Codificada por: Lightyear 💫
Finalizada em: Fevereiro/2025Um amor que ninguém poderia destruir”
Sunsetz — Cigarettes After Sex
Um rosto familiar pairou sobre . Olhos afiados e penetrantes, costeletas, o pequeno cavanhaque sobre o queixo. Não era possível que fosse ele, era? O brilho dourado dos brincos sob os cabelos escuros cobertos pelo chapéu branco com manchinhas pretas não deixava dúvida alguma. Era um sonho, com certeza. Não tinha como ser real. Nos últimos anos, só vira aquele rosto através dos cartazes de procurado cada vez que a Marinha emitia uma nova recompensa pelo capitão dos Piratas do Coração.
Fechou os olhos com força. Fazia tantos anos desde a última vez. Por que sua mente tinha que ser tão dura consigo mesma depois de uma derrota que a destroçara fisicamente? Não era justo pregar-lhe aquela peça. Era cruel fazê-la se lembrar tão vividamente de quem sentia falta, ainda mais quando estava desesperada pela oportunidade de uma segunda chance.
Abriu os olhos e o rosto não estava mais lá. Ainda assim, não se sentiu melhor. Quis se agarrar à sua katana, buscar por segurança no objeto, porém não havia nada ao seu lado. Apalpou ao redor e constatou estar deitada em uma cama confortável o bastante para o seu estado deplorável. Tinha muitas dores e, o que mais a incomodava, estava longe de sua arma favorita e não sabia o porquê. Um arrepio lhe subiu à espinha. Apesar das roupas que vestia, era como se estivesse nua. Não gostava de ficar longe de sua espada.
— Ô, do cabelo azul — chamou uma voz de homem. Doía-lhe perceber o quão familiar aquele tom quase rude soara. — Há algum problema?
— Algum problema? O que você acha? — Não conseguiu evitar o sarcasmo. — Aquele maldito homem… Devo ter escapo por um triz. Pensei que estava morta, mas… aqui estou eu. — olhou ao redor, perguntando-se onde diabos seria “aqui”. Foi então que ela viu o homem escorado na parede, de olhos postos nela. O mesmo rosto de quando abrira os olhos naquele local desconhecido. — Eu estou… sonhando? Morta? Eu morri mesmo, não foi? Que merda.
Havia um certo quê de curiosidade no rosto dele.
— Você certamente não está sonhando — disse sem rodeios e cruzou os braços sobre o peito. — Nem morta. Por pouco, eu diria, mas continua viva.
fechou os olhos por um breve instante e suspirou. Ele até cruzara os braços do jeitinho que ela se lembrava, e antes a chamara por aquele apelido bobo referenciando o cabelo dela. tinha se acostumado com aquilo no passado, mas fazia tanto tempo…
— Law? — Seus olhos lacrimejaram. Ela ainda não conseguia acreditar. — É mesmo você?
— Sou eu, sim. — Deu um pequeno aceno em resposta e sua expressão suavizou-se apenas um pouquinho. Seus olhos vagaram sobre ela. — Sua aparência está horrível.
— Horrível? Que gentil de sua parte. Mas sim, acho que está. — Ela riu, e um certo alívio a envolveu. Ele estava ali. Trafalgar Law realmente estava ali, perto dela, depois de todos aqueles anos. — Você me salvou, não foi? Aquele maldito ia me matar.
— Salvei. — Havia uma pequena sugestão de divertimento no olhar de Law, e o canto de seus lábios se repuxou em um sorriso quase secreto. — Você estava em uma situação bem difícil quando a encontramos.
— Imagino que sim, já que não vi nem você e nem ninguém da sua tripulação antes de desmaiar. — tentou se sentar, porém grunhiu de dor. — Inferno!
— Pare com isso. — Law estreitou os olhos em preocupação. Ele se aproximou e pousou a mão no ombro dela para parar o movimento e evitar que ela se machucasse mais. — Não deveria se mover muito, ainda não. Sofreu alguns bons ferimentos.
— Ainda bem que tenho um médico incrível ao meu lado agora, então. — Lançou-lhe um olhar furtivo. — Suponho que tenha acabado com o homem com quem eu estava lutando. Estou certa? Ele estava fazendo os aldeões daquela ilha sofrerem, eu tinha que intervir.
— Sim, eu dei um jeito nele. — Afastou a mão e fechou a cara. — A propósito, você lutou tolamente. Não comece mais brigas que não pode vencer.
