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Autora Independente do Cosmos 🛸

"O reflexo no espelho
Me diz que é hora de ir para casa
Mas eu não estou pronto
Porque você não está ao meu lado
﹝...﹞
É cada vez mais difícil fazer com que você ouça
A medida que eu avanço
Incapaz de fazer as escolhas certas
E tendo ideias ruins
﹝...﹞
E não consigo te ver aqui, me pergunto onde eu estou (estou)
Meio que parece que estou correndo contra o tempo (tempo, tempo)
Eu não encontrei o que esperava encontrar (encontrar)"

🖤🎤 Why'd You Only Call Me When You're High?


Jungkook se agachou e começou a remexer numa pilha de caixas de papelão encostadas nas janelas até conseguir formar um assento.
Quando finalmente encontrou uma posição, sentou-se no amontoado de poeira e puxou o maço amassado do bolso de trás, acendendo-o com o isqueiro minúsculo que não dava volume no tecido e tragou com força, retendo a calmaria e silêncio que necessitava das pequenas partículas de fumaça.
Silêncio esse que não durou por mais 3 minutos, quando a porta velha de madeira rangeu e Yoongi colocou a cabeça para dentro.
— Sabia que você estaria aqui.
O mais velho entrou, deixando que um resquício da música e das conversas respingassem um pouco para dentro antes de calá-las com o fechar da porta. Jungkook revirou os olhos e apoiou as costas na parede.
— Se veio me mandar subir, vou dizer pra você ir se foder.
— E eu mando em você, por acaso? — Yoongi se aproximou e estendeu uma mão. — Me dá isso.
— Vai se foder.
— Achei que só diria se eu te mandasse subir.
— Se me mandar subir ou tentar pegar o meu cigarro. Vão ser só 10 minutos, o happy hour pode continuar sem mim.
— Me dá logo essa porra — Yoongi grunhiu, mantendo a mão no ar. Jungkook revirou os olhos e xingou, entregando o maço com irritação. Sempre era difícil se livrar de um maço de Dunhill, porra.
Yoongi caminhou até o outro lado e arrastou uma das outras caixas espalhadas, bem ao lado dos caixotes que escondiam os restos dos vegetais e dos produtos vencidos do restaurante, e sentou-se da mesma forma que Jungkook, puxando uma guimba da caixa e acendendo-a com um isqueiro bem maior e bem mais bonito.
Jungkook arqueou uma das sobrancelhas.
— Disse que tinha parado de fumar.
— Você precisa parar de acreditar em tudo que eu digo — Yoongi ergueu o pulso e lançou a caixinha pelo ar até que Jungkook a pegasse com apenas uma mão. — E eu devia dizer pra você parar de fumar, mas que se foda, já tem 24 anos, sabe bem o que faz.
Jungkook se endireitou para ficar mais confortável no montante de pó e do cheiro almiscarado de madeira molhada. O lugar não devia ser visitado há pelo menos 1 semana, e as pessoas duvidariam muito se descobrissem que o porão escuro do restaurante caro em que o BTS era cliente fiel situado no distrito de Gangnam era um dos lugares favoritos de Jeon Jungkook quando queria que o mundo lá fora explodisse.
Hoje, especialmente, ele queria muito isso.
— Por que desceu também? — Jungkook quebrou o silêncio confortável, a cabeça apoiada para encarar o teto sem luz.
Yoongi moveu um pouco os pés para se desvencilhar de uma teia de aranha que estava pressionada contra o osso do joelho.
— Estava chato.
— Se estivesse chato, você iria embora para a sua casa, não viria até aqui.
— Em casa também estaria chato.
— Você tem um cachorro, quadros para pintar, um estúdio…
— Você quer mesmo me ouvir dizer que vim ver se você está bem?
Yoongi não estava olhando para ele, o rosto coberto com a fumaça do Dunhill, mas soube pelo silêncio do garoto que aquele tipo de resposta também não o deixava melhor.
— Eu estou bem — afirmou, reiterando a palavra. Havia algo em sua postura que não permitia o julgamento do contrário.
Afinal, para seus amigos e irmãos do trabalho, Jungkook sempre estaria bem.
— Como vai a Ali? — Yoongi perguntou, e Jungkook engoliu em seco.
— Péssima. Disse que não quer mais sair de casa. Não quer mais voltar para a UNS. Não quer chorar na minha frente, mas já secou todo o estoque do whiskey. Os filhos da puta com as câmeras não saem da frente do apartamento dela, não importa o quanto eu ligue pra polícia — Jungkook bufou, e mesmo no escuro era possível distinguir sua expressão entupida de cólera. — Eles encontraram coisas que nem acreditei que ainda existiam. As nossas fotos em restaurantes, no carro, em algum beco da Europa, tudo isso nas mãos dos desgraçados que tinham sido pagos para se livrarem do material. Pelo menos foi o que o Bang me disse, que tinha pagado. Mas os filhos da puta acumularam cópias e mais cópias dessa merda ao longo dos anos e esperaram o momento oportuno para fazer ainda mais dinheiro com elas. Um momento em que essas coisas não seriam interessantes o suficiente apenas na merda desse país, mas em todos os outros.
— Foram inteligentes, se me permite dizer. Conseguiram até mesmo provar a antiguidade do relacionamento de vocês. Instigaram uma revolta implacável — Yoongi encarou a fumaça sem denotar grandes mudanças na voz. Se enchesse seu vocabulário com palavras de conforto e um timbre um pouco mais passional, faria Jungkook se retesar com a mísera ideia de que ele estava com pena.
Mas o garoto apenas rangeu os dentes audivelmente, querendo passar adiante toda a frustração que estava guardando a partir do momento em que Namjoon o dera uma bronca pelo modo como agiu naquele camarim.
— Doentes de merda. Todos eles são. Quem tirou, quem publicou e todos os imprestáveis que estão cedendo tempo para comentar aquelas coisas horríveis e insanas sobre Ali. Eles nem a conhecem, não sabem de um ⅓ do que aconteceu, e não sabem o quanto ela é importante pra mim! Caso contrário, parariam de perder tempo tentando fazê-la chorar.
— Você sabe que isso pioraria as coisas, não sabe? — Yoongi se ajeitou na caixa até inclinar o corpo para a frente, apoiando os cotovelos nos joelhos. — Se você falasse alguma coisa, não melhoraria em absolutamente nada, JK. Infelizmente, não temos o privilégio de responder as perguntas que queremos e nem de perguntar sobre as ordens que recebemos. Parece uma loucura, mas é verdade, independentemente do que dizem nos blogs. Vai muito além de reputação, tem a ver com imagem, com uma ilusão para venda, uma posição que decidimos ocupar há quase 10 anos porque tínhamos um sonho e precisávamos pagar o preço.
Agora esse preço estava sendo cobrado em todas as áreas, porque Jungkook percebeu, pela primeira vez, que também tinha se iludido quando pensou que seu coração fosse a única coisa que conseguiria esconder das pessoas, o único elemento que não faria parte dos holofotes, junto com todas as caixas de pequenas coisas que fazia questão de guardar para si, como gostar de estourar os ouvidos com Nirvana e fumar um Gold Flake sempre que tinha vontade.
Agora até mesmo essas caixas pareciam escondidas por uma peneira frágil, ameaçando estourar e revelar o personagem que ele manteve esses anos todos para a selva midiática.
Porque o Jungkook de verdade, o garoto enclausurado dentro daquele porão e dentro daquelas roupas ainda de pós show, estava louco para pegar um microfone e gritar para a multidão que amava Ali Dalphin, independentemente de tudo que estavam dizendo sobre ela, sobre o que achavam que ela era, e que se pudesse, pegaria o primeiro avião para a Virgínia e faria um casamento no campo, com apenas os dois, muita cerveja e Justin Vernon no lugar de um padre.
Impulsivo e sonhador. Esse era Jeon Jungkook quando amava, quando estava claramente apaixonado e entregue a uma causa. Cada mísera ação daquele cara disseminava determinação, bondade, um furor maluco de querer lutar contra o mundo, de fazer até mesmo o que diziam ser impossível, como cuspir em cima de um sonho que tinha desde que se conhecia por gente.
Mas toda essa loucura não combinava com sua posição. Ele sabia disso, sabia tanto que o esmagava quando pensava nisso. Toda a impotência da situação massacrava seu cérebro, e as circunstâncias de silêncio o faziam abrir um sorriso forçado no rosto que as pessoas insistiam que era de verdade. Isso só o mostrava cada vez mais o quanto aquele bando de gente que o amava não sabia porra nenhuma sobre ele.
— Eu sei que estragaria tudo — disse ele, chutando um pedaço murcho e morto de alho poró, com uma quantidade prodigiosa de terra. — Sei que as vendas cairiam. Sei que vasculhariam ainda mais a vida dela, que a porra dessa sociedade conservadora do caralho não nos deixaria em paz com as fotos, mas ainda assim… Ainda assim, eu acho que quis estragar tudo, Yoongi. Ainda quero. Porque no momento, odeio tudo isso. Odeio essa indústria, odeio as regras, os contratos, os shows, as músicas, a maquiagem, o dinheiro, odeio tudo. Odeio mais do que já amei algum dia. E mais ainda quem causou tudo isso.
E odeio não poder pegar um voo para a Virgínia, ele queria completar. Odeio não me esconder em uma dessas caixas de porão até que tudo passe. Porque também odeio Ali e sua raiva mórbida, e odeio tudo que causou isso, odeio ela. Aquela.
Yoongi baixou os olhos, murmurando um “humm” de compreensão, como se Jungkook finalmente tivesse chegado ao ponto que ele queria.
— Você não devia ter feito aquilo.
Jungkook soltou uma risada sem humor, recheada de sarcasmo.
— Não dou a mínima. Sempre admirei a coragem alheia, mas a dessa garota ultrapassou todas as expectativas. Ela só pode ser algum tipo de pirada para aparecer aqui.
— A loira disse que não foi ela.
— E a loira agora é nossa amiguinha para que todos vocês acreditem naquela historinha dramática do caralho de armação, porra? — Jungkook travou o maxilar com a raiva, nervoso com a lembrança da mulher que falava e gesticulava sem parar enquanto contava como sua pobre amiga não teve a chance de publicar aquelas fotos. De onde veio tanta criatividade, meu Deus? — Vocês já foram melhores do que isso, Yoongi.
— Não estou dizendo para você acreditar em nada, só estou falando que não importa mais. Não chamo aquela garota de corajosa, já que ela parecia tão perturbada quanto você, e se deixou levar pelo seu descontrole para sair da sala. Essas coisas não se resolvem assim, e não vejo como algo pode ser feito…
— Eu não queria que algo fosse feito, Yoongi.
— Então…
— Eu queria que ela desaparecesse! — Jungkook aumentou ligeiramente o tom de voz, colocando-se de pé em um impulso, balançando os braços e os dedos que seguravam o cigarro na metade. — Queria sentir ódio só da imagem dos infernos que tive em New York, a imagem que eu amaldiçoei centenas de vezes desde que tudo aconteceu, mas me livrei dela porque não adiantaria de nada ficar tentando adivinhar quem acendeu o fósforo quando a explosão já aconteceu e ainda estamos limpando a bagunça. Mas ela apareceu, Yoongi, apareceu andando calmamente por aí, como todos aqueles filhos da puta no exterior aparecem depois de foderem com alguém, escondendo a porra do rosto atrás de uma lente, os profissionais de merda em escalonar o caos e se fingirem de civis inocentes depois. Pode me olhar do jeito que você quiser, mas não tô suportando a ideia de que essa garota esteja aqui, dividindo a mesma cidade comigo, vinda da puta que pariu como se quisesse esfregar na minha cara que conseguiu me foder.
— Eu não acho que ela estava pensando em te foder. Não acho nem que estava pensando em você quando tirou as fotos.
— Você sempre me disse pra desconfiar de tudo e todos, qual o seu problema agora, cacete? — Jungkook rosnou para o amigo, fechando ainda mais a cara furiosa. — Vai me dizer que não acha toda essa merda estranha? Vê-la e vê-la aqui, qual é, vai se foder. Até Jaehyun confirmou que era mesmo ela, e ele a viu por dois segundos! Chame do que quiser, mas o fato é de que ela tirou aquelas fotos, bagunçou o que estava no lugar e agora tenho seu nome e rosto como um tipo de castigo. Porque não tenho nada a fazer com isso a não ser sentir ainda mais ódio.
Jungkook respirou fundo, olhando para a primeira parede cheia de infiltrações, lembrando-se daqueles olhos grandes sustentando seu olhar com medo, raiva e descontentamento, recusando-se a abaixar a cabeça, recusando-se a pedir desculpas.
Pelo menos nisso ela era corajosa. Até o momento em que fugiria de novo, como ele bem esperava que fizesse.
— Você vai contar pra Ali? — Yoongi perguntou no meio da semi escuridão, vendo Jungkook com os braços caídos ao lado do corpo, ardendo internamente com a imagem da garota em sua cabeça. — Que a encontrou hoje.
Jungkook ponderou por meio segundo até se virar novamente para o amigo, sacudindo a cabeça em um não.
— Nunca vou contar isso para ela.
— E por que não?
Jungkook suspirou, e chutou mais um pedaço de folha para a outra parede.
— Porque algo me diz que as bombas de Hiroshima e Nagasaki não seriam nada comparadas a ela.
O vinco na testa de Yoongi fez Jungkook levantar os ombros levemente. A imagem que tinha da namorada, presa dentro de seu apartamento por dias, o lugar onde tinha batido o pé que não moraria, o trazia um misto de revolta e tristeza. Quanto mais Ali insistia em ler as notícias, mais ela bebia, mais resmungava, mais se afastava dele. Estavam mais perto fisicamente do que estiveram em 3 anos e mais longe do que nunca. Ali insistia em convocar uma legião de advogados e quem quer que fosse para destruir o mal pela raiz – a pessoa que tinha dado o clique, a pessoa que Jungkook havia tido o desprazer de conhecer há poucas horas atrás.
seria a cura da fossa de Ali Dalphin, o motivo que faria sua garota voltar a sorrir, nem que fosse por motivos obscuros, mas quando ele se lembrava dos olhos animalescos e dos discursos regados a álcool que escutava dia após dia, sabia que Ali não estava brincando e que não estava no seu melhor estado mental.
Ninguém estava. E naquilo tinha que concordar com seus amigos: não podia resolver nada com os nervos ainda tão escancarados.
— Ela não vai saber, Yoongi — Jungkook reiterou quando viu que o amigo ainda esperava resposta. — Ainda acho que tudo isso vai passar e as pessoas vão se esquecer de toda essa merda e nos deixar em paz. Já passei por fases ruins antes com Ali, não vai ser essa merda que vai nos destruir. E além do mais… — ele soltou uma grande quantidade de fumaça no ar, que embaçou até mesmo as vigas frágeis do teto. — Não vou perder meu tempo com turistas.
Yoongi balançou a cabeça, jogando um pouco de cinzas no chão empoeirado.
— E se ela não for uma turista? — perguntou ao se lembrar da apresentação da loira, e de como ainda parecia um pouco mecânica para falar e se portar como normalmente os canais de comunicação faziam. Ela era novata, e certamente não estava fazendo um trabalho esporádico de curto prazo.
Jungkook virou o rosto para Yoongi, e havia algo de infantil e venenoso no seu sorriso, algo que era grotescamente bonito.
— Então vou fazê-la desejar nunca ter entrado naquele avião.



Jungkook forçou a comida de volta na garganta.
O súbito susto o fez engasgar como um idiota, e Ali franziu o cenho do outro lado da mesa.
— O que você disse? — perguntou ele quando terminou de tossir, puxando uma caneca grande de café.
— Falei que conheci alguém no curso.
— A outra parte — inquiriu. Ali remexeu os ovos com o hashi até puxar um.
— Que é uma garota?
— A última parte, meu bem.
— Que o nome dela é ? Eu acho que é esse, só a conheço por uma semana e nos tratamos pelo sobrenome. . Eu achei bem bonito — ela esboçou um mísero sorriso de canto enquanto mexia em uma velha moeda romana que sempre carregava no bolso. — É bom conhecer outra estrangeira, para variar. Sei que ela sabe quem eu sou, mas parece que não dá a mínima pra isso. E as fotos dela…
Jungkook não estava mais escutando. Sua atenção tinha se dissipado, se transformado em poeira secular, à medida que o nome ganhava um rosto e um contexto, e de repente o ar lhe faltou de modo audível. Ali perguntou se estava tudo bem e ele apenas balançou a cabeça e disse que estava, controlando o ímpeto de mover as pernas e ir fazer alguma loucura.
Não dava para acreditar. Não dava para aceitar que fosse tão maluca!
A raiva se acendeu em Jungkook em cada molécula do corpo, e a comida já não tinha mais graça, o que o deixava com ainda mais ódio. Era a primeira vez naquela semana que Ali quis tomar o café da manhã; que disse algo da universidade; que esboçou um sorrisinho por alguma coisa que acontecia do lado de fora.
E tudo isso por causa de uma garota que logicamente estava mentindo pra ela.
Com os músculos rígidos, Jungkook olhou apenas para o café, lembrando e relembrando daqueles olhos odiosos na superfície do líquido, como se ela pudesse se afogar ali.
— A que horas é a sua aula? — Ele perguntou sem perceber. Ali mordeu um pedaço de torrada.
— Daqui há 40 minutos.
— Posso te levar?



