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Revisada por Selene 🧚‍♂️ (Mia)

Última Atualização: Out/2023.

Na cidade de Yokohama, a tensão era tão palpável quanto os ventos que açoitavam o porto naquele 31 de outubro. As ruas da cidade, normalmente movimentadas, pulsavam com uma energia diferente na noite de Halloween. Crianças, com seus baldes em mãos, corriam de porta em porta, gritando um animado "トリック・オア・トリート!" (doces ou travessuras!). Jovens e adultos, vestidos como super-heróis, personagens de animes, jogos e criaturas mitológicas, desfilavam pelas ruas com máscaras e varinhas luminosas, transformando a multidão em um mosaico cultural. O ritmo contagiante da música ecoava por todo lugar, enquanto fogos de artifício iluminavam o céu. O aroma de comidas exóticas e bebidas adocicadas pairava no ar, criando uma atmosfera ainda mais festiva e vibrante naquela noite.
Enquanto a cidade se entregava à euforia do Halloween, uma figura sombria espreitava pelas profundezas do porto. Escondida pelas sombras e protegida pelas ruínas de um navio naufragado, uma feiticeira recém-libertada de seu aprisionamento buscava por uma relíquia ancestral, o Orbe da Obediência. Um artefato celestial amaldiçoado que permitia controlar a mente de outras pessoas. Seus olhos, cintilantes como a noite, fixaram-se em um antigo mapa desenhado em pergaminho em suas mãos, onde um ponto luminoso marcava a localização do orbe e de outro artefato, conhecido como O Livro das Sombras. Este outro, segundo as lendas milenares, concederia a quem o possuísse poder absoluto, um livro proibido que continha feitiços poderosos, mas que corrompia a alma de quem o lesse.
Enquanto isso, na superfície, uma densa nuvem de fumaça negra e opaca se alastrava implacavelmente por todo lugar, cobrindo a cidade de Yokohama com um manto de trevas. Delineando com escuridão da fumaça, uma figura encapuzada emergia, com seus olhos cintilando com uma luz sinistra capaz de cortar a noite. A euforia que antes inundava o centro da cidade agora se transformava em um rugido de terror. A multidão, antes eufórica, era arrastada por uma onda de pânico, tropeçando em restos de fantasias e máscaras estilhaçadas. A terra tremia com a violência de um gigante adormecido, engolindo gritos e risadas em um abismo de caos. Vidros espatifavam-se, alarmes estridentemente chilreavam, e o cheiro de gás se espalhava pelo ar. A feiticeira, de volta à superfície, vestindo uma capa esvoaçante e olhos que brilhavam como brasa, observava tudo de maneira prazerosa. E o ar úmido e salgado que cobria sua pele não conseguia abafar o calor que emanava de seu corpo.
— Séculos aprisionados nas profundezas ansiando por este momento… — a figura encapuzada começou. — A era para o nosso domínio está prestes a se iniciar. O portal para o nosso reino, forjado nas profundezas do abismo, se abrirá, e a humanidade, em sua mera insignificância, será inundada pela imensidão do nosso poder — com um sorriso que revelava uma crueldade profunda, ele proclamou. — A ordem natural será invertida. Daremos um fim a todos os que possuem habilidades paranormais e faremos o planeta inteiro se render à nossa vontade. — Ele virou-se em direção à feiticeira, com os olhos brilhantes. — Com o Livro das Sombras, o Orbe da Obediência e o nosso poder...
— A cidade de Yokohama será nossa — completou ela, sorrindo triunfante. A cada passo que a mulher dava em direção à figura encapuzada, o piso tremia sob seus pés, como se a terra estivesse viva e a temesse. — E, com ela, o mundo! — com sua voz melodiosa e sinistra, ela garantiu, estendendo o artefato celestial envolto em névoa negra para a figura de capuz.
— O Despertar das Sombras finalmente chegou. — Com um gesto majestoso, o chão se abriu, revelando um abismo que se estendia até o infinito. O portal, adormecido sob as ruínas de um templo esquecido, começou a emitir uma luz pulsante, rasgando a escuridão. — Agora, toda a humanidade conhecerá o verdadeiro significado de poder — ele sussurrou, seus olhos brilhando com uma intensidade sinistra. A névoa que se erguia pelo porto carregava um odor fétido e uma promessa de algo maligno, enquanto as luzes da cidade cintilavam fracamente, como se a escuridão tentasse apagá-las. As forças do caos se agitaram, e o mundo tremeu perante a iminente catástrofe. Com um sorriso enigmático e perverso nos lábios, a figura encapuzada e a feiticeira se fundiram à escuridão, desaparecendo nas sombras. Um silêncio sepulcral se instalou, quebrado apenas pelos gemidos das estruturas danificadas. O terremoto havia aberto uma fenda, e as forças do mal se preparavam para invadir Yokohama.
Observando de longe, em meio ao caos que se alastrava pela cidade, um jovem, antes perdido na multidão, sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Uma sensação de medo o consumia, algo muito estranho estava acontecendo. Embora tentasse manter a calma, havia algo diferente, algo mais profundo e sombrio.
— Dazai, sou eu... — o garoto disse, com o celular sobre seu ouvido, fazendo uma pausa breve. — Estamos com sérios problemas.