— Ora essa! Eu não podia simplesmente ficar reclusa num cantinho e deixar aquelas pessoas morrerem pelas mãos dele! — grunhiu outra vez com o esforço de sua fala agressiva, então respirou em busca de uma calma que lhe faltava. — Devo lhe agradecer, Trafalgar Law. Por isso, e por cuidar de mim e dos meus danos. Eu devo a minha vida a você… de novo.
— Você realmente não me escuta, escuta? — Law suspirou e balançou a cabeça, aborrecido. — Deveria ter mais cuidado. Se eu não estivesse por lá, você já estaria morta.
— Que sorte a minha vocês terem aparecido naquela ilha bem na hora, então — comentou ela. — E que sorte enorme eu tive por você ainda se importar.
Law revirou os olhos em um movimento que deveria ter sido automático, mas não foi. Ele teve que se forçar a isso, a demonstrar indiferença.
— Eu não me importo. — Voltou a cruzar os braços, como que para enfatizar suas inverdades. Ainda assim, não havia como negar sua preocupação com a garota, afinal, estava mais do que estampado em seus olhos. Era impossível fingir que era indiferente em relação a , por mais que se esforçasse.
— Não importa o quanto cruze os braços, Law, você ainda é péssimo em mentir para mim — ressaltou ela. — Mesmo depois de todos esses anos.
Seus lábios se curvaram para baixo com o comentário e ele desviou o olhar.
— Quem disse alguma coisa sobre mentir? — murmurou.
— Sua boca, ora essa! — ergueu as sobrancelhas. — Dizendo que você não se importa quando seus olhos gritam o contrário.
Quando Law voltou-se a ela e tentava formar uma resposta espertinha que o afastasse daquelas acusações, a porta se abriu. Um dos tripulantes entrou e concluiu, por fim, que eles estavam dentro do Polar Tang, o navio-submarino do bando dos Piratas do Coração.
— Shachi! — Ela o cumprimentou, animada por revê-lo. — Quanto tempo!
— É bom te ver de novo, , e melhor — disse ele. — Ficamos preocupados com o estado em que você estava.
— Imagino. Eu estava bem péssima mesmo. — riu de leve. — Ainda estou um pouquinho. Inclusive, o Law disse que estou horrível. Sabe como ele adora me elogiar…
— O que foi? — Law perguntou ao seu companheiro antes que aquela conversa prosseguisse.
— Estamos chegando em uma nova ilha, capitão — reportou Shachi.
— Bom. Devemos atracar e reabastecer os suprimentos — estabeleceu e olhou outra vez para . Seu olhar permaneceu sobre ela por um momento antes de se voltar a Shachi. — Mas não ficaremos por muito tempo. Temos outros assuntos para resolver.
— Desembarcarei com vocês. — forçou-se a levantar, mas não pôde esconder o grunhido de dor que o movimento lhe arrancou.
Os olhos de Law se arregalaram. Não era possível dizer se era de preocupação ou irritação com a teimosia da garota. Era bem possível que fosse as duas coisas.
— Não, você vai ficar aqui e descansar. — Foi até ela e pousou uma mão firme sobre seu ombro em uma tentativa de impedi-la de sair completamente da cama. — Você está ferida. Não está em condições de se juntar à nossa expedição.
— Bem, eu não vou ficar sozinha dentro do Polar Tang enquanto vocês estiverem fora — argumentou enquanto Shachi saía de fininho para deixar os dois se entenderem por si próprios. — De um jeito ou de outro, colocarei meus pés nessa nova ilha. Se teme pela minha saúde, Law, você pode ser um bom médico e ficar por perto.
A mandíbula dele se contraiu. Conhecia o suficiente para saber que sua teimosia era imbatível. Se a garota disse que iria, ela iria mesmo e não havia nada que ele pudesse fazer. Irritado ou não, não podia negar que, quando queria, a do cabelo azul era incrivelmente persuasiva com ele.
— Você está sendo irracional — murmurou. — Não poderá ser muito útil em sua condição. E não é uma questão de eu estar perto ou não. Isso é sobre você ficar aqui, onde é seguro e permitir que seu corpo se cure adequadamente.
— Eu não ligo. Quero pegar um ar, andar pela praia, só isso. — Levantou-se mesmo com a mão dele sobre o seu ombro. — Então… você vai devolver a minha katana ou terei de ir desarmada?
