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Última Atualização: Fanfic finalizada!
CAPÍTULO UM
Sabe aquele momento da vida que você se pergunta em qual parte da vida a escolha que fez resultou naquele outro resultado? Era exatamente isso que estava se questionando enquanto subia 5 lances de escadas, os quais já até esteve acostumada no passado, mas tinha meses que não aparecia por ali.
Subir aquilo tudo e processar mentalmente os últimos três anos de existência parecia um eterno déjà vu. Só que dessa vez o motivo era outro, um que ela se envergonhava profundamente, mas era orgulhosa demais para admitir.
Quando chegou na frente do apartamento 5B, refletiu mais dez vezes se realmente faria isso. Tudo se resolveria se contasse a verdade, certo? Certo! Só que não queria contar, e, mesmo assim, já tinha começado a mentir o suficiente para começar a retroceder agora. Precisava de uma desculpa plausível para sua mente entender todas as circunstâncias, mesmo que estivesse rezando a todos os santos já inventados para que ele dissesse que sim, toparia.
Bateu na porta. Com pouca força.
Não teve resposta.
Respirou fundo.
Bateu de novo, mais forte dessa vez.
Ouviu um “já vai”.
Exprimiu todo o ar dos pulmões. Será que dava tempo de correr escada abaixo?
Não, não dava, porque enquanto sua mente viajava por quilômetros de distância, a porta se abriu e estava bem na sua frente um homem mais alto que ela, cabelo raspado, barba ralinha e ainda sem camisa, exibindo os músculos tímidos do abdômen, encarando-a de forma curiosa com aqueles belos olhos castanhos. Ele não mudará nada desde da última que o viu, alguns meses atrás, continuava a mesma pessoa irresistível e, aquele perfume... Se tivesse como ficar mais arrependida de todas as decisões, aquele exato momento definitivamente era O momento, já que aquele homem era nada mais e nada menos que , seu ex-namorado.
— ? O que está fazendo aqui? Aconteceu alguma coisa? — Ele estava surpreso, mas, ao mesmo tempo, parecia espantando.
Imediatamente, o cérebro da mulher se esvaziou por completo. Como que falava mesmo?
— Er... Então... — Respirando fundo mais uma vez e fechou os olhos. Precisava se recompor. Era só um homem, porra. — Preciso muito de um favor seu.
ergueu uma sobrancelha começando a achar toda aquela situação levemente engraçada, não era do tipo de mulher que ficava sem palavras tão fácil. O que também o deixava mais apavorado; alguém devia ter morrido.
— Não, ninguém morreu. — Ela acrescentou rapidamente, como se lesse seus pensamentos. — Mas preciso que você me escute sem me interromper até que eu termine, ok?
O rapaz cruzou os braços e concordou com a cabeça. Ela apenas soltou o ar que ainda estava segurando
— Bom, como você sabe, minha irmã vai casar nesse próximo final de semana e estava tudo certo até que uma das madrinhas da minha irmã, Rose, aquela loira que estava grávida e tudo mais, lembra? Então o bebê nasceu antes do esperado, o que significa que ela não vai poder mais ir, e agora minha mãe me ligou desesperada perguntando se eu não podia ir mesmo ao casamento porque estão precisando de mais uma madrinha. E como o compromisso que tinha para esse final de semana foi cancelado, confirmei, sim, claro que ia, por que não? É minha irmã quem está se casando, afinal. Só que o marido de Rose também não vai e elas nos querem lá como um casal porque acho que meio que não contei que terminamos e agora não sei como desmentir porque não quero decepcionar minha mãe e surtar minha irmã mais um pouco e tão será que você não poderia assim... ir comigo?
respirou pela primeira vez após tagarelar todo o discurso que tinha pensado da pior maneira possível e sorrindo no final, para passar uma certa segurança (que não tinha), aguardando ansiosamente uma mínima reação do rapaz à sua frente, que continuava quase imóvel.
tentou processar cada palavra vomitada à sua frente de maneira racional, mas estava completamente confuso, nem sabia por onde começar, então tentou pelo óbvio:
— Por que você não contou que terminamos? Ou melhor, que você terminou comigo?
Ela sabia que aquela pergunta viria, só não sabia como responder.
— Não sei.
— Ah, , qual é?
— Olha, minha mãe gosta muito de você e quando conversamos pelo telefone ela só me pergunta como está e respondo que está tudo bem, não tive oportunidade de contar sobre.
— Em quatro meses?!
apertou os lábios com força. Sabe que ele está certo, quase sempre está mesmo. Porra, é uma das pessoas mais inteligentes que já conheceu na sua vida inteira.
— , se você não quiser aceitar, tudo bem, só que precisava vir tentar, ou melhor, implorar que você fizesse esse favor por mim.