Horas antes do ocorrido...


Localizado no topo de um declive, próximo ao porto de Yokohama, o escritório da Agência de Detetives Armados era um refúgio de seriedade e concentração, enquanto as ruas vibravam com a alegria contagiante das pessoas fantasiadas e o tilintar dos baldes de doces. Ao redor de suas mesas, a equipe de detetives especiais debruçava-se sobre seus casos, imersos em um silêncio profundo, quebrado apenas pelo tique-taque implacável do relógio e pela luz fraca das lâmpadas amarelas. Dentro daquela fortaleza de tijolos, as mesas, repletas de papéis espalhados e de telas cintilantes, testemunhavam a intensidade do trabalho e a tensão que pairava no ar, ao contrário da animação contagiante das ruas abaixo, onde pessoas fantasiadas celebravam o Halloween. A animação lá fora era um eco distante, contrastando com a concentração intensa dos detetives que se preparavam para mais uma semana de trabalho, que prometia ser longa e desafiadora desde o incidente envolvendo Fiódor Dostoiévski, líder de uma organização clandestina chamada Ratos na Casa dos Mortos, e também um dos cinco membros da Decadência dos Anjos.
Com um corte de cabelo curto e penteado para frente em pontas soltas, uma mecha longa deixada no lado direito do rosto, incluindo uma mecha preta proeminente entre os fios, um corte num estilo irregular — resultado de anos de um bullying cruel no orfanato — Atsushi Nakajima exibia um olhar cansado e uma expressão marcada por noites mal dormidas. Seus olhos, de um tom indefinido entre o roxo e o amarelo, pareciam refletir noites sem sono. A palidez de sua pele, acentuada pela luz que entrava pela janela, contrastava com a intensa vivacidade de seus olhos, emoldurados por uma mecha mais longa que caía sobre o lado direito de seu rosto. Com olhos fixos em um mapa rabiscado, o rapaz desenhava rotas complexas com a ponta do dedo. A cada traço, sua respiração se acelerava, e a madeira da mesa ecoava com a batida impaciente de seus dedos, enquanto sua mente se perdia nos detalhes no caso de um esquema de contrabando de órgãos no mercado negro.
A mesa à frente de Atsushi estava desocupada e vazia. À direita dela, Doppo Kunikida, seu colega de trabalho, tinha o olhar fixo na tela do notebook. À esquerda e de frente para Kunikida, Osamu Dazai, seu experiente colega e mentor, dormia profundamente sobre sua mesa, enquanto sua respiração suave contrastava-se com a concentração de Kunikida. No canto direito, de frente para a janela, Ranpo Edogawa saboreava tranquilamente uma caixa de salgadinhos, enquanto na extremidade oposta da sala, Jun’Ichirou Tanizaki e sua irmã Naomi estavam igualmente imersos em seus trabalhos e pesquisas. De repente, a porta se abriu e Kyouka Izumi entrou no local, carregando uma pilha de livros na altura de seus olhos. Atsushi, que até então observava o mapa, levantou-se rapidamente e foi ao encontro da garota, que ainda se encontrava próxima à porta.
— Ei, deixa que eu te ajudo! — exclamou ele, pegando os livros com cuidado e caminhando até a mesa vazia em frente à sua. — Sabe… eu estava pensando, já que teremos o resto do dia livre, o que acha de irmos juntos ao centro da cidade? — perguntou o garoto, virando-se para a garota. Kyouka, com seus olhos cintilando sob a luz fraca do escritório, sorriu minimamente com a oferta de Atsushi, aceitando sem hesitar.
— Nós dois? — ela perguntou, observando o jovem detetive com um olhar brilhante.
— Sim, o que acha? Vai ser divertido! — Atsushi respondeu, animado.
— Tipo um encontro? — murmurou ela.
— Sim… quer dizer… não nesse sentido. — Atsushi coçou a nuca, envergonhado, olhando para o chão. — Acontece que você nunca foi em um festival de Halloween antes e… bem... — Olhou para a garota à sua frente e continuou: — Desde que você se juntou à Agência, você não teve a chance de viver experiências assim. Ser uma pessoa normal, sabe? Sem alguém para te controlar ou manipular — ele explicou. — Nesse festival, você pode ser quem quiser, sem se preocupar com o passado ou a Máfia do Porto. — Kyouka sorriu levemente, seus olhos cintilando de gratidão. A sinceridade de Atsushi era evidente, e ela apreciava o gesto.
— Tudo bem. Eu adoraria ir com você, Atsushi — respondeu ela com a voz suave.
Atsushi soltou um suspiro de alívio, e um sorriso largo se espalhou pelo seu rosto.
— É diferente de tudo que você já viu. Tem música, comidas deliciosas e várias outras coisas — ele enumerou, empolgado. — Coisas que você precisa experimentar para entender. E, bem, acho que você vai gostar. Eu prometo que será divertido — garantiu ele.
Kunikida, que ouviu a conversa, levantou a cabeça e tirou os olhos do notebook, olhando para os dois ao seu lado.
— Não se esqueçam de estarem sempre em alerta! Hoje a cidade estará mais agitada do que nunca — ele advertiu, voltando sua atenção para a tela. Dazai, que até então cochilava sobre sua mesa, levantou a cabeça, apoiando o queixo em sua mão esquerda, e, ainda sonolento, abriu um dos olhos, lançando um olhar divertido para os dois jovens.
— E tomem cuidado com os fantasmas! Logo a cidade estará cheia deles — brincou ele, fechando o olho novamente. Impulsionado pela brincadeira de Dazai, Atsushi começou a levar a sério a possibilidade de fantasmas.