— Não está bem para lutar, . Por que tem que ser sempre tão teimosa? Que saco! — Bufou, irritado. — Não vou devolver. Não agora.
— Isso quer dizer que vai mesmo me acompanhar? — perguntou, mas fez um beicinho. — Sabe que eu me sinto nua sem a minha katana, Law. O que é um espadachim sem sua espada?
— Só vai ficar na praia, não precisará da espada — disse ele. — E, sim, irei com você.
— Ah, é? — suspirou. — Certo. Aceito sair sem a minha katana, se você tirar o chapéu.
— O quê? — Abriu mais os olhos.
— Isso mesmo que você ouviu. Eu gosto de te ver sem ele. — ergueu bem a cabeça e Law deu um passo para trás, encabulado por suas palavras diretas. — Vai me mostrar o caminho? Nunca entrei no seu navio antes, então não faço ideia de como sair. — Observou-o enquanto ele se afastava e pegava sua própria espada. — Não sei se você se lembra, mas todas as nossas… coisas… fazíamos do lado de fora.
De olhos estreitos, com uma leve irritação brilhando em seu olhar devido às pequenas provocações, Law suspirou profundamente.
— Tudo bem. — Tirou o chapéu e passou a mão pelos cabelos, exasperado. — Te mostrarei a saída.
o seguiu para fora sem dizer nem sequer uma palavra. A ilha em que desembarcaram era um paraíso de verão, com areias douradas e águas cristalinas. A tripulação dos Piratas do Coração partiu para encontrar suprimentos em um raro momento de paz, já que o local parecia calmo e nada ameaçador. Trafalgar Law, no entanto, permaneceu na praia, acompanhando aonde quer que ela fosse.
— Eu pensei que nunca mais te veria — confidenciou ela. — Foi por isso que pensei estar sonhando quando acordei com você ali, ao meu lado, cuidando de mim.
olhou de canto para o homem que caminhava com ela. A expressão dele era estoica e o som rítmico das ondas contra a costa enchia o ar, sendo o único som presente entre eles por um bom momento.
— Eu também nunca pensei que veria você de novo — confessou Law. Houve uma mudança sutil em seu olhar, uma rara vulnerabilidade que vazava através da usual máscara de indiferença que ele costumava vestir. — No entanto, aqui estamos.
— Aqui estamos de novo — concordou ela, com o coração pesado. O calor do sol em sua pele trazia lembranças de uma época em que as coisas entre os dois eram mais simples. Praias ensolaradas, conversas sussurradas sob o céu de verão. Uma época em que ela acreditava na possibilidade de algo duradouro. — Talvez o destino tenha algo em mente para nós.
— Destino? Eu não acredito em destino. — Seu olhar se deslocou para o horizonte de fim de tarde. Mesmo ao pronunciar as palavras em voz alta, ele não tinha certeza. Havia uma dúvida tênue que não conseguia afastar. Então virou-se para a garota e estudou-a com a devida atenção. — O que você acha? Passou a acreditar em destino nesse meio-tempo?
— Eu… Ai! — Ela parou de repente e levou a mão às costelas, de olhos fechados. — Inferno!
— Cuidado! — Law se aproximou dela, preocupado, e estendeu a mão para tocar seu braço de modo gentil. — Não deve se esforçar tanto. Seus ferimentos ainda são sérios.
— Não estou me esforçando, eu só fui… descuidada. — Retorceu os lábios e levantou o rosto para encará-lo, agora tão próximo. — Estar perto de você me fez esquecer meus machucados. Sinto muito, Law. Tomarei mais cuidado, eu juro.
— Você é mesmo imprudente — resmungou, mas seu olhar suavizou-se. Uma mistura familiar de preocupação e frustração guerreava dentro dele, que suspirou. — Suponho que isso seja parte do seu charme, não é?
— É, suponho que sim. — Ela sorriu, divertida, e colocou sua mão sobre a dele, que ainda repousava em seu braço. — Estávamos falando sobre destino, certo? Não tenho certeza se passei a acreditar nisso. No entanto, nos separamos há anos, quando eu não me juntei à sua tripulação porque não podia deixar para trás a minha grande amiga. E agora, uma onda do destino, ou o que quer que seja essa merda, nos juntou outra vez.