O rapaz coçou a cabeça incrédulo, de todas as coisas que teria programado para uma terça-feira à tarde dificilmente seria uma discussão no corredor do prédio com sua ex-namorada.
Eles não se viam tinha quatro meses, ela tinha terminado, ele respeitou o afastamento dela, mesmo que fosse contra, e agora ela estava ali, pedindo que viajassem juntos para um casamento sendo que não estavam juntos? Era maluquice.
— Não vai rolar. — disse por fim. — Arrume uma briga familiar, procure um novo namorado, não sei, não vai acontecer.
— Por favor, sei que não tenho direito, mas...
— É exatamente isso, você não tem. — ele a interrompeu, extremamente indignado. — Você passou meses sem dar notícias, sequer veio saber como fiquei depois que tudo acabou, e agora aparece aqui na minha porta pedindo para fingir que nada aconteceu? Simplesmente não consigo.
— , por favor... — A voz dela já estava levemente embargada, pensou por um instante que ia chorar ali mesmo, na frente dele.
a encarou nos olhos pela primeira vez desde que abriu aquela porta e quase largou todo aquele discurso no lixo. Olhar naqueles olhos tão azuis quanto o mar era sua perdição, sentia tanta falta dela. Era possível que ele quisesse beijá-la bem ali enquanto estavam discutindo? Ele ainda a amava demais.
— Você parou para pensar em todos os passos do que está pedindo? Que vamos ter que conviver como um casal por alguns dias? E quando voltar? Vai continuar mentindo para sua família até surgir outro evento social e tentar me arrastar junto?
— Vou contar para eles que terminamos. Eu juro!
ainda estava desconfiado. Não estava mesmo pensando em concordar com aquela ideia maluca, estava?
— Posso pedir quartos separados, se preferir.
Ele não achava que ia ajudar.
— Eu simplesmente não consigo fingir que tudo está tudo bem, . Simplesmente não consigo.
— Também não vai ser fácil para mim.
— Há alguns meses pareceu extremamente fácil!
Touché.
Ela não ia chorar, não ia.
Não foi fácil para ela também.
Nunca foi.
Mas merecia toda aquela revolta, merecia ouvir toda a frustração sendo despejada bem ali, na porta daquele apartamento, que ela praticamente morou nos últimos anos de tanto que frequentou.
Não sabia em que momento realmente teve a esperança de que ele fosse dizer de bom grado que iria, sim, compactuar com uma farsa que ela bolou só porque é fraca o suficiente para não dizer a verdade para sua mãe. Recusou-se a prologar aquele momento, não estava pronta para a verdade ainda.
— Quer saber? Esquece! Fui idiota demais em pensar que essa conversa levaria para algum lugar — falou, dando meia-volta e seguindo para o lance de escadas quando foi impedida por uma mão segurando o seu braço.
Aquele toque era quase letal para ela, continha algum tipo de eletricidade que irradiava todo o seu corpo, não sabia ao certo se era realmente só um toque no braço ou se tinha acabado de ter uma descarga elétrica.
Já para , ele estava vendo a mulher que o abandonou após meses, e agora ela queria simplesmente sair como se nada tivesse acontecido? De novo? Precisava de respostas.
— O que eu ganho com tudo isso?
mordeu os lábios. Para aquilo não tinha resposta. E nem precisava, pois aquele simples gesto fazia o coração dele ir de 0 a 100 em segundos.
💍
— Sinceramente? Acho que você está ficando maluco.
Assim que saiu da porta do apartamento de , ele rapidamente ligou para Ryan Horner, seu melhor amigo, como a sociedade o caracterizava. Eles se conheceram enquanto cursavam Ciências Políticas, e ambos decidiram seguir carreira juntos, praticamente, mesmo que em estudos diferentes. Naquele estágio da vida, Ryan dava aula na Universidade da Califórnia, enquanto terminava o doutorado na mesma universidade.
Horner era aquele tipo de amigo que toparia ir a um bar perto da universidade em plena terça-feira, às cinco horas da tarde, só para humilhá-lo sem dó depois que você contasse quais decisões tomou na vida. Sem mencionar que ele conseguia arrumar tempo na vida de professor universitário para malhar pesado, dando a ele músculos de sobra para que não ousasse contrariá-lo. Nem os cabelos levemente ondulados que iam até a orelha ou os olhos azuis claros ajudavam a amenizar a postura rígida do professor, apesar que era uns 15 cm mais alto, mas só frequentava a academia “para cuidar da saúde”.
— Eu concordo cem por cento. — Bebeu mais um gole de cerveja, extremamente frustrado do porquê diabos tinha aceitado aquela loucura. — Sabe o que é pior? Eu tenho convicção que estava começando a superá-la.
Ryan riu, negando com a cabeça enquanto bebia da sua cerveja também.