— Você realmente acredita em fantasmas, Dazai? — o garoto perguntou inquieto, voltando para a sua mesa.
— Quem sabe? O mundo está repleto de mistérios, não acha, Nakajima? — o rapaz de cabelos castanhos escuros, curtos e levemente ondulados e com um sorriso enigmático, respondeu com outra pergunta.
— Por favor, Dazai, não assuste ainda mais o garoto! Fantasmas não existem! — Kunikida o repreendeu. Embora as palavras e o sorriso enigmático de Dazai fizessem com que até mesmo ele se questionasse.
O rapaz sonolento a sua frente, agora de olhos fechados, movimentava seu braço direito — indo e voltando — enquanto segurava um aviãozinho de papel. Enquanto ele fazia isso, seu braço acabou esbarrando e derrubando alguns livros de sua mesa sobre o notebook de Kunikida, que acabou fechando-o com o impulso.
— Dazai, você não cansa de causar problemas? O que você acha que está fazendo? Você não tinha que resolver uns assuntos? — Inclinando-se sobre a mesa, Kunikida berrava com Dazai, fazendo o rapaz das bandagens recuar e tapar a boca.
Com o livro sobre o peito, Atsushi observava a reação do colega, cujo rosto se contorcia em indignação. Paralisado diante daquela cena, ele só conseguia pensar em uma coisa: ‘Esse Dazai é mesmo um mestre em tirar Kunikida do sério.’
— Calma, Kunikida. Acho que você está precisando tirar umas férias da agência — Dazai disse simplesmente. — Com esse mau humor você vai acabar sozinho — ele continuou, um sorriso divertido nos lábios.
O loiro, com as veias pulsando no pescoço, ajeitou os óculos em seu rosto e aproximou-se ainda mais de Osamu.
— Você está me provocando, Dazai? Sabe muito bem que não podemos simplesmente abandonar um trabalho. Temos responsabilidades! — exclamou, seus olhos verde-acinzentados faiscando de raiva. Dazai, imperturbável, apenas sorriu.
— Relaxa, Kunikida. Foi apenas uma sugestão. Afinal, quem precisa de um parceiro que só sabe reclamar? — provocou Dazai, se recostando na cadeira.
— Reclamar? Você acha que estou de brincadeira? Temos muitos casos para resolver e você... Meu Deus, você dormiu praticamente o dia inteiro! — ele disse, tentando controlar a raiva. Dazai, por sua vez, apenas observava a reação do parceiro com um sorriso divertido.
Antes que fizesse mais um comentário para que pudesse irritá-lo ainda mais, a porta do escritório se abriu com um estrondo. Kenji Miyazawa, acompanhado de um visitante inusitado, adentrou o ambiente.
— Oi, pessoal! — Kenji, parado a poucos metros à porta do escritório, acenou para os companheiros. No entanto, logo atrás do garoto estava uma vaca, que mastigava um feno calmamente, chamando a atenção de todos.
A reação dos colegas foi imediata: bocas abertas, olhos arregalados e risos nervosos tomavam conta do escritório. Kunikida, com a sobrancelha arqueada, encarou o animal parado entre o lado de dentro e fora da sala.
— Uma vaca? Mas o quê…? — Atsushi, um pouco assustado, murmurou.
O loiro, suspirando profundamente, correu rapidamente na direção do animal, colocando-o para fora. Retornou à sala minutos depois.
— Por Deus, Kenji, como essa vaca veio parar aqui? — Kunikida exclamou. Miyazawa, parecendo não entender a reação do mais velho, coçou a cabeça, um sorriso bobo no rosto.
— Ela parecia tão perdida aqui na cidade grande... achei que precisava de ajuda. — O rapaz, de olhos dourados e cabelos loiros curtos que iam além da nuca, deu de ombros, na maior naturalidade.
— E achou que ela encontraria justo aqui? — perguntou Kunikida, ajustando os óculos em seu rosto, em seguida caminhou até a janela, respirando fundo pela milésima vez.
— Mais uma prova de que a ingenuidade de Kenji não tem limites. — Dazai se levantou e começou a recolher os livros que havia derrubado sobre a mesa de Kunikida.
— Como se espera da agência de detetives, há sempre uma surpresa — Ranpo, sem tirar os olhos de sua caixa de salgadinhos, murmurou. Os irmãos Tanizaki, após a visita inesperada do animal, voltaram suas atenções para o que estavam fazendo, tentando agir normalmente. Enquanto Kyouka apenas observou a cena em silêncio.
A brisa gélida que serpenteava pelo cômodo trazia um alívio momentâneo ao calor do dia. Atsushi, recuperado do susto, passou a mão por seus cabelos grisalhos claros e soltou um suspiro profundo, tentando se recompor. Ele começou a organizar sua mesa e guardou o mapa rabiscado à sua frente. Olhou para o relógio na parede e ficou de pé em seguida.
— Vamos? — perguntou, dirigindo-se a Kyouka. Seus olhos brilharam com uma estranha intensidade. Kunikida, que observava as crianças fantasiadas pela janela, virou-se para os dois.
— Mais uma vez, tenham cuidado. É Halloween, sabemos como as coisas podem acontecer nesta época do ano. Lembrem-se de ficar sempre em alerta — ele disse, com um tom mais sério do que o habitual.
— Pode deixar, Kunikida! Tomaremos todo o cuidado possível — Nakajima respondeu, tentando esconder a preocupação que sentia. Kyouka, percebendo a tensão no ar, colocou a mão no ombro do garoto.
— Não se preocupe, Atsushi. Estaremos juntos — a garota disse. O rapaz suspirou, mas um sorriso gentil surgiu em seus lábios.