Law ficou pensativo. As circunstâncias que levaram ao afastamento deles anos atrás não haviam sido a falta de sentimentos, emoções ou o que quer que fosse entre os dois, mas sim algo externo a eles. Seu olhar manteve-se repousado sobre as mãos unidas deles. Um lampejo de algo brilhou em seu interior. Arrependimento, talvez? Saudade?
— Ondas, destino, ou como quer que chame… — murmurou. O aperto no braço dela aumentou um pouquinho, como se temesse que ela fosse desaparecer se ele a soltasse. — É uma coisa estranha, não? Ter nos unido depois de tanto tempo, mesmo que nós dois tenhamos mudado tanto.
— Pois é — suspirou ela. — Mas que sorte a minha, não? Se você não tivesse aparecido na hora certa, com certeza eu estaria morta e apodrecendo. Talvez aquela balela do fio vermelho do destino exista mesmo.
— O fio vermelho do destino? — Um pequeno sorriso enfeitou os seus lábios céticos. Não podia parar para pensar em qualquer outra parte da fala dela, ou acabaria imaginando morta. E aquela seria uma imagem dolorosa demais para ele, que já perdeu tanta gente. — Acredita mesmo nesse tipo de absurdo romântico?
— Você sabe que não. — Ela riu e sua mão segurou ainda mais firme na dele. — Mas você, de fato, me encontrou na hora exata.
— É, suponho que sim — concedeu e seu sorrisinho aumentou ainda mais. — Lugar certo, hora certa, a pessoa certa para te salvar.
— A pessoa certa… — repetiu . — Sim, eu acho que você é.
O olhar de Law encontrou o dela. O dourado dos olhos dele brilhava mais forte sob a luz do sol poente. Um emaranhado de emoções transpareciam no modo como a fitava — surpresa, confusão, saudade e talvez uma pitadinha dos mesmos sentimentos antigos que ele tentara enterrar nas profundezas de seu ser.
— A pessoa certa… — ecoou, ainda um tanto descrente. — Nunca pensei que te ouviria dizer isso novamente… ainda mais em relação a mim.
— Ah, Law… — Ela fechou os olhos e soltou um pesado suspiro. Os velhos sentimentos caíram sobre ela como uma tempestade, inundando-a por inteiro. — Fui eu quem escolhi ficar para trás, sei disso, mas… Nós deixamos tantas coisas não ditas entre nós e… E você foi embora sem nem mesmo dizer adeus.
— Acha que eu queria ir embora sem me despedir? — Raiva e dor transbordavam de sua voz. — Você sabe por que fui embora.
— Porque tinha que ir, eu sei. Não poderia parar a sua vida por causa de mim e de minhas escolhas, seria injusto. E eu fiquei porque precisava cuidar de Mizuru, minha amiga, minha irmãzinha do coração. Não podia deixá-la. — Soltou a mão dele e escorregou os dedos entre os próprios cabelos, abalada. — Mas eu esperava pelo menos uma despedida… e algumas últimas palavras antes de sua partida… e um último beijo.
Law vacilou por um instante. A lembrança de seus últimos momentos juntos ainda o afetava muito. A menção de um último beijo entre eles — ou melhor, da falta de um — lhe trouxe uma pontada forte em seu peito. Doía pensar naquilo… no que foi, no que era e no que poderia ter sido.
— Eu… não queria dizer adeus — confidenciou baixinho, sem tirar os olhos dos dela. — E eu não queria te beijar. Sabia que seria ainda mais difícil de ir embora se tivesse feito isso.
— Eu entendo, juro que entendo. — Assentiu devagar e engoliu em seco. Era o mesmo para ela. — Deixamos tanta coisa sem dizer…
— Sim. — Ele deslizou a mão pelo braço dela e segurou seu pulso. — Deixamos.
A tensão no ar era quase palpável. Os sentimentos não resolvidos de anos atrás ainda persistiam entre eles, intensos demais para qualquer palavra descrever. E Law a olhava como se buscasse por algo… uma resposta, uma explicação, um sinal. Nem ele sabia o que procurava.
— Era o lugar errado e a hora errada. Foi um péssimo timing, não foi? — Envolveu a mão dele que estava em seu pulso e entrelaçou seus dedos. Uma sensação de conforto familiar invadiu a ambos. — As coisas não ditas sempre me perseguiram, Law, mas acho que nos sentiríamos muito pior se tivéssemos conversado sobre o assunto naquela época. Porque eu ainda teria ficado, e você ainda teria partido.