— Não precisa mentir para si mesmo, cara. Lembro claramente de ouvir uma reclamação sua sexta passada.
Tal evento se tratava de um encontro duplo que Horner tinha programado com uma amiga da namorada dele. No final, tudo até que se saiu bem, mas quando o encontro acabou, comentou que a mulher que ele saiu era “até que gente boa, mas não era a ”.
— O que você espera disso tudo, afinal? — O professor arqueou as sobrancelhas, curioso.
— Quero tentar entender por que que ela foi embora sem dar explicação. Acho que mereço saber.
— Você realmente precisa saber? — Ryan questionou de forma retórica, ajeitando a postura e encarando aquele papel de professor conselheiro que odiava. Bebeu mais um gole da cerveja rapidamente, demonstrando como aquele assunto o deixava desconfortável.
tentou, de todas as formas, não se culpar pelo que aconteceu e seguir em frente, um dia de cada vez, só que simplesmente apareceu na porta da casa dele, e aí surgiu a oportunidade perfeita para descobrir por quê, necessitava de uma resposta, mesmo que talvez não fosse gostar tanto dela.
— Você quer voltar com ela?
mexeu os ombros. Não tinha como Ryan voltar a falar de coisas simples como quem venceria a próxima eleição, sei lá?!
— Não está nos meus planos.
— Mas você ainda a ama, não ama?
Ele queria responder àquela pergunta? Ryan apenas soltou um riso nasalado quando ficou sem resposta.
— Se eu fosse apostar, , diria que você não quer saber um porquê, você só quer uma segunda chance. Mas é você quem merece essa chance? Ou ela?
Ryan Horner era um diabinho em pessoa, por isso eram tão amigos.
E era o maior ponto fraco de .
O doutorando em ciências políticas estava completamente apaixonado, rendido por uma garçonete vinda do interior de Illinois.
E a única coisa que ele queria ao final daqueles dias que passariam juntos era não sair tão machucado como da primeira vez em que ela terminou tudo.
💍
chegou na lanchonete que trabalhava por volta das seis horas da tarde, ficaria no expediente até fechar naquele dia. Ela queria poder dizer que estava menos ansiosa agora que tinha aceitado fazer parte do plano que elaborara, mas só de pensar que precisava lidar com a família inteira enquanto mentia cara a cara com eles, fazia-a roer as unhas mais ainda.
sempre teve problemas familiares: seus pais, em geral, sempre foram muito rígidos, e a mulher sempre se sentiu um tremendo fracasso em tudo… Esse teria sido o principal fator que não permitiu que ela contasse que tinha terminado o namoro, primeiramente porque ela ainda precisava entender consigo toda a situação, e, segundo, que, depois de tantos relacionamentos fracassados e de ser taxada como “garota problema” pelos pais, ela finalmente estava tendo um relacionamento duradouro.
— Você acha que sua mãe vai desconfiar? — Quem perguntava era Brooke, uma das melhores amigas que conheceu na Califórnia. Trabalhavam juntas na mesma lanchonete.
— Ela sempre foi muito observadora, acho difícil não perceber, por isso tem que ser perfeito. — Estavam limpando o balcão de atendimentos enquanto tagarelava sobre a infeliz escolha de vida de .
— Acho que ficaria mais preocupada com o fato de ter que conviver com meu ex do que com a minha família.
— Como assim? — largou o que estava fazendo para encarar a amiga, que lhe deu os ombros.
— Você não tem medo de conviver novamente com seu ex? Tipo, carícias e afetos com certeza vão acender alguma faisquinha dentro de vocês, não? Eu sempre acho que superei meu ex, mas quando cruzo com ele no saguão do condomínio meu coração palpita um pouquinho, imagina ter que conviver 24 horas com ele? Eu ia…
nem prestou atenção no restante, porque estava tão focada em não decepcionar sua mãe que tinha esquecido de calcular perfeitamente o fato de que teriam que agir realmente como namorados. A presença dele não seria apenas o suficiente, sem levar em consideração que era muito mais inteligente que ela, não aceitou aquele convite desagradável em troca de nada, alguma consequência teria. E foi assim que ela começou a suar frio novamente; estava ferrada.
CAPÍTULO DOIS
chegou no aeroporto antes dele, para ver se conseguia se controlar e antecipar o pesadelo que estava por vir, mas na realidade estava dentro do banheiro, andando de um lado para o outro, hiperventilando. Não tinha nem conseguido dormir direito e, além da situação completamente estressante, precisaria lidar com uma bem pior: andar de avião. Não tinha nada pior no mundo do que entrar dentro de uma sardinha gigante a muitos metros de altura. Quando recebeu a mensagem de contando que já estava pelo aeroporto, jogou um pouco de água na cara e respirou fundo, tinha se colocado naquela situação e precisava pôr a mente em seu devido lugar.