*********


Atsushi e Kyouka saíram da agência caminhando lado a lado, apreciando a atmosfera festiva de Yokohama. A cidade estava vibrante, decorada com abóboras, figuras assustadoras e teias de aranha. Crianças fantasiadas corriam pelas ruas pedindo doces, jovens e adultos davam risadas, enquanto estrangeiros e nativos se divertiam juntos. Enquanto caminhavam por uma rua mais tranquila, Nakajima e Izumi notaram um cartaz colado em um poste, e decidiram ver o que estava escrito.
— Olha, está acontecendo um Festival de Máscaras e Fantasias no centro de Yokohama! — Atsushi leu em voz alta, virando-se para a garota ao seu lado. — Que tal se a gente participar? — sugeriu ele animado.
— Mas, nós não estamos usando nenhuma das opções que estão no cartaz — Kyouka respondeu. O rapaz pensou por um momento.
— Vem comigo, eu tenho uma ideia! — exclamou ele. Enquanto seguiam em frente, Atsushi notou uma pequena loja de fantasias e adereços do outro lado da rua. — Olha lá, Kyouka! — o rapaz disse, apontando para o estabelecimento. — Talvez encontremos algo legal naquela lojinha — afirmou, puxando a garota com delicadeza em direção à loja.
Ao adentrarem o estabelecimento, os dois observaram a vitrine que estava decorada por máscaras de animais, personagens da cultura japonesa e deuses mitológicos, que entrelaçavam-se com as fantasias de bailarinas, super-heróis, piratas e personagens de contos de fadas, criando um cenário completamente mágico; enquanto a iluminação suave do lugar realçava as cores vibrantes dos objetos, criando uma atmosfera de mistério e encanto. Atsushi e Kyouka, parados diante de uma prateleira, ficaram hipnotizados pela profusão de cores e pela as formas das máscaras, com seus olhos vazios e expressivos, que pareciam observá-los.
— Esta ficaria bem em você! — Kyouka sussurrou, apontando discretamente para cima. Atsushi seguiu seu olhar, e seus olhos se arregalaram. Uma máscara de tigre, com olhos de cristal que pareciam pulsar de vida, os observava de cima. Um sorriso tímido se espalhou pelo seu rosto, enquanto seus olhos brilhavam com a mesma intensidade que os cristais da máscara de tigre.
— Acho que você tem razão! — ele concordou, estendendo a mão para pegá-la. Com a ponta dos dedos, Atsushi traçou as delicadas linhas da máscara de tigre. A pelagem branca contrastava com a intensidade de seu olhar, e, por um instante, pareciam se fundir. Um sorriso singelo se espalhou por seus lábios. Aquela máscara era mais do que um simples objeto: era uma extensão de si mesmo.
Kyouka, que o observava atentamente, notou uma pequena lágrima escorrendo pelo rosto de Atsushi. Ela se aproximou do garoto e, com cuidado, enxugou-a com o polegar. O garoto, percebendo o que havia acontecido, pareceu voltar à realidade. Um tremor em sua voz denunciava a emoção que ele tentava conter.
— Essa máscara... ela me lembra de um tempo muito difícil — disse ele, os olhos fechados, como se estivesse revivendo uma lembrança dolorosa. — Um tempo em que eu não me sentia digno de nada — ele murmurou, e Kyouka o puxou para um abraço apertado. Ele se deixou levar, sentindo o calor do corpo dela e a força de seus braços. Por um instante, todos os seus medos e inseguranças pareciam desaparecer.
Kyouka apertou Atsushi ainda mais forte, sentindo a fragilidade por trás da fachada de coragem que ele sempre mostrava. Ela sabia que ele precisava desse apoio, e que a máscara era mais do que apenas um objeto para ele. Os dois permaneceram abraçados por um breve momento, encontrando conforto e segurança um no outro. Quando finalmente se separaram, Atsushi olhou para a máscara de tigre. Ela não era apenas um símbolo de seu passado, mas também uma representação de sua força e resiliência. E, acima de tudo, era um lembrete de que ele merecia estar vivo.