— Sim, era o lugar errado e a hora errada. E nós dois éramos teimosos demais, não? — Seu polegar traçou pequenos círculos na palma da mão dela. — Talvez fosse melhor assim, sem dizer todas as coisas que sentíamos naquela época.
— Pois é. Mas a ideia de morrer sem te dizer que eu sinto, sim, todas aquelas coisas das quais falamos no passado… Que eu as sinto desde aquele dia em que estávamos sentados na praia e olhando o sol se pôr como agora… — Ela respirou fundo. — Essa foi uma das coisas que se passaram pela minha cabeça antes de desmaiar, quando aquele cara me derrubou e eu pensei que estava morrendo… A primeira foi apenas “maldito seja este homem idiota, não posso deixar ele vencer”.
Aquilo arrancou uma pequena risadinha até mesmo de Law. E a risada virou um sorriso no canto de seus lábios ao relembrar do dia que havia mencionado.
— Você sempre foi muito teimosa, sabia? — Ele não se cansava de falar aquilo. — Mas suponho que eu também era. Foi isso que nos colocou nessa confusão em primeiro lugar, né?
— Teimosos demais, nunca dizendo aquilo que deveríamos… É tão difícil deixar a teimosia de lado quando eu falo com você. — riu, mas era impossível esconder a afeição.
— Algumas coisas nunca mudam — disse ele.
— De fato — ela concordou. — Eu sinto todas aquelas coisas, Law. Eu realmente sinto. Mesmo depois de todos esses anos longe de você.
— Eu também, sabe? — admitiu calmamente. — Esses sentimentos… Eles nunca foram embora.
— Pelo menos agora dissemos um ao outro — reconheceu em um tom aliviado. — Amadurecemos o suficiente para isso.
Law apertou a mão dela com mais força e olhou na direção do pôr do sol. O tom alaranjado lançou um brilho quente sobre seu rosto, e ele se perdeu em pensamentos. não conseguia deixar de admirá-lo, navegando em sua própria saudade. Por isso, não quebrou o silêncio que existia não entre eles, os separando, mas sim com eles, os unindo como fazia no passado.
— Mas e agora? — perguntou baixinho ao voltar a encará-la. — Não podemos simplesmente… continuar de onde paramos. Muito tempo se passou. Nós dois mudamos.
— Nós sempre mudamos e, de alguma forma, permanecemos os mesmos, ao menos em essência. O tempo perdido foi perdido. Tudo o que podemos fazer é continuar vivendo nossas vidas… juntos ou não. — tomou um tempo para contemplar seus olhos, o contorno de seu rosto. — Eu sei que faz parte do seu estilo, mas sempre amei te ver sem o chapéu. Você fica tão bonito com esse cabelo.
Ela ergueu a mão livre e passou os dedos entre seus fios escuros. Um arrepio percorreu-o com o contato e ele fechou os olhos antes de respirar fundo.
— Você sempre gostou do meu cabelo, eu me lembro bem. — Sorriu de lado e olhou para . Os anos separados derreteram-se por completo com a intensidade daquela troca de olhares.
— Eu gostava, sim. — Ela umedeceu os lábios.
Os olhos de Law foram atraídos instantaneamente para sua boca e ficaram ali por um instante antes de retornar aos dela. Ele deu um passo à frente, sem soltar a mão dela.
— Você ainda parece a mesma, sabia? — murmurou. — Tão linda quanto eu me lembrava.
— Obrigada. — Abriu um sorriso bonito, feliz. — E aí, gostou do meu cabelo agora?
Law observou seu cabelo. Mesmo preso, dava para perceber que os fios azuis estavam muito mais longos do que da última vez em que estiveram juntos. Usou a mão livre para tocar a mecha que caía sobre seu ombro tatuado.
— Sim, ficou bonito. Muito mais bonito. — Colocou a mecha para trás da orelha dela e manteve a mão repousada sobre sua bochecha por mais tempo do que o necessário antes de afastá-la. — Você ainda gosta do meu?
— Eu amo — garantiu ela, sem hesitação. — Bastante.
— Só “bastante”, é? — Soltou uma pequena risada.
— E o que eu deveria dizer? — perguntou, com um brilho de diversão em seus olhos espertos. — Que estou tão apaixonada pelo seu cabelo que mal consigo respirar quando olho para ele?
