calçada, desviando dos curiosos, tentando chegar mais perto. Não precisou procurar muito; uma voz familiar a chamou:
— Sid? Por aqui!
Ela esticou o pescoço e avistou Alex do outro lado da rua. Infiltrou-se entre as pessoas, deslizando sob a fita de contenção com a ajuda dele. Sacou o celular do bolso do casaco, pronta para fotografar e anotar cada detalhe.
— O que você pode me contar? — perguntou, sem rodeios.
Alex tragou o cigarro que segurava entre os dentes, a fumaça formando uma espiral em meio à garoa.
— Três tiros à queima-roupa pelas costas. Nada foi roubado.
Uma execução? pensou. Quem quer que fosse aquele homem, sabia demais ou incomodava as pessoas erradas.
— Testemunhas?
Alex lançou um olhar rápido aos cabelos dela, ainda úmidos, antes de soprar a fumaça para o lado.
— Ninguém está falando, você sabe como é.
— E o que você não pode me contar?
Alex jogou o cigarro no chão e o esmagou com a sola do sapato. Pegou um pirulito do bolso, desembrulhou-o com calma exagerada e enfiou o doce vermelho nos lábios. De perto, percebeu novamente como seus olhos verde-água pareciam transparentes. Ele tinha a mesma idade dela, talvez fosse até mais jovem.
Ela sabia que Alex a ajudava porque nutria uma certa queda por ela. Não se incomodava. Aprendera cedo que sua aparência podia ser tanto uma vantagem quanto um incômodo, dependendo de como usava. E, naquele caso, era uma vantagem clara.
— O morto é Roberto Molina — começou ele. — Empresário, dono de uma rede de restaurantes. Chegou pela entrada VIP sozinho, mas passou a noite acompanhado de uma mulher.
— Nome?
Alex tirou o pirulito da boca, pensativo.
— Estou trabalhando nisso. Me dê algumas horas.
estreitou os olhos.
— Por que me chamou, Alex? O que isso tem a ver com o meu caso?
O detetive olhou ao redor, garantindo que ninguém estivesse perto o suficiente para ouvir.
— Molina foi o último a ser visto com a garota de programa que desapareceu semana passada. Ele nem sequer foi interrogado.
ficou em silêncio. Não conseguia entender como a polícia ignorava tantas coincidências. A alguns metros dali, no estacionamento, viu um corpo estendido no chão e decidiu ir até lá.
Uma poça de sangue carmesim fresco era visível no asfalto escuro e úmido pela garoa. O homem estava deitado de bruços, com o rosto virado em direção à rua. Vestia um terno preto elegante, agora marcado pela violência. Sua expressão estava congelada em choque, um lembrete assustador de como a vida podia acabar num instante. Parecia um homem de meia-idade, e uma aliança de ouro grossa adornava sua mão esquerda. Definitivamente, não foi um assalto que deu errado.
voltou para a calçada ao ver os legistas se aproximando. Antes de voltar à calçada, olhou de relance para o Phoenix. Algo em seu instinto a fez erguer os olhos. Acima das luzes de neon, uma sombra enorme se movia. Ele usava uma capa e seu rosto estava coberto por uma máscara. Observou rapidamente a pequena multidão na rua antes de pular para o prédio ao lado, como se pudesse voar.
O Batman.
Nos quase seis meses que esteve na cidade, ouviu muitas histórias sobre ele, mas nunca o tinha visto. Achava que as pessoas exageravam, mas agora, sentindo um frio gelado na espinha com sua aparição, não tinha mais tanta certeza. Sabia que ele ajudava a polícia com crimes mais complicados e começou a questionar se aquele seria o caso naquela noite.
— Você precisa ir para o outro lado da faixa. O comissário Gordon vai sair dali a qualquer momento.
A voz de Alex a trouxe de volta. guardou o celular no bolso e ajeitou o casaco, lançando um último olhar para a boate.
— Me liga quando souber de mais alguma coisa.
Ela acenou para ele uma última vez e caminhou em direção à rua, procurando um táxi que a levasse rápido para casa. Tinha uma matéria para escrever.

