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Codificada por: Cleópatra

Última Atualização: 25/05/2025

— Você precisa tentar pelo menos um ano querido… é o que diz aí.

Bomi, a mãe lhe deu alguns tapinhas nas costas enquanto apontava para as folhas dispostas sobre a mesa na frente de .

Ele piscou os olhos diversas vezes, enquanto os presentes no recinto o observavam em silêncio.

— A hal-abeoji não tinha como ter me deixado de herança algo menos… — Ele pareceu pensar nas palavras — Intenso? Nós nem tínhamos uma convivência diária.

— Sua avó era uma mulher muito generosa, querido, e ela certamente viu potencial em você para lhe deixar a casa de chás como herança . Você deveria ser grato, essa casa de chá é uma tradição da família e ajudou a sua avó a nos criar, eu e seus tios.

olhou para os papéis mais uma vez, sentindo o peso daquela situação. Ele nunca tivera uma relação próxima com sua avó e, para ser honesto, não fazia ideia de como tocar um negócio como uma casa de chá. O nome soava bonito, mas ele sabia que, na prática, não passava de um lugar pequeno, antigo e malcuidado, que mal conseguia manter os poucos clientes regulares.

Além disso, o próprio empreendimento em que ele vinha trabalhando há anos já não estava na melhor fase. Os últimos meses tinham sido difíceis para ele e sua equipe, com projetos estagnados, despesas em alta e a constante pressão de reverter os números. Ele mal conseguia se imaginar dedicando tempo e esforço para algo que era tão distante de sua realidade, um negócio tradicional que parecia ter saído de outra época e que, sinceramente, não tinha o menor apelo para ele.

“Um ano… como vou manter essa casa de chá de pé por um ano?”, ele se perguntou, o estômago se apertando com a ideia. Não fazia ideia de onde começar ou como atrair mais clientes para um lugar que mal conhecia.

suspirou fundo, voltando os olhos para o testamento sobre a mesa. As palavras da avó estavam ali, de forma direta e sem rodeios: ele teria que manter a casa de chá funcionando por pelo menos um ano. Apenas depois disso, caso desejasse, poderia vendê-la. Ele leu a cláusula mais uma vez, como se procurasse uma brecha, algo que pudesse alterar aquele plano e o livrasse do compromisso. Mas não havia escapatória.

Em seguida, ele pegou as folhas do contrato de aquisição da casa de chá. O papel já começava a amarelar nas bordas, e as letras finas e firmes da assinatura de sua avó pareciam relembrá-lo de seu olhar determinado. percorreu os olhos pelas cláusulas, detalhando a transferência do imóvel e as condições de manutenção. Sentiu o peso da responsabilidade crescer a cada linha lida.

A ideia de abrir mão de seu próprio negócio — que já estava em uma situação delicada — para salvar um outro empreendimento, tradicional e decadente, parecia insana. Mesmo assim, algo o prendia ali. Talvez fosse o olhar de sua mãe, esperançosa de que ele preservasse uma parte da história da família.

Ele soltou o ar lentamente, encarando as folhas em suas mãos e perguntando-se se aquele ano realmente traria o fim da casa de chá — ou se, quem sabe, mudaria algo em sua vida também.

bufou, largando as folhas sobre a mesa com um certo desdém. Pegou a caneta e girou-a entre os dedos, lançando um olhar frustrado para sua mãe, que apenas lhe respondeu com um sorriso encorajador. Ele soltou mais um suspiro pesado, balançando a cabeça.

— Tá bom… vamos acabar logo com isso, já que eu não tenho escolhas mesmo — murmurou, mais para si do que para qualquer outra pessoa. — Um ano. Só um ano… — repetiu, tentando se convencer de que seria algo rápido.

Ele pressionou a caneta contra o papel, assinando de forma decidida, mas com uma ponta de ressentimento. Feito isso, empurrou as folhas para o lado, cruzando os braços e se recostando na cadeira. Sentia-se exausto só de pensar no que viria pela frente.

***

caminhava ao lado da mãe pelas movimentadas ruas de Seul, o paletó dobrado sobre o braço, tentando se acostumar com a ideia que acabara de aceitar. A cidade estava viva como sempre, cheia de ruídos e pressa, mas seu pensamento estava longe, preso na casa de chá que em breve veria com outros olhos — agora como seu novo e incômodo fardo.

Bomi caminhava a seu lado com um sorriso discreto, aproveitando aquele raro momento em que ele parecia mais próximo do que o usual. Quando as ruas largas deram lugar a uma viela mais estreita e tranquila, as construções modernas ficaram para trás, e pequenas casas e comércios tradicionais surgiram, trazendo um ar acolhedor e nostálgico.

Depois de alguns minutos, eles pararam em frente a um prédio antigo, com telhados tradicionais e uma pequena placa desgastada que dizia “Casa de Chá Seonghwa.” observou o local em silêncio, notando os detalhes envelhecidos da fachada e as marcas do tempo. Não era nada grandioso, mas havia um certo charme na simplicidade do lugar.

— Aqui estamos — disse Bomi, interrompendo seus pensamentos. Ela puxou um chaveiro do bolso e estendeu a chave para ele, sorrindo. — A partir de hoje, é sua responsabilidade, .

Ele pegou a chave com uma expressão indefinida, encarando o metal frio em sua mão. Esse simples objeto agora simbolizava o peso de uma tradição que ele mal conhecia. Com um suspiro resignado, ele olhou para a mãe, que lhe deu um aceno incentivador, antes de se virar para a entrada da casa de chá. Era o começo de um caminho que ele jamais esperou trilhar.

enfiou a chave na fechadura, hesitando por um momento antes de girá-la. A fechadura rangeu e a porta se abriu lentamente, revelando o interior da casa de chá. Ele entrou no local, seguido de perto por sua mãe, e procurou o interruptor. Ao acender as luzes, uma claridade suave iluminou o espaço.

Ele deu alguns passos à frente, deixando o olhar vagar pelo salão silencioso e nostálgico. As mesas baixas de madeira escura, as almofadas simples, as luminárias de papel, tudo parecia como uma pintura que havia parado no tempo. Havia prateleiras decoradas com pequenos potes de chá e chaleiras tradicionais, uma coleção de xícaras artesanais e alguns objetos que provavelmente pertenciam à sua avó.

O ar carregava um leve aroma de ervas e madeira, uma fragrância que parecia ter impregnado o lugar ao longo dos anos. não sabia exatamente o que sentia; era um misto de desconforto e fascínio, uma sensação de estar em território desconhecido, mas que de algum modo o atraía.

Ele suspirou, enfiando as mãos nos bolsos enquanto observava o ambiente. Tentava imaginar o que sua avó havia visto ali, o que a fizera dedicar a vida àquele lugar. O silêncio parecia esperar por ele, como se o local aguardasse sua decisão de fazer algo novo ou simplesmente deixá-lo definhar.

Ele caminhou lentamente, passando os olhos pelos detalhes da decoração. Uma estante de madeira desgastada estava repleta de potes de cerâmica, cada um etiquetado com nomes de ervas e misturas que ele mal reconhecia. Suas mãos instintivamente tocaram a borda de uma chaleira de ferro, o metal frio e pesado em contraste com o ambiente delicado ao redor.

Ao lado, pequenas xícaras de cerâmica pintadas à mão estavam dispostas cuidadosamente, como se aguardassem silenciosamente o próximo chá a ser servido. Ele passou o dedo pela borda de uma delas, sentindo a suavidade da superfície. Observou as luminárias de papel penduradas no teto, cujas luzes difusas lançavam sombras suaves, criando uma atmosfera quase etérea.

Cada canto do lugar parecia carregado de memórias, como se sua avó ainda estivesse ali, guiando cada detalhe. sentiu um leve aperto no peito ao perceber o cuidado que ela tivera com tudo aquilo. Ele se perguntou se, algum dia, seria capaz de entender o valor desse lugar da forma que ela parecia entender. Por ora, só o que enxergava era um peso e uma incerteza que ele ainda não sabia como carregar.

suspirou e deu uma última olhada ao redor. Passou as mãos pelos bolsos, como se ainda procurasse algo ali dentro que pudesse magicamente resolver a situação. Sabendo que não era o caso, apagou as luzes e fechou a porta atrás de si, girando a chave com um leve rangido que ecoou pela viela silenciosa. Quando se virou, encontrou a mãe parada do lado de fora, esperando pacientemente. O sorriso suave em seu rosto contrastava com a expressão carregada de .

— É um pouco… opressor, não é? — ele murmurou, enfiando as mãos nos bolsos, sem saber exatamente como descrever o que sentia.

Bomi assentiu com compreensão, dando-lhe um leve aperto no ombro.

— Eu sei que parece muita coisa agora, mas tudo bem, . Você não precisa fazer tudo de uma vez. — Ela afagou seu braço, num gesto reconfortante. — Sua avó também começou sem saber muita coisa, sabia? Ela aprendeu devagar, com o tempo… e eu sei que você é capaz de fazer o mesmo.

soltou um riso sem humor, balançando a cabeça.

— Acho que hal-abeoji tinha uma ideia exagerada de quem eu sou. Não faço ideia de como tocar um lugar desses, mãe. Já tenho problemas o suficiente no meu próprio negócio…

Bomi o olhou com ternura e se aproximou mais, segurando suas mãos com delicadeza.

— Ela te conhecia mais do que você pensa, . E, mesmo que não seja fácil, talvez isso te faça ver as coisas de outra forma… Talvez te faça descobrir algo novo, quem sabe? — disse ela, sorrindo com uma confiança tranquila que parecia acalmá-lo, ao menos um pouco.

Ele soltou um suspiro longo, encarando a fachada da casa de chá por um momento antes de olhar novamente para a mãe.

— Bom, acho que só me resta tentar.

ajeitou o paletó no braço e suspirou, lançando um último olhar para a casa de chá antes de se virar para a mãe.

— Vou te deixar em casa — disse ele, tentando soar firme, como se aquilo fosse apenas mais uma tarefa a ser feita.

Bomi assentiu com um sorriso leve, e os dois começaram a caminhar. O trajeto foi silencioso, ambos envolvidos em seus próprios pensamentos. sentia o peso da responsabilidade pulsando a cada passo, enquanto sua mãe o acompanhava com uma presença tranquila e reconfortante.

Quando finalmente chegaram à porta do apartamento dela, Bomi parou e se virou para ele, os olhos brilhando de um jeito suave.

— Entra, meu filho… — convidou ela, a voz baixa e calorosa, mas com uma nota de preocupação que ele não pôde ignorar.

hesitou, olhando para o chão e mexendo nos punhos da camisa. Não queria mostrar fraqueza, nem admitir que precisava de ajuda. Mas antes que ele pudesse encontrar uma desculpa para recusar, a mãe deu um passo à frente e segurou sua mão com carinho.

— Acho que temos muita coisa para conversar, querido — disse ela, os olhos cheios de compreensão e afeto. — Ficaria muito feliz se você me deixasse tentar consertar as coisas, juntos.

a encarou por um momento, sentindo o peso daquela oferta sincera. Um nó em sua garganta o impedia de responder, mas, de algum modo, a presença dela ali o fazia sentir que talvez, só talvez, ele pudesse encontrar uma saída. Com um aceno silencioso, ele aceitou o convite e entrou na casa dela, abrindo caminho para uma conversa que poderia mudar o rumo das coisas.

entrou na casa da mãe, e assim que cruzou a porta, foi tomado por uma sensação estranha. O espaço que se estendia à sua frente parecia totalmente diferente do que ele lembrava. As paredes, que antes carregavam uma pintura desbotada e marcas do tempo, agora estavam impecáveis, cobertas por uma tonalidade neutra e elegante. O piso, que um dia rangia sob seus pés, fora substituído por madeira clara e bem polida, refletindo a luz aconchegante de luminárias modernas.

Ele deu alguns passos, olhando ao redor. O ambiente era decorado de forma minimalista, com móveis novos e cuidadosamente escolhidos. Não havia mais sinais da estante abarrotada de livros velhos que costumava ocupar um canto da sala, nem do sofá gasto que era o ponto de reunião da família. No lugar deles, uma prateleira elegante exibia alguns livros e vasos decorativos, enquanto um sofá de couro parecia quase intocado.

franziu a testa, passando a mão pelo encosto de uma das cadeiras da sala de jantar, tentando se acostumar com a nova atmosfera. Nada naquele lugar parecia carregar as memórias da sua infância. Era como se ele estivesse em uma casa completamente diferente, de alguém que ele mal conhecia.

— Reformei tudo há uns dois anos — disse Bomi, percebendo a expressão no rosto do filho. Ela fechou a porta atrás deles e sorriu suavemente. — Achei que estava na hora de mudar algumas coisas… começar de novo.