— Ah, então quer dizer que está apaixonada pelo meu cabelo? — Um sorriso cintilou em seus lábios; o sorriso brincalhão do qual sentia falta.
— Quem sabe seja o contrário, não é mesmo? Afinal, é você quem gosta de me chamar de “do cabelo azul”. — Ela riu. — Tudo bem, tudo bem. Pode ser que eu esteja mesmo, mas e daí?
— Está, é? Não tenho certeza se acredito em você. — Seu tom de voz era divertido e sua mão roçou na cintura dela de um jeito que não fazia há muito tempo. — Convença-me.
— Talvez eu não estivesse falando sobre o seu cabelo — insinuou ela, sem desviar o olhar. — Como você deve ter notado.
O sorrisinho de Law vacilou por um momento e seus olhos se abriram mais.
— Você…? — hesitou quando suas bochechas esquentaram, então segurou a cintura dela com mais firmeza. — … É melhor você não falar coisas desse tipo, ou eu vou…
— Ou você vai…? — incentivou-o, curiosa. — Diga-me, Trafalgar Law, como você lida com a verdade das minhas palavras?
O ar prendeu-se em sua garganta e o rubor em seu rosto se aprofundou. Law gostava de manter a aparência fria, o rosto franzido e mal-humorado. , entretanto, lhe trazia a vontade de ceder às emoções acumuladas entre eles. Por isso, puxou-a para mais perto.
— Você realmente quer saber? — indagou.
— Não tenho nada a perder — disse ela. — Então, sim, eu quero saber. Esperei anos por isso. Me diga o que deseja fazer com a verdade sobre os meus sentimentos, Law.
O olhar dele disparou ao redor enquanto refletia. Sua mente era um campo de batalha entre suas próprias emoções e sentimentos. Queria outra vez, é claro, mas não queria perdê-la de novo. Perdas, mesmo quando não eram literais, eram difíceis de lidar. Não gostaria de passar por aquilo de novo.
— Você sabe o que eu quero. — Voltou a fitá-la com seu olhar ardente, sua voz afiada de desejo. — O que eu sempre quis, , desde o dia em que fui embora.
— Me beijar? É só isso? Ou você tem mais para mim? — perguntou. Ela sabia que havia mais, porém tinha medo de estar apenas projetando sentimentos nele, vendo coisas onde não existia nada.
— Você sabe muito bem o que quero — garantiu-lhe. Seu peito arfava com a respiração mais pesada. — Mas eu não consigo… — As palavras prenderam-se na garganta.
O conflito interno guerreava em seus olhos dourados. podia ver. Ele estava dividido entre indecisão, hesitação e tudo o mais que sentia. E então a represa, enfim, estourou. Law desfez a pouca distância entre seus corpos e capturou os lábios dela com uma fome desesperada de anos. o correspondeu de imediato, transpassando todo o seu desejo e saudade através de seus lábios e língua. Queria que ele percebesse o quanto ela sentira falta daquilo. E ele queria o mesmo ao deslizar as mãos pelo corpo dela e prendê-la em seu abraço.
E então grunhiu de repente. Uma pontada de dor surgira em suas costelas, agora pressionadas contra ele.
— Law, eu… — ela começou, mas ele pousou o indicador sobre sua boca.
Seu corpo estava tenso. Ele era o médico da história. Deveria fazê-la manter-se em repouso para se recuperar, mas estava ali, causando-lhe mais dor. De cenho franzido, afrouxou seu aperto e deu um passo para trás.
— Sinto muito — murmurou em um tom carregado de culpa e uma pitadinha de vergonha. — Eu me empolguei.
— Não, volte aqui. — Ela o puxou de volta. — Não tem que se desculpar. Eu sou a única responsável pela minha má conduta como paciente.
Ela deu uma risadinha. Law, pelo contrário, se manteve sério. Seu olhar oscilava entre o rosto dela e as costelas machucadas sob suas roupas. Com o tempo, o arrependimento deu seu adeus, porém foi substituído por preocupação e, mais do que isso, a vontade de protegê-la… e não apenas porque era a sua paciente. Não. Havia muito mais. Claro que havia.
Envolveu os braços em volta dela de novo, e se esforçou para ser o mais gentil e cuidadoso possível. Depositou beijos suaves sobre o seu rosto e desceu-os para o pescoço.
— Você está bem? — sussurrou. — Eu não queria te machucar.