**


O salto alto de ecoava pelos corredores da redação enquanto ela andava depressa sobre o chão de madeira. Seu cabelo, antes preso em um rabo de cavalo firme, agora balançava desordenado, com fios soltos escapando do elástico. A redação estava movimentada naquela manhã; o som constante dos teclados, que geralmente soava reconfortante, parecia irritante agora.
Sem bater, entrou no escritório do chefe. Pilhas de papéis e caixas espalhadas pelo chão dificultavam o caminho até a mesa. O editor-chefe, Jameson, era um homem experiente, à frente do jornal havia mais de vinte anos. Atrás da mesa, Jameson, revisava artigos enquanto tragava calmamente um charuto caro.
— Senhorita . Entrou sem bater novamente... — disse ele, sem tirar os olhos dos papéis.
— Por que fez isso? — perguntou, furiosa.
— Do que está falando?
— A matéria sobre o tiroteio no Phoenix é minha! Fui a primeira no local, consegui todas as informações e enviei o artigo com meu nome!
Jameson olhou para ela com aparente tédio.
— Desde quando você é repórter investigativa?
engoliu em seco, tentando controlar o tom.
— Isso não é justo. Eu me esforcei naquela matéria. Eu consegui-
— Você não tem autorização para escrever matérias investigativas — interrompeu Jameson. — Quantas vezes vamos ter essa conversa, querida?
O tom paternalista a fez cerrar os dentes.
— Por quê? Eu sou mais do que competente para o trabalho.
— Eu nunca disse o contrário. Você é ótima com o site. Os acessos triplicaram desde que você assumiu.
Ele fez uma pausa para tirar o charuto da boca e apontou para a cadeira em frente à mesa.
— Obrigada, mas não é o que eu quero fazer — respondeu , recusando-se a sentar.
— Mas foi o que você aceitou fazer quando assinou o contrato.
Jameson descansou o charuto em um cinzeiro grande e prateado sobre a mesa.
— Eu sei, mas quero mais. Quero-
— Você sabe o quão competitivo é por aqui — ele a interrompeu novamente. — Promoções são conquistadas fazendo o seu trabalho, não o trabalho dos outros.
Ele se levantou e caminhou para o outro lado da sala, parando em frente à TV.
— Venha aqui. — Ele olhava fixamente para a tela de plasma.
hesitou, mas foi até ele. Sua paciência estava no limite, mas sabia que não poderia deixar aquela discussão sem uma solução.
Jameson apontou para a tela de plasma.
— Bruce Wayne — começou, sem olhar para ela —, o homem mais rico da cidade, está tentando recuperar o prestígio que sua família tinha. É um playboy, mas o nome dele vende jornal como água.
observou a TV. Um homem alto, de ombros largos, vestindo um casaco que parecia custar mais do que um ano de aluguel, entrava em um Porsche. O cabelo escuro estava fixado com gel, os olhos eram profundos e o rosto, perfeitamente esculpido. Ela já tinha ouvido falar de Bruce Wayne, mas nunca tinha realmente prestado atenção nele. O homem era bonito, quase como um astro de cinema.
— O que ele tem a ver com a minha promoção? — perguntou, franzindo a testa.
— Bruce Wayne não dá entrevistas. Ele evita a imprensa como o diabo foge da cruz.
— Está dizendo que quer uma entrevista com ele?
— Isso mudaria o jogo. Se você conseguir uma entrevista exclusiva para o site, pode ter a promoção que quiser. Menos o meu cargo, é claro.
olhou novamente para a TV, onde o clipe se repetia. Bruce Wayne entrando no carro esportivo. Parecia uma missão impossível.
— Como vou saber que está falando sério?
Jameson deu de ombros e voltou para a mesa.
— Terá que confiar na minha palavra. Mas sabe que estou falando sério. Coloque Bruce Wayne no site com uma entrevista exclusiva, e terá o cargo que quiser neste jornal.
Ela bateu o pé no chão algumas vezes, avaliando a proposta. Não tinha nada a perder.
— Como eu chego até ele?
— Isso é problema seu. É seu trabalho descobrir. Vá atrás dele. Investigue. Não aceite um "não" como resposta. Nós dois sabemos que você é boa nisso.
respirou fundo, já pensando nos desafios.
— Tudo bem. Vou conseguir essa entrevista.
Jameson sorriu, satisfeito, e voltou a fumar o charuto.
— Estarei esperando uma atualização.
A conversa havia terminado. saiu do escritório com uma determinação renovada. Conseguiria aquela promoção a qualquer custo.
De volta à sua mesa, a primeira coisa que fez foi acessar a internet. Digitar "Bruce Wayne" na barra de pesquisa gerou centenas de resultados. Ele era um dos assuntos favoritos dos sites de fofoca. Quem eram suas companhias, que grifes ele vestia, o que comia para manter o corpo em forma. Aparentemente, ele era mesmo o homem mais rico de Gotham, herdeiro da Wayne Enterprises e proprietário de metade da cidade.
Isso que é nascer em berço de ouro, pensou , enquanto analisava imagens dele usando diferentes relógios caríssimos.
Ela odiava homens como Bruce Wayne. A vida era uma grande festa para ele. Sem dúvida, as mulheres se jogavam aos seus pés. Em todas as fotos, ele estava de braços dados com uma modelo diferente.
Como vou chegar perto dele?, refletiu, mordendo a ponta da caneta. Tentar pela abordagem convencional seria inútil. Então, ela pensou em alguém que talvez pudesse ajudá-la.