Ele assentiu levemente, sem conseguir esconder o desconforto.

— É… ficou bonito. Só… estranho, eu acho. Não parece o lugar em que cresci.

Bomi suspirou e se aproximou, pousando a mão no ombro dele.

— Eu sei, querido. Mas às vezes, mudar o ambiente ao nosso redor nos ajuda a mudar por dentro também. — Ela fez uma pausa, os olhos carregados de um misto de carinho e preocupação. — Mas, se isso faz você se sentir distante, podemos resgatar algo daqui. Talvez um quadro, uma peça que traga boas lembranças…

deu de ombros, ainda absorvendo as mudanças. Era muita coisa para processar, mas ele sabia que aquele não era o momento de se apegar às diferenças.
— Não se preocupe, mãe. É só questão de me acostumar. — Ele sorriu de leve, um gesto mais para tranquilizá-la do que por convicção própria. — Vamos sentar? Acho que temos muito o que conversar.
Bomi sorriu diante do esforço de em parecer confortável e o guiou para a varanda.

— Vamos para a varanda, então. É o meu lugar favorito agora — disse ela, abrindo uma porta lateral que dava para um pequeno espaço externo.

A varanda era acolhedora, com um toque simples e elegante. Havia uma pequena mesa redonda com cadeiras confortáveis, rodeada por vasos com flores e ervas. O cheiro fresco de lavanda e hortelã pairava no ar, trazendo uma sensação de calma que parecia quase contrastar com o turbilhão de pensamentos na mente de .

— Sente-se aqui, querido. — Ela indicou uma das cadeiras e desapareceu por um instante, voltando com um prato contendo fatias de bolo caseiro. — Fiz esse bolo ontem. Espero que ainda esteja bom. — Ela colocou o prato sobre a mesa e sorriu. — Vou preparar um café para acompanhar. Espere só um momento.

assentiu, observando enquanto a mãe desaparecia para dentro da casa novamente. Ele pegou o garfo e cortou um pedaço pequeno do bolo, levando-o à boca. O sabor suave do doce trouxe um flash de nostalgia, um eco distante das tardes em que sua avó fazia algo parecido para ele.

Ele respirou fundo, olhando para o horizonte da varanda. Talvez essa pausa, esse momento simples, fosse exatamente o que ele precisava para organizar seus pensamentos antes de enfrentar os desafios que o aguardavam.

***
Bomi voltou à varanda carregando um pequeno bule de café fumegante e duas xícaras de porcelana, equilibrando tudo com habilidade. O aroma rico do café recém-passado preencheu o ar, misturando-se ao frescor das plantas ao redor. Ela colocou o bule e as xícaras na mesa com cuidado, lançando um sorriso caloroso para .

— Aqui está. Nada como um bom café para acompanhar uma conversa séria, não é? — disse ela enquanto começava a servir, enchendo primeiro a xícara dele e depois a sua.

observou em silêncio, o olhar vagando entre os movimentos cuidadosos da mãe e o vapor que subia do café. Aquilo era tão diferente do que ele estava acostumado na rotina acelerada de sua vida. Era simples, mas carregava uma intimidade que ele não sabia que estava perdendo.
— Obrigado, mãe — murmurou, pegando a xícara e envolvendo-a com as mãos. O calor se espalhou pelos seus dedos, quase como um lembrete de que, apesar de tudo, ele ainda tinha algo sólido a que se agarrar.
Bomi se sentou à sua frente e apoiou os cotovelos na mesa, segurando a própria xícara com um sorriso sereno.
— Agora me diga, … o que mais está te preocupando? — perguntou ela, olhando-o com aquele jeito compreensivo que só uma mãe parecia ter. — Porque eu sei que não é só sobre a casa de chá.
coçou a nuca, um gesto que denotava a sua hesitação. Ele olhou para a xícara em suas mãos, os olhos focados nela como se ela fosse a resposta a todas as suas perguntas. O calor do café parecia reconfortante, mas a ideia de falar sobre seus verdadeiros sentimentos com a mãe o deixava incomodado. Depois de tanto tempo afastado, e com tantos percalços não resolvidos entre os dois, desabafar nunca foi uma opção fácil.
Bomi, que estava observando-o atentamente, notou o desconforto do filho, o jeito como ele parecia pesar as palavras antes de pronunciá-las. Ela suspirou baixinho, colocando a xícara sobre a mesa com um pequeno tilintar e inclinando-se levemente para frente.
... — ela disse suavemente, com um olhar cuidadoso. — Sei que tem algo te incomodando além da casa de chá. Você sempre foi bom em esconder o que sente, mas não precisa fazer isso comigo, querido. — Sua voz estava cheia de empatia, mas também trazia um toque de preocupação genuína.
Ele levantou os olhos, tentando disfarçar o nervosismo que o invadia. A mãe parecia perceber mais do que ele queria mostrar, e isso o deixou vulnerável de um jeito que ele não estava pronto para lidar.
— Não sei se vale a pena falar sobre... — ele murmurou, desviando o olhar, desconfortável com a possibilidade de reviver antigas tensões. As palavras ficaram presas em sua garganta. — Acho que você tem razão, mãe, não sou muito bom em compartilhar as coisas.
Bomi suspirou novamente, com uma expressão suave, mas firme.
— Eu entendo, querido. Mas às vezes, as coisas se tornam mais fáceis quando as compartilhamos. Nós passamos por muitas coisas, é verdade, e nem sempre foi fácil entre nós. Mas eu sou sua mãe, e estou aqui para você, mesmo que você sinta que não está pronto para falar. — Ela pausou, e o olhou com carinho. — Só saiba que estou disposta a ouvir, quando você se sentir à vontade.
ficou em silêncio por um momento, o peso das palavras dela pairando no ar. Ele não sabia se estava pronto para abrir aquele capítulo da sua vida, mas algo no olhar dela fazia com que fosse difícil ignorar a sinceridade que emanava de cada palavra.
— Porque eu sempre senti que você não me amava?
Bomi ficou visivelmente surpresa com a pergunta. A xícara de café que segurava parou a caminho de seus lábios, e por um momento, ela apenas encarou , como se tentasse processar o que acabara de ouvir.

... — começou ela, a voz levemente trêmula. Ela pousou a xícara na mesa, suas mãos agora entrelaçadas enquanto lutava para encontrar as palavras certas. — Por que você diria uma coisa dessas?
Ele desviou o olhar, sentindo o peso de sua própria confissão. Não era fácil dizer aquilo, mas era algo que ele carregava consigo desde a adolescência, algo que nunca teve coragem de falar em voz alta.
— Porque você sempre pareceu tão... distante — disse ele, finalmente. — Sempre ocupada, sempre cuidando de tudo e de todos, mas nunca... de mim. — Sua voz era baixa, quase um sussurro, mas cada palavra carregava uma carga emocional evidente. — Eu achava que não era importante, que talvez eu fosse apenas... um peso para você.
Bomi respirou fundo, suas mãos agora apertando uma à outra com força.
— Meu filho... — ela começou, a voz carregada de emoção. — Se eu falhei em mostrar o quanto você é importante para mim, isso é uma falha minha, e não sua. Mas eu preciso que você saiba... nunca houve um único momento em que eu não te amasse. Nem um só.
continuava olhando para a mesa, mas as palavras da mãe começaram a penetrar a barreira de frieza que ele erguera ao longo dos anos.
— Eu me afastei, sim — admitiu ela, a voz cheia de culpa. — Eu me deixei consumir pelas responsabilidades, pelas dificuldades, pelo medo de não ser o suficiente para cuidar de você. Mas isso nunca foi por falta de amor. Era exatamente o contrário. Tudo o que eu fazia... era por você.
Ele finalmente levantou os olhos, encontrando o olhar dela. O rosto de Bomi estava marcado por uma mistura de dor e arrependimento, mas também por uma honestidade que ele não podia ignorar.
— Eu sei que não posso mudar o passado, . Mas se você me der a chance, eu quero que a gente comece de novo. Quero que você saiba o quanto eu te amo e o quanto você significa para mim.
As palavras dela ficaram no ar, cheias de uma vulnerabilidade que ele nunca havia visto antes. sentiu um nó se formar em sua garganta, mas desta vez, não tentou escondê-lo. A conversa que ele sempre evitou agora parecia ser exatamente o que precisava para começar a quebrar a distância entre eles.
respirou fundo, lutando para manter o controle das emoções que ameaçavam transbordar. As palavras da mãe pesavam em sua mente, trazendo à tona memórias que ele tinha tentado enterrar. Ele olhou para ela, ainda inseguro sobre como responder.
— É difícil... — começou ele, a voz rouca. — É difícil ouvir isso agora, depois de tanto tempo sentindo que não era assim.
Bomi assentiu devagar, compreendendo a hesitação do filho.
— Eu sei, querido. Não espero que você confie em mim de uma hora para outra. Essas coisas levam tempo. — Ela se inclinou levemente para a frente, os olhos fixos nele. — Mas eu estou disposta a esperar e a fazer o que for preciso para reconstruir o que deixamos para trás.
desviou o olhar para o jardim, observando as plantas balançarem suavemente com o vento. O silêncio entre eles não era desconfortável, mas carregado de significados. Ele sabia que tinha feridas que precisavam ser cicatrizadas, mas também sabia que não poderia ignorar o esforço dela.
— Não vai ser fácil — murmurou ele, finalmente voltando o olhar para ela.
Bomi sorriu com ternura, uma expressão que ele raramente havia visto nela.
— Nada que vale a pena é fácil, meu filho.
Ele soltou um suspiro pesado, sentindo o peso da conversa começar a diminuir, mesmo que ligeiramente. Talvez fosse o início de algo novo, ou pelo menos uma tentativa de consertar o que estava quebrado.
— Vamos tentar, mãe — disse ele, com uma sinceridade tímida. — Mas devagar, ok?
Bomi assentiu, seus olhos brilhando com um misto de alívio e emoção.
— O tempo que você precisar, . Só o fato de você estar disposto já significa o mundo para mim.
Eles se encararam por mais alguns segundos antes que ele desviasse o olhar novamente para o café. A conversa, embora breve, parecia um passo importante na direção certa.
— Acho que vou pegar mais um pedaço de bolo — disse ele, tentando aliviar o clima, e isso fez Bomi rir, um som que preencheu o ambiente com uma leveza inesperada.
— Eu sabia que você não resistiria — brincou ela, levantando-se para buscar mais.
Enquanto ela entrava na cozinha, se recostou na cadeira, olhando para o céu que começava a se tingir com as cores suaves do entardecer. Por mais difícil que fosse, ele sabia que talvez estivesse pronto para dar esse passo. E, pela primeira vez em muito tempo, ele sentiu que não estava tão sozinho.
***
ajustava delicadamente o obi de seu hanbok, certificando-se de que cada dobra estivesse perfeitamente alinhada. Era um ritual que ela fazia com naturalidade, um reflexo de sua dedicação à tradição. A sala de chá em que trabalhava, situada em um canto tranquilo de Seul, era seu santuário. O aroma de folhas de chá frescas preenchia o ar, misturado com o sutil perfume de incenso que ela havia acendido momentos antes.
O espaço era pequeno, mas cada detalhe havia sido cuidadosamente pensado. Tatames limpos, paredes de papel de arroz adornadas com caligrafia tradicional, e um tokonoma com uma pintura simples, mas cheia de significado. Para , aquilo não era apenas um lugar de trabalho, mas uma extensão de sua própria alma.
Ela passou os dedos pelo conjunto de chá de porcelana, verificando se tudo estava em ordem para a próxima cerimônia. Cada xícara, cada bule, cada colherinha tinha uma história, e ela fazia questão de respeitá-las. Trabalhar com cerimônias do chá não era apenas um emprego para ; era uma filosofia de vida, uma forma de se conectar com as pessoas e com suas raízes.
Quando o sino da porta soou suavemente, ela ergueu o olhar e sorriu com serenidade. Uma mulher de meia-idade entrou, seguida por uma jovem tímida. Provavelmente mãe e filha, pensou .
— Bem-vindas à Casa do Chá Serenity — disse ela, com uma reverência cortês. — É um prazer recebê-las.
A mãe sorriu e se curvou em retribuição.
— Minha filha está interessada em aprender mais sobre a cerimônia do chá. Eu disse a ela que você é a melhor para ensinar.
inclinou a cabeça, agradecida.
— Será uma honra. A cerimônia do chá é mais do que técnica; é um caminho para a harmonia.
Enquanto guiava as duas para seus lugares, começou a explicar os princípios básicos: respeito, harmonia, pureza e tranquilidade. Ela fazia isso com paciência, gesticulando suavemente enquanto demonstrava os movimentos precisos e graciosos necessários para preparar o chá.
— É importante lembrar — disse ela, enquanto derramava a água quente no bule — que cada etapa deve ser feita com intenção. O chá reflete o coração de quem o prepara.
A jovem parecia encantada, observando atentamente cada gesto de . Quando a cerimônia terminou, a mãe agradeceu com entusiasmo, e a filha parecia profundamente impressionada.
Depois que as duas saíram, suspirou, olhando para a xícara em suas mãos. Por mais que amasse seu trabalho, ela às vezes sentia o peso de manter viva uma tradição que muitos pareciam esquecer.
Ela se levantou e começou a limpar o espaço com o mesmo cuidado com que realizava as cerimônias. Para , a essência do chá não estava apenas na preparação, mas na forma como ele conectava as pessoas — mesmo que, às vezes, ela mesma desejasse um pouco mais dessa conexão em sua própria vida.
Enquanto dobrava o pano de limpeza, uma sensação de inquietação a invadiu. Talvez fosse apenas cansaço, ou talvez fosse algo mais. Ela balançou a cabeça, afastando os pensamentos. Amanhã seria outro dia, e o chá sempre estaria lá, esperando para ser preparado com dedicação e amor.
bufou alto enquanto encarava o recinto ainda empoeirado à sua frente. Ele nem sabia por onde começar, afinal de contas ele não sabia o que fazer com aquele lugar. Na verdade, já tinha algum tempo que ele mal sabia o que fazer com sua vida em geral.