— Você não me machucou, Law. Você nunca me machucou. A propósito, fez o oposto; até mesmo me salvou daquele doido na outra ilha — lembrou-lhe. — Eu senti tanto a sua falta.
— Eu também senti a sua falta, . — Abarcou seu rosto com uma das mãos e o canto de seus lábios se repuxou para cima em um sorriso torto. — Mais do que eu gostaria de admitir. — Pressionou um beijo em sua testa. — Mas estou aqui agora, e não vou a lugar nenhum.
— Exceto que você vai, sim. É um pirata, afinal de contas. Mas talvez… — titubeou e olhou ao redor por um longo tempo, então suspirou. — Você e eu, a praia, a costa, o calor, o mar, o sol… Nós temos história.
Law estreitou os olhos. Uma grande dúvida despontou em sua cabeça, junto com um medo e também uma certa expectativa. Seguiu o olhar dela e contemplou a vastidão do mar para além do Polar Tang. As lembranças o banharam como uma água morna e confortável. O verão que haviam passado juntos anos atrás… Ainda assim, não fora capaz de decifrar o que se passava pela cabeça de .
— Nós temos, sim, uma história — concordou. — Mas onde você quer chegar com isso?
— Em lugar nenhum, na verdade. Eu estava apenas… pensando sobre nós, o que compartilhamos e as coisas que nos conectam. — Mordeu o lábio de leve. — O mar está sempre envolvido, de um jeito ou de outro.
— Ele sempre fez parte de nossas vidas, não é? — Sua mão subiu para acariciar o cabelo dela. — É como se o mar nos unisse de alguma forma, como um fio condutor que liga nosso passado ao nosso presente.
— E talvez ao nosso futuro — sugeriu ela.
— Talvez — assentiu, de olhos fixos nela. — Talvez seja o destino.
— E se o mar for mesmo o destino, quem sabe eu deveria segui-lo — comentou. — O convite para eu me juntar aos Piratas do Coração ainda está de pé depois de todos esses anos?
Law arregalou os olhos. Não pôde evitar. Seu coração disparou com a antecipação e ele buscou em seu rosto e olhos algum sinal de hesitação ou incerteza.
— A oferta ainda está na mesa — respondeu com demasiado cuidado. — Mas tem certeza de que é isso o que deseja, ? Juntar-se ao meu bando não é algo a ser encarado levianamente.
— Eu nunca busquei por coisas levianas. Sempre preferi as robustas, resistentes, difíceis. Não à toa acabei envolvida com você. — Ela acariciou a lateral do rosto dele. — Não tenho mais nada me segurando a lugar nenhum, Law, não mais. Eu estava ancorada, mas minha âncora já foi içada. Mizuru foi tomada por outra doença dois verões após a sua partida e não resistiu. Então eu fiquei completamente sozinha no mundo. — Soltou um pesado suspiro. — Sabe como nunca gostei de ficar sozinha.
Law acenou com a cabeça devagar. Lembrava-se de como considerava Mizuru uma irmã, afinal, como perdera os pais quando era muito nova — assim como ele —, a garota era a sua única família. Um lampejo de nostalgia agridoce brilhou em seus olhos. Ele entendia a solidão que vinha com a perda de alguém próximo. Entendia muito bem. Sua irmã, seu pai, sua mãe, Corazón… Presenciar a morte de alguém que você amava era um tipo de coisa que jamais se esquecia. Agora, esta era mais uma coisa que Law e compartilhavam.
— Não ficará sozinha novamente — prometeu ao segurar a mão dela em um aperto reconfortante. — Caso se junte aos Piratas do Coração, você será parte de uma família. Eu cuidarei de você.
— E eu, de você — prometeu de volta. — Então, é isso. Estou oficialmente me tornando uma pirata.
— Bem-vinda a bordo, do cabelo azul. — Um sorrisinho satisfeito curvou seus lábios. — Espero que esteja pronta para a vida de pirata. Nem tudo é sol e arco-íris, sabia?
— Qual é, Law! Você me conhece melhor do que isso. — Ela revirou os olhos, mas não foi capaz de esconder o sorriso. — Eu nunca estive atrás de sol e arco-íris.
— É, eu sei bem. Aprendi isso em primeira mão. — Seu olhar vagou sobre ela com carinho. — Sempre gostou mais de aventuras emocionantes e escapadas perigosas, se bem me lembro.