**


— Você está falando sério?
O olhar incrédulo de Antônio, o fotógrafo do jornal, era melhor do que o olhar lascivo que ele costumava ter em seu rosto toda vez que a via. Ele era o encarregado de seguir e fotografar os figurões da cidade.
— Por que eu mentiria sobre isso? Preciso saber onde encontrar Bruce Wayne, de preferência, longe de outros jornalistas.
Ele a encarou, curioso. A luz negra do minúsculo estúdio fotográfico onde trabalhava conferia um tom misterioso à conversa.
— Sid, Jameson te deu uma tarefa impossível. Ele sabe que você não vai conseguir, por isso prometeu a promoção.
sabia que essa era uma possibilidade. Embora frequentemente subestimada, ela não era burra. Desde que começou no jornal, as pessoas julgavam mais sua aparência do que sua competência.
— Ele acha que não vou conseguir. E você pode se juntar ao time dele, se quiser. Só preciso da informação. Pode me ajudar ou não?
Antônio suspirou, hesitando, antes de responder:
— Tudo bem, vou entrar no jogo.
Ele começou a mexer no tablet, deslizando os dedos pela tela enquanto consultava uma agenda ou algo do tipo.
— Ok, tem um baile amanhã para arrecadar fundos para o Hospital Infantil. O Wayne fez uma grande doação e será homenageado. Com certeza, ele vai estar lá.
— Amanhã está ótimo. Quanto mais cedo eu falar com ele, melhor.
Antônio sorriu de canto.
— Adoro essa sua confiança, Sid. É muito atraente.
— Como eu entro? — ela rebateu, ignorando o comentário.
— Vou pegar minha credencial mais tarde. Isso vai te colocar dentro da festa. O resto é com você.
— Pode deixar.
começou a pensar no que vestir. Fazia anos que não se fantasiava de burguesa.