Não demorou muito para encontrá-lo, tinha um pequeno sorriso tímido no rosto quando a avistou. Juntos, atravessaram pelo raio-x, e foram diretamente para o portão no qual começaria o embarque. Quando estavam devidamente sentados esperando pela chamada, ofereceu uma barrinha de snickers.
— Sei que você esquece de comer quando está em situação de muito estresse, mas não pode deixar isso acontecer.
— Obrigada. — agradeceu um pouco perplexa, decidindo comer em silêncio. Não esperava cuidados, principalmente depois de ter feito o que fez, mas ali estava ele.
Porém não parou por aí, quando embarcaram, conseguia perceber a tensão de longe, conhecia a mulher que estava sentada ao seu lado como conhecia as dinâmicas políticas dos Estados Unidos. Colocou a palma da mão virada para cima, a oferecendo. sabia que não devia, mas não é como se fosse morrer se a segurasse, por isso cobriu a palma da mão dele com a sua e respirou fundo, tentando regular sua ansiedade. A presença dele ali era o suficiente para que ela ficasse um pouco em paz, sempre foi, e esse era o maior problema.
💍
Era por volta das quatro horas da tarde quando chegaram a Galena, uma pequena cidade no interior do estado de Illinois, conhecida pelas vinícolas que produziam o vinho da Galena Cellars, e também onde tinha crescido antes de se mudar sozinha para Los Angeles. Assim que desceu do carro alugado que arrumaram, foi sufocada por um abraço de sua mãe, daqueles que demoraria minutos até que fosse finalmente solta.
— Mãe, tá bom, preciso ajudar o a tirar a mala do carro — suplicou.
— Ah, que nada, um homem com aqueles braços consegue tirar duas malinhas — respondeu a progenitora, mas ainda assim soltando-a do abraço. — Estou feliz que vieram, a Joana também, ela ficou muito triste quando falou que não vinha, que bom que deu certo.
sorriu da melhor forma que conseguiu antes de dizer um “eu também”, mas na verdade é que estava com medo de que a qualquer momento sua farsa fosse descoberta.
— Boa tarde, senhora . — intrometeu-se no meio da conversa mãe-e-filha, cumprimentando sua pseudosogra. — É bom estar aqui também.
Mais mentira, claro, pensou .
— Fico feliz que minha filha não tenha te abandonado ainda — a mulher mais velha falou, indo abraçar o enteado com um sorriso de orelha a orelha. A mais nova achou que fosse morrer ali mesmo.
— Eu também — ele respondeu, e ambos encararam , sorrindo.
Era oficial: não passaria daquela data, não conseguiria viver com aquela teia de mentiras, estava fodida.
— Vem, vou hospedar vocês no quarto em que vão ficar, a família está ansiosa para vê-los. — A mulher saiu puxando uma das malas para dentro da casa que eles passariam aqueles dias.
sentiu um toque na mão direita e percebeu que tinha entrelaçado a dela com a dele, dando um leve aperto. Aquele toque era o suficiente para confortá-la.
— Você está bem?
Ela só confirmou com a cabeça, pois mais uma vez não lembrava uma palavra sequer para dizer. Que os santos a ajudassem.
— Ainda bem que vocês conseguiram vir, fiquei tão feliz com a notícia! — Joana, também conhecida como a irmã mais nova de , falou assim que os encontrou descendo as escadas depois de guardarem as malas no quarto, correndo para abraçá-los.
— Também estou feliz de estar aqui neste momento importante para você. — A mulher retribuiu o abraço, pelo menos nisso não precisava mentir.
— E você, nunca mais apareceu para atrapalhar as chamadas de vídeo da minha irmã? — Quando juntos, sempre tinha mania de se intrometer nas chamadas entre elas e de ajudar a contemplar a fofoca que estavam compartilhando, assim como Vitor, o futuro marido de Joana, também tinha esse costume.
— Sabe como é, estou estudando bastante agora na reta final do doutorado, muita coisa para ler e escrever — justificou rapidamente.
— Falando em doutorado, como vai sua tese? — O noivo em questão carregou pelo braço para conversarem em outro canto, servindo-o com uma cerveja.
— E você, mocinha? Como que anda a vida de uma mulher californiana?
Enquanto atualizava a irmã sobre sua tediosa vida na Califórnia, observava o pseudonamorado do outro lado da sala, em uma conversa empolgante com seu pai e cunhado. Ele sempre foi uma pessoa muito comunicativa, sempre tinha se dado bem com a Família , esse também foi um dos motivos para que tivesse tanto receio em contar a verdade sobre o término para eles: foi o primeiro e único namorado que eles aprovaram, ou que ela verdadeiramente apresentou; também estava em questão que foi o mais duradouro. Só que, olhando bem naquele momento, era impossível não aprovar . Ele era lindo e simpático, do tipo que arrancava suspiros de qualquer pessoa no mundo, e ainda por cima era inteligente, praticamente sem defeito algum. E quando os olhos deles se encontraram por um instante e sorriu, achou que fosse desmaiar. Tinha sido tão sortuda e estragou tudo.