— Desculpe, Kyouka. Eu não queria que você me visse assim. — disse ele, levando a mão até a máscara, como se precisasse dela para se sentir mais forte. — Ahn... mas e você, o que pretende escolher? — Ele sorriu de lado, curioso para saber qual seria a resposta dela. Kyouka pensou por um momento, deslizando seus dedos pela superfície fria da prateleira. Em seguida, seus olhos se fixaram na máscara de coelho próxima a uma fantasia de fada.
— Irei escolher essa aqui — murmurou ela, com um brilho nos olhos. — Eu gosto de coelhos — Kyouka disse, colocando a máscara no rosto. A pelúcia macia cobriu sua face, deixando apenas seus olhos à mostra. Ela girou, observando sua imagem refletida no vidro da vitrine. — Como eu estou? — perguntou, virando-se para o Atsushi.
— Você está adorável! Combina com você. — O rapaz não conseguiu conter o sorriso.
Após escolherem e pagarem por suas máscaras, os dois saíram da loja e seguiram em direção ao local do festival de Halloween. Enquanto caminhavam em direção ao centro da cidade, Atsushi observou Kyouka, que parecia encantada com as decorações e com as pessoas fantasiadas.
— Está gostando? — perguntou ele, com um sorriso nos lábios. Ela assentiu com a cabeça, os olhos brilhando.
— É bem diferente do que eu imaginava — respondeu ela. O rapaz sorriu ainda mais largo, sentindo-se feliz por poder proporcionar essa experiência a ela.
As máscaras em seus rostos cintilavam intensamente sob as luzes da cidade de Yokohama, e o festival de Halloween invadia o ar com a frescura do fim da tarde, enquanto a noite começava a se aproximar, trazendo o aroma doce e fumegante de algodão doce, o som da música pulsando em seus ouvidos. No meio da multidão, sorrindo para as pessoas que os cumprimentavam, Atsushi percebeu algo estranho: uma pessoa encapuzada que os observava de longe. Ele sentiu um arrepio percorrer sua espinha, e tentou segui-lo com os olhos, mas ele já havia desaparecido.
— Você viu aquilo, Kyouka? — perguntou ele, vendo-a negar com a cabeça. Ele coçou a nuca e olhou ao redor. — Deve ter sido minha imaginação. Vamos seguir em frente — ele disse, deixando aquilo de lado por um momento. E então guiou a garota pela multidão. — Quer experimentar um doce temático de Halloween? — sussurrou em sua direção. Ela virou-se para ele e concordou com a cabeça. — Ótimo! Vem comigo — ele disse, guiando-a até uma barraquinha próxima. A vendedora, uma senhora sorridente com um avental estampado de abóboras, os recebeu com entusiasmo.
— O que vão querer, jovens? — ela perguntou, sua voz doce ecoando no ar. Kyouka e Atsushi tiraram as máscaras de seus rostos e observaram as opções disponíveis, escolhendo por fim doces coloridos e com formatos assustadores. A garota, ao provar cada um deles, fez uma cara engraçada.
— É tão doce! — exclamou ela. A cada mordida, seus olhos brilhavam, encantada com o sabor. — Eu quero mais! — pediu, virando-se para a vendedora, o que fez o rapaz ao seu lado rir.
— Vou comprar mais desses, por favor! — Atsushi pediu, sorrindo educadamente. A vendedora sorriu, entregando mais um pacote do doce para Atsushi.
— Esse doce é especial, feito com uma receita secreta da minha avó — ela disse, piscando para Kyouka. — Ela sempre dizia que quem os comia ficava com a alma leve e o coração feliz. — Kyouka arregalou os olhos, encantada com o que a vendedora disse. Atsushi sorriu, observando a reação da garota. “Então vamos levar essa felicidade para todo mundo!”, pensou ele.
— Pode embalar mais alguns desses para os nossos amigos? — Nakajima sugeriu, entregando uma boa quantidade de doces para a vendedora.
Enquanto a vendedora embrulhava os doces com cuidado e os entregava ao rapaz, um estrondo seco e forte ecoou pela loja, seguido por um tremor violento que fez as prateleiras tremerem e o embrulho dos doces se espalharam pelo chão, incluindo suas máscaras. A senhora e os detetives se agacharam imediatamente com o inesperado acontecimento.