Ali recusou a carona. É claro.
Por mais que Jungkook tenha insistido que jamais iria com a Mercedes, Ali Dalphin já estava ferida demais pelos comentários que tentava ignorar dia após dia, ou pelo menos era o que tinha dito à ele.
Ele respeitou sua vontade. Mas não deixou de estacionar com a Hyundai bem na frente do campus, tranquilo com os vidros escuros como breu e misturando-se com os outros carros espalhados no estacionamento de grama baixa tão parecidos uns com os outros.
Jungkook já havia perguntado como eram os prédios, os professores, as aulas e tudo que é possível de saber sobre o curso de fotografia de Ali muito antes de toda aquela bagunça. Ele se lembrava nitidamente do edifício que a deixou uma vez, uma grande caixa retangular de tijolos brancos, ou que eram brancos, com uma outra pedra mais clara que o resto da superfície hoje encardida.
Quando viu aquele emaranhado de cabelos descendo as escadas largas da entrada no fim da manhã, Jungkook logo cerrou os dentes e desfez o cinto de segurança. Odiou cada segundo da sequência de abrir o porta-luvas, colocar um boné, máscara e sair do carro, enfiando as mãos nos bolsos para esconder cada mínimo reflexo da tatuagem nos dedos. Ninguém parecia estar saindo junto com ela, e a garota andou distraída pela calçada enquanto puxava algo da bolsa crossbody, algo que parecia uma barrinha de cereal. Ela parecia mesmo um pouco faminta.
Quando se virou para entrar em um estabelecimento, Jungkook não se preocupou em ver qual era. Observou a garota freando os pés repentinamente, lendo algo em um pequeno bloco de notas, e em seguida caminhando até o balcão para dizer palavras arrastadas em coreano. Para quem estava na cidade há menos de 3 meses, ela estava conseguindo se fazer entender, pelo menos. O homem do balcão assentiu com a cabeça diversas vezes e apontou para um dos corredores nos fundos da loja, comentando algo sobre ela não precisar ter pressa.
Jungkook olhou para a direção que ela seguia. E só então caminhou, com os olhos grudados em um conjunto de fitas para o pescoço, amuletos chineses e pingentes de chaves, como qualquer outro cliente.
Mais ao fundo, os limites da loja repeliam qualquer luz do sol, mantendo-a seguramente do lado de fora, transformando a estrutura estilizada do lugar em algo parecido com os bares subterrâneos de Bangkok. Havia a imagem de um corvo entalhado em uma das paredes de tapeçaria vermelha, e quando as prateleiras começaram, ele pensou por um segundo que a havia perdido. Prateleiras enormes, guardando todo o tipo de coisas: cerâmicas, louças, aparelhos eletrônicos, bandeiras, artesanato oriental, dezenas e dezenas de estátuas de Buda e… Câmeras. Várias delas. Diversos modelos antigos com seus respectivos filmes ou respectivas peças para se vender separadas. Não parecia um bom lugar para se comprar equipamentos profissionais.
Ele costurou as estantes com rapidez, sem tempo para adivinhar o que ela fazia ali. Quando a viu, há alguns metros na frente, ela tinha a cabeça inclinada para trás, o corpo se alongando para tentar pegar algo em uma prateleira mais alta. Ele arrancou a máscara e se aproximou em silêncio, erguendo o braço para cima e pegando o objeto que seus dedos tentavam desesperadamente tocar.
— Obrig…
travou no meio da palavra quando se virou para olhar o responsável pela ajuda. Jungkook segurava o carretel, um objeto que se parecia muito com uma pedra com um buraco no meio, no qual ele encarou a garota através dele por um segundo. A forma da pedra deixava a imagem de em foco, e talvez trazia à tona os últimos resquícios de sua simpatia.
— Qual é a sua? — Ele perguntou, estendendo aquela coisa para ela. olhou do objeto para ele antes de perguntar:
— O que está fazendo aqui?
— Eu perguntei qual é a sua, porra? — Não demorou muito para que ele trincasse os dentes com a raiva que engoliu junto com o café. — O que você ainda está fazendo aqui?
— Como assim? O que…
— O que ainda tá fazendo na porra da cidade, na porra do país? Se aproximando da minha namorada com essa cara de pau?
— Quê?!
— Para de se fazer de desentendida, cacete. Por que caralho você ainda não foi embora?
— Eu nunca disse que iria embora…
— Que se foda o que você disse — Jungkook se aproximou da garota, os olhos crepitando com a ira explícita, deixando parte de seu controle completamente de lado. — Quanto você quer pra sumir? Hm? Tenho certeza de que seja lá o que esteja estudando aqui, pode estudar em qualquer outro lugar. Para onde você quer ir? Paris? Espanha? Londres? — ele pontuou as sugestões com um levantar de ombros, e sentiu como se ele tivesse jogado uma caixa pesada bem na sua cabeça. — Uma ligação e você tá dentro.
Qualquer outra resposta que poderia sair da garganta de morreu junto com a sua paciência. Cada sugestão dele formava um buraco dentro dela, e de repente o rosto escondido debaixo do boné não era de Jeon Jungkook, mas um rosto muito parecido com o de James Parker, um cara que dissera coisas e prometera Londres com olhos esperançosos para conseguir o que queria. sentiu nojo dele na mesma hora, nojo de suas palavras e de sua presença.
— Responde! O que mais você quer arrancar dela? Quer escolher uma oportunidade que case com seu próximo furo? Não vê que o psicológico dela já tá fodido o suficiente? Qual é o seu…
— Sai de perto de mim — murmurou entre os dentes, sustentando o olhar de repulsa do rapaz, controlando-se para não repetir o movimento do camarim: um chute certeiro que o deixaria desorientado por vários segundos.
Só então Jungkook percebeu o quanto estava próximo, e o quanto seus dedos se enterravam nas palmas para não tocar no braço dela, ou qualquer outra coisa para que ela não visse o quanto a fúria irradiava de seu ser. Ele se afastou lentamente, olhando para a face com músculos cerrados da garota. Um lado de seu rosto estava vermelho com a luz escarlate do ambiente, transformando-a em um reflexo de seu próprio ódio.
— Eu não sei do que você está falando, não quero a porcaria do seu dinheiro e não sou quem você julga que eu sou — voltou a falar, mantendo o tom de voz normal, ainda que ele parecesse um pouco hesitante.
Jungkook riu pelo nariz, e a raiva borbulhou ainda mais.
— Tá ofendendo a minha inteligência? Pelo amor de Deus, se toca! Olha a zona que você arrumou! E não contente, decidiu se matricular na turma dela? O que você quer com a Ali? É consciência pesada?
— Eu não quero nada com ela…
— Por que não contou a ela quem você era?
— Por que você não contou?
Jungkook franziu os lábios, respondendo em um tom mais baixo que o normal:
— Porque ela acabaria com você — e se aproximou novamente, desta vez bem pouco, apenas o suficiente para abaixar a cabeça e reiterar: — E apesar de eu não dar a mínima pra isso, Ali acabaria se destruindo também. Mais do que já está, com todos esses comentários grotescos sobre ela que estão fazendo mais mal do que ela se permite admitir.
se encolheu por um segundo. Mesmo que Jungkook quisesse mandá-la para qualquer barco em alto mar ou para o mais alto das montanhas, ele também estava genuinamente preocupado com Ali e seu estado mental, mesmo que pudesse estar sendo, de uma forma louca e de muito de mal gosto, um dos motivos para o qual Ali não queria se manter trancada e fora da realidade em seu apartamento.
E ela se lembrava de como havia encontrado Ali naquele banheiro na primeira vez. De como a modelo parecia um pouco destruída, e de como se sentiu uma maluca por ter tido coragem de abrir a boca com ela. E em como quis fugir para alguma caverna de pedra no Reino Unido quando a mesma loira se sentou a alguns metros dela na grande sala oval, e em como esses metros estavam gradativamente diminuindo com o passar dos dias apenas porque não parecia nutrir nenhum olhar curioso sobre Ali Dalphin e sua vida pessoal.
Nada disso foi premeditado, em nenhum centímetro. Mas ele ainda estava olhando para através de sua raiva, inflexível em sua crença de que ela era o anticristo particular de sua vida perfeita.
— Não falei pelo mesmo motivo que você — admitiu ela, estranhamente constrangida. — Eu sabia que contar não ajudaria em nada, e pioraria tudo, e eu… Eu não vim pra cá por causa de absolutamente nada relacionado a você, ou a vocês dois, acredita em mim, tudo isso é uma terrível coincidência…
— Coincidência é coisa dos seus livros, garota. Na vida real, eu acredito na maldade e no calculismo das pessoas, e você pode até enganar os outros e meus próprios amigos, mas a mim você nunca vai chegar perto de enganar — observou sua garganta se mover no pomo de Adão, como se ele estivesse se controlando para não gritar e atrair a atenção da recepção, e antes que pudesse retrucar os absurdos, ele já estava dando passos na direção da saída. — Pensa na proposta da viagem. Tenho certeza que você vai perceber que aqui não é lugar pra você.



País de Gales. Peru. Austrália. Montana, e outros lugares estranhos que só alguém insanamente rico poderia saber.
Qual o destino da próxima passagem que receberia?
Com raiva, ela amassou o envelope pardo, sem nem checar seu conteúdo. No mês que se seguiu, já era o 6º que chegava em suas mãos, das formas mais inusitadas possíveis. Uma passagem de ida para um país qualquer que não ficasse a menos de 8 mil km da Coreia.
No início, achou que ele estava apenas zangado, mas agora tinha certeza que ele era maluco.
Não perguntou a Candice por quanto tempo aquela coisa estava na caixa de correio, e muito menos se ela fazia alguma ideia das passagens, mas não importava. Candice ter conhecimento das mínimas coisas que Jungkook andava aprontando só pioraria tudo. Ela seria capaz de transformar um galho em um garfo para atacá-lo, sem se importar nem por um minuto se ele era o Golden Maknae ou que tinha criado um laço estranhamente forte com a maioria dos outros membros do BTS.
Ah, aquela amizade. ainda tinha dificuldade de pontuar como tudo começou. Trocar risadas com Hoseok no camarim naquele primeiro dia tinha se transformado em convites esporádicos, e os convites se transformaram em outros convites, e de repente Candice estava visitando eventos e se sentando ao lado de outros deles como se fossem grandes amigos há anos, amigos que discutiam suas casas e suas varinhas preferidas do mundo de Hogwarts.
Embora nunca tivesse um interesse real em acompanhá-la, vez ou outra, era arrastada para um restaurante propositalmente mais vazio, um bar em Itaewon ou outros lugares que as pessoas não faziam ideia de que os garotos frequentavam.
Mas as poucas vezes em que se deixava levar e se sentar à mesa com Candice e seus novos amigos tinham uma condição muito bem estabelecida e inegociável: Jungkook também vai?
Não?
Então podem contar comigo.
achava impossível, mas aquele cara realmente tinha deixado claro para quem quisesse ouvir o quanto odiava . E o quanto a queria bem longe, o mais longe possível. E mostrou isso não apenas com as palavras, mas também nos impedimentos propositais de reuniões onde ela tentava um bico nas produções de photoshoot da empresa, em como seu portfólio demorou mais do que o normal para parar nas mãos do senhor Ahn, o chefe de seção; em como as ferramentas de manutenção de sua câmera vendidas na loja em frente à Universidade andavam cada vez mais em falta, ao mesmo tempo que o estoque da Hybe ia aumentando gradativamente, entre outras coincidências bizarras que não cheiravam a coincidências. Era apenas uma intuição, mas Jungkook não parecia ser o tipo de cara que negaria a responsabilidade em tudo aquilo caso ela o confrontasse.
O que com certeza não faria, porque ela queria distância dele. A máxima distância que era capaz de conseguir.
Ainda fervendo por dentro com mais um pacote, passou pelas portas giratórias da outra grande empresa a qual tinha se candidatado para um trabalho na produção. O e-mail de confirmação havia chegado no dia anterior, dando-lhe as instruções para onde ela deveria se dirigir assim que chegasse e o que deveria levar para o teste inicial. A Canon improvisada teria de servir por um momento até que ela conseguisse se firmar mais um pouco no mercado e investir em uma nova, já que a anterior tinha sido completamente destruída pelas mãos do idiota que queria transformá-la em um cadáver.
Antes de chegar à recepção, ela desdobrou o papel onde constava o e-mail que tinha imprimido, lendo as instruções novamente com a tradução que tinha anotado a mão em cada linha. Em seguida, puxou o telefone acabado para verificar as horas e viu que talvez pudesse estar 30 minutos adiantada.
— Então você tem um telefone.
A voz foi arduamente reconhecida em cada poro de sua pele. levantou a cabeça ao mesmo tempo em que o cara se aproximava, murmurando um pedido de espera para os outros dois que o acompanhavam.
Jeong Jaehyun. O cara.
Ultimamente, o único cara que não saía de sua cabeça.
Enquanto ele caminhava até ela, o imaginou sob holofotes, com ventiladores e câmera lenta como a cena de um drama. A cada passo, seu coração se esquecia de bater direito. Era como se ela estivesse pisando em lençóis de água escondidos sob aquele piso brilhoso.
Quando ele estava perto o bastante, olhou de novo na direção de suas mãos, onde ela segurava o celular.
— Interessante. Faz tempo que não vejo um desses.
deglutiu algo pela garganta, talvez um nó enorme que sempre era formado quando ele aparecia. Patético, patético.
— É… bem antigo — respondeu com uma voz baixa e encolhida. Não conseguia falar direito perto dele. Não conseguia desde que o viu naquele estádio, desde que o viu depois, em um dos bares que Candice a arrastou, não conseguia desde que viu seu rosto em destaque em vários MVs no YouTube junto de outros 8 ou 9 rapazes.
Por que infernos não tinha desconfiado desde o início que ele também era uma celebridade? Em que mundo ignorante ela vivia?
Bastava olhar para ele. Jaehyun era simplesmente perfeito. Perfeito demais para um cara comum. E a beleza era o último item dessa lista.
Ele abaixou os olhos de novo para o aparelho nas mãos dela, uma versão de tecnologia simples demais comparado ao iPhone bacana de última geração que ele guardava no bolso.
— Você me disse que não tinha um — ele voltou a dizer, como se esperasse uma resposta melhor do que aquela.
guardou-o no bolso, como se estivesse, pela primeira vez na vida, com vergonha dele.
— Acho que ele não pode ser chamado de um celular. Seria só um quebra galho — uma completa mentira, mas precisava dissipar o estranho fato de Jeong Jaehyun parecer estar interessado no telefone dela.
— Ele recebe mensagens? — perguntou ele. balançou a cabeça que sim. — Recebe ligações? — Outro sim. — Ele manda mensagens?
Ela bufou, mas assentiu. Onde ele estava querendo chegar?
— Então posso te mandar a localização amanhã.
juntou as sobrancelhas, sem entender. Então Jaehyun colocou a mão no bolso e puxou o telefone de capinha preta, estendendo-o para .
— É um jeito menos assustador de pedir o seu telefone. E ah, te convidar para o aniversário do Jeno.
encarou o celular à sua frente como se não fosse real. Não ousou tocar nele até perguntar:
— Aniversário de quem?
— Lee Jeno é um dos nossos membros. Bonito, talentoso e ama bolo de chocolate. Parece que sua colega de quarto já está sabendo e confirmou presença — ele disse com um sorriso lindo, como se deixasse claro que aquela informação era a única que precisava para ir.
Mas a garota ainda continuou parada como uma pedra, olhando de Jaehyun para o telefone como se fosse um engano.
— M-mas… Eu não conheço ele.
— Não precisa conhecê-lo para ir ao Yukur — ele respondeu de imediato. — A propósito, é lá que vamos cantar os parabéns. Só estou preocupado de você não saber chegar. E não sei se aceitaria uma carona caso eu oferecesse.
A pele de ficou instantaneamente quente. Ele falava e gesticulava tão casualmente como se já fossem amigos ou conhecidos de longa data, e não um idol mundialmente famoso diante de uma garota comum que estava indo para a sua 20° entrevista de emprego, passando pelo menos 18 horas do seu dia preocupada com contas e um novo futuro que teria que resolver.
Mas ao contrário de todos os outros famosos do ramo, e ao contrário de Candice e sua facilidade de socialização com quem quer que seja, não via malícia ou um senso podre de superioridade em Jaehyun. Ele não parecia estar pedindo seu telefone por uma mera questão de arrogância – pensando que ela com certeza o daria porque ele era Jeong Jaehyun, e ninguém seria louca de recusar –, mas porque estava sendo legal como era desde o início, tentando tornar sua adaptação no país o mais leve e divertido possível.
Perfeito, como ela já sabia. simplesmente sentia uma conexão bizarra com ele, algo que a permitia confiar nele.
Sem saber o que estava fazendo, engoliu em seco e puxou o telefone estendido, roçando a ponta de seu dedo sem querer nos dele, deixando-a aturdida por um mísero segundo.
digitou o número, voltando a entregá-lo, tentando não pensar com desespero no que tinha acabado de fazer.
“Vamos, Jaehyun!” um dos garotos altos acenou da entrada, e conseguiu vê-los cochichando entre si não tão disfarçadamente, todos eles sendo completamente proprietários de uma beleza extraordinária, mesmo que usassem calças de moletom e chinelos com meias diferentes.
Jaehyun fez um sinal rápido para eles, mas não deixou de encarar . Ele parecia fazer muito aquilo, vivendo em dois mundos simultâneos: no real e nos olhos dela.
Isso a deixava odiosamente sem fôlego.
— Então… Te vejo na sexta?
tirou delicadamente uma mecha caída na testa e assentiu rapidamente que sim, antes que mudasse de ideia completamente.
— Vou esperar — ele lhe deu uma piscadinha de leve e começou a se afastar, mas logo retornou para dizer: — E boa sorte na sua entrevista. Tenho certeza que vou te ver mais vezes por aqui.
E se afastou, juntando-se aos outros garotos na entrada e saindo pela porta da frente em meio à risadas altas e brincadeiras internas.
Com o coração em estado anormal, precisou de quase um minuto para ajeitar a postura e se voltar para o balcão da recepção e procurar seu devido setor. Só depois de muito tempo percebeu que agarrava o telefone flip entre os dedos com força, como se pela primeira vez na vida, não quisesse perdê-lo.