**


Bruce checou seu Rolex mais uma vez e olhou ao redor do salão do Starlight Hotel. O lugar estava decorado com o que há de mais luxuoso. As mesas redondas, cobertas com toalhas de seda em tons de marfim e dourado. No centro de cada mesa, arranjos florais luxuosos elegantemente dispostos em vasos de cristal. Candelabros com velas acesas acrescentavam um toque romântico, iluminando os rostos dos presentes com uma luz suave. Tudo de melhor que o dinheiro podia comprar.
Ele calculou rapidamente: faltavam 35 minutos para terminar a ronda de apertos de mão e sorrisos forçados. Estaria livre a tempo de subir ao palco, fazer seu discurso e sair antes que o jantar fosse servido.
Enquanto seus olhos percorriam o salão, procurou Camilla — ou seria Carmen? Não, era Camilla. Filha de um diplomata estrangeiro, ela estaria na cidade por três dias. Ele já havia passado algum tempo ouvindo-a falar sobre si mesma, uma interação que terminaria com uma desculpa bem formulada para que ela fosse sozinha para o quarto do hotel. Um ritual já conhecido, repetido em cada evento.
A festa também era a mesma todas as vezes. Tudo girava em torno de jantares que custam 5 mil dólares o prato. Mulheres com joias e vestidos longos, homens de smoking fumando charutos e bebendo champanhe. Tudo aquilo era uma fachada para corrupção, falsidade e mentiras. Gotham estava afundada na lama. E por mais que tentasse, Bruce não conseguia limpar aquela sujeira.
Bruce sentiu alguém se aproximar dele por trás. Virou o corpo e se deparou com o diplomata pai da sua acompanhante, os dois estavam de braços dados e já pareciam ter tomado champanhe demais.
— Boa noite Sr. Wayne. Me desculpe por roubar Camilla de você. Mas tem algumas pessoas aqui que quero que ela conheça.
Bruce forçou seu melhor sorriso. O homem não parecia tão velho, mas sua cabeça já estava cheia de cabelos brancos.
— Por favor, apenas Bruce. E não se preocupe, quando a convidei para ser minha acompanhante, eu já sabia que o senhor tinha interesses próprios neste evento.
— Ainda vamos embora juntos?
Camilla perguntou, piscando para ele. Bruce teve que se conter para não revirar os olhos.
— Estarei esperando — respondeu, com um sorriso automático.
Os dois se afastaram no momento em que um casal se aproximou. Conhecia os dois, eram importantes para seu propósito ali.
Desde o ataque à cidade, há quase um ano, que revelou alguns segredos da sua família, Bruce vinha tentando limpar a imagem ruim do sobrenome Wayne. E só por isso que estava ali há mais de uma hora apertando as mãos de pessoas que não gostava e sorrindo sem vontade, ao invés de patrulhar a cidade como fazia todas as noites.
Só mais vinte minutos, e ele poderia dar uma desculpa para ir embora. Ainda tinha que posar para fotos e fazer a encenação de sempre para os paparazzi na porta do hotel, e então ele iria para casa e-
Foi quando algo, ou melhor, alguém, chamou sua atenção.
Ele olhou através da multidão para uma mulher de pele marrom dourada e cabelos negros que tinha acabado de chegar. Vestida com um vestido prateado brilhante, ela estava parada na entrada do salão, parecendo radiante demais para ser real.
Ele não a reconheceu. Bruce tinha certeza que conhecia todos os convidados da festa, olhou pessoalmente a lista.
Todos no salão pararam o que estavam fazendo para olhar para ela. E como não? A mulher chamava a atenção.
Com seus cabelos negros presos no alto da cabeça, feições delicadas e seus olhos grandes da cor de chocolate, ela era deslumbrante. E aquele vestido… Bruce não entendia de moda feminina. Mas aquele vestido era perfeito. Moldado ao seu corpo, ele se movia como água enquanto ela caminhava para dentro do salão.
Cristo, ela era linda, ele pensou.
Bruce franziu a testa. Não costumava ficar tão impressionado com mulheres, já fazia muito tempo.
Quando chegou ao meio do salão, ela se virou na direção dele e encontrou seus olhos. Suas sobrancelhas se ergueram majestosamente quando ele não desviou o olhar.
Talvez eles já se conheciam? Não era possível esquecer aquele rosto. Talvez não gostasse de ser encarada daquele jeito, mesmo que todos os homens da festa estivessem fazendo o mesmo. Ele ainda estava olhando quando ela o analisou de cima a baixo. Bruce sentiu seu corpo reagir.
O que havia de errado com ele?
Ele escondeu sua reação enquanto ela o examinava. Quando finalmente conseguiu desviar seu olhar, apanhou uma taça de champanhe de um garçom que passava por ali.
Mais 10 minutos até o discurso. Estava mesmo na hora de ir. Sentia-se tão cansado daquilo tudo. Não conseguia se livrar da culpa e da sensação de que nada que ele fazia ajudava de verdade.
Quando o organizador da festa veio chamá-lo, ele já estava desesperado para sair dali.
No pequeno palco já estavam o prefeito e o secretário de saúde. Bruce ficou ali, esperando sua vez de falar.
— Senhoras e senhores, estimados convidados e queridos amigos — ele começou, cumprimentando os presentes. — Obrigado por se reunirem aqui hoje. É uma honra estar diante de vocês enquanto nos unimos por uma causa que ressoa profundamente em meu coração: a saúde e o bem-estar de nossas crianças. Hoje, tenho orgulho de anunciar em nome da Wayne Enterprises uma doação de 2 milhões de dólares. A doação de hoje é apenas um passo. É um investimento no futuro da nossa comunidade, um compromisso com a saúde de nossas crianças e uma promessa de apoiar as famílias que dependem deste hospital.
Bruce olhou no rosto de cada um naquele salão enquanto falava.
— Vamos lembrar que não se trata apenas dos fundos que arrecadamos hoje, mas das vidas que tocamos e dos futuros que mudamos. Obrigado pelo seu apoio e vamos continuar trabalhando lado a lado para fazer a diferença na vida daqueles que mais precisam em Gotham.
Os aplausos surgiram imediatamente. Algumas mulheres estavam emocionadas. Foi uma ótima ideia deixar que Alfred escrevesse aquele discurso.
Após apertar a mão do prefeito e do secretário, ele saiu do palco, cumprimentou mais algumas pessoas e viu que todos já começavam a se sentar para o jantar.
Bruce olhou o relógio mais uma vez, e quando levantou a cabeça, ela estava na sua frente.
— Boa noite, senhor Wayne.
A voz dela era suave e baixa, quase como uma carícia. Bruce abriu um sorriso e estendeu a mão.
— Boa noite. Nós nos conhecemos?
Questionou porque estava realmente curioso.
O sorriso que ela ofereceu foi gentil e convidativo, nada como o sorriso falso que estava acostumado a ver na maioria das pessoas naquela festa.
Os olhos dele piscaram sobre ela. Ela deveria ser uns 15 centímetros mais baixa do que ele. Os seios dela estavam escondidos no vestido prateado, mas ele conseguia ver claramente o formato perfeito. A cintura fina e a curva dos quadris. A fenda do vestido mostrava que tinha pernas longas. Ele também notou o perfume dela, algo leve e delicado como frésias que penetrou seu nariz e depois seu sistema nervoso.
Ela esticou a mão esquerda para ele.
— Não, você ainda não me conhece. Sou .
No momento que suas mãos se tocaram, uma labareda de calor subiu por seu braço, e ele viu nos seus olhos que ela sentiu o mesmo. Bruce se afastou bruscamente.
— Muito prazer, senhorita .
Ela o olhou da cabeça aos pés e Bruce sentiu seu corpo esquentar dentro do smoking Tom Ford.
Com um sorriso provocante, ela se aproximou um pouco mais. Na mão direita, ela tinha uma taça de champanhe.
— Eu estava procurando uma oportunidade de falar com você essa noite.
— Comigo? Não sou de longe a pessoa mais interessante dessa festa — ele brincou.
Ela riu.
— Com certeza, é. Não sou fã da maioria dos esnobes aqui.
Bruce ficou surpreso com a resposta. Contra seu melhor julgamento, ele decidiu que queria conversar com ela. Ele olhou para a boca dela, o batom acentuando os lábios carnudos, a sensualidade deles subitamente fazendo ele sentir que estava sufocado.
Jesus, o que estava acontecendo com ele?
— Como posso ajudá-la, senhorita ?
— Foi um belo discurso o que você fez agora. Todo mundo ficou emocionado — ela disse e deu um pequeno gole no champanhe. — Eu adoraria escutar você falar mais.
— Verdade? Seria um prazer.
Ela estava flertando?
— Trabalho para o The Gotham Times, e adoraria ter você na primeira página com uma entrevista exclusiva.
Uma jornalista? Ele a olhou novamente com cuidado, ela não usava o crachá de identificação para imprensa autorizada. Provavelmente usou para entrar e tirou em seguida quando chegou ao salão. Sabia que não deixariam que chegasse perto dele de outro jeito. Esperta. Ele estava impressionado.
— Me diga, senhorita , você é nova na cidade?
O sorriso no seu rosto pareceu vacilar um pouco, mas ela se recuperou depressa.
— Sim, me mudei para cá há poucos meses.
— Então você não sabe que não dou entrevistas?
A mulher escondeu o sorriso atrás da taça de champanhe.
— Meu chefe pode ter falado alguma coisa sobre isso. Mas eu acredito que posso fazer você mudar de ideia.
Bruce riu, abriu um sorriso de verdade. Ele estava sorrindo sinceramente e não aquele sorriso falso da sua fantasia de playboy.
— E como você vai fazer isso?
— Vou convencê-lo de que é muito importante para a comunidade de Gotham saber mais sobre o bilionário mais cobiçado da cidade. — ela disse e bebericou seu champanhe. Bruce levantou uma sobrancelha.
— É isso que eu sou?
— Foi uma das coisas que li nessas revistas de fofoca. Mas falando sério, as pessoas querem saber o que motiva, você faz tanto pela cidade.
— Não gosto de me gabar, deixo as ações falarem por si.
— Mas é uma história tão interessante. Um bilionário que se importa com os outros. Tão incomum.
Bruce começava a achar que o tom sarcástico na voz dela muito sexy. não gostava de gente rica, ou talvez só não gostasse dele.
— Essa é sua manchete?
— Ainda não pensei nos detalhes, primeiro preciso te convencer a falar comigo. Estou muito curiosa em conhecer o homem por trás dessa fortuna.
— Tem certeza que valho todo esse esforço?
— Claro que sim.
— Talvez seja melhor deixar quem eu sou nas sombras.
— Por que se esconder? Mostre para mim apenas. Você e eu, sem câmeras, sem pressão.
Aquilo parecia um convite para uma atividade que nada tinha a ver com uma entrevista e ele teve que se conter para não reagir àquele pensamento.
— Você é insistente, tenho que admitir.
Bruce olhou no relógio, já havia passado tempo demais da hora em que deveria ter ido embora.
— Sinto muito, senhorita , mas minha resposta ainda é não. Se me der licença, preciso ir. Aproveite a festa.
Ele sorriu e ela sorriu de volta. Não parecia derrotada.
— Não vou desistir.
Droga, aquela mulher seria um problema. Podia ver nos belos olhos dela.