Ele suspirou pesadamente e passou a mão pelos cabelos, sentindo os fios entre os dedos como se aquilo pudesse, de alguma forma, dissipar a pressão esmagadora em seu peito. Voltou a passear os olhos pelo lugar à sua frente, com suas mesas cobertas de poeira e o cheiro de mofo impregnado no ar, parecia um reflexo perfeito do seu estado atual: desgastado, abandonado, à beira do colapso.

Ele nunca se imaginou naquela situação. Havia anos que trabalhava duro para construir sua própria empresa de consultoria financeira, acreditando que seu futuro estava ali, que seria o suficiente. Mas a realidade havia se mostrado cruel. A economia estava instável, clientes haviam se afastado, e o que antes parecia uma oportunidade promissora agora era um fardo insustentável. O escritório onde investira tanto tempo e dinheiro estava prestes a fechar as portas, e ele mal conseguia admitir para si mesmo que era um fracasso.

E agora tinha mais essa. Uma casa de chá tradicional. Algo que ele simplesmente não entendia. Como diabos iria manter aquilo funcionando por um ano se mal sabia diferenciar os tipos de chá? Sua avó devia estar rindo dele em algum lugar.

apertou a ponte do nariz, tentando conter a crescente frustração. Sua vida parecia um castelo de cartas desmoronando, e quanto mais tentava segurar as peças, mais elas escapavam pelos seus dedos. Ele nunca tivera um círculo grande de amigos — talvez por estar sempre ocupado demais com o trabalho ou por nunca ter aprendido a confiar de verdade em alguém. As poucas amizades que construiu ao longo dos anos haviam se desgastado, como tudo o mais em sua vida.

Relacionamentos amorosos? Outro desastre. Quando não eram casuais demais para se tornarem algo significativo, acabavam desmoronando antes mesmo de começarem. E, se era sincero consigo mesmo, boa parte da culpa era dele. Ele não sabia como se abrir, como compartilhar seus medos, como se permitir ser vulnerável. Então, no fim, ficava sozinho.

E agora estava ali, encarando mais um problema que não sabia como resolver. Ele queria rir, mas sabia que, se tentasse, só sairia um som amargo.
Passou a mão pelo balcão empoeirado e soltou mais um suspiro. Como diabos ia administrar uma casa de chá se nem administrar a própria vida ele conseguia?
Andou mais um pouco pelo lugar, observando as coisas antigas deixadas lá pela avó e então pousou os olhos em um porta retrato com uma foto dela e do avô— que havia morrido quando ainda era menino, e então automaticamente ele se lembrou dos poucos momento que tivera com ela.

pegou o porta-retrato com cuidado, passando os dedos pela moldura envelhecida. A foto dentro dele mostrava sua avó ao lado do avô, ambos sorrindo de forma serena, como se não houvesse pressa na vida, como se tudo fosse simples e tranquilo. Ele se lembrava pouco do avô, mas a avó…

Ela sempre estivera lá, de alguma forma.

As memórias vieram como um vento suave, trazendo consigo ecos de um passado que ele quase esquecera. Ele se lembrou das tardes em que sua mãe o deixava na casa de chá porque precisava resolver algo do trabalho. Ele nunca gostava de ir. Achava tudo parado demais, silencioso demais. Mas sua avó sempre dava um jeito de entretê-lo.

“— Chá não é só para adultos, -ah. Quer aprender a preparar um? — ela dizia, com aquele sorriso paciente e olhos que pareciam sempre saber mais do que mostravam.”

Ele revirava os olhos, cruzava os braços e dizia que não queria brincar de fazer chá. Mas, no fim, acabava cedendo, porque sua avó tornava tudo fácil e curioso. Mostrava como segurar a xícara do jeito certo, como sentir o aroma antes de tomar o primeiro gole.
Lembrou-se também de como, nos dias mais frios, ela colocava um cobertor sobre seus ombros enquanto ele fazia a lição de casa em uma das mesas da casa de chá. Do cheiro de ervas e madeira antiga que sempre pairava no ar.
E, talvez, do que mais lhe doía lembrar: do dia em que simplesmente parou de ir.
Quando cresceu, as visitas se tornaram raras. Primeiro porque tinha aulas e atividades demais, depois porque o trabalho consumia todo o seu tempo. Ele sempre achava que teria mais oportunidades de vê-la. Mais tempo para sentar com ela e ouvir suas histórias. Mas, no fim, nunca teve. E agora, ali estava ele, segurando aquele porta-retrato em uma casa que parecia ter parado no tempo, como se esperasse pelo retorno de alguém que nunca voltaria.
O aperto em seu peito cresceu. Ele nunca se despediu direito. Nunca agradeceu.
Soltou um suspiro pesado e colocou o porta-retrato de volta no lugar. Olhou ao redor, para aquele espaço cheio de lembranças que não soube valorizar.
Talvez fosse tarde demais para consertar as coisas com sua avó. Mas, de algum jeito, ele precisava encontrar uma forma de honrá-la.
🍵🍵🍵

suspirou pesadamente e puxou uma cadeira, sentando-se em uma das mesas cobertas por poeira. Ele passou a mão pelo tampo de madeira, observando a fina camada de sujeira se acumular em seus dedos. O lugar precisava de muito trabalho. Mais do que isso, precisava de alguém que soubesse o que estava fazendo—e esse definitivamente não era ele.
"Por onde eu começo?"
Era a pergunta que martelava em sua mente desde que colocou os pés ali. Ele não entendia nada de chá, nada sobre tradições e, muito menos, sobre administrar uma casa como aquela. Sua avó conseguia, sua mãe conseguia, mas ele? Ele mal conseguia manter seu próprio negócio de pé.
Seu negócio…
O pensamento o fez pegar o celular do bolso. Se sua própria empresa estava falindo, a última coisa que ele precisava era afundar mais dinheiro e esforço em um lugar que ele não sabia nem como começar a administrar. Se ao menos tivesse alguma referência…
Ele abriu o navegador e começou a pesquisar casas de chá tradicionais em Seul. Rolou a tela, vendo fotos bem apresentadas de lugares aconchegantes, cardápios detalhados, depoimentos de clientes satisfeitos. Tudo tão distante do que ele tinha ali diante de si.
Depois de alguns minutos de busca sem rumo, um anúncio chamou sua atenção.
"Descubra a arte da cerimônia do chá. Experimente, aprenda e viva a tradição."
clicou no link, que o levou a um site elegante e minimalista. O nome da casa de chá aparecia no topo, junto com imagens de um espaço bem cuidado e harmonioso. Mais abaixo, a descrição falava não apenas sobre a venda de chás especiais, mas também sobre aulas e experiências imersivas na cerimônia do chá tradicional.
Um curso…
Ele franziu o cenho, apoiando o cotovelo na mesa e passando a mão pelo rosto. Não fazia parte de seus planos estudar sobre aquilo, mas talvez fosse um bom começo. Se ele não sabia administrar uma casa de chá, ao menos podia tentar entender do que se tratava.
E pelo que via nas fotos, aquela parecia ser uma casa de chá bem-sucedida. Se alguém podia ajudá-lo a entender aquele mundo, talvez fosse a pessoa por trás desse anúncio.
Com um suspiro resignado, ele anotou o endereço no celular e tomou sua decisão. Amanhã, ele faria uma visita.
🍵🍵🍵

— Há quanto tempo! Eu estava começando a me preocupar com você, não é Eunwoo? — Inyeop olhou para Eunwoo, que assentiu.
— Como vocês são exagerados. Tem o quê? Um mês, um mês e meio no máximo que não nos encontramos.
— Mas nós nos falávamos e nos víamos com muito mais frequência , o que tem acontecido? Não minta, nós sabemos que deve ter alguma coisa rolando…
, mexeu o café despretensiosamente, voltando seus olhos para a xícara. Ele confiava em Inyeop e em Eunwoo, eles se conheciam desde o período da faculdade, e haviam se tornado basicamente os únicos amigos de ainda tinha e mantinham-os o mais próximo o possível.
Acontece que ele tinha receio de se abrir, inclusive com os amigos. O que ele deveria dizer? Que sua empresa estava afundando? Que, além disso, agora ele tinha uma casa de chá tradicional para administrar sem ter a menor ideia do que fazer? Que, ultimamente, tudo na vida dele parecia um grande erro atrás do outro?
Ele soltou um suspiro baixo, desviando o olhar para a mesa.
— Eu só estive ocupado — murmurou, dando um gole no café.
Eunwoo cruzou os braços, arqueando uma sobrancelha.
— Ocupado com o quê? Você sempre foi um viciado em trabalho, mas agora até sumiu das nossas reuniões. Se fosse só a empresa, você nos diria.
Inyeop concordou, inclinando-se um pouco sobre a mesa.
— Exato. Então, fala logo. O que aconteceu?
apertou a alça da xícara, incerto. Ele odiava se sentir assim, como se tivesse que admitir que tinha perdido o controle das coisas. E, de certa forma, era exatamente isso.
— Aconteceu que minha avó me deixou a casa de chá dela de herança — ele disse de uma vez, sem rodeios.
Eunwoo piscou, parecendo precisar de alguns segundos para absorver a informação.
— Espera… o negócio de chás? Aquela casa tradicional que sua avó cuidou a vida toda?
— Essa mesma — confirmou, largando a colher no pires com um leve tilintar.
Inyeop soltou uma risada baixa, balançando a cabeça.
— Eu sabia que tinha algo errado… Mas, cara, que ironia! Você sempre correu dessas coisas de tradição, e agora — Ele foi interrompido por , que ergueu os olhos encarando os amigos.
— Agora eu preciso manter a casa aberta por um ano antes de poder vender. Está no testamento.
Os dois amigos trocaram olhares, claramente surpresos.
— E o que você pretende fazer? — Eunwoo perguntou.
soltou um longo suspiro, passando a mão pelos cabelos.
— Ainda estou tentando descobrir.
Ele fez uma pausa antes de continuar:
— Mas, pra começar, eu vou até uma casa de chá tradicional amanhã. Parece que eles oferecem cursos sobre cerimônias do chá. Se eu realmente preciso passar um ano com isso, então é melhor eu entender do que se trata.
Inyeop sorriu de canto, apoiando o queixo na mão.
— Nunca pensei que veria o dia em que aprenderia sobre cerimônias do chá.
— Nem eu — ele admitiu, levando a xícara aos lábios.
Mas ali estava ele. Tentando, pela primeira vez, entender um mundo que nunca lhe interessou.
— Mas e vocês? Como estão as coisas? Novidades, ou tudo na mesma? — mudou de assunto rapidamente.
Inyeop e Eunwoo se olharam, antes de olharem de volta para o mais novo:
— Eu vou ser pai. — Inyeop jogou e esperou a reação do amigo.
O café que ele estava engolindo quase voltou pela garganta e tossiu, Eunwoo lhe deu alguns tapinhas para ajudar e Inyeop riu.
— Você e a Nara voltaram, foi isso? Você vai ser pai? Caramba Inyeop, me explica isso direito. Você não pode simplesmente jogar uma informação como essa assim…
Inyeop suspirou pesadamente, tomando um gole de seu café antes de explicar melhor ao amigo:
— Não voltamos, ela me traiu inclusive, e foi por isso que me deixou tão inexplicavelmente. Ela foi embora porque não sabia quem era o pai do bebê, e bom… resumidamente? Eu sou o pai do bebê, e é um menino. Ah, e o Eunwoo está namorando!
— Você também está namorando! Quer dizer, eu não estou namorando, estou conhecendo a Jia melhor!
piscou várias vezes tentando assimilar a enxurrada de informação que os amigos despejaram de uma vez:
— Então eu perdi de vez os únicos amigos que tenho? — ele pensou alto enquanto os olhos marejavam levemente — Quer dizer, meu Deus! Parabéns Inyeop, você vai ser pai, e eu estou mega feliz por você, e quero conhecer a nova namorada. A tal Jia também Eunwoo!
— Eu não estou namorando! — Inyeop levou a xícara aos lábios outra vez — Só trocamos um beijo, Eunwoo gosta de exagerar as coisas, você sabe!
Eunwoo revirou os olhos enquanto ria dos dois amigos.
— Você vai adorar as duas, tenho certeza. Agora falta você arrumar um amor, não é? Você precisa sair mais de casa, se abrir mais para as novas oportunidades , tá parecendo um velho.
— É cara! Você não tem nem trinta anos ainda, precisamos mudar sua rotina.
riu, mas por dentro sentia um peso estranho no peito. Era engraçado como, de repente, ele parecia ser o único que ainda estava… parado. Inyeop ia ser pai. Eunwoo estava conhecendo alguém. Ambos seguiam em frente, mesmo com desafios e mudanças inesperadas. E ele?
Ele largou a colher no pires, sentindo o eco das palavras dos amigos martelar sua mente. “Você precisa sair mais de casa. Se abrir mais para novas oportunidades. Tá parecendo um velho.”
Talvez eles tivessem razão. Ultimamente, tudo o que fazia era trabalhar, se estressar e sentir que sua vida estava se despedaçando pouco a pouco. Ele não se lembrava da última vez que tinha conhecido alguém de verdade, que tinha sentido algo além de cansaço ou frustração.
O problema era… Ele nem sabia mais como mudar isso.
— Ei, não começa a filosofar demais aí — Eunwoo estalou os dedos na frente dele, trazendo-o de volta à realidade. — Não é um sermão, só queremos que você viva um pouco mais, sabe?
forçou um sorriso, assentindo.
— Eu sei… Só estou tentando entender como fazer isso.
Inyeop deu um pequeno sorriso, apoiando-se na mesa.
— Um bom começo pode ser essa casa de chá que você vai visitar. Quem sabe não conhece alguém interessante lá?
bufou, balançando a cabeça.
— O que eu vou conhecer é um monte de gente tradicionalista que respira chá e tradição.
Eunwoo riu.
— E quem sabe isso não te faz bem? Sair da sua bolha pode ser uma boa.
não respondeu de imediato. Apenas girou a xícara entre os dedos, sentindo um leve desconforto no peito. Talvez os amigos estivessem certos. Talvez fosse hora de fazer algo diferente.
E, de qualquer forma, no dia seguinte, ele daria o primeiro passo.
🍵🍵🍵