Antes que Lee Jeno completasse 21 anos, Ali Dalphin foi embora da cidade.
Jungkook envolveu uma parte do cabelo rebelde com os dedos furiosos, lendo e relendo o pedaço patético de papel como se, quanto mais fizesse isso, mais ele teria chance de ser uma completa alucinação.
Mas a parte vazia do armário, a ausência das últimas garrafas de whiskey e os últimos maços de Marlboro desaparecidos provavam o ponto que ele não conseguia aceitar.
Ali tinha repensado, se desesperado e simplesmente desistido de tudo.
E ele só conseguia pensar em como não reparou em tal coisa antes.
Devia ter notado quando ela fez uma piada na noite anterior. Quando quis fazer amor no meio da madrugada, e Jungkook não conseguia se lembrar de vê-la tão enérgica desde que tudo começou. Estava disposta a tudo, querendo devorar tudo. Ele estava exausto demais para ouvi-la sair na manhã seguinte. Merda, talvez nem tivesse esperado o sol nascer.
E deixou Jungkook para trás, com dúvidas, medos, sem respostas e um número de telefone. Apenas ele, a carta e as fotos.
Aquelas malditas fotos expostas no tampo da mesa, imagens provindas da câmera de e fixadas em um portfólio amador que Ali parecia achar o máximo. Principalmente, quando se referia à sua favorita: tartarugas migrando para o mar em um pôr do sol, um clique peculiar de tirar o fôlego.
Jungkook admitira na noite passada que a garota tinha algum talento. E não tinha sido apenas para que Ali parasse de falar nela.
Mas agora, ali, só queria jogar aquela pasta ridícula pela janela. E naquela situação, não havia outro nome que pairava em sua cabeça como a responsável pela atitude drástica de Ali.



A mãe de costumava dizer: não se aproxime de uma ponte que balança com o vento.
Também tinha dito: não desperdice elogios enquanto eles forem de graça, mas dizer coisas que parecesse minimamente com um elogio naquela situação pareceria muito com não apenas chegar perto da ponte instável, mas literalmente pular e dançar em cima dela.
O rosto de Jaehyun estava muito sério debaixo daquelas luzes piscantes enquanto ele bebia e conversava em uma roda com outros caras, que gesticulavam e falavam alto pela música nas alturas. A partir do momento em que o viu, não conseguiu olhar para mais nada. Nem sequer teve tempo de processar de que aquilo poderia ser o pub mais diferente de todos que já viu – não que tenha visto muitos –, porque se parecia muito com uma casa. Uma casa enorme, com 3 andares repletos de vidro.
Mas seu elogio preso na garganta não se referia à grandeza do lugar, e sim ao cara que fazia a boca de seu estômago encolher e gelar. O cara que a fez pensar que era uma boa ideia nem sequer discutir quando Candice disse “tenho uma festa para ir hoje, tá afim?”
A amiga fazia mais contatos a cada dia, e não demorou a cumprimentar deus e o mundo assim que pisou no lugar.
brincou com a bainha do vestido estampado, agarrada ao mesmo copo desde que chegou, há quase 2 horas. Se manteve seguramente longe do rapaz rodeado de pessoas, sem desviar os olhos dele, porque sabia que ele não a olharia de volta. se sentia em um papel diferente de todos que já esteve, interessada em um cara que provavelmente não deveria estar, mas as coisas estavam simplesmente acontecendo e ela não tinha mais controle. Quando viu, respirava fundo para tomar coragem e começava a dar passos para se aproximar, ciente de que não tinha nada a dizer, mas que alguma coisa sairia quando estivesse perto dele, qualquer coisa…
— Puta merda! — um resmungo mais alto escapou de um cara que esbarrou em seu ombro, derramando um líquido vermelho bem em cima do tecido verde claro com estampas de flores do vestido da garota. — Ah, merda… Meus sapatos.
paralisou com os olhos arregalados, pulando para trás com o susto. O cara nem ao menos virou o rosto para vê-la. Tinha uma voz grogue, e olhos muito alheios ao estrago que tinha feito no vestido dela. não tinha o que dizer; ele nem parecia enxergá-la.
Antes que ela pudesse se recuperar totalmente do susto, braços longos se esticaram diante dela, afastando-a do pequeno homem revoltado à frente, que estava se preparando para erguer o dedo e gritar coisas nada educadas para a garota.
— Nem pense nisso — a voz de Jaehyun soou alta e presente, mesmo mergulhada no barulho intenso. O cara piscou os olhos desfocados, tentando avaliar o responsável por tirar a maldita garota de sua frente.
— Ela derrubou minha bebida — ele insistiu, mas um segundo depois estava baixando os ombros e chegando para trás em um breve reflexo defensivo. estava atrás das costas de Jaehyun, e não fazia ideia de como estava seu rosto para o cara.
— Qual bebida? Essa aqui? — ele estendeu o copo vermelho para o homem, que franziu o cenho lotado de dúvida, como se realmente não lembrasse do que estivesse segurando há um segundo atrás. Sua reação foi olhar para ele e Jaehyun simultaneamente, olhar e recuar, olhar e recuar, até estalar a língua e soltar um palavrão escabroso, pegando o da mão dele com força e se retirando com uma golada.
Jaehyun se virou para , ainda atordoada com os dedos molhados de seja lá o que fosse aquilo.
— Estava esperando o momento em que os imbecis começariam a aparecer — ele murmurou, encarando o estrago. — Você tá legal? Ele te fez alguma coisa?
balançou a cabeça que não, agitando os dedos para se livrar do excesso do líquido. Ela não sabia o que dizer quando ele agia com aquele olhar preocupado – mesmo que o vestido dela estivesse arruinado. O único vestido que ela quis usar naquele dia, um vestido guardado no armário há tantos anos que se parecia um mero pedaço de pano brega comparado aos outros outfits do lugar.
Jaehyun não pareceu se importar com isso. Apenas puxou um dos dedos dela e passou os seus próprios limpos para tentar ajudar.
— Você pode me dizer caso ele tenha esbarrado com muita força. Não me custa nada cuspir duas vezes naquele copo.
Quando entendeu, seus olhos se arregalaram no mesmo momento enquanto levava uma das mãos à boca, soltando uma risada particularmente alta e desacreditada. Jaehyun devolveu o gesto e deu de ombros, indiferente.
— Você é maluco — disse . Ela estava dividida pelo desejo de encorajá-lo a vingá-la mais um pouco e o temor de onde aquilo iria levar.
Mas poxa, justo no dia que tinha decidido ir à festa por livre e espontânea vontade. E com suas próprias roupas.
— Eu prefiro justo — Jaehyun riu novamente, e percebeu que gostava muito quando ele dizia essas coisas. — Desde quando chegou?
— Tem umas duas horas.
— Estou tentando te ligar há mais tempo do que isso.
— Você tentou? — ela perguntou com as sobrancelhas juntas. Imediatamente, buscou o telefone na bolsa pequena de lado e não viu nenhuma notificação sobre ligações perdidas.
Jaehyun pareceu esticar os olhos para ver a mesma coisa. Quando fez isso, abaixou os ombros na direção de , loucamente perto.
— Você disse que ele recebia ligações.
— Ele recebe — prensou os lábios, abrindo um sorrisinho amarelo: — Mas talvez tenha esquecido de falar que não é sempre.
Jaehyun abriu um sorriso ladino, divertindo-se com a imagem de atrapalhada, claramente nervosa com a mera possibilidade de deixá-lo na mão com a ligação. Era o que aconteceria com certeza, ela só não queria dizer.
— Tudo bem. Pensei em mandar uma mensagem, mas achei que seria muito ultrapassado.
— E fazer ligações não é?
— Ouvir a voz das pessoas nunca deveria ser ultrapassado — Jaehyun respondeu simplesmente. abriu a boca, com o intuito de dizer alguma coisa, mas apenas conseguiu ficar olhando pra ele. — Vem, vou te ajudar com isso.
Ele estava prestes a pegar em sua mão, mas deu um passo para trás.
— Não precisa, só me diz onde é o banheiro mais próximo.
O rapaz viu todos os tons de vermelho na bochecha de , nervosa de repente por estar causando algum tipo de incômodo, e Jaehyun apenas limpou a garganta e disse:
— Segundo andar. Terceira porta. Eu te mostro onde fica.
— Eu consigo achar sozinha, não precisa se incomodar — disse ela. Jaehyun estava prestes a protestar, quando interrompeu: — Eu ouvi dizer que estão dando frozen yogurt em algum desses quiosques. Posso te encontrar em um deles daqui há 10 minutos?
Não dava pra acreditar que tinha dito uma coisa dessas.
Nervosa, continuou olhando para o rosto dele, tão lindo e escultural mesmo por baixo de tanta semi escuridão. Jaehyun a avaliou por uma respiração, encarando a face dela, tão frágil e até um pouco estranha com uma maquiagem feita por suas próprias mãos.
Deus do céu, ela teve mesmo toda a coragem do mundo para sair assim.
Por fim, Jaehyun assentiu com a cabeça, sem insistir.
— Vou estar naquele perto da piscina de bolinhas. Não se apressa.
assentiu e se prontificou para seguir pelo caminho contrário, andando a passos largos por entre as pessoas, tentando não tocar em nenhuma delas porque ainda balançava braços e um pouco dos pés para se livrar dos resquícios da bebida.
Que vergonha. Nem tinha se olhado em um espelho ainda, mas já sabia que o vestido estava arruinado, e junto com ele, toda a sua pouquíssima auto confiança.
não conhecia Jeno, mas precisava admitir que a estrutura escolhida pelo garoto para a sua festa de aniversário era simplesmente a maior que já viu desde as festas dos milionários adolescentes da Califórnia. Para chegar ao segundo andar, precisou passar por casais desinibidos, um malabarista de fogo e pernas soltas de uma mulher em um pole dance, tudo isso em uma escadaria.
Lá em cima, contou até a terceira porta, mas só então percebeu que Jaehyun não tinha sido específico sobre o lado em que ela estaria. Não havia ninguém de ambos os lados, então, adivinhando por si só, foi para a porta esquerda e girou a maçaneta.
A porta não se abriu de primeira, mas não porque estava trancada. Quando fez um pouco mais de força, ela tremeu até se mexer, mas continuou parada, como se estivesse sendo forçada a permanecer onde estava. E não tinha voz alguma vinda do lado de dentro.
Bufando impaciente, usou os ombros para empurrá-la mais uma vez, conseguindo finalmente que a madeira chique se movesse. Quando olhou para o cômodo de dentro, viu claramente a superfície de plástico duro de uma cadeira embaixo da fechadura, travando a porta propositalmente no lugar. Ela empurrou até que a cadeira saísse e a porta finalmente se abrisse por completo.
não fazia ideia do porquê não pensou na merda do motivo de alguém estar travando uma porta de propósito. Em uma festa.
Os motivos passaram em um flash por sua cabeça, fazendo-a se preparar tardiamente para o que veria. Mas o resultado daquilo foi pior do que pensou.
Primeiramente, porque aquela porta não levava ao banheiro. O espaço amplo e coberto era recheado de máquinas de fliperama dos dois lados da parede, e na outra extremidade vinha acompanhada de pares de sofás espalhados bem ao lado de um pequeno bar vazio no fundo. E no meio dela, em cima de um tapete persa gigantesco que tomava quase todo o piso, 4 mesas de sinuca estavam enfileiradas abaixo de pendentes de luz amarelada que eram a única iluminação da sala.
E a segunda coisa é que havia um cara desacordado em cima de uma delas.
nem pensou: simplesmente correu para dentro na direção dele. Um pico de alerta maluco pareceu avisá-la de que alguma coisa estava errada, que ele tinha se trancado em uma sala no meio de uma festa para fazer aquilo mesmo que ela nem tinha coragem de completar no pensamento.
Antes de sequer tocá-lo, notou como era fácil fazer uma leitura de seu estado, algo frágil e problemático, algo tão preocupante que fazia alguém escorar a cabeça escondida por um capuz em uma sala fechada abraçado a uma garrafa de vodka.
— Ei, você! Ei… — empurrou um de seus braços, procurando riscar a primeira desconfiança da lista: talvez ele estivesse apenas dormindo. Foi o que pensou quando ele grunhiu levemente, mas não se moveu do lugar. Com um pouco mais de desespero, ela o cutucou de novo, sem sucesso. Ela estava começando a, lentamente, pensar que ele era um adolescente ou um penetra escondido, buscando conseguir material para vender em alguma revista de fofoca por aqui e ganhar um bom dinheiro com isso. Apelando para a rapidez, ultrapassou o próprio limite e puxou a garrafa quase vazia das mãos do cara, obtendo algum resultado: ele finalmente virou a cabeça devagar, piscando os olhos pesados.
E, quando ergueu as mãos para abaixar o capuz, descobriu que ele não era nenhuma das duas coisas que havia ponderado.
Porque era Jungkook.
Ele ficou calado por um bom tempo, examinando a garota de pé com os olhos pressionados, retornando ao foco. Quando a imagem dela se estabilizou, o rapaz logo soltou uma grande expiração do nariz e um palavrão consternado da boca.
— Só pode ser brincadeira.
Ele puxou a garrafa de suas mãos, resmungando coisas ininteligíveis. permaneceu ainda parada, o choque em vê-lo ainda se dissipando pelo corpo, sem dizer nada. Não que lhe faltassem palavras, mas o que estava acontecendo?
— Não sabia que você estaria aqui — ela murmurou, por fim. Alguém, afinal, sabia que ele estava ali?
Jungkook se levantou do assento devagar, segurando-se na superfície de veludo da mesa de jogo para conseguir não cambalear para o lado. Ele fedia a álcool mais do que todos os consumidores do andar debaixo, mascarando completamente o cheiro marcante de cranberry que ela tinha sentido naquele dia do estádio. Ao conseguir ficar de pé, ele fungou uma vez pelo nariz, e observou a garota parada com a mesma cólera já programada de seu sistema nervoso.
— E quem diria que você estaria aqui? — disse com a voz arrastada, lotada de desprezo, por mais que hoje sentiu que não era o único alvo. Se parasse para pensar, Jungkook e aquelas olheiras fundas, o moletom amassado e o cabelo em estado de caos o tornavam alguém irreconhecível até para seus perseguidores. Até para alguém que não o conhecia direito, como . Mas perceber esses detalhes incomuns sobre ele ainda não a ajudava a responder a pergunta: o que tinha acontecido com ele? — Ou o Jeno anda sem critério mesmo, ou os paparazzis só estão seguindo seu instinto natural de ver luzes e festa e saírem correndo para ganhar dinheiro.
revirou os olhos na mesma hora, e seu interesse por ajudá-lo – quando não sabia que era ele – terminou de se dissipar.
Sem dizer uma palavra, ela se virou para sair, lembrando-se que ainda tinha um vestido arruinado para consertar e um frozen yogurt para dividir com um cara gato no andar debaixo. Talvez devesse apenas alertar Jungkook sobre o perigo de aparecer daquele jeito em público, e que possivelmente ele estivesse certo sobre paparazzis naquela festa, mas que se dane. Ele podia ir para o quinto dos infernos com toda aquela hostilidade.
— Ei — ele a chamou de repente. parou, quase na porta, ouvindo-o arrastar os tênis por alguns centímetros. — Achei que estivesse sendo uma boa amiga pra ela.
Com o cenho franzido, se virou. Ele a olhava com os mesmos olhos baixos, opressivos e irados. Era tão mais fácil olhá-la daquele jeito. Como se toda a raiva que precisou engolir na vida fosse facilmente descarregada ali, em cima da imagem de uma única pessoa.
— Do que está falando? — perguntou, arrependendo-se no mesmo instante. Ele estava bêbado – um poço de álcool. Nada do que diria faria sentido, e ela não deveria se importar, seja qual fosse o conteúdo.
Mas Jungkook, ainda segurando a garrafa, arqueou as duas sobrancelhas com espanto.
Do que estou falando? — E riu com incredulidade. Em seguida, os pés pisaram firme no tapete quando ele levou uma das mãos ao bolso da frente e puxou o que já tinha sido um pedaço de papel intacto, jogando-o no tórax de , que automaticamente o agarrou para que não caísse. — É disso que estou falando, dissimulada do caralho.