— Será que não tem nenhum vinho aí? Preciso de álcool. — interrompeu o monólogo de sua irmã, que sorriu em resposta, indo atrás da garrafa.
Depois da primeira garrafa de vinho, precisou ir ao banheiro respirar fundo. Encarou seu próprio reflexo no espelho, e precisou de muito autocontrole para não chorar. Estar em Illinois era demais pra ela, nem conseguia acreditar que sua irmã mais nova estava casando, enquanto ela estava fingindo ter algum tipo de relacionamento.
Ajeitou rapidamente a maquiagem e saiu.
O resto da tarde passou sem a necessidade de nenhum controle de danos. Como fazia anos que eles não se encontravam com a família dela, tinha muita coisa para atualizar. O problema oficial começou na janta: depois de duas garrafas de vinho com Joana, já estava alterada, e sentar ao lado de no jantar oficial dos convidados foi extremamente desafiador. Existia uma razão clara para evitar aquele homem por meses depois que terminou, pois não era capaz de se controlar perto dele. Ter consciência de ali, ao seu lado, em um jantar com sua família, mostrava um encaixe tão perfeito que ela não conseguia nem pôr em palavras. Por isso estava extremamente irritada com si mesma. Quando propôs a ideia de vir ao casamento com ele, não tinha colocado todos os detalhes juntos conforme estava acontecendo naquele momento. Aquilo era uma visão de futuro, um desenho claro de que talvez aquela relação realmente fosse algo promissor, talvez promissor até demais. E, porra, como ela queria que esse homem fosse só um pouquinho menos gostável para facilitar o trabalho sujo dela.
— Você está bem? — ouviu-o sussurrar em seu ouvido, e os pelos da sua nuca se arrepiaram quase que instantaneamente. Se não estava bem antes, depois daquilo é que não estaria mesmo.
queria tanto que ele não tivesse nenhum efeito sobre ela, ou sobre os sentimentos dela… tinha sentido tanta falta dele nos últimos quatros meses.
— Acho que sim — respondeu sem encará-lo, bebendo mais vinho, mas talvez fosse a hora de parar.
Foram as únicas palavras que trocaram o jantar inteiro, e com certeza sua irmã notou algo estranho, porque repetiu a mesma pergunta: “está tudo bem?”, depois que estavam se despedindo para ir dormir, e é claro que ela mentiu novamente, dizendo que sim. conhecia os próprios trejeitos e sabia que não conseguia esconder a cara de irritação naquele momento, mas não ia preocupar Joana agora, ela iria casar no outro dia, afinal, precisava dormir bem.
E o pior de tudo era que ela estava irritada consigo mesma.
— Sabe, você que escolheu toda essa situação, não consigo entender por que está tão irritada. — comentou assim que entraram no quarto.
— Eu sei. — ela soltou entre os dentes. — Não precisa ficar me lembrando disso o tempo todo, me deixa ainda mais irritada.
— Não te lembrei nada em momento nenhum, mal trocamos palavras o dia inteiro.
— Eu sei.
— Sinceramente, não estou entendendo mais nada. — parou do lado oposto do quarto, colocando a cama entre eles; se ela fosse atacá-lo pela discussão, tinha espaço pra tentar manobrar, pelo menos. — Só pontuei um fato, mas você não aceita, como sempre.
— Como sempre? Olha aqui, nem sei por que aceitou estar aqui, pra início de conversa.
— Não foi você que foi na minha porta implorar por isso?
Claro que foi, mas ela não tinha argumentos plausíveis para contornar a situação, precisava inventar alguma distração. Pousou a mão na cintura e o encarou: — Você podia ter recusado.
— Devia mesmo. — A resposta doeu tanto quanto se tivesse sido um tapa na cara. — Quer saber o motivo?
— Adoraria. — ironizou, brincando com a linha tênue entre o medo de ouvir o que ele tinha para falar e a expectativa.