No dia seguinte…

Buzinou duas vezes antes de olhar as notificações no celular e ver algumas reclamações dos poucos funcionários que ele ainda conseguia manter na empresa. Balançou a cabeça, bufando logo em seguida ao pensar que ainda tinha que resolver o que fazer com o negócio que sempre havia sonhado.
A mãe apareceu, fechando o portão com toda a calma do mundo, como se eles não tivessem um horário marcado na casa de chás, e apesar disso, sorriu ao ver a mãe. Ele sabia que talvez, incluí-la nas programações e decisões relacionadas à casa de chás, pudesse ajudar no processo de cura que os dois estavam iniciando, então resolveu chamá-la para ir com ele.
— Bom dia querido! A mãe colocou uma das mãos sobre a dele, que repousava em sua coxa — Desculpe a demora, o meu celular acabou não despertando. Você sabe que não sou muito boa com tecnologias, não é?
deu uma risada fraca, ligando o carro enquanto olhava de relance para a mãe.
— Eu sei, eu sei… Você e tecnologia nunca se deram muito bem. Mas tudo bem, ainda temos tempo.
Ela sorriu, ajeitando o cinto de segurança.
— Você está ansioso para essa consultoria?
Ele bufou, encarando a rua à frente enquanto manobrava o carro.
— Ansioso não é bem a palavra… Mais para apreensivo. Eu nunca me vi nesse mundo do chá, você sabe. Meu negócio sempre foi outro, e agora…
— Agora você tem um desafio novo — completou a mãe, olhando para ele com suavidade. — E desafios podem ser bons, se você se permitir aprender algo com eles.
suspirou.
— Eu só não quero estragar tudo, sabe? A empresa que eu montei do zero está afundando, e eu nem sei se consigo salvar. E agora tem essa casa de chás, esse legado da vovó… Eu não faço ideia de como administrar algo assim.
A mãe assentiu devagar, como se estivesse ponderando cada palavra antes de falar.
— Você não precisa saber tudo de uma vez. É para isso que serve a consultoria. E além disso… — Ela hesitou, mas continuou. — Sua avó teria ficado feliz em saber que você ao menos está tentando.
O peito de apertou.
— Será?
— Claro que sim. Ela nunca esperou que você fosse um especialista em chás, querido. Ela só queria que esse lugar continuasse sendo especial para alguém.
Ele ficou em silêncio por alguns instantes, digerindo aquelas palavras.
— Eu acho que estou esperando que me digam logo o que fazer. Que alguém chegue e me entregue um manual de instruções para essa fase da minha vida.
A mãe sorriu, balançando a cabeça.
— A vida não vem com manuais, filho. Mas às vezes, as respostas vêm quando menos esperamos.
não soube o que responder. Apenas manteve os olhos na estrada, sentindo o peso daquela conversa se misturar à expectativa do que estava por vir.
Seja lá o que fosse acontecer naquela casa de chá, era só o começo.
🍵🍵🍵

O lugar tinha um estacionamento privativo e deu a sorte de encontrar a última vaga do local, o que o surpreendeu um pouco. Uma casa de chás, cheia daquele jeito? Aos olhos de Bommi, aquilo pareceu um bom sinal.

Caminharam para fora do estacionamento, vislumbrando a entrada do local do outro lado da rua, nervosamente ele aguardou, ao lado da mãe, que o sinal fechasse para que eles atravessassem. A cada passo, seu coração batia mais forte.
respirou fundo ao se aproximar da casa de chás. A fachada era elegante e convidativa, com detalhes em madeira escura e uma placa discreta, mas sofisticada, onde estava escrito o nome do estabelecimento em um caligrafia delicada. Ao redor da entrada, vasos de cerâmica com pequenos arbustos e flores cuidadosamente podados davam um ar acolhedor e harmonioso ao lugar.
Ele empurrou a porta de vidro, que abriu suavemente, revelando um interior iluminado por uma luz suave e aconchegante. O aroma no ambiente era um misto de ervas frescas, especiarias e um leve toque amadeirado. O espaço era bem organizado, com mesas baixas de madeira e almofadas espalhadas pelo chão em algumas áreas, enquanto outras tinham cadeiras tradicionais.
As paredes eram decoradas com prateleiras repletas de potes de chá etiquetados, alguns livros antigos e pequenas esculturas. Em um canto, um balcão de madeira polida exibia uma fileira de bules artesanais e xícaras de porcelana refinadas. Tudo parecia cuidadosamente pensado para transmitir uma sensação de tranquilidade e respeito à tradição do chá.
passou os olhos pelo espaço, notando o fluxo constante de clientes. Havia grupos conversando em voz baixa, pessoas sozinhas lendo ou apenas apreciando sua bebida, e até mesmo um pequeno espaço reservado para uma cerimônia do chá que parecia estar prestes a começar.
— Uau… — murmurou sem perceber, sentindo-se levemente intimidado.
Bommi olhou para ele com um pequeno sorriso.
— Parece que viemos ao lugar certo, não é?
assentiu devagar, sentindo uma mistura de curiosidade e receio. Se aquela casa de chá estava sempre tão movimentada, então talvez pudesse aprender algo ali.
Agora só precisava descobrir por onde começar.
Eles se aproximaram do balcão onde um jovem sorridente os atendeu:
— Eu tenho um horário marcado com a senhora Kim… meu nome é .
O atendente conferiu a agenda sobre o balcão, passando o dedo pelas anotações antes de assentir com um sorriso educado.
— Ah, sim! Senhor , estão agendados com a senhora Kim. Por favor, me acompanhem.
Ele contornou o balcão e os guiou por um corredor discreto ao lado, que levava a uma área mais reservada do estabelecimento. observou os detalhes ao longo do caminho—paredes adornadas com pinturas tradicionais, estantes repletas de potes de chá organizados por tipo e origem, além do leve aroma de ervas e especiarias que parecia se intensificar a cada passo.
Quando o atendente deslizou uma porta de correr de madeira e papel de arroz, ficou imediatamente surpreso. O "escritório" de não era nada do que ele esperava.
O espaço era aconchegante e minimalista, sem cadeiras ou mesas convencionais. No centro, uma mesa baixa de madeira polida repousava sobre um tatame, cercada por almofadas para assento. Várias chaleiras estavam dispostas em uma prateleira lateral, junto com potes de cerâmica contendo diferentes tipos de folhas e ervas. Pequenos utensílios tradicionais para o preparo do chá estavam organizados com precisão, transmitindo uma atmosfera serena e respeitosa.
Mas o que mais o pegou de surpresa foi a própria .
Ele esperava encontrar uma senhora idosa, talvez com os cabelos grisalhos presos em um coque e vestindo um hanbok tradicional. No entanto, diante dele estava uma mulher jovem, provavelmente na casa dos vinte e poucos anos, de postura elegante e expressão tranquila. Seus cabelos estavam presos em um rabo de cavalo baixo, e ela usava uma blusa de mangas largas e uma saia longa, que combinavam com a estética tradicional do ambiente, sem deixar de transmitir um toque moderno.
ergueu os olhos de um pequeno caderno de anotações e sorriu gentilmente ao vê-los entrar.
— Senhor ? — sua voz era suave, mas firme.
demorou um segundo para reagir, ainda assimilando a cena à sua frente.
— Sim… ah, sim. Sou eu. — Ele piscou algumas vezes e pigarreou, tentando disfarçar a surpresa.
fez um gesto delicado, indicando para que se sentassem nas almofadas ao redor da mesa.
— Sejam bem-vindos. Por favor, fiquem à vontade.
trocou um olhar com a mãe antes de se abaixar e sentar-se no tatame, sentindo uma mistura de curiosidade e desconforto. Ele não sabia absolutamente nada sobre chás e cerimônias, mas algo lhe dizia que aquela mulher à sua frente podia mudar isso.
🍵🍵🍵
serviu o chá em pequenas xícaras de porcelana e empurrou uma para cada um, mantendo seu olhar atento e curioso sobre .
— Então, senhor , o que os trouxe até minha casa de chás? — perguntou com um sorriso discreto, envolvendo sua própria xícara entre os dedos.
olhou para a bebida fumegante à sua frente, sentindo o aroma herbal suave que se espalhava pelo ar. Ele não sabia exatamente por onde começar.
— Bom… — pigarreou, endireitando-se ligeiramente. — Eu recentemente herdei uma casa de chás da minha avó, mas para ser honesto, não entendo nada sobre chás, muito menos sobre as tradições envolvidas.
assentiu, mantendo-se em silêncio para que ele continuasse.
— Eu tenho minha própria empresa, ou pelo menos tinha — soltou uma risada sem humor. — Ela está à beira da falência, e agora me vejo responsável por um negócio que não sei administrar. Preciso aprender, ou pelo menos entender se isso pode dar certo.
Ele lançou um olhar breve para a mãe antes de prosseguir.
— Minha mãe e eu acreditamos que talvez honrar o legado da minha avó possa nos ajudar a encontrar um propósito, mas… não sei por onde começar.
manteve sua expressão calma e atenta, seus olhos avaliando com uma mistura de curiosidade e compreensão.
— Entendo — disse ela, pousando sua xícara na mesa. — Você não é o primeiro a se ver diante desse desafio. Chá não é apenas uma bebida; ele carrega histórias, tradições e um modo de vida. E se você deseja entender esse mundo, precisará mais do que apenas conhecimento sobre ervas e infusões.
engoliu em seco. Ele sabia que não seria algo simples, mas ouvir aquilo em voz alta apenas reforçava a imensidão da tarefa à sua frente.
— Então… — ele hesitou, olhando para . — Por onde eu começo?
Um pequeno sorriso surgiu nos lábios dela, como se já tivesse a resposta pronta antes mesmo da pergunta ser feita.
— Primeiro, você precisa aprender a apreciar o chá. Depois, aprenderá a respeitar suas origens e significados. Só então poderá pensar em administrá-lo.
Ela fez uma pausa e olhou diretamente para ele.
— Está disposto a aprender, senhor ?
piscou diversas vezes, como se precisasse sair de um leve transe antes de conseguir falar. As palavras pareciam emperrar na garganta – não por falta de vontade, mas pela súbita consciência do passo que estava prestes a dar. Antes que pudesse reunir coragem, sentiu a mão de sua mãe apertar-lhe o braço, firme e encorajadora.
— Sim, estamos dispostos – respondeu Bomi por ele, a voz cheia de convicção. Ela inclinou a cabeça na direção de , mantendo o aperto reconfortante no filho. — Meu filho quer honrar o legado da avó dele, e eu também quero ajudá‑lo nesse caminho.
ergueu o olhar para , ainda surpreso com a prontidão da mãe, mas sentindo um fio de determinação nascer sob o toque carinhoso dela. Talvez fosse ali, naquele instante, que o novo capítulo realmente começava.
pousou a xícara à frente de e manteve a postura ereta, as mãos descansando sobre o joelho, como quem se prepara para ditar regras sagradas.
— Antes de falarmos sobre fluxo de caixa, marketing ou fornecedores, o senhor precisa vivenciar o chá — disse com serenidade, mas sem espaço para réplica. — Não se trata apenas de vender uma bebida; trata‑se de transmitir valores. Sem isso, qualquer estratégia de negócio será vazia.
engoliu em seco. Sentiu a mãe ao seu lado se endireitar, atenta. continuou:
— Proponho quatro encontros práticos por semana, sempre pela manhã, das seis às oito. A primeira hora será dedicada à preparação correta: escolha da água, temperatura, utensílios. A segunda hora será para degustação e reflexão. — Ela ergueu um dedo, como pontuação. — Pontualidade é essencial. O ritual não espera.
Ele abriu a boca para protestar — seis da manhã? — mas antecipou a objeção com um leve sorriso.
— A qualidade do ritual não é negociável, senhor . Se pretende honrar a memória de sua avó, deve aprender a respeitar cada detalhe, do primeiro aquecer da chaleira à última gota servida. Caso não cumpra, não há curso.
Bomi lançou um olhar significativo ao filho, apertando‑lhe de leve o braço. respirou fundo, sentindo o peso do compromisso antes mesmo de aceitar. Mas, de algum modo, aquela firmeza — quase austera — soava como a estrutura de que ele precisava.
— Tudo bem — disse, finalmente. — Quatro manhãs por semana. Eu estarei aqui.
inclinou a cabeça, satisfeita.
— Então começamos amanhã. Traga roupas confortáveis e, por favor, desligue o telefone antes de entrar. A pressa do mundo lá fora fica do lado de fora da porta.
Ele assentiu, sentindo que, ao concordar, não havia simplesmente marcado um horário: havia cruzado uma porta para um universo que desconhecia — um universo onde cada minuto era medido em silêncio, vapor e paciência.
🍵🍵🍵