não se ateve ao veneno de suas palavras. Em vez disso, olhou para o papel e desdobrou a folha até que as primeiras palavras surgissem, tortas e desengonçadas pelas linhas do amassado.
A carta de Ali. Uma despedida curta gravada em um post-it qualquer.
não percebeu quando a boca se entreabriu em espanto, ou quanto tempo ficou lendo e relendo linha por linha, tentando entender o que aquilo tudo significava.
A risada dele chamou sua atenção. Uma risada grotescamente perversa.
— Agora vai, faz a sua carinha de inocente como se não soubesse que ela já estava planejando fazer isso, ou que não tenha comentado nada com você.
— Mas… — ainda olhava para o papel. Parecia ter sido dobrado e desdobrado uma dezena de vezes. — Ela não me disse nada, Jungkook. Absolutamente nada. Achei que não estava indo essa semana porque não se sentia bem, ou porque não estava com vontade de fazer os trabalhos, ou não…
— Corta essa, — ele trincou os dentes, largado a garrafa na mesa, apontando um dedo grogue e bêbado para ela, deixando a raiva fluir como o álcool no sangue. — Você sabe de alguma coisa. Deve saber! Sabe pra onde ela foi?
— Eu não sei.
— Fala a verdade!
— Eu não sei, cacete. A última coisa que eu faria era mentir sobre isso agora, seu imbecil — ela levantou o tom de voz, dando passos para perto para se fazer entender com mais afinco. Não tinha vontade alguma de se igualar à raiva dele, ainda mais quando ele estava tão propenso a lançar frases tão odiáveis na direção dela, a única pessoa que tinha qualquer vínculo com Ali Dalphin fora ele mesmo.
Foi a primeira vez que teve a constatação de que poderia ser a única amiga do verdadeiro amor de Jungkook, ou o que ele via como amiga. Porque para , aquele título era entregue a apenas uma pessoa, e como poderia ser amiga de alguém para a qual tinha feito tão mal, direta ou indiretamente? E para quem não disse nada sobre sua participação naquele momento tão difícil que vivia?
Ali estava acumulando coisas por trás daquele sorrisinho que a dava nas aulas de Poéticas Visuais. Coisas que não faria a besteira de descarregar em público, como tinha feito no banheiro no dia em que se conheceram. sabia disso e não fez nada, absolutamente nada para ajudá-la a se sentir melhor.
Jungkook voltou a rir, e naquele momento, não havia nada de bonito nele. Só havia dor, desespero e olhos vermelhos como o resquício de seu inferno pessoal.
— Você está mentindo…
— Jungkook, eu não estou…
— Você está mentindo! — em um movimento brusco, ele abriu os braços com fúria e tentou dar um passo para a frente. Uma das mãos bateu com força na garrafa quase vazia, fazendo-a cambalear até cair e se espatifar no piso. Desorientado, Jungkook se desequilibrou para se apoiar na mesa, abaixando o tronco em direção aos cacos, soltando um palavrão grogue logo em seguida: — Porra.
olhou para baixo. Mesmo com a iluminação patética dos pendentes, dava para enxergar nitidamente o brilho das luzes fracas tremulando no sangue da palma da mão.
Ela se abaixou em um impulso, largando a bolsa de lado e puxando a mão dele para a luz.
— Calma, fica parado — chiou, avaliando o estrago. Estava claro que ele tinha alguma pressa em limpar os cacos, e ponderou que havia alguma chance de que ele pudesse ter roubado aquela bebida do bar vazio, e isso o traria problemas, ainda que pudesse pagar por ela.
— Eu não preciso…
— Cale a boca.
olhou o corte semi profundo na palma, o sangue começando a escapar para fora e descer pelo pulso. Rapidamente, puxou o cara para cima, colocando-o na mesma cadeira de antes, empunhando a bolsa para pegar o estilete que carregava por aí, mais para abrir peças grudadas de câmeras velhas do que exatamente para auto defesa.
Jungkook não pensou assim. Com a mente letárgica e embriagada, viu em câmera lenta a lâmina brilhando sob a luz, aproximando-se rapidamente dele até que ela abaixasse de novo e fizesse algo no próprio joelho. Joelho? Ou seria na canela? O que ela estava fazendo? Ele não conseguia dizer e igualmente não conseguia perguntar essas coisas, porque a dor latejante começava a pulsar em sua palma, uma dor pior do que a que ele sentia no peito.
Mas antes que tivesse a chance de se mexer e exigir que ela mantivesse aquela coisa longe dele, Jungkook soltou um urro seco da garganta, um grito que escapou quando sua mão pareceu ferver em chamas.
— Porra! — disse ele, travando o maxilar enquanto erguia o rosto. — O que você tá fazendo?! Me larga…
— Estou limpando! — ela puxou sua mão de volta, e Jungkook percebeu que a queimação, na verdade, vinha do líquido que ela esfregava delicadamente em seu machucado com um tecido verde estampado, que tinha agora partes em vermelho e, olhando mais adiante, parecia muito com o tecido do vestido dela, e a mesma cor carmesim estava espalhada pela barriga de até a borda da roupa.
Jungkook, debilmente, teve medo de repente de todo aquele sangue ser dele.
— Vou amarrar agora — avisou ela, agora envolvendo a palma de sua mão com o tecido fino, fazendo tudo com um cuidado cirúrgico, claramente demonstrando a mínima experiência no assunto. Ele jamais admitiria o quanto ela estava mandando bem. A raiva impulsionada pela bebida se esvaiu como fumaça enquanto dava voltas e voltas por sua mão, e ele sentiu o peito mais leve e tranquilo, desobstruindo também suas narinas, que respiraram o oxigênio longe de fumaça de nicotina pela primeira vez nas últimas 24 horas, o que foi responsável para que ele confirmasse que o vermelho revolto no vestido de não era sangue. Tinha cheiro de sangria.
O líquido vermelho que combinava muito com os lábios de Ali.
— Ela simplesmente… Se foi — ele nem percebeu quando falou, mantendo os olhos aéreos na direção das janelas altas, como se fossem uma saída alternativa para a qual Ali tinha usado para desaparecer. — Sumiu. Não me disse onde ia, onde queria ir, quando voltaria, não me atende, não responde mensagens, não me deixou nada, só… Foi. E não faço ideia do que pensar sobre isso. Parece um pesadelo, e fico tentando refazer os passos de antes de toda essa merda, e talvez… Talvez tenha sido por minha causa também. Eu tinha dito pra gente contar, estava tentando convencê-la que era a coisa certa a fazer, íamos a porra de um cinema pela primeira vez e agora… Agora é como se ela estivesse certa o tempo todo, certa sobre tudo.
diminuiu os movimentos do pequeno nó que fazia na mão do rapaz. Aqueles olhos fitando as janelas não pareciam olhos de verdade; era um par de glóbulos negros e vazios, sem brilho ou esperança, retidos dentro da própria cabeça. Qualquer pessoa que prestasse o mínimo de atenção veriam a carência escancarada de sono e boa alimentação no rosto do rapaz, e isso de repente apertou o peito de em uma angústia repentina.
A ida de Ali ainda estava sendo uma completa surpresa para ela, mas para Jungkook, era como se ele a tivesse sentido por 7 vezes ininterruptas desde que tudo acontecera. Pensando e repensando no caminho que ele e Ali ainda tinham que percorrer, e de como isso pareceu extremamente insustentável para ela.
Como não disse nada na hora, Jungkook se virou lentamente para ela, e se apressou em dizer:
— Quanto te devo pelo vestido? — ele inclinou o queixo para a base rasgada nos tornozelos. pressionou os lábios e revirou os olhos, endireitando a postura para longe de sua mão.
— Existe gentileza gratuita, caso você não saiba — murmurou ela, pegando a bolsa jogada no chão e jogando o estilete lá dentro.
Jungkook riu pelo nariz.
— A gente acabou de se conhecer. E eu te odeio — afirmou, trazendo a mão machucada para o colo. — Por isso, tenho o princípio pessoal de não ficar te devendo coisa nenhuma.
— Você só deve alguém quando não faria o mesmo pela pessoa. Então, sim, talvez esteja me devendo. Mas, diferente de você, eu faria isso por qualquer um. Pode me pagar me deixando em paz. Sou muito nova pra ir pra cadeia por chutar um idol duas vezes no mesmo lugar.
finalmente se virou para a porta, passando a bolsa pelos ombros e as mãos pelo tronco do vestido, buscando se livrar do álcool de cheiro doce da vodka que tinha usado para limpar o machucado dele.
No meio do caminho, contudo, freou os pés e se virou para ele apenas com o perfil do rosto.
— Eu não faço ideia pra onde ela foi. Não trocamos contatos ou detalhes da vida pessoal, por mais que você duvide disso. Ali sempre dava um jeito de sorrir quando conversava comigo porque eu não perguntava o que ela não queria responder. Imagino que isso a dava uma falsa sensação de que as coisas estavam bem. Mas eu não… — e perdeu a coragem de explicar que também não se abria como as pessoas normais deveriam se abrir quando encontravam alguém tão legal, e que isso era um mecanismo de defesa antigo e enraizado da própria , mas essa não era uma confissão que deixaria escapar para aquele cara. — Eu não acredito nem por um segundo que ela não fez o melhor que achou que estava fazendo. E nem por isso ela tenha deixado de te amar.
Jungkook engoliu em seco, deixando os braços cederem moles ao lado do corpo, encarando com menos do ódio que alimentava incessantemente sobre ela. esperou que ele dissesse alguma coisa, algo nada bonito ou simpático, porque ela certamente também era muito nova nessa coisa de tentar consolar pessoas, mas pela primeira vez viu um brilho ínfimo irradiar daqueles olhos sem vida, como se ele, por mais que a odiasse, também confiasse que ela dizia a verdade.
Ela se contorceu para não abrir a boca e dizer para que, por Deus, que ele não fosse embora dirigindo ou que não fosse embora sem parar em um pronto socorro para ver aquela mão, mas antes que abrisse a boca para tentar, a porta meio fechada se escancarou por completo, e Jaehyun demonstrou alívio absoluto ao ver .
— Desta vez, acho que mandei umas 5 mensagens — ele disse entre uma respiração longa, apontando para a bolsa dela, onde provavelmente estava o celular. engoliu em seco e automaticamente se virou para abrir a bolsa e verificar, mas logo desistiu e lhe lançou um sorrisinho de desculpas. Jaehyun balançou a cabeça, como se não importasse. — Tudo bem. Achei que tinha se perdido. Parece que tem mais gente do que Jeno imaginou — e ele logo olhou para o canto da sala, para a pessoa abatida bem embaixo das luzes amarelas. — Você se parece como uma das pessoas que ele não esperava.
Jungkook fez um ruído sarcástico com a boca, arrastando-se para longe da luz bem em cima da cabeça.
— Eunwoo me convidou.
— Eunwoo te convidou para a festa. O que está fazendo aqui em cima? — ele logo lançou um olhar apreensivo para , e para as manchas da bebida ainda quase intactas em seu vestido. — Você chegou a encontrar o banheiro?
buscou as melhores palavras, mas nada era mais verdadeiro do que:
— Eu errei a porta.
Com os olhos rápidos, Jaehyun olhou para a borda irregular do vestido no lugar do rasgo do tecido, passando para a palma de Jungkook e a faixa fina que rodeava o sangue ainda fresco.
E o cheiro da vodka doce que começava a encher as paredes.
— Você está bem? — Jaehyun perguntou, mas Jungkook não precisou nem se virar para saber que não era com ele, por mais que os olhos do amigo queimaram em sua direção. Olhos sensatos, pacientes, porém resolutos e firmes. Obstinados, era o adjetivo que Jungkook havia encontrado para dar a eles. Eram olhos que ele evitava entrar em conflito. — ?
entendeu tardiamente a pergunta e logo limpou a garganta, assentindo com a cabeça.
— Claro, estou bem. Ele tropeçou e cortou a mão, então quis ajudar.
Jaehyun lançou mais um olhar para Jungkook. Aquele que o perguntava discretamente se podia acreditar que ele não tinha sido um babaca como Jaehyun o havia dito para não ser, agindo como um ser humano completamente sensato que tentava distribuir um pouco desse princípio aos amigos, mas naquele momento, Jungkook não tinha forças para sustentar aquele olhar com uma resposta. Em vez disso, olhou para Jaehyun com faíscas de gana agressiva, como se ele fosse o ser humano mais idiota da face da Terra por estar sempre pronto para defender aquela garota ridícula que havia causado tanta merda na sua vida.
Ele estava publicamente escolhendo o lado dela, de novo. Isso era penoso, era repulsivo, de certa forma.
— Se estiver pensando em me lançar um discurso moralista agora, já sabe onde eu vou dizer para enfiá-lo — com um sorrisinho venenoso, Jungkook usou a mão boa para se impulsionar para cima da mesa de sinuca, puxando um maço amassado do bolso de trás e tirando o seu último cigarro de dentro.
Jaehyun revirou os olhos. Sentia como se tivesse trabalhado tanto para parecer o mais sereno possível, mas ver Jungkook ou qualquer um de seus amigos naquela circunstância era um convite à perda de controle.
— Consegue achar o Eunwoo sozinho? — perguntou ele ao ver o amigo acendendo o cigarro com um isqueiro barato. Se não estivesse perto, ele provavelmente sacudiria os ombros de Jungkook e o falaria para voltar a si e agir racionalmente sobre as coisas. Era possível que o maknae ficasse ainda mais bravo, e ainda assim, Jaehyun tentaria de novo.
Mas aquela situação tinha um cheiro de novo que Jaehyun ainda não conseguia identificar. Quando o avaliava agora, não conseguia enxergar seu amigo de sempre. Antes de Ali, Jeon Jungkook nunca tinha se apaixonado antes e, consequentemente, não havia términos difíceis no histórico e nada que roubasse sua sanidade como aquilo.
Ainda nem estava claro que o que tiveram foi realmente um término.
Mas não havia outro caminho que Jaehyun pudesse tomar além de ser paciente. E permitir, pela primeira vez, que Jungkook pedisse ajuda sozinho, ou que agisse com sensatez pelo bem de si mesmo.
Porque, no momento, havia . E sinceramente, entre ela e Jungkook, sabia quem estava sendo a pessoa mais afetada daquela história toda.
Antes de responder, Jungkook tragou forte a fumaça, olhando para Jaehyun com um tédio absoluto.
— Eunwoo vai me encontrar. Ele sempre encontra.
Jaehyun assentiu e se virou para .
— O frozen yogurt deve estar sem fila agora. Vamos?
abriu um sorrisinho automático, direcionado a ele. Concordou com a cabeça, esquecendo-se imediatamente do cheiro forte de álcool em volta, do vestido agora literalmente acabado, dos olhos vazios e escuros do cara bêbado e chapado em cima da mesa de jogos.
E Jaehyun sorriu de volta, como se todo esse conjunto de coisas igualmente desaparecesse.
— Você ainda precisa ir ao banheiro?
olhou insegura para a própria roupa, e em seguida apenas deu de ombros e riu pelo nariz.
— Acho que não vai adiantar muito. Vou escolher as raspadinhas.
Ele assentiu e deu espaço para que ela caminhasse na frente, saindo do cômodo atrás dela, ambos não se dando ao trabalho de olhar para trás nenhuma vez.
E naqueles breves minutos, muito breves, antes que Jungkook erguesse o olhar com o som de passos cruzando o piso em sua direção e percebesse a presença de Mingyu com seus músculos e erva de má qualidade, o garoto pescou algo por entre a fumaça que escapava de seus dedos que o deixou igualmente irritado e incrédulo, as duas coisas se misturando até se transformar em mais ódio.
estava caidinha pelo seu amigo. E ele, como o palerma romântico que era, estava se deixando levar como o burro atrás da maçã.
Burro! Estúpido do caralho!
O grande cabeçudo que lia Sócrates e ouvia Cigarettes After Sex em discos de vinil não conhecia a expressão: não durma com o inimigo?
Quem seria tão imbecil a ponto de fazer uma merda dessas?