— Você saiu da minha vida há quatro meses sem dar nenhuma explicação, apenas disse que ia terminar e acabou. Tentei ligar várias vezes e não me atendeu, e acha que não tenho direito de te cobrar nada? Foram 3 anos de relacionamento, , não três dias. — Ele fez uma pausa, frustrado com toda a situação. Tanta coisa guardada nos últimos meses e finalmente estava colocando para fora. — E, que saber? Estou aqui porque ainda te amo — disse, olhando diretamente nos olhos dela, atrás de alguma reação. — E faria qualquer coisa por você, por isso estou aqui passando por essa situação, exclusivamente por você, só que você não é capaz de lidar com isso, então acho que é minha vez de parar de tentar.
assistiu ele pegar rapidamente as coisas de dormir que estavam em cima da cama e colocá-las para fora. Não conseguiu se mover por um segundo sequer, apenas perguntou: — Aonde você vai?
— Deve ter algum quarto vazio nessa casa em que eu possa dormir hoje.
Assim, sem mais nem menos, ele fechou a porta, deixando-a só.
Apenas ela, as lágrimas e uma burrada de quatro meses atrás ocupando um triplex inteiro na mente.
CAPÍTULO TRÊS
não conseguiu pregar os olhos por nem um momento sequer, não sabia se estava triste, confuso ou arrependido, talvez um pouco de cada. Revivia incessantemente a última vez que estivera com , quatro meses atrás, quando ela decidiu pôr um ponto final.
— Como assim? — Ele estava tão surpreso que achou ter entendido errado.
— Nós precisamos terminar. — ela repetiu, sem o encarar.
Estavam sentados no sofá do apartamento dele, a mulher tinha mandando mensagem falando que precisavam conversar, e ali estavam eles. De todos os diálogos do mundo, nunca passou pela cabeça do rapaz que seria um término, até porque, o relacionamento deles ia bem mais que bem até aquele momento.
— Por que isso agora, ?
— Não consigo explicar, mas sei que no futuro vai entender. — E assim, sem mais nem menos, ela saiu pela porta do apartamento do rapaz, e nunca mais voltou.
Não voltou até precisar implorar para que estivesse ali com ele.
Não conseguiu achar uma resposta para aquele quebra-cabeça que o matava por dentro.
Durante o jantar, sentiu uma imensa vontade de estar ainda mais próximo para confortá-la, sabia que a relação da com a família era um pouco conturbada: a mulher jurava para si mesma que era a “maçã podre” da família. O que era mentira, e ele queria lembrá-la disso sempre que possível.
Ele não conseguia deixar de se preocupar, não conseguia deixar de amá-la, e tudo aquilo remexia tanto dentro dele que, quando se deu conta, já era de manhã, e precisaria de muitos energéticos para se manter acordado até o fim da cerimônia.
mal dormiu, seus olhos estavam completamente fundos quando chegou no quarto em que sua irmã iria se arrumar para o tão grande momento. Teria decidido ficar ali com ela aproveitando cada momento, mas a verdade é que não queria esbarrar com pelos corredores da casa.
O quarto era uma grande suíte, com quarto e sala, tinha muitas pessoas perambulando por ali preparando roupas, maquiagem e cabelo. O casamento seria no final da tarde, para aproveitar o pôr do sol, e todo mundo estava garantindo que sairia tudo perfeito. Tentou não pensar nos problemas que circulavam sua cabeça; era o dia de Joana e somente dela.
Quando viu sua irmã mais nova naquele vestido noiva estilo princesa todo de cetim, com apenas algumas rendas nas laterais, achou que fosse começar a chorar ali mesmo. nunca fora de demonstrar sentimentos em público, para ninguém, se assim pode considerar, mas toda aquela situação mexia insistentemente com ela.
— Demon fez um ótimo trabalho de maquiagem em você, nem dá para ver que você estava parecendo o bicho-papão quando entrou aqui hoje de manhã — a mais nova deixou escapar, finalmente entrando no assunto. Estavam finalmente só elas duas, de frente para o espelho, tinha acabado de ficar pronta e estava ajudando a caçula com o véu.
— Não sei do que você está falando — tentou desconversar.
— Vitor me contou que dormiu em outro quarto hoje.
— Achei que noivos não podiam se ver no dia.
— Foi por mensagem, e não muda de assunto!
suspirou derrotada, encarando Joana pelo espelho. Mesmo com os saltos, a noiva não conseguia ficar mais alta que ela.
— Como você soube que ele era o ideal?
A mais nova se virou para que ficassem frente a frente, antes de dizer: — A gente só sabe.
— Conta outra!
— Não, , veja… — Suspirou dramaticamente, se preparando para o discurso. — Eu não sei o que aconteceu com vocês dois, mas te conheço literalmente desde do dia que nasci e você nunca foi boa em escolher namorados. E acredito que seja isso o que mais te assusta quando se trata do . Quantas vezes tive que te consolar por conta dos relacionamentos merdas que passou? Bob, o problemático, que até hoje não sabemos como conheceu aquele cara? Ou James, no colegial, que te traiu com a escola inteira? — Ambas riram das lembranças. — O novo assusta mesmo, mas não precisa ter medo, tá bom? Você é a pessoa mais corajosa que conheço, saiu daqui para ir morar sozinha em uma cidade mil vezes maior que Galena, ganhando pouquíssimo, só porque acredita em algo. E se não for para ser, vou estar aqui para te ajudar a juntar os caquinhos de novo, ok? Você não vai estar sozinha, até se eu morrer volto para puxar seu pé.