deslizou a porta ainda antes do sol atingir plenamente as janelas de papel de arroz. Bomi já se despedira, deixando o filho sozinho com a jovem especialista. No tatame diante da mesa baixa esperavam dois chawan (tigelas), um pequeno chashaku (colher de bambu) e o chasen, o batedor de finos tentáculos.

— Hoje começaremos com usucha — explicou em voz serena, derramando um fio de água quente na tigela apenas para aquecê‑la. — Observe cada gesto antes de tentar.
engoliu em seco e se ajoelhou. O silêncio só era quebrado pelo leve tilintar da água. girou a tigela, enxugou‑a com o chakin, depois mediu duas porções de matcha verde‑vivo. Quando acrescentou a água, o vapor ergueu‑se, trazendo um aroma fresco, quase adocicado.
Então começou a coreografia: o chasen entre os dedos, batidas rápidas em zigzag constantes, depois circulares para polir a espuma. Cada pausa, cada respiração, era intencional — como se o tempo se dilatasse a serviço do chá.
— Agora você. — Ela empurrou o segundo chawan para .
Ele copiou os movimentos: reaqueceu a tigela, mediu o pó, despejou a água. Mas, ao tentar o ritmo firme de , o pulso rígido tremeu; um respingo verde saltou e manchou o tampo de madeira. O rubor subiu‑lhe às orelhas.
— Desculpe… — murmurou, buscando papel para limpar.
— Nada de desculpas — disse , com brandura. — A cerimônia é também sobre aceitar falhas sem pressa.
Ela tomou lugar ao lado dele, quase ombro a ombro. Seus dedos esguios fecharam‑se sobre o punho dele — apenas um instante de contato, mas suficiente para que ele sentisse o calor de sua pele. Guiou o pulso dele levemente para cima.
— Segure mais alto; deixe o movimento vir do antebraço, não da mão. Assim… — Entrelaçou‑se ao redor do chasen, mostrando o ritmo. O perfume discreto do sabonete dela misturou‑se ao vapor do matcha, e ficou subitamente consciente da proximidade: a cadência do batimento dele se confundindo com as batidas do batedor.
Sob orientação, a espuma começou a formar um véu uniforme. afrouxou o toque, mas não se afastou até ter certeza de que ele sustentava o ritmo sozinho.
Quando terminou, ele ergueu a tigela espumosa, incrédulo.
— Melhor — ela disse num sussurro, quase sorrindo. — Agora prove.
sorveu um gole. O amargor suave espalhou‑se pela língua com nota de brotos tenros; lembrava‑lhe o aroma da casa da avó, mas mais vivo, mais presente. Ele expirou devagar, sentindo uma calma inesperada.
— Você vê? — recostou‑se, mantendo os olhos nele. — Quando o movimento e a respiração encontram o mesmo compasso, o chá devolve harmonia.

Ele assentiu, ainda meio atordoado — não sabia dizer se pela lição, pelo sabor, ou pela memória daquele toque firme e paciente sobre sua mão.

Lá fora, um pardal chilreou. Lá dentro, o som ecoou suave, como se selasse o instante.
percebeu que, pela primeira vez em muito tempo, não pensava em balanços financeiros nem em planilhas: apenas no círculo de espuma perfeita dentro da tigela — e na certeza de que queria repetir aquele momento até que o gesto se tornasse tão natural quanto respirar.
O silêncio recém‑instalado foi interrompido por um zumbido insistente.
O celular de , largado contra a parede de tatame, tremia como um inseto preso. A tela acendia em sequência: notificações do grupo de funcionários, alertas do banco, e‑mails marcados como “urgente”. O velho reflexo corporativo se apoderou dele; quase esticou o braço.
— Deixe‑o descansar — disse , sem elevar a voz. Seus olhos mantiveram‑se serenos, mas firmes. — O chá não tolera pressa.
Ele congelou, a mão suspensa no ar. Dentro da cabeça, ouviu o eco do caos que o aguardava fora dali: prazos vencidos, contas vermelhas, a sensação de estar sempre um passo atrás. Sentiu um nó de ansiedade apertar o peito. Se não respondesse agora, tudo poderia ficar ainda pior.
Mas então lembrou‑se da espuma perfeita que acabara de formar, do ritmo que havia finalmente encontrado — e da mão segura que guiara a sua. Inspirou fundo. O vapor do matcha ainda pairava no ar, como se convocasse calma.
abaixou a mão, deslizou o aparelho até si, sem abri‑lo. Por um segundo, encarou a tela piscando. Depois, com um toque, colocou o celular em modo avião, desligou a tela e repousou-o virado para baixo sobre a madeira.

O silêncio voltou a ocupar o espaço, como água retornando ao leito.
inclinou‑se num agradecimento discreto.
— Quando você estiver aqui, esteja inteiro aqui — disse ela. — As respostas virão com mais clareza depois que o coração aprender a ficar quieto.
Ele sustentou o olhar dela, sentindo, pela primeira vez em meses, que escolher a quietude era uma possibilidade — e que, talvez, fosse exatamente o primeiro passo de que precisava.
🍵🍵🍵

O silêncio tornara‑se tão denso que quase podia senti‑lo repousar sobre os ombros. Ele ergueu a tigela para o gole final — a espuma ainda intacta, o verde vivo contrastando com a porcelana branca. Assim que o líquido tocou sua língua, uma onda de lembrança o invadiu.
Viu‑se menino outra vez, sentado em um banquinho baixo na antiga cozinha da avó. O cheiro de folhas moídas era o mesmo, embora ele, de carranca, empurrasse a xícara para longe, alegando que aquilo tinha gosto de mato. A avó apenas sorria, paciente, e dizia que um dia ele entenderia o valor do amargor suave. Naquela época, ele revirava os olhos e corria para brincar; agora, o perfume trazia um calor inesperado ao peito — uma pontada de saudade misturada a uma espécie de promessa.
Quando baixou a tigela, aproximou‑se com um pano de linho e limpou o rebordo, gesto final do ritual. Depois, retirou de uma caixa de madeira um pequeno embrulho de papel washi, amarrado por um fino cordão vermelho. Colocou‑o diante dele, como se fosse algo precioso.
— Matcha Gyokuro, primeira colheita — explicou, o tom suave, porém solene. — Traga‑o preparado por você amanhã. Será a sua prova de intenção: mostrar que realmente quer aprender.
tocou o pacote com cuidado; o papel era áspero, mas leve — estranhamente pesado de significado.
— Eu… — Respirou fundo, encarando o presente. — Eu vou preparar.
— Sem pressa — acrescentou . — Respeite a água, o pó, o silêncio. E lembre‑se: o chá revela o estado de quem o faz.
Ele assentiu. Guardou o embrulho dentro da pasta como quem guarda um talismã. inclinou‑se num meio‑reverência e abriu a porta de correr para que ele saísse.
O dia lá fora começava a ganhar movimento, carros e vozes enchendo as ruas de Seul. ficou parado no limiar, sentindo o celular ainda em silêncio no bolso, o cheiro do Gyokuro imaginário subindo do pacote fechado. Deu um passo para fora, mas antes lançou um último olhar para o interior sereno da sala.
“Será que consigo?”, perguntou‑se, apertando o embrulho contra o peito.
A dúvida o acompanhou enquanto descia os degraus, mas, pela primeira vez, ela vinha pontuada por algo que se parecia muito com esperança.
desceu os degraus da casa de chá com o pequeno embrulho premium guardado no paletó. Na calçada, o mundo já fervilhava; buzinas, vozes, a pressa habitual que fizera questão de banir do tatame. Ele respirou fundo, ativou o celular – agora fora do “modo avião” – e a enxurrada de notificações finalmente explodiu. Dez chamadas perdidas do gerente financeiro, quatro mensagens de clientes que tinham cancelado contratos, um lembrete do banco sobre o limite de crédito já ultrapassado.
A realidade urgente de sua consultoria financeira – a Strategies – o puxava de volta. Ele entrou no carro, programou o GPS para o centro empresarial e foi repassando mentalmente tudo o que precisava enfrentar: folha de pagamento atrasada, aluguel do escritório, rescisões, impostos… Se transmitisse ao tatame metade da bagunça que carregava na cabeça, todas as xícaras teriam rachado.
O escritório ficava no 14º andar de um prédio envidraçado que contrastava violentamente com a serenidade que ele acabara de experimentar. A recepcionista levantou‑se de imediato.
— Senhor , a equipe está esperando na sala grande. — O tom ansioso dela dizia muita coisa.
Ele deixou a pasta no balcão, afrouxou a gravata – ainda eram nove da manhã, mas já parecia noite – e seguiu para a sala de reuniões. Estavam lá apenas os “sobreviventes”: Minseo, sua gerente financeira; Jae‑ho, chefe de projetos; e duas analistas que ainda insistiam em acreditar na empresa.
Minseo projetou gráficos no telão assim que ele entrou.
— Linhas de crédito esgotadas. Receita do trimestre vinte e oito por cento abaixo do projetado. Temos caixa para, no máximo, seis semanas de operação se não fecharmos novos contratos.
sentiu o estômago revirar, mas manteve o rosto impassível. Puxou a cadeira, abriu o laptop e fez a pergunta que ninguém mais ousava verbalizar:
— Quais contratos ainda são recuperáveis?
— Dois médios e um grande – respondeu Jae‑ho, deslizando um quadro Kanban digital. — Mas o cliente grande já sinalizou que pode levar o projeto in‑house se não reduzirmos a proposta em quinze por cento.
— Se cortarmos mais quinze, viramos a zero ou negativo — Minseo rebateu. — E para completar, a auditoria tributária começa na terça‑feira.
O ar pareceu mais espesso. Durante anos, orgulhara‑se de ser o estrategista que encontrava saídas numérico‑matemáticas para qualquer desastre, mas agora até os números gritavam “game over”. Antes que o pânico se instalasse, a lembrança de batendo o chasen fez‑lhe ecoar no peito: o chá não tolera pressa. Resolveu respirar como na cerimônia – inspiração profunda, expiração lenta – e encarou a equipe.
— Precisamos enxugar escopo do cliente grande sem derrubar valor percebido. Vamos converter parte do trabalho em consultoria remota; reduz horas presenciais, mantém a margem. Quanto aos médios, oferecemos pacotes de manutenção trimestral com pagamento antecipado – desconto de cinco por cento se quitarem neste mês. Minseo, prepara as simulações. Jae‑ho, liga pros três ainda hoje e marca vídeo‑call até sexta‑feira.
Os rostos ainda tensos, mas menos sem rumo, concordaram.
— E sobre a folha? — perguntou uma das analistas.
Ele comprimiu os lábios.
— Corte temporário de vinte por cento nos salários da gerência pra cima, inclusive o meu. Se os contratos fecharem, reembolsamos integralmente. Se não… – engoliu seco – aí decidimos entre fusão ou venda de carteira. Eu pego a possibilidade de fusão com a BlueScale e volto até terça. Minseo, prepara os books. Sem dados, sem negociação.
Silêncio. Depois, breves acenos. Ele percebeu nos olhos da equipe não exatamente esperança, mas alívio de ter um plano, ainda que duro.
🍵🍵🍵