se lembrava de estar segurando algo embaixo do braço antes de abrir aquela caixa de e-mail, mas depois, todos os seus músculos pareceram ter sido banhados em Esquelesce e virado borracha.
Ela se abaixou cuidadosamente com o laptop no colo até se sentar de pernas cruzadas ao lado da prateleira na biblioteca, lendo e relendo aquela mensagem de spam que estava parada ali já fazia 1 semana.

“É a Ali.

Não sei bem como dizer isso. Sei que minha vida pessoal não tem sido parte das nossas conversas e isso, de certa forma, foi me cansando mais do que alegrando, mesmo sabendo que você certamente sabe de tudo. Sabe que eu tenho um namorado nativo, um motivo muito raso para ter feito essa matrícula e péssimas habilidades para estar por trás de um flash. Você sabe de tudo. Fico igualmente aliviada e desapontada que a sua presença efetivamente encerrava tantos ruídos ao redor, mas por mais que você só recebesse a Alison, sinto que eu estava sufocando ainda mais a Ali. Permitindo que as pessoas continuassem fazendo isso. E isso me enfureceu. Porque percebi que gosto de ser a Ali, independentemente do que as pessoas acham que ela é.
A Ali não queria estar aí e segurar essa barra, para início de conversa. Por mais egoísta que posso parecer, a Ali queria continuar em suas passarelas, no seu mundo rodeado de câmeras, sendo o centro dos holofotes e alvo de várias Canon como a sua. Queria estar mais aqui do que aí, e não me pergunte onde é o “aqui”. Eu sinceramente não sei e duvido que vá ficar por muito tempo até ir para outro “aqui”.
A coisa é que eu afoguei tanto a Ali no início de toda essa confusão que ela acabou se perdendo. E se fizer uma análise mais profunda, coisa que odeio fazer, acho que perdi muito dela nos últimos anos, enfurnada em uma paixão avassaladora que me segurava de pé e me mantinha viva como eu nunca estive desde que buscava isso em coisas nada saudáveis. Por Deus, se formos falar sobre essa coisa de auto conhecimento, diria que eu estava dando tanto de mim que comecei a enlouquecer. A me perder. Mas não é exatamente assim que o amor funciona?
Sei que você não precisa entender isso, . Não precisa entender porque tomei essa decisão, mas precisava dizer a alguém de fora da situação que o ar dessa cidade estava consumindo minha sanidade. E por mais que eu o ame e tenha certeza de que não vou amar ninguém assim na vida, fui tendo cada vez mais certeza, em vários momentos do dia, que ele estava amando alguém ainda muito egoísta para ser a pessoa que ele merece.
A única coisa que posso fazer agora é contemplar a ironia de que estou sendo realmente o que os últimos comentários tanto insistiram que eu fosse: uma vadia sem coração que não o merece. Esses ruídos foram adentrando, se infiltrando por osmose, e foderam com a minha percepção. Então, agora estou sendo uma vadia? Talvez. Não o mereço? No fundo, sempre soube. Ele me ama de um jeito espetacular a ponto de planejar um futuro comigo? Eu sei. E talvez ele me odeie e repense sobre tudo que já deixou esquematizado sobre nós na sua cabeça, mas eu imaginei tudo isso. Eu imaginei dezenas de vezes como seria viver no mundo e no futuro dele. Mas onde ficava o meu futuro?
À essa altura, isso não importa mais. Preciso de um tempo, e não consigo especificar de quanto. Enxergue isso como colocar as coisas no lugar, como a redescoberta de quem é Ali Dalphin depois de tantas suposições a seu respeito.
Obrigada pela sua companhia nesses dias. Espero que nos encontremos de novo.”


levou as mãos à cabeça, absorvendo cada linha das palavras com pesar no peito, com um certo desespero ao olhar a data de envio. Tinha pelo menos 1 semana, 3 dias antes da festa de Jeno, uma mensagem escondida na caixa de spam que já havia comentado que ficava oculta em sua caixa de entrada. Uma mensagem para ser apenas lida e não respondida, já que estava claro que Ali já havia decidido que todas as suas respostas àquele assunto seriam não.
Ela tinha de fato ido embora e desaparecido em seu “aqui” sem nome. se lembrou imediatamente da conversa que tivera com Jungkook naquele dia, em como ele a acusava de saber de alguma coisa quando ela literalmente não fazia ideia. E lembrou-se ainda mais daqueles olhos vazios e desfocados, da tristeza em forma de gente, fazendo o possível para se segurar na raiva na frente dela para desabar logo depois.
O que isso tudo queria dizer? Era a única pergunta que queria fazer à modelo, a única coisa que poderia se transformar em uma resposta definitiva.
Mas agora, a imagem de Jungkook permeava sua mente como se estivesse vendo-o naquela noite bem ali, na sua frente, perguntando-a de novo: “Você sabe de alguma coisa, não sabe? Sabe pra onde ela foi?
Ela não sabia, mas agora tinha alguma coisa. Diferentemente dele, que foi deixado com um pedaço patético de papel quadrado com nada mais que uma linha de aviso.
Ah, Ali… Se você o visse.
Se ela o visse, entenderia o que estava prestes a fazer.
Levantando-se do chão, ela conectou a máquina de impressora no computador e apertou o botão.



Durante a afobação, não parou para pensar que estava indo falar com Jungkook.
E que ele era um idol mundialmente famoso que vivia rodeado por seguranças de 2 metros, usava elevadores separados, salas com trancas eletrônicas e tudo o mais que tornavam impossível a invasão de uma garota qualquer na área da empresa.
Mas não estava pensando em invadir. Não depois do fiasco do VMA. Ela só precisava vê-lo por um breve minuto. Seria o bastante para colocar aquela folha dobrada nas mãos dele e ir embora imediatamente.
Entrar na agência tinha sido fácil, mas sem um motivo convincente, não passaria da recepção. De jeito nenhum poderia perguntar se Jungkook estava ali, ou qualquer um dos outros membros, porque pareceria uma piada se dissesse que os conhecia e até já tinha tentado uma entrevista ali.
E antes que recuasse por não ter mais ideias, essa última pareceu tão louca e tão brilhante ao mesmo tempo.
Eu queria pegar meu portfólio de volta.
Foi a única coisa que disse à recepcionista, que mesmo que tenha precisado de informações mais detalhadas do que isso, ainda se convenceu da aparente urgência de e a informou o corredor para os elevadores do lado contrário onde ela sabia que Jungkook deveria estar. Isso não pareceu um problema em potencial.
entrou no elevador para a sala de multimídia, não exatamente certa do caminho que tomaria ao chegar ao andar. Sua memória sobre aqueles corredores era muito frágil, e mesmo que soubesse que poderia mandar uma mensagem para Candice pedindo o número de Jungkook – ela literalmente tinha os contatos de todos eles, mesmo que não se falassem com frequência. Pelo menos não como ela andava falando com Yoongi –, não valeria a pena quando precisava realizar só uma entrega. Apenas aquilo. Seria tão rápido que ele só entenderia quando ela fosse embora.
As portas metálicas se abriram e avistou o princípio de um passadiço muito longo e muito vazio para uma agência de entretenimento. Virou em uma daquelas bifurcações, andando rápido por entre escadas de emergência, mais elevadores e portas com caracteres coreanos que ela ainda não entendia.
Em 5 minutos, tinha certeza que estava perdida. E isso definitivamente não fazia parte do plano.
Não havia ninguém a quem pudesse perguntar como se chegava ao estúdio. Depois, percebeu que seria a pergunta mais idiota de todas, porque oras, a porra da Hybe devia ter no mínimo uns 20 estúdios. E quem era ela para querer saber uma coisa dessas?, eles logicamente iriam querer saber e, mais uma vez, se veria na situação chata de precisar correr para não ser arrastada pelos seguranças.
Não havia ninguém. A não ser um ponto colorido que vinha caminhando distraidamente na outra extremidade, cantarolando algo antes que levantasse a cabeça e dissesse:
?
Ela prendeu a respiração por um milésimo de segundo até reconhecê-lo.
— Oi, Hoseok — graças a Deus era ele e não, sei lá… Namjoon? Ele certamente não iria sorrir tão imediatamente assim como o cara vestido de Louis Vitton, atravessando o corredor com passadas mais largas em sua direção.
— Caramba, o que faz aqui? Acho que não te vejo desde aquelas cervejas no Walkas. Como vai a Candice?
— Esperando o convite para as outras cervejas, com certeza — riu, notando que ele não a abraçou imediatamente apenas pelo fato de estar pingando de suor dos pés à cabeça. — Você estava ocupado, pelo visto.
Ele sorriu, movendo os ombros categoricamente em uma dança improvisada.
— Ocupado do melhor jeito que eu sei — e riu com uma estranha felicidade, como se no fundo, estivesse tentando impressionar apenas pelo fato de que parecia ser impossível impressioná-la. — Mas e você? Veio fazer a sua entrevista?
— Não, na verdade… Você viu o Jungkook?
Hoseok franziu o cenho na mesma hora, prestes a pedir que ela repetisse. se sentiu extremamente idiota e estranha por não ter pensado que seria muito mais suspeito perguntar sobre Jungkook para os seus amigos do que para qualquer funcionário zanzando pelo ambiente, mas se consolou com o fato de que pelo menos Hoseok não chamaria a segurança por invasão desordenada de uma fã.
— O Jungkook? Quer falar com ele?
— É, Candice me pediu pra passar um recado. Parece que ela ainda está tentando usar o nome dele pra conseguir mais bônus no novo cargo — falou tão rápido que não percebeu as palavras que saíam. Aquilo não bem uma mentira – Candy ficava de olho constantemente nos números das maiores personalidades da Ásia, e garantia que mesmo que pessoalmente não curtisse muito Jeon Jungkook, não podia negar que ele colecionava um montante de popularidade igualável ao número de conchas no oceano.
Hoseok continuava com a mesma expressão.
— Candice pediu pra você fazer isso?
— Eu também achei uma maluquice — riu pelo nariz nervosamente. O papel em sua bolsa pareceu pesar como chumbo. — Mas sabe como é, ela me prometeu trufas de pistache em troca, e não sei como dizer não. Os sacrifícios fazem parte da vida.
Hoseok piscou os olhos algumas vezes, como se estivesse ponderando se acreditava. sustentou o olhar, o coração batendo de ansiedade, a pele das mãos ficando úmida no local onde seus dedos apertavam na bolsa. Por fim, o garoto riu, alto e escandalosamente de praxe, balançando as mãos pela aparente piada que tinha contado.
— A Candice é uma figura. Como fica metendo você nessas coisas?
— Pois é, me pergunto a mesma coisa todo dia.
Ele endireitou a postura e apontou para algum ponto de trás.
— Ele tá na sala de dança. Mas se me permite dizer, não sei se ele vai querer falar com você. Nada pessoal dessa vez, mas no caso ele não queria falar nem comigo. Ainda tá muxoxo com toda essa história da Ali.
engoliu em seco, perguntando no automático:
— Então ela foi embora de vez?
Hoseok prensou os lábios, sem perguntar como sabia da história, mas pensando logo depois que não era tão difícil assim que soubesse. Ela morava com Candice Chaperman, afinal. E Candice estava cada vez mais amiga de Yoongi e do próprio Hoseok.
— É, parece que sim. Acho que todo mundo tá meio chocado com a história ainda. Ela também não me disse nada, mas não via ela sorrir há um tempão.
— Ela te diria caso decidisse uma coisa dessas?
— Ali costumava me dizer um monte de coisas — Hoseok deu de ombros, e inclinou a cabeça para trás ao ouvir um grunhido alto misturado com o som de impacto no chão. Jungkook tinha errado mais um movimento. — Tem certeza que quer falar com ele agora?
Não.
— Tenho — aproveitou a guarda aberta e começou a se afastar em direção à porta, pensando loucamente que ainda existia a chance da mulher da recepção ligar para a multimídia para verificar se ela havia pego mesmo o portfólio. — Vai ser bem rápido. Obrigada pela informação, Hoseok. Não vou te atrapalhar mais.
— Você não me atrapalha, . Vamos comer churrasco um dia desses. E beber aquele refrigerante que Candice importou do Brasil. Como é o nome mesmo? Guaraná?
— Claro, vamos sim. Até mais — ela deu as costas e apressou o passo, sem esperar mais perguntas dele até estar próxima o suficiente da porta semi aberta da sala de dança, andando e andando até tocar na maçaneta larga e abri-la.
O momento do impacto bagunçou todos os músculos de quando deu de cara com o peito nu e suado que empurrou a porta ao mesmo tempo, fazendo-a se afastar imediatamente pelo susto e Jungkook gemer de dor por um instante.
Por 3 segundos exatos, os dois se olharam com olhos arregalados e a respiração presa.
Depois disso, as sobrancelhas dele tomaram a típica expressão raivosa que já era exclusiva de , mesmo que esboçada naquele rosto úmido e cabelos caóticos longe da testa, ficasse aterrorizante e adorável ao mesmo tempo. As tatuagens espalhadas pelo braço ajudavam na parte do aterrorizante.
— Como você entrou aqui? — Ele olhou automaticamente para os lados, mas é claro que não havia seguranças.
— Vim te entregar uma coisa — enfiou a mão na bolsa imediatamente, puxando o papel dobrado e estendendo para ele.
— O que é isso? — Jungkook puxou o papel, mas não o olhou. — E o que você é, um rato? Consegue se esgueirar por todos os buracos igual a eles. Preciso chamar a segurança ou memorizou a porta de saída?
— Dá pra deixar de ser babaca por 2 minutos e ler a porcaria da carta?
— Carta?
Ele levou 1 segundo para juntar as sobrancelhas e abrir o papel. Na mesma hora, foi tomado por um fogo ardente na base dos dedos, como se a folha de papel impresso fosse alguém real, a pessoa real que havia digitado aquelas palavras, a pessoa que o fazia pensar que tinha uma vidinha tão pequena, tão frágil, comparada a tudo que queria viver com ela.
— O q-que é isso? — perguntou ele, o coração batendo na garganta.
— Estava na minha caixa de spam. Acho que ela me enviou um pouco antes de ir embora, mas eu não tinha visto. E isso é verdade — ela respondeu de forma fulminante, antes que ele se enchesse de acusações. — Se eu tivesse visto antes, eu teria te falado na festa.
Jungkook semicerrou os olhos, lutando para não trincar os dentes.
— Teria mesmo?
— Claro que eu teria. Tanto que me esgueirei como um rato pra te trazer isso agora — ela voltou a fechar a bolsa. — E já tô de saída. Guarda sua saliva com a segurança.
se virou para o corredor. Já fez o que tinha que fazer. Por aquela fagulha mínima de alívio e felicidade que enxergou nos olhos dele ao ler a primeira frase, tinha valido a pena, de certa forma. Ela ainda seria capaz de cortar a língua dele com uma motosserra caso abrisse a boca para falar merda, mas estava com uma consciência estupidamente tranquila por ter chegado ali.
— Por que? — A voz dele veio em suas costas. parou, ouvindo passos se aproximando. — Por que veio me dar isso?
Ela respirou fundo e pensou em seguir em frente. Mas virou a cabeça de lado e respondeu:
— Porque você precisava de mais do que aquela despedida.
Ela não sabia direito o que ele merecia, mas por mais que fosse um completo escroto com ela, ainda era apaixonado por Ali e devia estar criando histórias bizarras para o seu sumiço. Graças àquela carta na caixa de spam, ele não enlouqueceria com suas dúvidas, mas também nutriria esperanças sobre ela.
E tinha um péssimo pressentimento sobre isso.
Ela recomeçou a andar, mas ouviu a voz dele de novo:
— Espera — Jungkook arfou, andando rápido para se colocar à sua frente. Ela deu um passo para trás, abrindo um espaço entre os dois. Ainda era estranho e… desconfortável vê-lo ali sem camisa. — Obrigado… Essa foi mais uma atitude legal sem esperar nada em troca?
— Não, já disse que seu pagamento é me deixar em paz.
— Posso fazer outra coisa, se você quiser — ele levantou um ombro e ergueu a carta. — E você pode fazer melhor do que isso.
Um princípio mínimo de um sorriso surgiu em seus lábios, e arregalou um pouco os olhos.
— Do que está falando?
— Quero saber se ela está bem. Quero saber qualquer coisa sobre ela, . Mesmo que ela precise de um tempo, estou disposto a dar, mas vou ficar louco se não souber de nada.
o fitou e arqueou as sobrancelhas. Ainda estava esperando entender o que tinha a ver com isso.
— E como você acha que eu posso conseguir uma coisa dessas?
Jungkook apontou para a metade superior do documento, onde as palavras dentro dos símbolos “<” e “>” mostravam uma mensagem eletrônica cheia de códigos HTML escondidos e ícones matemáticos.
— É o antigo e-mail de agenciamento dela. Ali não manda e-mails pra ninguém por ele, nem sabia que ainda tinha a senha. Se fizer uma análise da mensagem, pode pegar alguns dados. Ela te deixou pelo menos um número de telefone que você possa ligar. E se ela pensa que você não me conhece, tem mais chances de te atender e conversar.
abriu a boca para contestar, porque tudo parecia ridículo demais.
— Isso é loucura. Ela não disse que queria receber ligações.
— Também não disse que você não poderia ligar.
— Tá bom, sei que você quer vê-la de novo, que vocês precisam se resolver, mas eu não quero me envolver nisso, Jungkook. Não quero ficar te passando informações quando não suportamos compartilhar o mesmo ambiente. Então, minha consciência já tá mais leve, e se quiser, pode usar esse número de telefone ao seu favor. Tô indo nessa.
bateu em seu ombro ao passar por ele, mas parou imediatamente com a voz perto de seu ouvido:
— Eu posso te ajudar com Jaehyun.
Uma garra invisível e gelada desceu por sua espinha, e ela achou que estava louca por não saber se vinha do nome de Jaehyun ou daquela voz odiosa tão perto de seu tímpano.
— Quê? — tratou de se afastar para o lado. Jungkook tinha um sorriso completamente sádico.
— Posso te achar insuportável, , mas tenho olhos e você é completamente péssima em tentar esconder sua paixãozinha.
sentiu a bochecha arder. Estava mais do que claro o quanto queria ir embora dali.
— C-claro que nã-
— Qual é, . A verdade tá bem aí, na sua carinha de sonsa: você gosta do Jaehyun. E por mais que isso me dê mais repulsa do que ânimo, posso te ajudar a pelo menos não ficar sem assunto com o cara.
abriu e fechou a boca várias vezes, revoltando-se a cada segundo que passava, socando a si mesma com luvas de boxe por ter sido tão, tão… por estar simplesmente ainda parada ali, deixando aquele idiota rir dela!
Mas, por mais que odiasse a forma como foi descoberta, simplesmente aceitou a verdade e acariciou o fato já estabelecido: ela realmente gostava de Jeong Jaehyun, ainda que não entendesse muito bem disso. E Jungkook ser a pessoa a captar essa veracidade não a deixava nada empolgada.
— Em que mundo você acha que eu aceitaria isso?
Ele riu e deu um passo à frente.
— No mundo em que você esteja louca por ele e não sabe merda nenhuma do que fazer. Olha naquela festa! Conseguiu pelo menos que ele te desse um beijo? — Jungkook inclinou um pouco a cabeça para olhá-la nos olhos, apoiando as duas mãos na cintura. — Claro que não, como conseguiria sendo tão desastrada e ainda por cima se vestindo para a missa. A bebida no seu vestido pelo menos deixou ele um pouco melhor. Mas que se fodam as suas roupas. O fato é o seguinte: eu sei do que ele gosta e sei do que precisa pra chamar a atenção. Acredite, se ele tivesse chegado um minuto antes naquela sala e visse o jeito como você consertou isso aqui — ele levantou a mão machucada, agora com apenas uma pequena faixa transparente — ele acharia foda e ao mesmo intimidante, porque Jeong Jaehyun gosta de garotas que querem ser protegidas, e não o contrário. E você literalmente precisa guardar essas garras se quiser um jantar.
soltou o ar com incredulidade, balançando a cabeça em negação.
— Isso é ridículo…
— Isso é um acordo, . Com o bônus de uma trégua.
— Trégua?
— Isso mesmo. Faz parte do te deixar em paz.
— Vai parar de me ofender?
— Publicamente, sim.
— Vai parar de se meter no estoque dos meus filmes? De aparecer do nada no campus? E principalmente, vai parar de me enviar as passagens?
— Vou, vou. E então? — Jungkook estendeu a mão para a frente. — Vai aceitar?
olhou para a mão dele no ar com hesitação. Mesmo que aquele cara odioso e babaca, gostoso e gentil na mesma proporção estivesse totalmente relaxado com a possibilidade de um acordo entre eles, ainda assim, sentia como se estivesse prestes a se aliar a um supervilão que destruiria o seu mundo no futuro.
Mas Jaehyun… Jaehyun estava desestabilizando o seu mundo de agora, no presente, e esse jogo era tentador demais.
Ela torceu os dedos e murmurou entredentes:
— Se isso for uma brincadeira…
— Nada que envolve a Ali é brincadeira, . Vamos, não tenho o dia todo.
umedeceu os lábios e olhou dentro de seus olhos. Ele não parecia que iria dizer mais nada e ela tampouco tinha condições para seguir. Parecia simples. Parecia.
Ela apertou sua mão quente com receio. Jungkook sustentou o toque e de repente puxou-a para mais perto, se aproximando de como um raio, com um sorriso debochado cortando o rosto. Ela conseguiu sentir o cheiro dele antes que sussurrasse, perto demais do seu nariz:
— Mas fique sabendo que isso não anula absolutamente nada do que penso ou sinto sobre você. Eu te odeio, sempre vou odiar e ansiar pelo dia em que você suma pra sempre — e se afastou tão rápido quanto se aproximou, começando a seguir pelo corredor ao qual já deveria ter ido embora há muito tempo. — Ah, só pra constar: Jaehyun odeia frozen yogurt e vai odiar se continuar usando sapatilhas de freira.
E lhe deu uma piscadinha.
Uma piscadinha.
Atônita, ficou parada enquanto observava as costas largas se afastando, assobiando descontraidamente, sentindo que, de um jeito ou de outro, tinha vendido a alma ao diabo.
E agora só lhe restava pagar o preço.