— O que foi isso? — perguntou Kyouka, os olhos arregalados. Atsushi, sem responder, correu até a porta e a abriu. A rua estava em caos total. Pessoas gritavam e corriam em todas as direções, tropeçando umas nas outras. Izumi, que o observava atentamente, percebeu uma mudança na expressão de Atsushi. Seus olhos, antes tão calmos, agora estavam tomados por um intenso desespero.
— Temos que sair daqui agora! — exclamou o rapaz, aproximando-se da vendedora. — A senhora está bem? — A vendedora, pálida e trêmula, apontou para o céu. Uma enorme névoa se projetava sobre a cidade. Atsushi e Kyouka se entreolharam, sentindo um frio percorrer suas espinhas. — Não podemos ficar aqui. Vamos procurar um lugar seguro, rápido. — A vendedora, ainda em choque, murmurou algo sobre um abrigo, apontando para uma pequena rua lateral. Atsushi ajudou a senhora a se levantar e, com a ajuda de Kyouka, saíram da loja, seus olhos fixos na névoa que se aproximava rapidamente.
E, sem hesitar, os três seguiram em direção ao local indicado. A rua era estreita e escura, e a névoa já cobria quase toda a cidade, engolindo os prédios e as ruas como um monstro faminto, tornando a visibilidade cada vez mais impossível. Atsushi sentiu um nó na garganta, a ansiedade crescendo a cada passo.
— Chegamos! — exclamou a senhora, apontando para uma pequena porta de ferro com uma placa desbotada. Eles bateram insistentemente na porta, esperando que alguém atendesse. A porta rapidamente se abriu, revelando um homem idoso com uma expressão apavorada.
— Rápido, entrem! — ele disse, abrindo caminho para que eles entrassem. O interior da casa era pequeno e aconchegante, com uma lareira acesa que irradiava calor. Atsushi ajudou a senhora a se sentar em uma poltrona.
— A cidade está parcialmente coberta pela névoa — Kyouka disse, observando a cidade por uma fresta na janela. — Precisamos voltar para a agência o mais rápido possível. — Olhou para Atsushi, que mantinha uma expressão séria em seu rosto.
— Você tem razão. Vocês dois ficarão bem? Não querem ir para um outro lugar? — o rapaz perguntou, dirigindo-se ao casal.
— Não se preocupem conosco, nós estaremos seguros aqui — o homem idoso, com a voz trêmula, respondeu.
— Prometemos aqui voltar assim que a situação se acalmar — Atsushi assegurou, colocando a mão no ombro do homem. Com um aceno de cabeça, o casal agradeceu. Atsushi e Kyouka se despediram e dirigiram-se à porta.
Ao abri-la, uma névoa fétida e densa os envolveu, obscurecendo sua visão. A cada passo, adentrando mais fundo naquela escuridão, a sensação de serem observados se intensificava. Ruídos estranhos ecoavam por todos os lados, gemidos baixos e um sussurro constante, como se milhares de vozes sussurrassem em uníssono, ecoando através da névoa. As sombras, antes vagas, agora tomavam formas grotescas, com olhos que brilhavam intensamente na penumbra. Enquanto corriam pelas ruas, os dois se entrelaçaram com um grupo de pessoas, correndo em desespero e esbarrando uns nos outros.
— Atsushi! — a garota gritou, mas acabou desaparecendo entre eles.
Atsushi, sentindo um arrepio percorrer sua espinha, imediatamente desviou o olhar, tentando encontrá-la, mas foi em vão.
— Kyouka! — gritou ele, avançando pela multidão. — Onde você está? — A cada passo que dava, sentia o peso da angústia em seu peito. — Kyouka! — Atsushi continuou a gritar seu nome, mas a multidão ruidosa abafava seus clamores.
A cada esquina, a sensação de desespero crescia. As sombras, antes grotescas, agora pareciam se mover com propósito, como se estivessem lhe guiando para algum lugar. Um pressentimento sombrio o invadiu. Algo de muito errado estava acontecendo, e ele não era o único que parecia perceber.