A reunião dispersou. ficou sozinho, encarando o skyline de Seul. No reflexo do vidro, viu‑se segurando o pequeno pacote de Gyokuro que retirara do bolso sem perceber: um lembrete de que, ao mesmo tempo em que lutava contra dívidas, precisaria amanhecer às seis para dominar o ritual do chá.
“Se eu falhar na empresa e na casa de chá, o que me resta?” pensou.
“Será que consigo?” A pergunta que sussurrara ao descer os degraus de voltou, agora mais alta. Mas junto dela surgia outra: “E se o cuidado que o chá exige se tornar justamente o filtro para cada decisão daqui em diante?”
Uma notificação nova apareceu na tela do celular. Ele quase a abriu por reflexo, mas fez o que mandara: bloqueou a tela, colocou o aparelho virado para baixo. Ainda haveria minutas, ligações e planilhas. Mas neste exato instante, precisava de cinco minutos de silêncio – o mesmo silêncio que fizera a espuma do matcha permanecer intacta.
Sentou‑se, respirou, e deixou que o amargor suave do chá imaginário o lembrasse de que crise também é pausa, e que no intervalo entre uma batida e outra do chasen há o espaço exato para planejar o próximo movimento.
Quando se levantou, a dúvida ainda existia, mas não era mais paralisante. Pegou o pacote de matcha, guardou‑o no cofre da mesa como quem guarda não só um ingrediente raro, mas a promessa de que cada escolha, dali em diante, teria sabor — mesmo que, por ora, fosse um amargor necessário para acordar.
E voltou ao trabalho.


O céu ainda era cinzento quando acendeu a chaleira elétrica na cozinha. Pela primeira vez em anos, ele acordara antes do despertador. A pasta com o embrulho do matcha repousava sobre a mesa como uma pequena promessa — ou uma armadilha, ele ainda não sabia.
Vestia uma camiseta simples e calças de moletom, o cabelo ainda desalinhado e os pés frios contra o chão de cerâmica. A cidade lá fora despertava aos poucos, mas dentro daquele apartamento, o tempo parecia suspenso.
Com mãos ainda pesadas de sono, abriu o embrulho cuidadosamente, como se estivesse prestes a profanar algo sagrado. O pacote de folhas premium exalava um aroma vegetal intenso, fresco e misterioso. Ele se lembrou do que dissera no dia anterior: “Respeite a água, o pó, o silêncio.”
Separou uma tigela branca simples — não era de cerâmica artesanal, nem havia tatame sob os pés, mas era o que tinha. Lavou as mãos, esquentou a água, pegou uma peneira fina para tirar as impurezas do pó, como vira fazer. Depositou duas porções com o chashaku, hesitou, e em seguida despejou a água — mas talvez quente demais.
Ao bater o chasen, seus movimentos eram apressados, desajeitados. A espuma não se formava como na aula. Algumas gotas respingaram para fora da tigela, manchando a mesa. praguejou baixo, suspirando, e quase abandonou tudo ali mesmo.
Mas então se lembrou da tigela que preparou com . Da sensação estranha e reconfortante de acertar um único gesto. Da mão dela sobre a sua, firme e paciente. Do silêncio. Da lembrança da avó.
Inspirou profundamente. Lavou a tigela. Recomeçou.
Na segunda tentativa, tentou manter o ritmo constante. A água estava mais amena, o traço do chasen mais controlado. Ainda imperfeito, ainda irregular — mas seu.
Ao final, observou a espuma fina que começava a se formar. Sorriu de leve, um sorriso breve e contido, como quem reconhece uma pequena vitória e não quer assustá-la.
Transfiriu o chá para uma garrafinha térmica, tampou com cuidado e apoiou o pacote de matcha de volta na pasta, como quem protege uma lição preciosa.
Antes de sair, ainda de pé diante da mesa, encarou a garrafa fechada.
— Se isso aqui estiver horrível, espero que ela tenha piedade — murmurou, com uma leve risada nervosa.
E então saiu de casa, levando o chá preparado por suas próprias mãos. Ainda com dúvidas, ainda carregando o peso do mundo nos ombros, mas com algo novo dentro de si: a sensação, tênue, de que estava tentando — de verdade — honrar o que recebeu.
🍵🍵🍵

— Bom dia senhor ! — conferiu as horas no relógio fixado na parede da casa de chás e então sorriu satisfeita — Pontual.

— Fiquei com medo de você, então resolvi ser o mais pontual o possível. — respondeu com um meio sorriso, enquanto tirava os sapatos na entrada e ajeitava o embrulho com a garrafinha térmica sob o braço.
arqueou uma sobrancelha, divertindo-se com a resposta.
— Medo é um bom começo — disse em tom neutro, mas com um brilho sutil nos olhos. — Mas espero que, com o tempo, você descubra que o chá funciona melhor com respeito do que com medo.
Ele apenas assentiu, não ousando retrucar. O interior da casa de chá ainda estava silencioso, banhado por uma luz suave filtrada pelas janelas de papel de arroz. O aroma do ambiente — leve e herbal — agora já lhe era familiar, quase reconfortante.
indicou o mesmo espaço reservado do dia anterior, com a mesa baixa e as almofadas dispostas cuidadosamente sobre o tatame.
— Hoje, quem servirá o chá será você. Estou curiosa para saber o que trouxe.
— Você vai precisar ser gentil — advertiu, retirando lentamente a garrafinha da pasta enquanto se ajoelhava com cuidado. — É minha primeira tentativa, então... digamos que eu passei mais tempo limpando do que preparando.

não respondeu imediatamente. Sentou-se à frente dele com postura ereta, as mãos repousando no colo com elegância. O olhar, porém, era atento. Sem traço de sarcasmo ou julgamento.

— O chá não exige perfeição. Exige presença! — disse, suave. — Me mostre o que você preparou.
Com mãos menos trêmulas do que esperava, abriu a garrafinha e despejou o conteúdo cuidadosamente na tigela. A espuma era rala, e o verde não tão vibrante quanto o da preparação de , mas ainda assim havia algo ali. Algo dele. Ele empurrou a tigela na direção dela, tentando controlar a respiração.
a pegou com as duas mãos, girou-a em um gesto cerimonial e levou-a aos lábios.
Silêncio.
observava cada movimento, como se a expressão dela pudesse confirmar ou destruir o que ele sentia. Mas não demonstrava pressa em dar um veredito. Terminou o gole, colocou a tigela de volta na mesa e ergueu o olhar.
— Está instável. Pouca espuma, e a temperatura um pouco acima do ideal. — Ela fez uma pausa, depois sorriu levemente. — Mas tem algo muito mais importante aqui.
— O quê?
— Intenção. E honestidade. — inclinou a cabeça. — E isso não se mede em colheres ou temperatura. Você começou bem, senhor .
soltou o ar que nem sabia que estava prendendo, sentindo uma pontada de orgulho infantil.
— Então... passei no teste?
— Passou na primeira etapa. A jornada ainda é longa. — Ela se levantou com leveza, estendendo a mão para ele. — E hoje, vamos aprender sobre o silêncio entre os gestos. Venha. O chá começa com o som da água e termina quando você aprender a ouvir o que está dentro de você.
Ele aceitou a mão dela — quente, firme — e se levantou, sentindo que, pela primeira vez em muito tempo, estava exatamente onde deveria estar.

soltou sua mão assim que ele se pôs de pé e caminhou à frente, guiando-o por um corredor estreito que levava a uma sala menor, ainda mais reservada que a anterior. O ambiente estava silencioso, à exceção de um filete constante de água que escorria de uma pequena fonte de pedra, no canto. O som era delicado, quase hipnótico.
No centro da sala havia uma única mesa de madeira escura, baixa e minimalista, com uma tigela já posicionada, utensílios limpos e organizados ao lado — o chasen, o chashaku, o natsume. Cada objeto em seu devido lugar, como peças de um ritual que já havia começado antes mesmo da chegada de .
— Aqui é onde costumo treinar sozinha — disse , sem virar-se. Ela ajoelhou-se com precisão e gesticulou para que ele fizesse o mesmo. — E onde você vai aprender a dominar não apenas os gestos, mas o que acontece entre eles.
— Isso parece... assustadoramente filosófico — murmurou, ajoelhando-se ao lado dela, ainda inseguro sobre como se portar.
— Porque é. — Ela lançou-lhe um olhar rápido, quase divertido. — Mas também é muito prático. O silêncio entre os gestos determina a fluidez. A intenção entre um movimento e outro molda a energia que você transmite com o chá.
Ela pegou o chasen e, com delicadeza, o posicionou nas mãos de .
— Hoje, você vai repetir um mesmo gesto por vinte minutos. Não mais, não menos. — Seus olhos se fixaram nos dele. — E vai fazer isso em silêncio absoluto.
Ele piscou.
— Vinte minutos...?
— Se parecer fácil, é porque você não está presente.
prendeu o fôlego por um segundo, depois assentiu. Posicionou-se como havia visto ela fazer, ajustou as mãos ao redor do chasen e tentou reproduzir os movimentos circulares com suavidade.
No início, parecia fácil. Mas logo percebeu seus ombros tensionando, a respiração se descompassando. A mente, inquieta, vagava: nas mensagens do grupo da empresa, nas contas a pagar, nas palavras da mãe, na expectativa de . Os minutos pareciam não passar.
E então — quando finalmente o cansaço físico e mental o fez ceder — ele soltou o ar devagar. Os movimentos desaceleraram. Ele focou apenas no som do chasen batendo na água, no vapor subindo da tigela, no som constante da fonte atrás de si.
, em completo silêncio, o observava. Um pequeno sorriso se desenhou em seus lábios. Não era perfeito. Longe disso. Mas, naquela sequência de círculos irregulares e respirações nervosas, ela via o início de algo real.
Quando os vinte minutos terminaram, ela falou novamente:
— Agora, diga o que sentiu.
hesitou, mas respondeu com sinceridade:
— Que eu tenho muito barulho dentro de mim.
assentiu devagar.
— E esse foi o seu melhor preparo de chá até agora.
Ele não respondeu. Apenas olhou para a tigela ainda fumegante à sua frente, e pela primeira vez não se apressou para escondê-la.
Do lado de fora, a cidade pulsava como sempre. Mas ali dentro, o tempo havia aprendido a esperar.
🍵🍵🍵

A tigela diante dele começava a esfriar, mas mal percebia.
Os movimentos de eram hipnóticos. O modo como ela segurava o chasen, os pulsos leves e firmes, a maneira com que cada gesto parecia ter peso, mas sem jamais parecer forçado… Era como assistir a uma dança contida — controlada, ensaiada, mas profundamente natural.
tentava acompanhar, mas sua mente traía seu corpo. Primeiro, os olhos se detiveram nas mãos dela. Depois, no traço fino dos lábios. No pescoço parcialmente exposto pelo decote do hanbok moderno que ela usava. E então, na expressão tranquila, quase inatingível, que o deixava sem saber se ela estava pensando no chá ou em absolutamente tudo ao mesmo tempo.
— Senhor . — A voz dela soou firme, mas sem levantar o tom.
Ele piscou, levemente sobressaltado, percebendo que havia parado o movimento com o chasen há quase um minuto, com a colher ainda imersa na água esverdeada.
Ahn… desculpa — murmurou, ajeitando a postura e voltando os olhos para a tigela.
o observou por um instante longo, o canto dos lábios se curvando em algo entre paciência e provocação.
— Concentre-se na aula. — Seu tom era calmo, porém firme. Inquestionável. — O chá exige respeito. E meu tempo também.
sentiu o rosto esquentar, mas antes que pudesse balbuciar outra desculpa qualquer, ela completou:
— Agora… se estiver tão interessado em me observar, talvez queira me convidar para sair quando a aula terminar. — Ela ergueu uma sobrancelha, como quem testava os limites com leveza, mas seriedade. — Aí sim, fora deste ambiente, pode ficar perdido me olhando o quanto quiser.
Ele congelou, sem saber se ria, corava, ou se se jogava para fora da casa de chá.
se inclinou ligeiramente para frente, os olhos presos nos dele.
— Mas enquanto estiver aqui, senhor … seja meu aluno. Apenas isso.
E voltou aos movimentos com o chasen, como se tivesse acabado de dar mais uma aula — uma das mais importantes, talvez.
, ainda um pouco atordoado, abaixou o olhar e tentou se concentrar de novo. Mas dessa vez, o motivo de sua distração agora pesava no peito com uma nova forma de curiosidade: não só pela arte do chá, mas pela mulher que a ensinava com tanta precisão… e tão poucos rodeios.