Ambas riram novamente, e só então percebeu que estava chorando. Usou um paninho que o maquiador havia dado para não borrar a maquiagem.
— Odeio você ser dois anos mais nova que eu e mais sábia — disse por mim.
— Eu só te amo o suficiente.
Depois do momento choroso com a irmã, decidiu que era a hora de contar a verdade para a mãe. Desceu as escadarias da casa e foi até a área externa, no qual estavam montando os últimos detalhes para que o casamento começasse. Encontrou a mulher que procurava sentada em um dos balanços infantis da residência, tragando um cigarro enquanto observava os movimentos dos funcionários. Escolheu sentar no outro balanço e passou a encarar os funcionários também, ficando em silêncio enquanto tentava achar as palavras certas para começar.
— Eu menti pra senhora. — Arrancou o band-aid de uma vez, um pouco mais aliviada por finalmente estar falando a verdade. — Eu e não estamos mais juntos, terminei com ele há alguns meses e não tive coragem de te contar, implorei para que ele viesse comigo e fingisse estarmos juntos.
O silêncio seguinte perdurou por tanto tempo que achou que fosse uma eternidade. Sua mãe apenas tragou o cigarro, o mais devagar, e soltou a fumaça pela boca antes de dizer:
— Não achei que ele estivesse mentindo, é nítido o quanto que ele te ama, não estaria aqui fazendo toda essa encenação a troco de nada.
— Mas eu…
— Pediu, eu entendi — interrompeu a filha. — , sinto muito se em algum momento fiz parecer que não deveria me contar a verdade, você não se define por um relacionamento, minha filha. Vou amá-la independente de com quem esteja, meu deus! A questão é que como sua mãe, vou querer que esteja bem, e a diferença entre e seus exs, ele não é um merda. Só que não vou te sacrificar se terminar com ele, exceto se o próximo seja outra merda, aí certamente vou fazer você ouvir.
riu, aliviada.
— Eu pensei que você me visse como uma fracassada, sabe? Trabalhando como garçonete em outro estado. E terminar seria tipo, fracasso ao quadrado.
— Pelo amor de Deus, garota! Você só sai daqui se me prometer fazer terapia. — A Sra. apagou o cigarro no chão e levantou-se, ajudando a filha a levantar-se também. — Eu te amo, filha. E te admiro, vou estar aqui te apoiando sempre. Apenas batalhe para conseguir o que quer. Infelizmente essas batalhas são só suas. Agora chega dessa melancolia, que tenho uma filha para casar.
só encontrou efetivamente no momento em que eles precisavam se juntar para fazer a entrada como padrinhos de casamento.
Quando viu naquele vestido de madrinha azul-claro como o céu sem nuvens, desenhando perfeitamente cada pedaço do corpo da mulher, por um momento esqueceu que estavam brigados e, pior, separados. Precisou de todo o autocontrole que o mundo fosse capaz de dar quando ela falou: — Precisamos conversar.
E ele apenas respondeu: — Depois.
Fingindo que não queria tirar ela dali e ficar a sós em algum lugar que pudesse mostrá-la o quanto ainda a amava.
O casamento em si ocorreu da forma mais tranquila possível, entretanto, não conseguia parar de olhar para , que estava em pé do outro lado do altar, e só desviava a atenção quando ele a encarava de volta.
O ambiente estava lindo, Joana tinha mandado decorar com flores amarelas por todo o evento. O corredor que entraram, o arco do altar, a cor das flores, que complementavam o tom alaranjado do pôr do sol, transformando todo o momento em único e inesquecível. achava que sua irmã era sortuda, o que a deixava extremamente emotiva, nem percebendo que tinha voltado a chorar na hora da troca dos votos.
— Hoje, me perguntaram como eu sabia que era você, e, na verdade, é que a gente apenas sabe. Amar alguém não tem fórmula certa, é um sentimento único e pessoal, algumas pessoas sabem demonstrar ele, algumas pessoas sabem falar sobre ele, algumas pessoas apenas ignoram a existência dele, mas a maioria das pessoas esquece de sentir. Eu sei, eu sinto e eu aceito esse amor. Por isso hoje eu te digo sim, e prometo continuar dizendo sim todos os outros dias que estão por vir. Eu te amo.
tentou por tudo não encarar , mas foi impossível. O mundo ao redor deles desacelerou mediante cada palavra dita de Joana, e quando percebeu que a mulher a encarava de volta com os olhos cheios de lágrimas, quase largou tudo novamente só para ir beijá-la ali mesmo no meio do casamento de outra pessoa. Como se só existissem eles dois ali. Com sempre era assim, faria questão de mudar a rotação da Terra só porque ela pediu.