Sentado em um banco de metal em frente aos seus computadores, Bruce lia com atenção o relatório da polícia sobre o assassinato de Roberto Molina.
Aparentemente, os detetives ainda não conseguiram localizar a mulher que esteve com ele na boate antes de ele ser atacado no estacionamento. Se eles falhassem, Bruce teria que cuidar disso pessoalmente, com sorte, ela saberia de alguma coisa. Roberto Molina era um criminoso conhecido por tráfico de armas, a polícia estava de olho nele há algum tempo, mas nunca conseguiram nada que o colocasse na cadeia.
Os passos vindo da escuridão teriam o assustado, se ele já não tivesse visto o mordomo inglês nas câmeras de segurança.
— Mestre Bruce, como foi o baile?
— Chato.
Ele disse, mesmo sabendo que não era totalmente verdade. Desde que deixou o hotel, aquela jornalista não saiu dos seus pensamentos. Quem era aquela mulher, afinal? Isso o estava deixando irritado.
— Por que não vai tomar um banho?
— Alfred, pode me fazer um favor?
— O que você precisa?
— Pode pesquisar uma pessoa para mim? , ela disse que trabalha no The Gotham Times.
Alfred o observou por um instante antes de responder.
— Claro. Até onde quer que eu vá?
— Não muito fundo. Só quero saber quem ela é e de onde veio. Não gosto de ser pego de surpresa.
— Farei isso. Agora, por que não vai tomar banho e dormir? De manhã estará tudo pronto, quando você acordar.
— Alfred, preciso estudar esse-
— Até o Batman precisa de descanso. Não conseguirá ajudar ninguém se estiver exausto. Boa noite, Mestre Bruce.
Alfred saiu em direção ao elevador e Bruce não tinha energia para contrariá-lo naquela noite. Estava mesmo cansado, e não só fisicamente.
Bruce tirou o resto da armadura de couro e foi para os chuveiros que ele mesmo instalou na caverna. Foi uma boa ideia, pois muitas noites ele não conseguia se arrastar até o seu quarto na mansão. Enquanto a água quente caía em seus ombros, ele tentava não pensar em vestidos prateados e olhos cor de chocolate.