🍵🍵🍵
— Eu estarei livre após as 18h, senhor … — disse com naturalidade, enquanto recolhia o chasen com movimentos precisos. — Tem meu telefone. Eu aguardo sua mensagem.
ficou parado, ajoelhado no tatame, segurando a tigela como se ela tivesse acabado de se transformar em um artefato sagrado e altamente instável. A voz dela ecoava na mente dele, e tudo o que conseguiu fazer foi piscar — duas, três vezes — tentando assimilar.
Ela não o olhava diretamente agora. Terminava de organizar os utensílios, como se não tivesse acabado de lançar aquela bomba com a mesma serenidade com que serve um chá de fim de tarde.
— Espera… — ele disse, a voz mais baixa do que pretendia. — Você… está falando sério?
ori ergueu o olhar, enfim, e seu sorriso veio calmo, mas direto. Sem mistério.
— Eu nunca digo o que não pretendo cumprir, senhor .
— Mas… você acabou de me dar um sermão por não me concentrar. — Ele piscou, ainda incrédulo. — Agora está me dizendo pra te mandar mensagem e...?
— Estou dizendo que existem tempos e lugares para tudo. — Ela se levantou, com a postura impecável. — Durante a aula, foco. Depois dela… escolhas. Você decide o que quer fazer com seu tempo.
engoliu seco. Aquilo era um jogo que ele não sabia jogar, e … bem, ela parecia ter escrito as regras com caligrafia impecável em papel de arroz.
— Certo… — ele disse, ajeitando a postura e tentando recuperar um pouco da compostura. — Então, se eu mandar uma mensagem… a gente janta?
— Se for essa sua intenção, sim — respondeu ela com simplicidade. — Mas não demore muito pra decidir. A paciência, até mesmo fora do chá… tem limite.
Ela caminhou em direção à porta, deixando no ar não apenas o aroma suave das folhas recém-preparadas, mas uma tensão nova, estranha e inesperadamente excitante.
Quando a porta de correr se fechou atrás dela, ficou ali por alguns segundos, sozinho com o próprio coração batendo mais rápido do que deveria.
Olhou para o celular. Depois para a tigela.
— Tá bom… — murmurou para si mesmo, abrindo o aplicativo de mensagens. — Que mal pode haver em um jantar?
E com os dedos ainda meio trêmulos, digitou:
"18h30 funciona para você?" "Eu conheço um lugar discreto. Nada tradicional, prometo."
Ele hesitou antes de enviar, mas no fim… clicou. A bolha azul apareceu. E com ela, o primeiro gole de algo que não tinha nada a ver com chá — e tudo a ver com .
🍵🍵🍵
— Meu Deus Inyeop! Eu nem acredito, chingu!
abraçou o amigo com toda a força que ele tinha no corpo e sentiu Inyeop cambalear um pouco para trás, antes de dar alguns tapinhas em suas costas, com um sorriso discreto nos lábios.
— Porque fez isso por mim? Eu… ai caramba! Eu nem sei como te agradecer, amigo! E claro, eu prometo pagar centavo por centavo desse empréstimo!
— Você não precisa me agradecer, . — Inyeop afastou-se um pouco para poder olhar o amigo nos olhos. — E também não precisa pagar centavo por centavo. A gente só precisa de você de pé.
piscou, surpreso com a resposta, e abriu a boca para contestar, mas Inyeop levantou a mão, cortando qualquer objeção antes que ela viesse.
— Ouve aqui, chingu. Eu sei que você nunca foi de pedir ajuda… e também sei que, se chegou ao ponto de aceitar esse dinheiro, é porque está no seu limite. Então deixa eu te dizer uma coisa: você não está sozinho, tá? Nunca esteve.
engoliu seco, sentindo o rosto esquentar. A gratidão o esmagava por dentro, mas mais do que isso, era o alívio — o tipo que só vem quando você percebe que alguém te enxerga mesmo quando você tenta se esconder.
— Eu juro que vou dar um jeito nisso, Inyeop. Ainda tenho alguns clientes interessados, estou tentando reorganizar a estrutura da empresa, e... — ele passou a mão pelos cabelos, soltando um suspiro — agora também tem a casa de chá. E… bom, uma professora um tanto intimidadora.
Inyeop riu.
— A tal ?
arregalou os olhos.
— Você já sabe dela?
— Eunwoo não sabe guardar segredo nem por um dia. E, francamente, vocês deviam estar gravando essas aulas. O tanto que você fala dela sem perceber…
— Eu não falo tanto assim — ele resmungou, coçando a nuca.
— Fala, sim. E agora vai jantar com ela hoje, não é? — Inyeop o cutucou com o cotovelo.
tentou manter o semblante sério, mas o sorriso escapou antes mesmo que pudesse impedi-lo.
— Vou. Mas não faço ideia do que esperar. Ela é tão… diferente de tudo o que eu conheço.
— Talvez seja exatamente disso que você precisa — disse Inyeop, dando mais um tapinha nas costas dele. — E talvez esse jantar seja o começo de algo bom. Não só com ela, mas com você mesmo.
ficou em silêncio por alguns segundos, apenas absorvendo. Ele havia começado aquele dia fazendo chá num silêncio incômodo, depois enfrentado a coragem de mandar uma mensagem, recebido ajuda financeira que nunca imaginou aceitar, e agora…
Agora havia um jantar no horizonte — e, com ele, talvez um novo começo.
— Obrigado, Inyeop. Sério. Por tudo.
— Sempre, meu amigo. Sempre.
E os dois se abraçaram mais uma vez. Era estranho como, mesmo em meio ao caos, existiam momentos como aquele — pequenos, firmes, capazes de segurar alguém no lugar certo.
🍵🍵🍵

ajeitou os cabelos atrás das orelhas antes de abrir a tampa do batom nude e passá-lo pelos lábios com precisão e destreza. O espelho refletia uma mulher que poucos conheciam fora do tatame: poderosa, elegante e com uma confiança que não precisava de palavras para se afirmar.