*********


Ao chegar ao centro da cidade após escapar da multidão em pânico, Atsushi foi engolido por um caos ensurdecedor. Edifícios retorcidos, como ossos quebrados, perfuravam o céu cinzento, enquanto nuvens de fumaça negra e tóxica obscureciam cada vez mais o pôr do sol. As ruas, antes vibrantes, agora eram um labirinto de escombros, onde corpos mutilados jaziam esparsos, como bonecos de pano descartados. O ar era irrespirável, carregado pelo cheiro acre de pólvora, sangue coagulado e carne queimada.
Seus olhos, acostumados à penumbra, foram atraídos por duas figuras que se destacavam no meio da destruição. Uma mulher, de beleza glacial e olhos que brilhavam como brasas, conversava com uma figura encapuzada, cuja voz rouca ecoava pelos destroços. À medida que se aproximavam um do outro, o chão tremia sob os pés de Atsushi, como se a própria terra os temesse. A mulher, com seus movimentos sinuosos e sorriso sardônico, emanava uma aura de morte que gelava os ossos.
Intrigado e aterrorizado, Atsushi se escondeu atrás de uma árvore carbonizada e aguçou sua audição de tigre para ouvir o que eles falavam. A cada palavra proferida pela figura encapuzada, um arrepio percorria sua espinha. E à medida que escutava, Atsushi percebeu que Yokohama estava no epicentro de algo muito maior do que imaginava, algo que arrastaria a cidade para um abismo de horror e destruição.
— A era para o nosso domínio está prestes a se iniciar. O portal para o nosso reino, forjado nas profundezas do abismo, se abrirá, e a humanidade, em sua mera insignificância, será inundada pela imensidão do nosso poder — com um sorriso que revelava uma crueldade profunda, a figura encapuzada proclamou. — A ordem natural será invertida. Daremos um fim a todos os que possuem habilidades paranormais e faremos o planeta inteiro se render à nossa vontade. — Ele virou-se em direção à feiticeira, com os olhos brilhantes. — Com o Livro das Sombras, o Orbe da Obediência e o nosso poder...
— A cidade de Yokohama será nossa — completou ela, sorrindo triunfante. A cada passo que a mulher dava em direção à figura encapuzada, o piso tremia sob seus pés, como se a terra estivesse viva e a temesse. — E, com ela, o mundo! — com sua voz melodiosa e sinistra, a feiticeira garantiu, estendendo o artefato celestial, envolto em névoa prateada, para a figura de capuz. Em seu braço, estava um símbolo de corvo totalmente negro.
— O Despertar das Sombras finalmente chegou. — Com um gesto majestoso, o chão se abriu, revelando um abismo que se estendia até o infinito. O portal, adormecido sob as ruínas de um templo esquecido, começou a emitir uma luz pulsante, rasgando a escuridão. — Agora, toda a humanidade conhecerá o verdadeiro significado de poder — ele sussurrou, seus olhos brilhando com uma intensidade sinistra. A névoa que se erguia pelo porto carregava um odor fétido e a promessa de algo maligno, enquanto as luzes da cidade cintilavam fracamente, como se a escuridão tentasse apagá-las. Com sorriso enigmático e perverso nos lábios, os dois se fundiram à escuridão, desaparecendo nas sombras.
Atsushi sentiu outro arrepio percorrer sua espinha e, embora tentasse manter a calma, uma sensação de medo o consumiu. Com as mãos trêmulas, pegou o celular em seu bolso e digitou rapidamente o número de Dazai.
— Dazai... — o rapaz disse, com o celular sobre seu ouvido, fazendo uma pausa breve. — Estamos com sérios problemas.
Saia daí imediatamente, Atsushi. — A voz de Dazai ecoou em seu ouvido.
— Mas a Kyouka desapareceu entre a multidão e... — O garoto tentou continuar, mas foi interrompido.
Não há tempo para detalhes agora. Só saia daí o mais rápido possível — o colega disse, com sua voz soando firme.
— Mas Dazai... — A voz de Atsushi falhou pela angústia.
Eu sei o quanto você se preocupa com ela, Atsushi, mas agora não é hora para ser teimoso. Encontre um lugar seguro e espere por mim. Eu já estou a caminho. — Atsushi hesitou por um momento, mas a voz autoritária de Dazai o fez acenar com a cabeça, mesmo que relutantemente.
— Tudo bem! Mas se algo acontecer a ela eu... — A última frase pairou no ar, mas foi rapidamente abafada pela voz de Dazai.
Kyouka vai ficar bem, ela sabe se proteger, não se preocupe. Ela é forte — ele garantiu. — Agora, vá. — E antes que Atsushi pudesse responder, a ligação foi encerrada. Suas mãos tremiam tanto que quase deixou cair o celular. O garoto sentiu um nó na garganta ao ouvir a voz calma de Dazai. As palavras do amigo o tranquilizavam um pouco, mas a imagem de Kyouka desaparecida o atormentava.
Atsushi olhou em volta, e avistou um beco, escuro e silencioso do outro lado da rua, que parecia uma fenda aberta nas entranhas da cidade. O ar úmido e frio do anoitecer penetrava em seus ossos, carregado de um cheiro metálico que lhe causava náuseas. Com as pernas bambas e o coração pesado, Atsushi correu em direção ao beco, que o levou para um labirinto de ruas desertas e construções decadentes. A cada passo, a sensação de que algo terrível estava prestes a acontecer se intensificava. A névoa, como um manto sujo que se arrastava pelo chão, cobria a cidade como uma mortalha. Sussurros tênues pareciam ecoar em seus ouvidos, prometendo horrores inimagináveis. Ao adentrar o beco, que parecia ser ainda mais opressivo, um arrepio percorreu sua espinha. De repente, foi como se uma porta se abrisse em sua mente, lembranças de sua vida no orfanato se misturando à noite em que se transformou em tigre. A dor física da mutação era quase tão insuportável quanto a culpa que o assombrava desde então. A névoa se aproximou, envolvendo-o em um abraço gélido. Ele podia sentir olhos frios sobre si, como se penetrassem sua alma.