Entretanto, tiveram que esperar o momento certo para finalmente poderem conversar.
Depois da cerimônia, o jantar foi servido, brindes e mais discursos foram feitos, inúmeras felicitações, abertura da pista de dança, até que finalmente, deixando os dois completamente impaciente, até que conseguisse arrastar para um lugar mais distante de onde a festa estava acontecendo, atrás de uns arbustos cenográficos.
— Primeiramente, preciso que saiba que nunca fui boa em demonstrar sentimentos. Quando recebi oficialmente o convite de casamento da minha irmã mais nova, eu surtei. Sai de casa querendo tentar qualquer oportunidade melhor em Los Angeles, mas no final acabei trabalhando como garçonete por anos sem muita perspectiva, me sentia um fracasso colossal, e quando você disse que me amava eu… — Ela fechou os olhos sem conseguir controlar as lágrimas que escorriam — Eu me senti péssima, são três anos de relacionamento e percebi que não conseguia dizer essas palavras, achei que você merecia alguém melhor. Alguém que sabia dizer o quanto te ama e o quando que você é importante. E veja, não é que eu não te amo, eu só não consigo me expressar direito.
— , olha para mim. — segurou delicadamente o rosto da mulher para que ela o encarasse, voltando a atenção para si. — Eu te amo, e você não vai conseguir mudar isso. Não me importo com essas palavras, nunca duvidei do seu sentimento por mim. — Tentou olhar o mais fundo que conseguiu daquelas órbitas brilhantes. — Nunca vou te cobrar por isso, ok? Desculpa se em algum momento te fiz sentir pressionada a falar…
— Você não…
— Só promete para mim que quando se sentir assim, vamos conversar, certo? Não fuja de mim como da última vez, não sei se sou capaz de superar.
— Quer dizer que o homem mais inteligente que conheço não consegue superar uma mulher? — passou os braços pelo pescoço do rapaz, aproximando-o dela.
— Não consigo superar você. E nem quero — disse antes de puxá-la pela cintura e beijá-la, fazendo o mundo inteiro se apagar ao seu redor. Não existia barulho de música, casamento, taças, apenas eles e seus corações acelerados, matando a saudade que vinha se perdurando por quatro meses. Para , beijar era como beijar o paraíso, o cheiro de rosas do perfume dela que o envolvia parecia a entrada principal de algo magnífico, quando seus lábios estavam grudados nos dele era como se andasse para o infinito, quando ouvia os pequenos gemidos que ela soltava achava quase impossível ter mais beatitude. Para , beijar era como um fósforo acendendo inúmeros fogos artifícios que se explodiram dentro dela lentamente, quebrando todas as barreiras que ela ousava levantar, a deixava sem fôlego toda vez.
Eles só se soltaram quando ouviram de longe Joana gritando que precisava jogar o buquê.
, na verdade, não queria estar presente naquele momento, pelo menos não tendo que pegar o buquê, porque aquilo certamente a deixava com o coração acelerado e suando frio. Se demostrar sentimentos era complicado, imagina então falar sobre casamento. Mas era a irmã mais nova, então não tinha muito o que fazer.
Entretanto, o universo sempre tinha planos quando se tratava de . Sabe aquele momento em que tudo acontece de forma mais cômica e inexplicavelmente? Foi assim que aconteceu. Joana estava em cima do palco fazendo a contagem regressiva, enquanto a mais velha tentou de tudo para ficar mais atrás do que as outras damas, porém, com a força com que a mais nova jogou o buquê amarelo vibrante de gérberas, ele fez todos voarem em direção à , que segurou por puro reflexo e petrificou completamente em seguida quando se deu conta do que tinha acontecido. Mesmo que tentasse evitar a todo custo, a vida sempre dava um jeito de mostrá-la que não tinha como controlar todas as situações, precisava deixar ela te levar às vezes.
Quando as pessoas ao redor explodiram em aplausos, foi quando ela caiu na realidade de que tinha pegado o buquê, sorrindo da forma menos falsa que conseguiu. Joana correu para abraçá-la, assim como sua mãe, pai e cunhado. Na vez de , ele sorriu daquela maneira tranquilizadora de sempre e sussurrou no ouvido da mulher: — Você pode me pedir em casamento quando estiver preparada, não me importo.
encarou aqueles belos olhos castanhos brilhantes em sua direção. Era sortuda de ter alguém como ele, ao final. O surpreendeu quando o puxou pelo pescoço e grudou os lábios aos dele.
— Eu te amo, .