**

Bruce dormia até tarde, e o motivo não era só suas atividades noturnas, ele não tinha um sono tranquilo desde criança. Pesadelos o atormentam constantemente. Dormir o deixava ansioso.
Ele desceu as escadas descalço, olhou pelas grandes janelas e viu o tempo fechado, o dia estava cinza.
— Bom dia, Mestre Bruce. O café da manhã está servido. Você tem um compromisso na empresa em algumas horas.
Bruce sentou-se à mesa com um longo suspiro. Frequentar as reuniões da Wayne Enterprises foi uma decisão difícil, ele não tinha real interesse em nada daquilo, mas precisava fingir e precisava de dinheiro para continuar a ser o Batman.
Alfred voltou da cozinha com uma bandeja cheia de comida e uma pasta amarela que ele estendeu para Bruce.
— O que descobriu?
Questionou enquanto folheava o conteúdo da pasta. Alfred começou a servir a comida na mesa de maneira metódica.
trabalha no The Gotham Times?, está listada como funcionária e começou há quatro meses. Antes disso, trabalhou em Metrópoles por um ano, até decidir se mudar para Gotham. Tem mais algumas informações sobre onde mais ela trabalhou na pasta. Não tem propriedades em seu nome, nenhuma dívida, sem passagens pela polícia. Mas tudo começa há mais ou menos dez anos, antes disso era como se não existisse.
Bruce baixou o papel que estava lendo para encarar o mordomo.
— Ela mudou de nome.
— Sim, não fui mais fundo que isso. Deixarei essa decisão para você. Agora, por favor, coma alguma coisa antes de sair. Cuidarei do seu terno.
Bruce folheou os papeis com as informações. Nada ali comprometia . Ela parecia ser uma jornalista competente. Mas quem era ela antes disso? Isso não era realmente da conta dele. Mas por alguma razão, sua curiosidade sobre a mulher só aumentava.

**

Choveu forte a noite toda. Agora a água rodopiava transbordando de uma vala em frente ao seu prédio. A tempestade manteve o céu escuro e as luzes da manhã tentavam cortar as nuvens pesadas sem sucesso.
Era sábado, ela podia chegar mais tarde na redação, então aproveitou para sair e comprar alguma coisa para comer. Fazer uma refeição decente por vezes era necessário. Ela calçou as botas de borracha e foi até uma pequena padaria na esquina. Pediu pãezinhos doces, alguns ovos, e estava ansiosa para passar um café bem forte quando chegasse no apartamento.
No caminho de volta, a temperatura começou a subir, deixando o ar úmido. não via a hora de se acostumar com o clima estranho daquela cidade.
Quando chegou mais perto do seu prédio, notou um homem parado na porta, vestido em uma capa de chuva. Ela não o reconheceu de primeira, mas logo ele se virou quando escutou ela chegar.
— Alex? O que faz aqui?
— Mandei mensagem, telefonei, mas você não atendeu. Fiquei preocupado.
não olhava o celular desde a noite passada.
— Ah, eu estava ocupada. O que houve?
Ele se afastou para deixar ela sair da garoa. Os dois ficaram lado a lado enquanto ela procurava as suas chaves. abriu a porta e entrou, colocando sua comida na mesa de centro da parte da frente do cômodo que ela chamava de sala.
— Posso entrar? — ele perguntou.
Alex nunca havia ido à casa dela. Os dois estavam se tratando pelo primeiro nome, mas não eram amigos. sabia que o homem a queria e usava isso a seu favor, porém tentava não alimentar nenhuma ideia errada. Mas ele estava ali, parecendo preocupado, e lá fora a chuva ficava mais forte.
— Claro — ela disse, fingindo estar confortável.
Ele entrou e olhou ao redor. pegou a sacola da mesa e a levou para o balcão que separava a sala da cozinha. Guardou os ovos na geladeira e serviu os pãezinhos em um prato. Ele a seguiu e se encostou na parede, a observando. Ele ocupava muito espaço no cômodo. Ela se sentia claustrofóbica, presa.
Sentindo o suor começar a escorrer nas suas costas, removeu o casaco e o pendurou em uma cadeira.
— Posso te oferecer algo para beber? Eu ia fazer um café agora.
— Não, obrigado. Tenho informações para você — ele disse, a observando atentamente.
— Sério? Vem, vamos sentar ali.
Os dois foram para a sala e se sentou no sofá. O detetive sentou em uma cadeira próxima à janela.
— Tive um pouco de dificuldade em encontrar a testemunha, porque ela usa um nome falso. Mas noite passada achei nome e endereço de Judith Asher.
se levantou para pegar papel e caneta na bolsa.
— Preciso falar com ela.
— Consigo segurar a informação até essa tarde. Então terei que atualizar meu chefe, e a polícia chegará até ela bem rápido. O caso do Roberto Molina virou prioridade. Ele estava envolvido em muita merda há bastante tempo.
— Preciso falar com ela sozinha, ela não vai falar nada para a polícia.
batia a caneta no bloco de notas.
— Você pode tentar achar ela na boate. Ela não está indo para a Phoenix, mas deve estar trabalhando. Meu palpite é o Pink, não fica muito longe do Phoenix.
— Vou até lá.
— Vou com você.
— De jeito nenhum. — sacudiu a cabeça e franziu a testa. — Ela nunca vai falar se você estiver lá.
— O Pink fica em uma área muito perigosa. Você não conhece nada por aqui.
— Vou ficar bem. Sério. Prometo avisar assim que estiver em casa e te conto tudo que eu descobrir.
O detetive a encarou daquele jeito que a incomodava um pouco. Como se ela fosse uma escultura, sem se importar com o que ela pensava ou se havia algum significado por trás daquela imagem. não era tão frágil como parecia.
— Tudo bem. Ficarei esperando. Eu deveria ir agora.
Ela o acompanhou até a porta, lá fora a chuva castigava o asfalto da rua. Sentada no sofá, todos os planos para um café da manhã normal foram esquecidos. Ela encarou o endereço no papel. Judith não falará nada para a polícia. Tudo que aqueles homens fazem é julgar e assumir o pior de mulheres como ela. não ligava para o assassinato de Roberto Molina, mas queria saber o que ela sabia sobre as amigas dela que desapareceram.