"Ela não quer dizer oi, mas eu não posso querer dizer olá
Meus batimentos estão no seu pico, quando você vem para conversar
﹝...﹞
Aqueles que juram não estarem se exibindo estão se afogando em contradições
Mas eles não são tão ruins quanto eu, diga qualquer coisa e eu vou concordar
Pois quando o assunto é atuação, com certeza eu poderia escrever um livro."

🖤🎤 You Probably Couldn't See For the Lights But You Were Staring Straight at Me


Por quase um mês inteiro, imaginou o momento em que reencontraria Jeong Jaehyun.
Os cenários mudavam e se distorciam semanalmente, a cada vez que tanto ele quanto suas respostas iam ficando mais distantes. No início, ela pensou que o beijaria antes de cumprimentá-lo, depois pensou que o abraçaria e deixariam as conversas importantes para um lugar apropriado e, por fim, quando já pensava que ele estava dizendo o que queria com seu silêncio, imaginou que uma saudação educada seria o suficiente. sabia muito bem o quanto doar para o quanto recebia, mas imaginava que quando se estava apaixonada, essa balança inevitavelmente se desequilibrava.
No entanto, quando os olhos castanhos do rapaz a fitaram por cima dos ombros e cabeças que o rodeavam, ela soube que tinha chegado a uma espécie de equilíbrio com Jaehyun. Que suas expectativas sobre aquele encontro tinham se alinhado com o presente. E que tinha dito a verdade para Jungkook: não estava mais apaixonada por ele. Ou o que quer que fosse aquilo que sentia antes.
Porém, indiscutivelmente, uma onda de calor e frio simultâneos atingiram como um soco quando aqueles olhos cravaram nela com perplexidade, prestes a abrir a boca e dizer alguma coisa.
— Ei, ei, bonitão — a voz de Changmin intercedeu no espaço mais uma vez, agora se colocando à frente de . — É pra mim que você deve olhar, barítono. A gata não tá trabalhando.
O próximo flash quase deixou Jaehyun cego. Ele piscou os olhos com violência, um pouco desorientado, ouvindo resmungos tanto de Changmin quanto dos outros funcionários, que tentavam chamar sua atenção para encenar uma pose mais natural enquanto terminavam de consertar a maquiagem que de repente pareceu tê-lo deixado pálido demais. Claramente, a maquiagem não tinha culpa nenhuma disso, mas como ele explicaria? Como ela estava aqui? Como?!
... — o nome dela escapou de seus lábios em um sopro, e mesmo diante da pequena baderna que o rodeava, Jaehyun tentou buscá-la outra vez, mas as circunstâncias não estavam a seu favor. Em um instante, mais pessoas começaram a invadir o corredor, todas misturando línguas e gestos que queriam dizer a mesma coisa: ele tinha que se apressar. Estava quase na hora.
segurou o coração desajeitado dentro do peito, a cabeça girando, o choque pela aparição dele percorrendo cada célula do corpo. Se não tivessem tantas pessoas por perto, ela pensaria que fosse uma alucinação. Que o visual do NCT 127 tinha uma cópia idêntica rodando pela cidade. Mas aquele era Jaehyun, o mesmo Jaehyun, e estava de volta na Coreia sem nenhuma mensagem de aviso.
Aquilo explicava bastante coisa. Reforçava como tudo havia mudado; tanto para ele quanto pra ela.
No minuto seguinte, a horda de staffs apressavam o modelo na direção do set, onde Jaehyun não viu outra escolha a não ser segui-los.
— Psiu. Ei, — Changmin se aproximou dela o suficiente para tocar seu ombro. — Vamos lá. A sessão vai começar.

O resto da tarde se estendeu de forma extraordinariamente constrangedora.
Jaehyun chegou a pensar que a Prada revogaria seu contrato depois de tantos puxões de orelha. A desatenção era como um tiro no pé para qualquer pessoa que estivesse na frente de flashes, já que cada mísero segundo de distração não disfarçado era facilmente pego por aquela tecnologia que congelava o tempo. Jaehyun não estava olhando para onde deveria olhar, não estava escutando quando deveria escutar e, principalmente, não estava sorrindo quando deveria sorrir.
Mas como iria sorrir quando ela estava ali, no mesmo ambiente, olhando-o vez ou outra enquanto trocava palavras com o fotógrafo bonitão quando ele a chamava para mostrar algo na tela, e de vez em quando davam risadinhas curtas como se contassem uma piada interna? Parecia mais do que óbvio que ela estava com ele, o que embrulhava o estômago de Jaehyun de um jeito agonizante. Sua mente não resistia em criar histórias. Precisava do seu foco de volta, precisava fingir que ela não estava ali, pelo menos por algumas horas.
Só que como faria isso se, quando não estava dispersa em uma interação com o fotógrafo, parecia exibir uma expressão ligeiramente cabisbaixa e até um pouco desorientada? Um tipo de fisionomia que não a permitia encará-lo por muito tempo sem desviar o rosto para qualquer parede, como se o ato fosse embaraçoso e insuportável na mesma proporção.
E Jaehyun sabia exatamente o motivo para isso.
Mesmo assim, o rosto da Prada não perdia a mínima oportunidade de olhar para ela, ainda que continuasse recebendo advertências. Qualquer intervalo de milissegundos entre um flash e outro, lá estava seus olhos, mirando a garota com crachá de visitante, absorvendo toda a nova imagem que tanto quis ver naquelas semanas corridas.
Porque era exatamente o que parecia: nova. Diferente. Em alguns pontos a mais ou a menos, mas o geral destoava completamente da garota que tinha beijado na frente de seu apartamento.
Ok! Muito obrigada, pessoal!”, o grito de encerramento o fez voltar ao eixo, e Jaehyun teve pouco menos de 3 minutos até voltar a sentir os mesmos braços e dedos das mesmas vozes estrangeiras que o engolfaram no início, agora afoitas para destruir toda aquela arrumação impecável. Em um instante, já não via e nem o fotógrafo, e era difícil prestar atenção ao redor para procurá-la com tanta gente falando ao mesmo tempo, e mais difícil ainda lutar contra eles quando te empurravam na direção do mesmo corredor dos camarins, que já estava sendo tomado por mais correria e gritos de ordem, prontos para também desmantelarem o cenário da cobertura.
Já bem longe do fundo verde, Jaehyun bufou e olhou para trás, novamente buscando ver qualquer resquício de que indicasse que ela estaria ali quando ele se visse livre do trabalho. Ou algo que dissesse que poderiam se encontrar mais tarde, no coquetel que seria obrigado a estar por questões de contrato, ou se ela simplesmente pudesse dá-lo 10 minutos para conversarem. Sozinhos, de preferência.
Mas ele não foi agraciado por nenhum vislumbre da imagem dela, e novas mãos e braços o guiaram de vez para dentro da sala.



estava começando a sentir uma profunda sensação de frio.
Parecia que cada hora naquele set tinha sugado mais e mais a sua energia. Olhar para ele era estranho, era constrangedor, e tentou disfarçar em todas as vezes que Changmin perguntava se ela estava bem ou se tinha escutado o nome da técnica que ele estava usando, mas a verdade era que tinha captado apenas metade dos acontecimentos. Quando o aviso de finalização foi dado, se sentia completamente exaurida apenas por olhar para Jeong Jaehyun.
Porque ele estava olhando de volta, e havia uma preocupação genuína naquele olhar, um chamado para uma conversa que teoricamente precisavam ter, mas ao mesmo tempo…
Do que falariam?
achou que nunca iria querer saber o que realmente tinha acontecido na América para que Jaehyun tomasse chá de sumiço, porque imaginou que sofreria desnecessariamente com a confirmação de que ele tinha mesmo alguém. Mas agora, essa recusa em saber tinha se transformado em indiferença. Ela não o impediria de explicar se quisesse, mas não mudaria nada. Não a angustiaria como bem idealizou seu coração antes.
E era exatamente que estava o problema.
Porque deveria importar. Porque ela deveria estar apaixonada por Jaehyun. Porque era a coisa certa a se fazer: gostar de alguém que esteja disposto a gostar de você.
E era insanamente perturbador como todas as suas iniciativas de olhar para ele e tentar fazer ou sentir o coração bater um pouco mais rápido tenham falhado miseravelmente.
— Então você se interessou por ele? — Changmin bateu um ombro no seu, tirando de seus próprios pensamentos desajustados. — É isso mesmo?
Ela demorou um tempo para franzir o cenho e perguntar:
— O quê?
— O nosso modelo. Jeong Jaehyun. Você pareceu ter olhado bastante pra ele.
— Claro, ele era o modelo — retrucou com um arquear das sobrancelhas. Changmin sorriu desconfiado, vendo-a suspirar logo depois. — Eu o conheço.
— Mesmo? Muito ou pouco?
— Depende do ponto de vista.
Changmin piscou os olhos para ela, vago e alarmado, e não entendeu como podia estar permitindo que ele pensasse o que quisesse da situação. Talvez porque ele claramente estava muito bem confortável no meio de todos aqueles nomes importantes, o que significava que já devia estar acostumado com aquele tipo de história nos bastidores. Talvez porque até mesmo já tenha feito isso antes. Um caso rápido entre fotógrafos e modelos era o que mais acontecia longe das lentes.
Por fim, o rapaz sorriu satisfeito, segurando nas cordas da câmera no pescoço, totalmente alheio à confusão do fim da sessão que acontecia ao redor deles.
— Eu não posso dizer que estou surpreso.
riu pelo nariz, balançando a cabeça.
— Vai me dizer que é porque acha que ele também deve dar em cima de todas as garotas que conhece, como seus clientes fazem?
— Ei, meus clientes são inofensivos. Morde a isca quem quer — ele estreitou os olhos e tirou a câmera do pescoço, entregando-a para o primeiro assistente que se dispôs a chegar perto. — Mas o que eu quis dizer é que… Não fico surpreso por você chamar a atenção de caras que não costumam dar atenção pra ninguém.
juntou as sobrancelhas em dúvida. Changmin riu abertamente.
— Porque você é linda, . Misteriosamente linda — falou, como se estivesse anunciando que a cor das paredes do recinto eram bonitas. Que o dia estava lindo. Que qualquer coisa que as pessoas sabiam que era lindo, era lindo.
Ela sentiu as bochechas corarem de uma só vez, e ele pareceu rir ainda mais, o que a irritou por um instante.
— Fica tranquila, sou puramente profissional, e minha lente gostou de você. Reclame com ela, não comigo — oferecendo uma mão, o rapaz inclinou a cabeça para o lado, bem na direção dos elevadores. — Vamos. Tá na hora do coquetel.
Mas se afastou a um passo antes mesmo que ele tivesse a chance de encostar em seus dedos.
— Eu prefiro deixar passar — respondeu, umedecendo um pouco os lábios, ainda muito confusa e desnorteada com toda aquela tarde maluca para deixar que esse estranho – que se tornava cada vez menos estranho – pegasse em sua mão para levá-la a uma festa chique. — Não é nada demais, eu… Acho que estou cansada. E sou mesmo muito grata por você ter me chamado pra essa sessão, e ter me colocado tão perto de como tudo funciona, mas eu realmente…
— Qual é o problema? — ele interrompeu. — Você tem alguma outra festa para ir hoje?
Ela quase riu. Segunda feira à noite é algum dia para festas?
— Não, mas…
— Então está preocupada com as roupas?
corou mais uma vez, desviando os olhos para o lado. Antes era por causa das roupas, mas agora elas eram um motivo muito mínimo perto do desconforto maior que seria encontrar Jeong Jaehyun no meio do salão.
Isso se ele fosse, mas considerando que até os estagiários que engraxavam sapatos e serviam cafés não paravam de falar sobre como estavam ansiosos, era difícil pensar que o rosto da campanha não estaria lá.
Quando ela não disse nada, Changmin viu a oportunidade para tirar suas conclusões e soltar uma grande expiração pelo nariz.
— Tudo bem, se é assim… Pierre!
O cara alto e loiro que estava fazendo uma leitura concentrada em várias folhas de papel grampeadas perto do cenário levantou a cabeça, e em seguida andou rapidamente para perto de Changmin, categoricamente solícito por qualquer pedido que o fotógrafo faria.
E seja lá o que tenha pedido, não entendeu porque o italiano de Changmin era perfeito demais e o homem o ouviu atentamente sem mover um músculo, balançando a cabeça apenas uma vez no final e sumindo por uma porta nos fundos após o painel, onde estava concentrado o maior número de vozes.
— O que você pediu? — perguntou com apreensão. Changmin apenas deu de ombros.
— Ah, não pedi, gata. Eu mandei.
Antes que tivesse a chance de questionar, o mesmo cara já estava retornando para a sala com pés velozes, trazendo uma arara gigante que não parecia estar ali antes, lotada de tecidos esvoaçantes, brilhantes e caros em cada cabide.
Vestidos. Roupas femininas.
Changmin segurou sua mão sem nenhuma cautela, como se temesse que ela entendesse tudo muito rápido e saísse correndo pela janela.
— Escolha um e vamos ao coquetel. Prometo que você não vai se arrepender.