Após o que pareceu uma eternidade, Atsushi finalmente encantou um lugar: um antigo armazém, com as portas entreabertas, e uma luz fraca emanando de seu interior. Ele hesitou por um momento, mas a lembrança da voz de Dazai o impulsionou para frente. Ao adentrar o armazém, seus olhos se acostumaram à penumbra, e ele avistou uma figura familiar sentada em uma caixa de madeira. Era Dazai. E, ao lado dele, estava Edogawa, a irmã mais nova de Ranpo.
— A quanto tempo, Homem Tigre! — a garota exclamou, com um sorriso travesso nos lábios.

*********

AGÊNCIA DE DETETIVES ARMADOS

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Continua no próximo episódio...


Nota da autora: Olá, fãs de Bungo Stray Dogs (Por favor, me digam que não sou a única), o que acharam? Pra ser sincera, não achei que conseguiria concluir esse primeiro episódio para o especial de Halloween tão rápido. Tive que re-assistir, três vezes seguidas, todas as cinco temporadas de BSD só para dar aos personagens as suas essências e personalidades (minha empolgação pra Introduzir um certo personagem não me deixa sossegada… PODE VIR CHUUYA NAKAHARA). Enfim, caso você, leitor(a), queira me dar alguma sugestão ou ideia para história, me siga nas minhas redes sociais: twitter/bluesky: @itwascheol, Insta: @vegaautora. Eu adoraria te ver por lá.

Nota da bethinha 🧚‍♂️: Ainda que eu tenha muito pouco conhecimento no universo de animes, consegui sentir um gostinho da profundidade da história lendo este início de O Despertar das Sombras. Já pude perceber que aqui temos personagens interessantes, backgrounds bem preenchidos e uma história com um tantão de potencial (especialmente quanto aos vilões, que já fizeram uma entrada sensacional.
Vega, a sua maneira de descrever o que acontece não poderia ser melhor. Se isso fosse uma avaliação você já gabaritava. A descrição da névoa obscura surgindo, do centro da cidade em suas festividades e depois retorcido pelo caos, os diálogos e as relações dos personagens... tudo muito bem feito e muito bem escrito. A sua dedicação com a fanfic é nítida a cada frase desenvolvida. Consegui notar o quanto você quis entregar algo bem feito, e felizmente está conseguindo! Continue assim, viu? Estou ansiosíssima para ler mais de O Despertar. Envie logo o próximo!!!!


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