**

Quando o relógio marcava 21 horas, desceu de um táxi na entrada do Pink. Ela nunca esteve naquele lado da cidade e isso a deixava tão nervosa quanto excitada com a situação.
Ela abriu o casaco comprido que escolheu para esconder o curto vestido preto que estava usando e respirou fundo antes de se aproximar dos seguranças. Os cabelos longos estavam soltos e pela primeira vez em anos ela usava uma maquiagem muito forte.
Os seguranças a notaram antes que ela pudesse pensar em falar qualquer coisa e abriram caminho para sua entrada. não podia deixar de apreciar as vantagens de ser uma mulher atraente. Ela sorriu e entrou balançando um pouco mais os quadris.
Talvez ela tenha chegado muito cedo, o lugar ainda estava meio vazio e cheirava a cigarro velho e produtos de limpeza. caminhou até o bar e atrás do balcão, ela viu garrafas de vodka coloridas, gin barato e uma garrafa de bourbon que parecia decente o suficiente.
Ela sentou-se em um banco e pediu uma dose de whisky para um homem pálido com o cabelo vermelho que parecia recém-pintado e tatuagens incompreensíveis cobrindo seus braços. Nos auto-falantes da boate, hip-hop tocava enquanto o lugar começava a ficar mais e mais movimentado.
— Onde posso encontrar a Peanut?
O barman olhou para ela curioso.
— Ela já deve estar para chegar. Todas já estão chegando — ele respondeu, e teve que gritar por cima da música.
engoliu sua dose de bourbon sentindo o líquido queimar sua garganta. Fome, seu cérebro avisou imediatamente. Deveria ter comido alguma coisa antes de sair de casa.
Ela olhou ao redor, observando as pessoas que entravam e saíam. Depois da segunda dose de álcool, o barman acenou para a porta e ela viu entrar uma mulher alta, usando um vestido rosa muito curto.
foi até ela, a mulher a notou imediatamente e sorriu charmosa. Com seu longo cabelo ruivo natural, olhos azuis e um corpo curvilíneo, ela parecia mais velha do que realmente era.
— Judith?
Peanut deu um passo para trás, ela provavelmente não revelou seu nome verdadeiro para ninguém.
— Quem é você? Como sabe meu nome?
— Podemos conversar em um lugar mais reservado? É importante.
— Não conheço você.
— Mas você conhece Cookie. Foi você quem prestou queixa quando ela desapareceu, não foi?
Peanut olhou ao redor e agarrou pelo pulso, puxando-a para a saída dos fundos do clube.
— Está tentando me arranjar problemas?
— Preciso falar com você, quero saber o que houve com sua amiga.
— Você é da polícia?
— Pareço ser da polícia? Acredite em mim, eu sei que a polícia não quer nada com esse assunto. Eu só quero ajudar.
Peanut a observou por um momento como se avaliasse se podia confiar nela.
— Tem um lugar aqui perto que podemos conversar — ela disse e começou a caminhar rua acima, sem esperar que respondesse.
As duas entraram em um pequeno restaurante, que naquela hora da noite estava quase vazio.
Elas se sentaram em uma cabine. O sofá coberto de vinil tinha uma cor marrom que já estava desbotando. Uma tira grossa de fita mantinha a almofada sob ele unida. Toda vez que ela movia a perna para o lado errado, ouvia um leve som de rasgo.
— Qual o seu veneno?
— O mesmo que o seu.
Para a sua surpresa, Peanut acabou pedindo café para as duas e um pedaço grande de torta de maçã. A garçonete se aproximou e encheu as canecas com o líquido fumegante. moveu seu olhar para o estacionamento escuro. De repente, tinha a estranha sensação de estar sendo observada.
— Quem é você, afinal?
voltou sua atenção para a mulher sentada na sua frente, comeu um pedaço da torta antes de responder.
— Meu nome é . Sou jornalista, estou tentando escrever uma matéria sobre o desaparecimento das suas amigas.
— Eu só conhecia a Cookie. E vou te dizer exatamente o que eu disse para a polícia. Cookie não iria embora sem me avisar. Ela não sairia da cidade desse jeito.
— Por que você tem tanta certeza?
— Éramos próximas, ela me contava tudo. Sei que ela ajudava a mãe, por isso trabalhava tanto. Ela estava fazendo um bom dinheiro aqui, não tinha porque largar tudo.
Os olhos de Peanut eram de um azul rico, cheios de gentileza enquanto ela falava da amiga.
— Como sabe que ela não está com a mãe?
— Elas não se dão bem. Ela nem sabe que recebe dinheiro da filha. Ela está bem doente. Sei que Cookie… Mary, o nome dela é Mary. Sei que ela não iria sumir assim desse jeito.
— Ok. Acredito em você. Quando foi a última vez que a viu?
— No Phoenix. Ela saiu dizendo que ia para um motel com um cliente.
— Quem? Você conhece o homem?
— Sim, é meu cliente também. Ou era. Ele foi assassinado algumas noites atrás.
— Roberto Molina?
Peanut bebericou seu café, ela não tocou na torta, provavelmente percebendo que estava faminta.
— Sim, achei que você era da polícia e queria saber sobre ele, mas eu não sei de nada. Ele não quis nada comigo naquela noite, saiu apressado dizendo que tinha um compromisso com alguém.
não acreditava que tudo aquilo fosse coincidência.
— Você não deve mentir para a polícia. Eles não ligam para você ou para Mary, mas não é bom desafiá-los assim. Depois que der seu depoimento, saia da cidade por alguns dias. Prometo descobrir o que aconteceu com sua amiga.
— Por que você se importa?
— Sei como você se sente.