— Provavelmente foi por isso que me senti atraída por você assim que te vi. — Ela riu, nostálgica. — E pensar que eu passei a acreditar, nos últimos anos, que o que tivemos naquela época tinha sido apenas um amor de verão e nada mais… Mas aqui estamos.
— Parece que o destino tinha outros planos para nós. — Deslizou os dedos pelo braço tatuado dela. — Mesmo que tenha levado algum tempo e uma boa distância para encontrarmos o caminho de volta um para o outro.
— Aquele destino no qual você e eu não acreditamos? — brincou.
— É, talvez esse tal de destino tenha uma maneira engraçada de se provar, até mesmo para descrentes como nós. — Law riu baixinho. — Aqui estamos, anos depois, juntos novamente sob o mesmo sol.
— Em um outro verão — acrescentou ela. — Mas agora ficaremos juntos, já que me tornei sua companheira, uma tripulante do seu navio. Certo, capitão?
— É isso mesmo, companheira — assentiu. — Agora faz parte do meu bando e está presa a mim.
— Parece ótimo. — Ela olha para o lado, para o vasto oceano. — Nunca pensei que o mar me chamaria como está fazendo agora. Mizuru era quem sonhava com isso: navegar, ser pirata, se aventurar pelo mundo… Agora o sonho dela é meu.
— Às vezes a vida encontra um jeito de mudar nossos sonhos e aspirações. — Ele apertou o ombro dela, um toque gentil que a passava confiança. — Mas talvez você sempre tenha sido destinada a seguir o sonho dela. Do seu próprio jeito.
— E ao seu lado, sob o seu comando, parece uma boa maneira de fazer isso. — Sorriu outra vez. Parecia sorrir com cada vez mais frequência desde que reecontrara Trafalgar Law.
— Ter você ao meu lado, como companheira do bando dos Piratas do Coração, parece certo — declarou. — Nós passamos por muita coisa juntos no passado, e agora estamos prestes a embarcar em aventuras ainda maiores. Garantirei que você esteja segura, , Agora e sempre.
— Ei, preocupe-se mais em cuidar dos meus ferimentos, que eu dou conta do resto — provocou. — Eu sou uma boa espadachim, ou será que se esqueceu?
— Ah, eu sei bem do que você é capaz. — Revirou os olhos, apesar de estar claramente se divertindo com a conversa. — Mas mesmo os melhores espadachins podem ficar um tanto imprudentes às vezes.
— Assim como eu fiz na outra ilha? — sugeriu, de olhos estreitos, e então riu. — Sou imprudente e também muito teimosa, não sou?
— Teimosa, imprudente e destemida — listou em tom afetuoso, um sorriso genuíno cruzou seus lábios. — Você dá trabalho, isso é certo.
— Bem, talvez você possa me ajudar a me manter no meu lugar — considerou. — Mas não posso prometer que vai funcionar, é claro.
— Ah, acredite em mim, farei o meu melhor para te manter sob controle — garantiu. — Mas você está certa. Aposto que não funcionará com essa sua cabecinha teimosa.
— Venha aqui. — Puxou ele para perto, rindo, e pressionou seus lábios nos dele. — Sei que já disse isso mil e uma vezes, mas… eu senti sua falta.
— Eu também senti sua falta, — murmurou entre beijos. — Mais do que você imagina.
— Prometo que nunca mais precisará sentir a minha falta. Permanecerei com você até o fim, e quando este fim chegar para você, chegará para mim também — assegurou-lhe com um sorriso. Era uma promessa que pretendia cumprir. — Estou muito feliz de, enfim, poder me juntar à sua tripulação… e de estar com você novamente.
— Estou feliz por você estar aqui. — Law descansou sua testa contra a dela. — E não deixarei de valorizar isso. Teremos nossos altos e baixos, ainda mais como um bando, mas sempre estarei lá para você.
Ele se inclinou e roubou um beijo lento e terno. O sol para eles havia se posto no passado e renascia hoje. Mas o que realmente nascia, bem ali, com aquele beijo apaixonado, era algo novo. Algo ainda mais bonito.
— E eu estarei lá para você — comprometeu-se. As ondas quebravam próximas a eles, mas não ouvia mais nada; apenas suas vozes e respirações emaranhadas. — Até que o sol se apague para sempre.
— Até que o sol se apague. — Apertou seu abraço ao redor dela. — Eu manterei essa promessa, pode ter certeza disso.