Ela se arrependeu assim que pisou no grande saguão do hotel.
A luz esquálida e forte não ajudava a se sentir menos exposta. Hesitante, ela trocava o peso das pernas a cada 3 minutos, farta daquela saia e farta do caviar servido à vontade como se fosse um petisco de 1 dólar que vendiam no píer Santa Monica.
Aquela coisa era tirada de um animal vivo. Um peixe gigantesco que era amarrado e desnorteado para ter seu ventre aberto e roubado. Até mesmo Wonnie repensaria sobre seu veganismo seletivo. E tal produto da crueldade custava o equivalente a 3 semanas de japchae do restaurante que Yoona gostava.
não conseguia engolir tanto exagero. Literalmente.
No momento, ocupar a mão e o estômago com uma taça era o suficiente. Changmin tinha pegado em sua mão antes de entrarem no lugar, e ainda não conseguia explicar porque a atitude não a deixava completamente desconfortável. Talvez porque o gesto não tivesse nenhum peso para ele – Ji Changmin parecia ser o típico cara bonzinho que ajuda velhinhas a atravessarem a rua e deposita 100 dólares nos chapéus de músicos do metrô, e se pudesse, seguraria gentilmente na mão de todos eles para alimentá-los no primeiro restaurante que encontrasse.
Portanto, quando ele pousava sua mão contra a dela, sentia que ele não estava fazendo para conseguir algo que ela não dera indícios de que ele algum dia conseguiria.
Mas o caviar e a bebida rosé preenchendo aquela taça sempre gelada não eram os únicos motivos de sua apreensão. Assim como a elegância escancarada das mulheres acompanhadas de outras mulheres e de homens que as revistas de moda adoravam citar os nomes, havia mais. Tratava-se do combo desconfortável que todas essas coisas representavam, trazendo à tona o familiar sentimento de peixe fora d’água que ela tanto fazia o possível para não deixar sobressair.
Visualmente, não tinha nenhum motivo para se sentir menor ou diferente da aglomeração sofisticada do evento. Dentro daquela saia plissada escura, descendo até depois dos joelhos com uma grande fenda lateral, combinada com a blusa curta de mangas que deixava uma faixa exposta de pele no umbigo, ela parecia genuinamente fazer parte do catálogo de qualquer empresa de supermodelos. Ou, se quisesse ser mais modesta: alguém que teria muitas curtidas no Instagram.
Changmin havia exigido que ela não usasse saltos altos – Yoona ficaria louca por saber que ele tinha mesmo reparado em seus pés naquela festa – e permanecesse com seus tênis, e então puf, de repente não era apenas um rosto lindo e desconhecido, mas sim uma sósia de Anna Scott quando desceu as escadarias do apartamento de William Thacker em Notting Hill nos anos 90.
Tirando o fato de que Julia Roberts sabia muito bem sustentar um visual de chamar a atenção, não . A aparência não valeria de nada se ela não pudesse contribuir em nenhum diálogo.
Já fazia 15 minutos desde que Changmin havia se enfiado em uma roda de pessoas que falavam alemão, gesticulando bastante com os braços em um assunto que parecia sério e ao mesmo tempo divertido, muito diferente das outras conversas frias e mecânicas que imaginava que acontecia em um lugar desses.
E nesses 15 minutos, tinha chegado na metade da segunda taça do vinho, sem nenhuma coragem de comer as outras opções de petiscos que estavam servindo naquelas bandejas. Voltar com o estômago vazio era o menor de seus problemas. Precisava primeiro saber o que estava fazendo ali.
— Já comeu? — A voz de Changmin veio por trás de sua nuca, e balançou os ombros de susto.
— Não estou com fome — mentiu, desviando os olhos para os lados. — Estou mais interessada em saber o que você quer que eu veja.
— Não entendi.
— Essa conferência não parece o lugar certo para uma visitante especial. Parece uma extensão do trabalho — afirmou, olhando para a taça. Sentia-se extremamente deslocada em um espaço onde pessoas ricas faziam acordos para ficarem ainda mais ricas, e onde o rosto de Jaehyun estava estampado por todos os cantos do quadrado. A logo da Prada destacada em cada pixel da imagem berrava com . Reforçava a distância não apenas do patamar dele para o dela, mas o dela em relação a toda aquela bolha. Uma bolha que cheirava a negócios e mais negócios, enquanto ela só estava ali pela fotografia.
Era isso que deveria ver, afinal? Que nunca passaria de uma amadora caso não aprendesse a falar a língua dos executivos?
Changmin riu pelo nariz, e raspou um dedo pela pele do pulso de .
— É porque você se recusa a sair da sombra dessa mesa e falar com as pessoas. Assim como está se recusando a comer — ele inclinou o queixo para a mesa de petiscos desconhecidos, e se aproximou de para falar mais baixo. — Mas não tem problema, também odeio essas porcarias. Se quiser podemos ir ao McDonalds assim que isso acabar.
segurou uma risada, olhando-o com divertimento. O sorriso de Changmin era algo difícil de não retribuir. E descobriu que seus convites também eram.
— Eu não tenho nada para falar com essas pessoas — admitiu ela, com um suspiro.
— Você é diretora de fotografia de uma das maiores agências de entretenimento dessa cidade, o negócio que literalmente mais fatura nesse país abaixo dos celulares da Samsung. Por que acha que isso não é um ótimo assunto?
— Porque são trabalhos muito diferentes dos que vi hoje. Conceitos diferentes, propósitos…
— Não são. E você vai descobrir isso quando abrir a boca e oferecer um boa noite. Ali, aquela é Francesca Tanza, diretora têxtil da marca, podemos começar por ela.
Em um piscar de olhos, já estava tendo o corpo arrastado de novo pelo fotógrafo, sentindo o toque de suas mãos firmes e convictas, prontas para carregá-la a qualquer canto. Mas ela firmou os pés no chão antes que completassem 3 metros de trajeto, soltando-se dele.
— Ahn, na verdade… — o argumento não se completou. Seria difícil soltar uma recusa sem explicação, ainda mais quando a atitude dele era tão inofensiva. Mas… Por favor, Deus, não estou afim de tentar engatar conversa nenhuma onde não vou ter nada para acrescentar. Onde vou ter que responder perguntas sobre um futuro nebuloso e provavelmente ser vista como uma fraude. — Eu vou ao banheiro. Bem rápido.
Changmin estreitou os olhos, um pouco desconfiado, mas lhe deu um sorrisinho amarelo que deixava à mostra um pouco de verdade.
Ele assentiu com um longo suspiro.
— Tudo bem, só vou confiar porque sei que a báscula do toalete só passa um bebê, então nem que você fosse a mulher elástica conseguiria — ele sorriu e por Deus, às vezes tinha a impressão de que ele era realmente bonito. — Vou estar te esperando.
— Ok — disse, apressando-se na direção da ala estreita na outra extremidade do salão, delimitadas por grades cravejadas de luzes e um lindo espelho redondo pendurado na frente da porta do banheiro de fato.
Ela mal se atentou à decoração extravagante do lugar. Pisando forte no piso cinzento, andou para o primeiro espelho acima de uma torneira que encontrou, apoiando as mãos no mármore frio de uma pia plana sem… Cuba?
A boca da torneira estava virada para a superfície lisa de pedra, sem nenhum ralo à vista. Uma esquisitice sem tamanho.
Ela bufou, resmungando que a arquitetura confusa do lugar era só mais uma das dezenas de coisas erradas que estavam acontecendo naquele dia. A começar por ela estar ali, naquela festa de granfinos, que podiam ser granfinos da sua área, mas que faziam um trabalho infinitas vezes diferente do dela. Ou do trabalho que ela gostaria de fazer. Um trabalho que, provavelmente, nunca iria fazer.
Talvez fosse isso o tempo todo. Talvez toda aquela apreensão seja fruto de uma enorme frustração, uma agonia por não ser mais parecida com eles; não em trabalho, mas em oportunidades. Em ver aquele bando de pessoas trocando experiências tão animadas sobre terem registrado um cara lindo vestindo roupas lindas como se fosse algo de importância global. Acho que é assim que as pessoas se sentem quando exercem o que amam: cada mínimo passo concluído é como plantar mais uma árvore.
O reflexo no espelho da de 23 anos se parecia muito com o da Conquistadora que pensou que seria quando chegasse àquela idade. Parecida, não igual. Essa imaginária do futuro usaria roupas bonitas como aquela, destacaria partes do corpo que ela negligenciava debaixo dos jeans largos, exibiria ainda mais tatuagens nos braços e se maquiaria daquele jeito diariamente. Faria tudo isso consigo mesma porque queria fazer, e não apenas para retratar uma conveniência em um evento. A futura frequentaria vários eventos como aquele, é claro. E teria tantas histórias e informações interessantes para contar que precisariam pegar uma senha. Essa era a dos sonhos. A de um futuro agora solto no universo, mas que ainda estava lá em algum lugar, pronto para ser alcançado.
No entanto, apesar de aquela no espelho presente soasse próxima da no futuro, não passava de um reflexo. E percebeu que desejar ter roupas iguais, joias iguais e oportunidades iguais àquelas pessoas, não a tornaria nunca a persona do futuro. Porque a casca de fora não tinha profundidade. Não tinha sentimento, propósito, paixão; coisas infinitamente mais importantes do que o resto. Essas características seriam o toque final da no futuro: bonita, bem sucedida e apaixonada pelo que faz. Paixão, objetivos. Coragem. Tudo que o espelho não mostrava – ela por dentro.
E por Deus, nem sabia se algum dia chegaria a ser essa pessoa. Vai saber a direção que o vento sopraria quando o contrato com os garotos acabasse. Tudo era incerto. Especialmente hoje, quando estava sendo um fracasso ao tentar se passar por um daqueles idôneos no salão, e Changmin não seria o único a perceber isso.
Ela baixou a cabeça para a torneira aleatória, trocando um olhar intenso com seu reflexo no metal, pensando na melhor desculpa que pudesse dar ao cara gentil do lado de fora que não o deixasse chateado demais com ela. Bem, ele não tinha feito nada de errado, basicamente. Merecia uma explicação.
— Com licença, você teria um estilete? — ouviu uma voz arfante bem ao seu lado, e um perfume refinado invadiu suas narinas assim que o barulho de saltos ia se aproximando. Distraída, apenas olhou de relance para os cabelos curtos e prateados surgindo pela retaguarda e apertou sua bolsa puída ao lado do corpo.
— Claro, eu… — ela automaticamente abriu o compartimento para puxar o objeto, sem se perguntar porque raios alguém a pediria aquilo num lugar desses e como seria ainda mais estranho que ela o tivesse.
Quando virou-se para a mulher e estendeu o acessório, demorou cerca de 10 segundos para que ela sorrisse de volta e a respiração de se tornasse irregular.
Ah. Meu. Deus.
— Ah, muito obrigada. Se eu não arrancar essa coisa, vou acabar arranhando as paredes como um tigre — a mulher de quase 1,77m soltou uma risada divertida, não notando como os lábios de ficaram pálidos e os olhos paralisados sobre ela; e não apenas porque começou de imediato a arrancar as unhas postiças pintadas de púrpura em cima da pia. Antes fosse. Mas alguém precisaria urgentemente surgir naquele toalete para averiguar se estava mesmo respirando.
Porque a loira à sua frente não podia ser ninguém mais, ninguém menos do que Jill Tiefenthaler, uma das cabeças da National Geographic, se não a maior delas. Alguém que admirava mais do que Edward Weston, Oliver Stone, mais do que o próprio Papa.
Uma pessoa dessas bem ali, em Seul, surgindo como mágica no meio de seus devaneios. teve medo de fechar os olhos e a mulher sumir como uma alucinação.
Ela ainda segurava frouxamente a alça da bolsa quando Jill diminuiu os movimentos bruscos nas unhas e se virou para ela.
— Ah, querida, não fique só olhando. Pode me dar uma ajudinha aqui?
— Cl-claro… — acordou do transe, empertigando-se no lugar quando tomou o estilete de volta, e viu Jill estender as unhas para ela, já roídas e completamente arruinadas pela lâmina. Alguns resquícios de duas ou três estavam jogadas em cima do tampo de mármore.
tentou não fazer notas mentais de que estava posicionando uma chapa de metal semi afiada na altura das cutículas de Jill Tiefenthaler para tentar puxar unhas postiças com aparência bem caras para fora. Ela conseguiu se livrar de todas da mão direita em menos de dois minutos.
As da esquerda levaram mais tempo. Pareciam ter sido colocadas ali em uma data longínqua, tipo desde o Natal passado.
— Ah, que alívio — a empresária soltou um suspiro satisfeito quando puxou as unhas naturais para debaixo do nariz, e desconfiou que ela vivia à base de cola e esmaltes nos últimos sete anos. — Essa coisa feita de plástico me faz passar vergonha toda vez. Se cai uma, preciso tirar todas, porque vão ter pelo menos sete pares de olhos em cima de você, prontos para julgarem uma coisa tão idiota, como se devessem chamar a polícia por eu estar com uma unha limpa — ela piscou os olhos para através do espelho quando se abaixou para abrir a torneira. — Você que deve ser feliz, são as unhas mais curtas e modestas de toda essa festa. Linda cor, inclusive.
desceu os olhos distraidamente para as próprias unhas prateadas, ainda da festa de Candice, como se tivesse ouvido Jill falar de outra pessoa, e não dela.
— Obrigada — foi o máximo que conseguiu repetir, em voz baixa e aérea, olhando atentamente para aquele mesmo rosto que viu pela primeira vez no anúncio da revista, que nomeara a primeira CEO mulher nos seus 134 anos de história, há 7 anos atrás.
O mesmo ano em que tinha decidido ir embora.
— Qual é o seu nome? — perguntou ela.
respondeu rápido, e logo concluiu debilmente: — É o meu nome.
— Prazer em conhecê-la, . Eu sou…
— Jill Tiefenthaler.
A mulher fechou a torneira devagar, erguendo uma sobrancelha antes de se virar para novamente.
— Me conhece?
— Como não conheceria a primeira mulher a ser CEO da National Geographic?
— Gosta da nossa revista? — Os olhos azuis cintilaram por baixo dos cílios grandes que também deviam ser postiços. observou que a pergunta era verdadeira, e não fazia parte apenas de alguma etiqueta de eventos grandiosos, então apenas balançou a cabeça em um grande sim. — Bem, as pessoas não leem muito as letrinhas pequenas na folha de rosto da capa. Fico surpresa que tenha pesquisado isso.
— Sou uma grande fã da revista. De todo o seu trabalho, na verdade. É uma das poucas que trazem assuntos realmente relevantes, fazendo um jornalismo impecável e muito atual, não escondendo a realidade e viajando por lugares que não colocam nas revistas turísticas. Gostaria… — parou e engoliu em seco, acrescentando em voz baixa: — Gostaria de ser como vocês. Algum dia.
Gostaria de viver por causas nobres assim, ela diria. Gostaria que as pessoas focassem no que precisavam, que vissem o planeta através dos meus olhos, que ouvissem as histórias de outros povos, que entendessem a grandeza desse mundo que julgam ser pequeno demais.
do futuro.
O peito de se apertou com as palavras não ditas. O sorrisinho de Jill mostrava que ela tinha notado algo – os sonhos guardados de que, na maioria do tempo enquanto tinha o nariz escondido atrás de uma câmera com a lente apontada para outras pessoas, estavam morrendo quando não deveriam.
— É mesmo? No que trabalha?
— Sou fotógrafa — consegui viver de alguma coisa que amo, Jill. Pelo menos isso. Parecia ser a única coisa que não poderiam tirar de mim.
A mulher desceu os olhos rapidamente por , tentando encaixar a imagem daquela garota naquela informação.
— Trabalha com algum dos engomadinhos ali fora?
— Não, vim como visitante especial — respondeu ela, percebendo que ainda não entendia aquela denominação. — Mas, por coincidência, trabalho como diretora de fotografia na Hybe Corporation. Estão preparando um álbum lindo para o início do outono.
— Hm, que interessante. Uma garota tão jovem como você — disse Jill, porque claramente não era algo que escutava todos os dias. — Imagino que essas coisas alavanquem carreiras por aqui.
— De fato — deu um risinho pelo nariz, mesmo que estivesse tentando, a todo custo, manter os olhos fechados para o seu próprio futuro indefinido depois que todos ouvissem o novo lançamento do grupo de 5 garotos. — Mas a senhora…
— Ah, não estou exatamente a trabalho. Digamos que sou quase uma penetra — ela riu e se aproximou, como se estivesse confidenciando um segredo a . — Acabei de sair de um congresso sobre meio ambiente na Yonsei University há menos de 20 minutos e recebi um convite para tomar um drink. Só não imaginava que seria com mais 40 pessoas vestindo Prada.
A mulher esboçou uma careta ao dizer o nome da marca, mesmo que tivesse reparado furtivamente que seu vestido azul claro com brilhos sutis e os sapatos brancos saídos de algum conto de fadas mostravam que também era adepta ao luxo tanto quanto os outros do lado de fora.
Mas os pedacinhos de plástico que antes eram unhas de dar inveja salpicando em cima do mármore branco talvez mostrassem o quanto Jill não se importava de verdade com tais coisas.
— Um congresso? — empinou os ouvidos. Era justamente para algo assim que esperava mesmo encontrar Jill Tiefenthaler em qualquer lugar do mundo.
— Ah sim, nossa empresa patrocina pesquisas de subsidiárias na área ambiental em parceria com a WWF, o que significa que precisamos checar de tempos em tempos se empresas com o selo sustentável estão realmente cumprindo as regras. A Coreia e a China são paradas obrigatórias, porque não descem do ranking de países que produzem mais lixo por nada nesse mundo — ela revirou lentamente os olhos, e imaginou que também era o que acontecia toda vez que Jill pisava em um evento e era obrigada a ouvir as mesmas desculpas esfarrapadas de executivos que driblavam as normas. — Mas enquanto isso, nos preparamos para as matérias das fontes termais da Tailândia e seus benefícios para a saúde. Os pesquisadores e repórteres devem estar espalhados por aí, ou voltaram para o hotel. É a nossa noite de folga.
— Uau — suspirou sem perceber, mesmo que a expressão de Jill por trás da maquiagem mostrassem um cansaço disfarçado e que a mulher só devia estar desperta por causa de cápsulas de cafeína. — Isso é tão legal…
— Espere só pra ver o que faremos nas savanas africanas.
Ela estava prestes a perguntar o que fariam quando um toque agudo surgiu no meio das duas, e Jill, enfiando as mãos em bolsos que não tinha reparado que aquele vestido lindo tinham, puxou um telefone de última geração e estalou a língua logo em seguida.
— Acho que descobriram que eu escapei. Espero que tenha vodka o bastante naquelas mesas — ela riu e começou a lentamente se afastar, voltando-se para a garota ainda parada na frente do espelho. — Como disse mesmo que era o seu nome?
. .
Por um momento louco, as sobrancelhas de Jill se juntaram no meio da testa, e ela encarou com um brilho fugaz no olhar, algo diferente e muito parecido com dúvida, como se estivesse tentando puxar na memória da onde tinha ouvido aquilo antes.
Mas tal coisa aconteceu tão rápido que não sugeriu nada demais pata . Com certeza, Jill já devia estar um pouco alterada, e se prepararia para beber ainda mais.
— Foi um prazer conhecê-la, .