**

caminhou depressa de volta para a boate após colocar Peanut em um táxi. A sensação de estar sendo observada logo se tornou insuportável. Em um beco mal iluminado, com chuva fina caindo, ela parou de repente e se virou para a escuridão, estreitando os olhos. Sua mão segurou o frasco de spray de pimenta que ela carregava sempre consigo no bolso do casaco.
— Quem está aí? Sei que você está me seguindo.
Emergindo das sombras, uma figura caminhou devagar até ela. E lá estava ele, envolto em preto, os olhos brilhantes perfurando a escuridão da noite. Seu coração acelerou, o medo a envolveu como uma névoa fria. Não era só a presença dele, era o poder que irradiava dele, a maneira como ele se movia silenciosamente, como se a própria escuridão estivesse viva. Como se ele fosse a escuridão. Naquele momento, ela percebeu a verdade suprema: em Gotham, o medo vestia uma capa, e estava olhando diretamente para ela. Sua respiração ficou presa e se perguntou se deveria correr, mas suas pernas não estavam obedecendo.
ficou paralisada, não imaginou que estava sendo seguida pelo Batman. Um arrepio percorreu sua espinha. Quando finalmente se moveu para correr, ele falou:
— Não vou machucar você.
não tinha certeza se era verdade, mas permaneceu parada.
— Por que está me seguindo?
— Não estava seguindo você. Estava seguindo Judith.
— Isso era para ser reconfortante? Você está me assustando.
— O que queria com Judith?
— Por que eu deveria te contar alguma coisa?
— Estou tentando ajudar.
— A polícia? E quem ajuda a Judith?
— Por que ela precisa de ajuda?
— Parece que você não é tão informado.
— Me conte.
o encarou, estreitando os olhos, um sentimento de frustração borbulhando em seu estômago.
— Quer ajudar ou é apenas intrometido?
— Vai ter que confiar em mim.
— Certo, e como vou confiar em você? Você simplesmente apareceu como um fantasma.
Ele deu dois passos na direção dela e teve que se segurar para não dar alguns passos para trás. Seu coração batendo forte, mas sua determinação inabalável. A cidade zumbindo silenciosamente ao redor deles.
— Eu não sou seu inimigo. Existem ameaças reais aqui fora.
— Talvez não, mas não gosto de ser seguida. Especialmente por um cara mascarado.
— Entendo sua hesitação, mas acho que você não tem muita escolha.
Ele não mostrava emoção nenhuma na voz, ou na sua postura. suspirou alto.
— Ok. Três garotas de programa que trabalhavam com a Judith desaparecem nos últimos dois meses. A polícia não se importa, mas eu acho que algo ruim está acontecendo. Vou descobrir o que é.
— Quem é você?
cruzou os braços na frente do corpo.
— Quem é você?
Houve um silêncio carregado de tensão. Seu olhar penetrante se fixou no dela.
— Posso descobrir ou você pode me contar.
— Faça isso — ela disse, sorrindo.
— Tome cuidado, pode estar se envolvendo em algo perigoso.
— Sei cuidar de mim mesma.
se virou e foi embora, olhando para trás uma vez mais, a tensão pairando no ar. Não podia acreditar no que tinha acabado de acontecer.




Continua...


Nota da autora: Você não precisa ter assistido o filme de 2022 para entender a história, os eventos do filme são mencionados aqui, mas não interferem na trama! Mas se você não viu The Batman, vai ver!!!! Battinson é tudo para mim!!!!

Essa história existe na minha cabeça desde que o filme saiu em 2022, comecei a escrever no começo de 2023 e só tive coragem de enviar agora, quase 2025... Enfim... Se gostarem comentem!!!


💫


nota da beth: Me arrepiei com esse encontro do Batman com a Sidney, ansiosa por mais!

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