Vestia um vestido tomara-que-caia preto, coberto por lantejoulas finas que captavam a luz de forma sutil, como se a própria pele cintilasse. O tecido moldava seu corpo com classe, sem exageros, exalando sofisticação com naturalidade. Ao redor do pescoço, um colar robusto de elos dourados, moderno e ousado, contrastava com a serenidade habitual da professora de cerimônias do chá. Ela sabia exatamente o efeito que causava — e não se desculpava por isso.
A maquiagem estava impecável: pele luminosa, delineado preciso nos olhos amendoados, cílios bem definidos, sobrancelhas fortes. Nada era exagerado — era controle. Era domínio. fora treinada para o silêncio da cerimônia, mas também sabia muito bem ocupar o centro de um ambiente quando escolhia fazê-lo.
Aquela noite, porém, era diferente. Ela não estava ali para ensinar, corrigir ou guiar. Estava ali como mulher. E — se soubesse o que era bom — entenderia que fora convidado a conhecê-la fora dos rituais, sem regras, sem códigos. Apenas ela.
Antes de sair, lançou um último olhar para o espelho. Um pequeno sorriso surgiu no canto dos lábios.
— Vamos ver se ele aguenta me olhar nos olhos hoje.
E com isso, calçou os saltos, ergueu o queixo e deixou o apartamento com a mesma tranquilidade com que servia um chá. Mas, dessa vez, com intenções que definitivamente não vinham em infusão.
🍵🍵🍵
O restaurante escolhido por era discreto, charmoso, com iluminação baixa e um sutil aroma de vinho e madeira no ar. Ele chegou antes do horário, o que era raro, mas o que o esperava naquela noite não era rotina.
Vestia um terno de tom verde acinzentado, elegante e moderno, com corte impecável que acentuava a estrutura de seus ombros e a postura naturalmente firme. O botão dourado no colarinho dava um toque final ao visual — clássico, mas nada óbvio. O cabelo, perfeitamente arrumado, parecia ter sido pensado até o último fio. E, no entanto, mesmo com toda a produção, estava inquieto.
Até o momento em que ela entrou.
cruzou o salão com a leveza de quem não precisa de permissão para ocupar espaço. O vestido tomara-que-caia preto com lantejoulas cintilava com discrição sob as luzes mornas do ambiente, abraçando o corpo dela com sofisticação e firmeza. O colar chamativo ao redor do pescoço, somado ao batom nude e ao delineado preciso, era o tipo de detalhe que fazia alguém virar o rosto duas vezes — e ainda assim, não ser capaz de decifrá-la por completo.
levantou-se automaticamente, como se impulsionado por uma força fora de si. Seus olhos estavam fixos nela, mas sua mente… bem, sua mente havia se esvaziado completamente.
E , por sua vez, também precisou de um breve segundo para absorver o que via. Aquele não era o homem distraído que derramava chá sobre o tatame ou que precisava de instruções para cada passo. O que ela via agora era elegância contida, uma presença firme — e um olhar que a fazia sentir que não era apenas ela quem sabia observar.
Ela sorriu, sem pressa, e parou diante dele.
— Senhor … — disse, com uma leve inclinação de cabeça. — Você me surpreendeu.
— Acho que estamos quites — respondeu ele, ainda tentando recuperar o fôlego.
olhou-o de cima a baixo, deliberadamente, e então cruzou os braços, o sorriso se tornando um pouco mais provocador.
— Se estivesse me olhando assim durante a aula, eu teria sido obrigada a interromper o ritual.
— Provavelmente teria — murmurou ele, abrindo espaço para que ela se sentasse. — E com razão.
Os dois riram, e quando se sentaram, havia algo novo entre eles: não era mais professor e aluno. Era homem e mulher. Dois mundos diferentes prestes a descobrir o sabor de um encontro sem cerimônia — mas com todos os rituais de uma tensão prestes a ferver.
E dessa vez, não queria desviar o olhar. E … não tinha a menor intenção de impedi-lo.
🍵🍵🍵
O garçom se aproximou discretamente, entregando os cardápios com um sorriso profissional. agradeceu com um leve aceno de cabeça, enquanto ainda parecia organizar seus pensamentos — ou, talvez, tentar ignorar a forma como os ombros dela brilhavam sob a luz suave do restaurante.
— Tem certeza que esse lugar é “nada tradicional”? — ela provocou, passando os olhos pelo menu. — Estou vendo pratos com nomes em francês e valores que beiram o espiritual.
riu, relaxando um pouco.
— Pensei que seria uma boa ideia equilibrar o excesso de tradição que eu já carrego na outra parte do meu dia — respondeu, apoiando os cotovelos na mesa. — Mas confesso que estou começando a achar que escolhi o lugar só pra ter certeza de que você aceitaria vir.
ergueu uma sobrancelha, interessada.
— Está dizendo que me subestimou?
— Estou dizendo que queria garantir sua presença. — A resposta veio firme, sem rodeios.
Ela cruzou as pernas de forma sutil, apoiando o queixo sobre a mão. O olhar estava mais suave agora, mas ainda tão atento quanto nas aulas.
— Você é diferente fora da sala de chá, senhor .
— ele corrigiu, com um sorriso de canto. — Hoje não sou seu aluno.
assentiu lentamente, como quem absorve uma informação antes de usá-la a seu favor.
— Certo. … — Ela testou o nome, gostando do som. — Então, me diga: por que aceitou esse desafio? A casa de chá, quero dizer. Você podia muito bem ter vendido. Usado o dinheiro para tentar salvar sua empresa. Ou ido embora.
Ele ficou em silêncio por um momento, observando a superfície da taça de vinho diante dele.
— Porque minha avó acreditava em mim de um jeito que eu não entendia. E porque eu estava cansado de não fazer nada que tivesse peso real. A empresa me exauriu. O chá, por mais difícil que seja, tem me feito ouvir coisas que eu calava há anos.
se inclinou levemente para frente.
— E você acha que eu faço parte disso?
Ele a olhou nos olhos.
— Acho que você é o motivo de eu ter continuado depois do primeiro dia.
Por um segundo, o ar entre eles pareceu se rarefazer. A intensidade do olhar de se manteve firme, mas algo em sua expressão suavizou, revelando surpresa — e talvez um certo prazer em ouvi-lo admitir aquilo.
— Que bom que você ainda não me acha insuportável — brincou ela, mas sua voz estava mais baixa, mais carregada de algo que ela mesma não soube disfarçar totalmente.
— Eu nunca achei — respondeu ele, sem hesitar. — Eu só… fico meio sem saber como lidar com você às vezes.
— Talvez eu devesse te ensinar isso também — ela provocou, apoiando as costas na cadeira, com um sorriso que misturava ironia e convite.
A refeição foi servida após mais alguns minutos de conversa. Os dois começaram a comer, mas a comida era apenas um detalhe agora. As conversas se misturavam a sorrisos discretos, olhares demorados e um silêncio confortável que só crescia entre eles.
No fim do jantar, quando o garçom retirou os pratos e ofereceu a sobremesa, fechou o menu sem nem olhar.
— Eu prefiro chá — disse, olhando diretamente para . — Mas hoje, talvez eu aceite outra coisa... dependendo de como você terminar a noite.
Ele arqueou uma sobrancelha, surpreso e fascinado.
— Você está me testando?
— Estou te dando liberdade.
sorriu. Um sorriso lento, confiante — diferente daquele que ela via na sala de chá. Era o tipo de sorriso que vinha de alguém que, finalmente, estava começando a entender como o jogo funcionava… e querendo jogar.
— Então me diga, … o que você faz depois do chá?
Ela inclinou a cabeça, deixando o cabelo cair suavemente por um dos ombros.
— Depende de quem está me servindo.
E ali, entre um gole de vinho e uma troca de olhares, os dois sabiam: o jantar estava longe de ser o fim da noite.
🍵🍵🍵
Do lado de fora do restaurante, o ar da noite estava mais fresco do que lembrava. A cidade vibrava em luzes, buzinas ao longe, e passos apressados de desconhecidos. Mas entre ele e , havia uma bolha invisível.
Uma bolha carregada de algo que o jantar inteiro preparou com cuidado: tensão, curiosidade e algo mais difícil de nomear.
— A noite está agradável — ele comentou, tentando prolongar o momento.
parou ao lado dele, os braços cruzados, o olhar fixo em algum ponto além da rua.
— Está. — Fez uma pausa curta e, em seguida, olhou diretamente para ele. — Mas estou mais curiosa para saber o que você faz quando a noite continua.
sentiu o coração acelerar.
— Eu... normalmente trabalho. Ou volto pra casa.
Ela sorriu, um sorriso curto, quase travesso.
— Hoje você não vai voltar pra casa. — E então, calmamente, acrescentou: — Você me deve um chá.
Ele arqueou uma sobrancelha, confuso.
— Eu… como assim?
— Você me serviu chá frio ontem. — Ela deu de ombros, como se aquilo fosse uma questão de justiça. — Não tive coragem de dizer na hora, pra não abalar seu ego. Mas agora… eu quero uma segunda tentativa.
— Mas... eu não tenho nada comigo.
— Sorte sua que eu trouxe. — Ela abriu a bolsa lateral, retirando discretamente um pequeno tubo de folhas envolto em papel washi e entregou nas mãos dele. — Agora só falta a chaleira.
Ele olhou para o papel, depois para ela.
...
— Vamos? — cortou, com simplicidade. — Meu apartamento é perto. E antes que você comece a pensar demais: é só chá. — Ela fez uma pausa curta, depois o olhou com mais intensidade. — A menos que você queira outra coisa.
engoliu seco.
Ela já caminhava à frente, os saltos tocando a calçada em um ritmo constante. O vestido brilhava suavemente a cada passo, como se não existisse pressa alguma no mundo.
Ele a seguiu.
Não porque estava preparado — mas porque queria estar. E porque, de todas as perguntas que o chá ensinava a fazer em silêncio… aquela noite, ele finalmente queria uma resposta.
🍵🍵🍵
O apartamento de era como ela: impecável, mas sem esforço. Minimalista, silencioso, com detalhes que revelavam uma mente refinada e sensível ao ambiente. Havia livros empilhados junto a potes de cerâmica, uma chaleira japonesa repousando sobre uma mesa baixa, e uma prateleira com pequenos frascos de folhas e flores secas, etiquetadas à mão.
entrou devagar, quase em reverência, como se já tivesse aprendido — mesmo que inconscientemente — a respeitar os espaços dela.
— Pode se sentar — disse , tirando os sapatos e deixando a bolsa sobre uma cadeira. — Fique à vontade. Aqui, o ritual é mais leve… mas não menos sincero.
Ele obedeceu, acomodando-se no tapete. Enquanto ela prendia o cabelo em um coque baixo com um grampo de madeira, se pegou observando os detalhes com mais atenção do que pretendia. O decote do vestido preto, o brilho das costas à mostra, o som suave que ela fazia ao andar descalça sobre o piso de madeira.
colocou a chaleira para esquentar e voltou-se para ele, ajoelhando-se com naturalidade diante da mesa baixa. Estava sem o colar agora, mas seus olhos pareciam mais intensos.
— Vai me ajudar ou vai ficar me encarando de novo, senhor ?
— Ainda não decidi o que me desconcentra mais: o chá ou você.
— Espero que aprenda a lidar com os dois — respondeu, entregando-lhe o chasen. — Porque nenhum deles vai pegar leve com você.
Os dois riram, mas o riso durou pouco.
Começaram a preparar o chá juntos. Ela guiava os movimentos, ele tentava se manter concentrado — mas as mãos esbarravam às vezes, os olhares se cruzavam por mais tempo do que deviam. A cozinha encheu-se de vapor e do aroma vegetal do matcha sendo batido, quente e delicado.
— Está melhor — disse ela, após o primeiro gole. — Ainda longe do ideal, mas agora eu sentiria orgulho em servir isso a alguém.
— Mesmo? — ele perguntou, olhando para ela por cima da borda da tigela.
— Principalmente se essa pessoa fosse você.
O silêncio que se seguiu não foi desconfortável — foi denso.
pousou a tigela. Ela fez o mesmo.
Não houve pressa, nem hesitação. Ele se inclinou primeiro. Ela não recuou. O beijo veio como a última gota do chá servido com perfeição: sem erro, sem interrupção.
Os lábios se tocaram com leveza no início, mas não era mulher de meias intenções. A mão dela subiu para a nuca dele, puxando-o com mais firmeza, enquanto o corpo se aproximava, ainda ajoelhado sobre o tatame. O calor entre os dois cresceu rápido, como água que ferve sem aviso.
levou uma das mãos à cintura dela, sentindo o tecido liso do vestido sob os dedos, e então a curva suave das costas nuas. suspirou contra os lábios dele, os dedos passeando por dentro da gola da camisa até desfazer o primeiro botão.
— Eu disse que era só chá — sussurrou ela.
— Você mentiu — ele retrucou, sorrindo contra a pele dela.
— Eu disse… que era só chá a menos que você quisesse outra coisa.
E naquele momento, ele queria tudo.
🍵🍵🍵
Os lábios voltaram a se encontrar, agora com mais intenção. Havia um certo tipo de urgência contida nos gestos de — como quem decide o ritmo, mas não esconde o desejo. Ela sentou-se sobre os calcanhares e, num movimento firme, puxou mais para perto, fazendo com que os joelhos dele tocassem os dela sob a mesa.
As mãos dele estavam em sua cintura, mas logo subiram pelas costas nuas até os ombros. Ele queria tocá-la com cuidado, mas o corpo dela o instigava a ser mais ousado. Como se dissesse: confie que eu aguento. Confie que eu também quero.
tirou o grampo do cabelo, soltando os fios em um movimento tão simples quanto provocante. Os cabelos caíram ao redor do rosto, e ela o empurrou com um leve toque no ombro, fazendo-o sentar-se para trás. Assumiu o controle com um deslizar de pernas firme e fluido, sentando-se agora sobre o colo dele, as mãos espalmadas em seu peito.
— Você tem mesmo a audácia de me beijar como se soubesse o que está fazendo... — ela sussurrou junto à orelha dele, a respiração quente.
— E você tem mesmo a calma de alguém que já me deixou sem chão — ele respondeu, os olhos fixos nos dela.
soltou um sorriso curto, provocativo.
— Agora eu não quero sua calma, . — Ela levou os dedos até o segundo botão da camisa dele, abrindo devagar. — Quero sua entrega.
Ele a puxou pela cintura, colando os corpos com mais firmeza, o calor entre eles crescendo, a tensão vibrando como corda prestes a estourar. Os beijos tornaram-se mais intensos, profundos, e as mãos exploravam com mais ousadia. O vestido dela deslizou por seus ombros, deixando-os nus, e ele inclinou-se para beijar ali, sentindo o gosto da pele morna e o leve arrepio que percorreu o corpo dela.
— Me diga se eu estiver indo rápido demais — ele murmurou contra a pele dela.
— Se estivesse, eu já teria parado — respondeu, firme, puxando o que restava da camisa dele para fora da calça. — Eu não sou mulher de fingir conforto. Nem de negar o que quero.
As palavras dela o atingiram em cheio. Não havia espaço para insegurança, não havia espaço para dúvida. Só para o desejo que crescia, controlado por ela, mas alimentado por ele.
se ergueu por um segundo, tirando o vestido com fluidez, sem hesitar, mantendo os olhos fixos nos dele — não havia vergonha ali. Apenas certeza.
E quando ele se permitiu deitar com ela sobre o tatame, foi como se todo o silêncio aprendido nas cerimônias do chá tivesse finalmente feito sentido: cada toque era uma pausa, cada respiração, um gesto intencional. Nada era apressado. Tudo era intenso.
Como o primeiro gole de um Gyokuro bem servido.
Como o ritual perfeito — só que dessa vez, nenhum dos dois pararia na metade.
As roupas foram deixadas de lado como se não tivessem mais utilidade, empilhadas discretamente ao lado do tatame. Os corpos se encaixaram como dois mundos distintos encontrando um ritmo comum — intenso, mas sem pressa; firme, mas cuidadoso.
explorava o corpo de com reverência, como se cada curva fosse uma resposta a uma pergunta que ele ainda não sabia formular. Ela, por sua vez, não esperava que ele soubesse o caminho — mas o guiava com o toque, com o olhar, com a respiração entrecortada que ele aprendeu a ouvir como quem aprende o som da água prestes a ferver.
ficava por cima às vezes, conduzindo com movimentos lentos e olhos abertos, como quem desafia: me sustenta assim. E quando ele a puxava de volta para si, invertendo posições, os dois entendiam que ali não havia disputa — apenas entrega compartilhada.
Beijos deixados na clavícula, mãos entrelaçadas no momento certo. Uma troca intensa, cheia de vontades silenciosas. Um suspiro mais profundo, uma frase dita entre gemidos baixos:
Não para...
E ele não parou.
O clímax veio como onda quente — não explosiva, mas avassaladora. Como quando a espuma do matcha cobre a superfície com perfeição: denso, vibrante, e ao mesmo tempo sutil. Eles permaneceram colados por longos segundos, ainda respirando forte, ainda de olhos fechados, como se o mundo tivesse parado exatamente ali.
O silêncio que seguiu não era desconfortável. Era pleno. Como o fim de uma cerimônia.
foi a primeira a se mover. Levantou-se sem pressa, buscou uma manta fina e cobriu ambos, sentando-se ao lado dele, as pernas ainda trêmulas. Olhou para e sorriu, mas não aquele sorriso profissional ou provocador. Era algo mais íntimo.
— Você está com cara de quem vai começar a pensar demais — ela comentou, ainda ofegante, passando os dedos pelo cabelo dele. — Por favor, não estrague esse momento com análise de desempenho.
— Eu não vou — ele prometeu, virando-se para ela com um brilho diferente nos olhos. — Acho que pela primeira vez em muito tempo... eu não quero pensar em nada.
— Bom começo. — Ela deitou ao lado dele e o puxou para perto, encaixando a cabeça no peito dele. — Agora me diz…
— Hum?
— Ainda acha que eu intimido você?
soltou uma risada abafada, os dedos deslizando pelas costas nuas dela.
— Muito. Mas agora eu gosto disso.
— Ótima resposta — ela murmurou. — Pode continuar me servindo chá.
Ele fechou os olhos, sorrindo.
E naquela noite, o homem que sempre buscou controle… se permitiu descansar nas mãos de alguém que o desarmava com precisão e desejo.


Continua...


Nota da autora: E aí chuchus? E esse fast burn hein????? E agora? Como vai ser o dia seguinte dos queridos nas aulas? Vejamos né

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