Havia muita música rolando naquele imenso saguão do Lotte World Tower naquela noite de segunda-feira, mas para , o som parecia estar vindo da Argentina.
Mais extasiada do que nunca, a garota deixou o banheiro do monumento com um sorriso que estava sendo contido entre os dentes para não parecer tão grande e esquisito. Um gesto inútil, já que ela abria e fechava os dedos várias vezes na alça da bolsa e assentia com a cabeça para os desconhecidos do evento como se fizesse parte deles, como se suas pálpebras fossem iguais às dela, como se toda aquela bolha caótica ali fora fizesse parte de uma realidade muito comum na rotina de , e não o contrário.
Jill Tiefenthaler tinha falado com ela. Mais do que isso: tinha perguntado seu nome. E mesmo que fosse esquecer dessa informação antes que o relógio batesse meia noite, ainda se lembraria desse momento como um dos mais insanos de toda a sua vida.
Automaticamente, tentou procurá-la pelos arredores, mas não viu nenhum resquício do vestido azul gelo ou do cabelo cinzento pelo entorno do lugar. Em vez disso, sentiu um toque no braço, e dedos folgados roçarem sua pele em um gesto já considerado familiar.
— Jurei que você tinha descoberto um jeito de escapar, .
Ela sorriu para ele, exalando um novo tipo de entusiasmo.
— Eu não quero mais escapar.
Changmin levantou as sobrancelhas de um jeito cômico e desconfiado.
— Que carinha é essa? Tem uma festa secundária nesse banheiro? Alguém te ofereceu alguma coisa? Eu posso entrar e ganhar também?
Ela revirou os olhos de forma divertida.
— Acabei de encontrar uma das maiores empresárias do mundo. Pra mim, é a maior.
— E eu conheço esse nome tão imponente?
— Talvez sim. É a… — travou quando avistou um conjunto caro de terno inglês cruzar o salão, desenhando o corpo robusto de um homem alto com cabelos loiros e olhos tão azuis que pareciam lentes de contato. Os mesmos olhos que estavam no balcão mais cedo, e que a acompanharam até o elevador. — Me dá um minuto, eu já volto.
Changmin não teve chance de dar uma resposta antes de os pés de se deslocarem no mesmo instante na direção do sujeito, abrindo novamente o fecho da bolsa surrada e tirando de lá o cartão alaranjado que tinha deslizado das mãos distraídas dele.
— Com licença, senhor… digo, Gregory — esperava que ele ainda não se importasse por ela dizer o seu primeiro nome. Parecia ser um lance dele, de qualquer forma. Formalidades pareciam deixá-lo mais velho.
Os ombros por baixo do terno se viraram imediatamente para a garota, antes que ele pegasse um daqueles petiscos horríveis de cima da mesa.
Ela estendeu o cartão.
— Isso caiu no elevador. O senhor saiu muito rápido.
Gregory olhou para o brilho laranja por dois segundos até reconhecê-lo e soltar um palavrão baixinho, puxando-o para si com a boca entreaberta.
— Céus. Nem imagina o escândalo que quase fiz na recepção de novo por causa disso — o sorriso de alívio do senhor Keller se estendia para os olhos. Também parecia ser algo que ele sempre fazia. — Acho que perco um pouco da minha memória em cada lugar do mundo. Mal das viagens executivas. Mas andei mais rápido do que aquele elevador, não foi? — um de seus olhos piscou brincalhão, e deu uma risada enquanto assentia com a cabeça. Não percebeu o olhar dele indo de seu cabelo até a ponta de seus pés em um tempo recorde.
— Você corre mesmo rápido. Mal ouviu quando eu tentei chamar.
— Eu estava atrasado. O meu cliente tem um ritual matinal e um antes de começar um trabalho, ou eu o obriguei a ter, mas de qualquer forma, pra quem está vindo de um fuso horário de 10 horas, não há rotina que cure mau humor — ele riu novamente, e em seguida voltou a olhá-la daquele jeito examinador. — Mas devo dizer que eu me lembrava que a senhorita estava mais… Modesta, se me permite dizer.
As bochechas de coraram na mesma hora. Novamente pensou: por que Changmin tinha que dizer que era tão fã de Notting Hill? Ela estava longe de ser parecida com a pintinha solitária da bochecha da Julia Roberts.
— Fiz um amigo que não parece brincar em serviço — tentou dar de ombros, mas seus braços cruzados à frente da barriga exposta para escondê-la não deixaram o movimento se completar.
— Imagino. Deve ser um sacrifício ser a versão latina de um símbolo como Anna Scott — ele cintilou um sorriso irônico, virando-se brevemente apenas para pegar uma taça comprida de espumante, e nem tentou esconder a risada seca e envergonhada pelo nariz. Sim, era um sacrifício. Porque tinha olhos demais em cima da latino-americana e lentes demais, lentes que impediam de tentar se esconder, e seu rosto já devia estar salpicando o fundo de muitas fotos daquelas. — E então, assistiu a sessão de fotos? O que achou?
— Incrível. Profissional, no sentido mais literal da palavra. É diferente de tudo que eu já vi.
— Ah sim, é o esperado que seja. Eles ganham muito dinheiro em cima do rosto do meu cliente em todas as campanhas, e vão vender os próximos cachecóis ou calças de alfaiataria como água apenas por vê-lo usando, mesmo que ainda estejamos nesse maldito verão — Gregory riu mais uma vez, tomando um grande gole da bebida enquanto retribuía sua amostra de dentes até que se tocasse do que o homem tinha acabado de falar.
— Seu… cliente? — A pergunta saiu espremida entre seus lábios, que ficaram rígidos por um instante. Não era uma alucinação; ele realmente tinha dito aquilo.
O homem assentiu com energia.
— Sim, o bonitão com o rosto naquele banner. Achei que ele iria me matar por tirá-lo de sua turnê antes da hora, mas até agora anda mansinho como um beagle. Você já o conheceu?
— Ah, eu… — tentou segurar a vermelhidão que tomou as bochechas, e a palidez que tomou os lábios, e tudo que desse na cara o quanto Jeong Jaehyun para ela não era apenas um rosto que se apreciava através de uma tela de celular. — Na verdade…
O cheiro do perfume suave a fez parar de falar antes mesmo de virar o rosto para o lado e enxergar o rapaz que surgiu de repente de alguma direção por trás de suas costas, caminhando rápido e certeiro até o empresário, que estava ocupado demais ainda escolhendo entre canapés e ovos de codorna.
— Pode dizer aos seus amigos que não quero um contrato de 5 milhões para Chanel? Eu já neguei e eles continuam insistindo nisso, mesmo depois da notícia que usavam trabalho escravo. Tem noção? Eu não… — o rapaz aborrecido se virou automaticamente para a mesa, pretendendo pegar uma taça de qualquer coisa que parecesse alcoólica, e nesse simples movimento conseguiu notar a garota já parada ali.
Jaehyun calou toda e qualquer reclamação que estava expelindo da garganta, como se a imagem de fechasse completamente a porta de toda essa bagunça. Ele primeiro olhou em seus olhos, para só então olhar para ela inteira, e foi inevitável a sensação do coração pressionando o peito e a mente se arruinando aos poucos.
Não esperava vê-la ali. E, pelo espanto que viu naquele semblante, imaginou que ela nutria uma certa esperança de não vê-lo.
— Não me lembro de você ter deixado de ser um ótimo modelo para que as marcas deixassem de competir por você — Gregory murmurou ao balançar sua taça, totalmente alheio ao breve silêncio constrangedor que tinha se instalado ali no meio. — Não estou dizendo que deve aceitar a Chanel. Céus, claro que não, temos um contrato com a Prada e a fortuna que recebemos não nos dá o direito de reclamar, mas você não pode tratar mal os outros. Eles são sua lista de espera — o homem suspirou e finalmente ergueu os olhos para o cliente, percebendo que seu rosto pálido estava cravado na garota à frente, que revezava sua atenção nos próprios sapatos e em alguma direção por onde pudesse sair sem ser vista — Jaehyun!
Jaehyun estremeceu com o chamado, virando-se para Gregory imediatamente.
— Tá, já entendi. Lista de espera.
Gregory revirou os olhos e esboçou outro sorriso ao se virar para .
— Jaehyun, essa é , uma garota muito simpática que não me deixou dormir em algum spa hoje. Parece que ela era uma visitante especial na sua sessão. E , acho que ele dispensa apresentações.
engoliu em seco ao sustentar o olhar de Jaehyun. A vontade de sair correndo pulsava em uma corrente elétrica pelo seu corpo. Correr para bem longe, se pudesse, até que entendesse o que estava sentindo – ou melhor: o que não estava sentindo.
Mas seria minimamente estranho se fizesse isso, então apenas tentou ajeitar a postura e começou:
— É um prazer, senhor…
— Vamos conversar — Jaehyun soltou de repente, fazendo tanto quanto Gregory virarem a cabeça para ele. O rapaz apenas se virou para o agente, subitamente ansioso. — Vai falar com os caras da Chanel. Eu disse que você os explicaria sobre a proposta.
Antes que Gregory tivesse a chance de responder, o garoto já estava se virando para novamente.
— Tem algum lugar servindo um vinho muito bom por aqui. Pode me acompanhar?
abriu e fechou a boca várias vezes, ainda tentando entender o que estava acontecendo e como ele parecia tão tranquilo com aquela demonstração explícita que se conheciam. Não era nada comum que ela, a visitante especial, conhecesse o rosto da marca. Até mesmo Gregory, antes com aquele sorriso enviesado e cheio de orgulho ácido sobre o cliente, olhou para o rapaz com o cenho franzido, como se não o conhecesse.
— Espera, vocês se conhecem?
— Sim. A Chanel, Gregory — Jaehyun insistiu, e inclinou a cabeça para a outra extremidade do lugar quando voltou a falar com . — O vinho fica nos decks lá fora. Vamos?
Ela se viu assentindo com a cabeça em concordância, e o viu caminhar primeiro na frente antes de lançar um sorrisinho sem graça para um Gregory ainda muito confuso e segui-lo com os passos vacilantes.



As luzes daquela noite que banhavam Jaehyun e suas joias espalhadas pelas orelhas, pescoço e dedos lembravam a da primavera.
E também em como ela agora parecia uma época tão nebulosa e distante.
Lá fora, o vento soava como o inverno nos ossos de . Quanto mais alto, menos atrito a brisa das montanhas encontrava para se espalhar pelos cidadãos. tentou se abraçar por um momento, mas não funcionou. Se Changmin queria transformá-la em Anna Scott, devia ter se lembrado de que não fazia tanto frio em Notting Hill.
Em contrapartida, Jaehyun parecia extremamente confortável na camisa social branca, com os botões abertos até o meio do peito, onde a correntinha dourada percorria o caminho pela pele nua, e a calça escura de alfaiataria combinada com os sapatos de couro lustrosos o transformavam em um ícone sexy e fashion na mesma proporção, um homem que não vendia apenas a roupa que usava exposto em um outdoor, mas a própria imagem, a si mesmo, garantindo que bastava apenas isso para qualquer marca fazer uma fortuna.
Não estava errado. Não estava nenhum pouco errado em supor isso.
Ele parecia ainda mais bonito quando se montava daquele jeito, quando estava logicamente trabalhando, ainda que na maioria das vezes em que esteve com fez jus aos jeans cargo, camisetas simples e os bonés inseparáveis com a aba tanto para frente quanto para trás.
De qualquer forma: lindo. Não existia uma única configuração em que Jeong Jaehyun não fosse extremamente atraente.
sabia disso. Não precisava nem refletir sobre isso. Mas ser atraente não era o único motivo pelo qual Jaehyun fazia seu coração bater loucamente há algumas semanas atrás.
Vamos lá, coração”, disse para ele mentalmente, soando um tanto desesperada. “É ele, é o primeiro cara que te deixou maluca, o cara que te despertou para um novo tipo de sentimento, o cara que sussurrou no seu ouvido que sentiria a sua falta e você quase precisou de um paramédico, qual é, vamos lá, é o cara com quem as coisas deveriam ser.”
O coração não parecia a fim de obedecer à . Ainda que a presença de Jaehyun estivesse deixando-a mais nervosa do que o normal, não era aquele tipo de nervosismo, um tipo que ela nem sabia que conseguia diferenciar.
Quando ele caminhou para uma pequena tenda que cobria um balcão improvisado servindo grandes taças de líquido escuro, pensou em inventar uma desculpa para não ficar ali. Ou para enxugar aquela conversa o mais rápido possível, já que não sabia o que diria. Podia sugerir que chamasse Gregory para um brinde. Até mesmo Changmin; ele com certeza falaria pelos três.
Estava muito perto de andar até Jaehyun e fazer a proposta, mas ele já estava de volta, estendendo uma das bebidas para ela.
— Obrigada — agradeceu e engoliu em seco, notando a garganta arranhando. Jaehyun abriu um breve sorriso.
— Não agradeça ainda. É vinho do Porto — e automaticamente, como se fizesse isso todos os dias, Jaehyun levou a borda da taça ao nariz e inspirou o cheiro da bebida antes de ingeri-la.
Ele nem percebeu que fez. E , piscando os olhos, limpou a garganta e bebeu um grande gole, ficando contente de repente por nunca tê-lo encontrado em nenhum evento daquele porte antes, porque ele certamente se parecia muito com um cara que achava frozen yogurt uma coisa de gente idiota.
— Você tá linda — Jaehyun comentou casualmente, soltando uma respiração ruidosa de alívio por ter dito. — Digo, você é linda, mas… Azul te cai muito bem. Não sabe o quanto eu queria te ver.
se arrepiou por dentro. A mão que segurava na taça de repente se tornou um pouco fria e fraca, e o sorriso que viu cintilando no rosto lindo de Jaehyun mostravam que ele estava sendo mais do que sincero.
— Hmm… Você queria me ver? — Ela perguntou automaticamente, tentando não soar tão surpresa. Ele queria vê-la? Mesmo?
Ele concordou com a cabeça, mas aquela sinceridade ainda não foi o bastante para o coração de .
— É, eu queria te ver. Queria muito te ver — respondeu ele com convicção. se perguntou como devia estar sua expressão no momento, e se ela parecia tão… confusa e desestruturada como se sentia por dentro. — Eu cheguei hoje… Há 6 horas, na verdade. A primeira coisa que fui obrigado a ver foi as costas de um motorista qualquer e o banco de uma van e de repente, já estava aqui. Tive 1 hora para arrumar cabelo e maquiagem, e mais 2 para posar, sorrir e… bom, você sabe. Nesse exato momento, estou preocupado de abaixar a cabeça e simplesmente dormir. — Ele deu um risinho sem humor pelo nariz. Parecia estar contando o relato para suas tias ou amigas de sua mãe, pessoas que certamente estariam enchendo-o de perguntas sobre a viagem, o trabalho, os pontos turísticos que visitou e todas essas coisas que se perguntava depois de meses sem ver alguém. — Por isso, e só por isso… Eu não falei nada.
fez uma leitura daqueles olhos, uma checagem de toda aquela postura apenas para ver que ele estava falando sério. Mais sério do que precisaria falar.
— Ah, essa é a última coisa que devia estar preocupado — afirmou, com uma entonação firme. Quase deu um passo à frente para pegar em sua mão e garantir que ele absolutamente não deveria esquentar a cabeça com aquilo. — É sério. A última coisa. Tenho certeza que você deve ter sido recebido no aeroporto por vários fotógrafos que já devem ter avisado ao mundo da sua chegada.
— Eu não me referi ao mundo.
— Tudo que você faz vai para o mundo, Jaehyun. É a sua realidade — interviu com um dar de ombros. Tinha pensado em dizer que aquela era a vida dele: exposição e mais exposição, e que por vezes a internet era mais eficiente do que uma mensagem de texto, mas ficou calada. Com que tipo de moral falaria uma coisa dessas? Era apenas uma verdade permanente sobre uma das celebridades mais conhecidas da Coreia.
Ele a encarou com um pouco de surpresa e constrangimento. Dava pra ver como, pouco a pouco, começava a identificar algumas estranhezas em , coisas diferentes que não estavam ali antes, ou pelo menos não tão claras, como aquele tom de voz.
desviou o olhar para algum ponto estático e não vivo do ambiente e coçou a garganta, abrindo outro sorrisinho.
— Então, como esteve? Nos últimos meses.
— Trabalhando. E você?
— Idem.
— Fiquei sabendo da sua promoção. Diretora de fotografia — ele sorriu, colocando uma das mãos nos bolsos da calça social, parecendo, pela primeira vez naquela noite, como o Jaehyun do início da primavera, o Jaehyun sem a carcaça artística, o cara gentil que só queria ajudá-la. — Fiquei muito feliz. Sério, , você… Você merece muito.
Ela levantou o canto da boca para sorrir, sentindo novamente a sinceridade emanar do rapaz, mas uma sinceridade superficial. Havia mais coisas por baixo desse sentimento, coisas não ditas, coisas que Jaehyun escondia com um belo sorriso.
Assim como ela.
Ficou tão feliz assim e não veio me parabenizar? E como ficou sabendo disso? Eu não disse uma palavra.
engoliu a pergunta. Jaehyun era honesto, mas também era transparente. E naquele momento, ele parecia incapaz de ser ambas as coisas.
— Obrigada — disse, com o tom indecifrável. — Prefiro pensar que foram ossos do ofício. Deixa as pessoas mais humildes.
— Você não precisa dessa baboseira de modéstia.
— Todo mundo precisa, Jaehyun.
— Outras pessoas sim, mas não você — pontuou ele, dando um passo ligeiro para a frente, embalando em seu cheiro forte e suave ao mesmo tempo. — E… Isso aqui.
Ele desviou os olhos para a altura de seus ombros. As cores vibrantes da tatuagem no braço escapavam por debaixo da manga da blusa curta, como fios de cabelo escapando de um boné. agora praticamente se esquecia dela na maior parte do tempo, e notou como nem tinha passado pela sua cabeça mostrar a ele tal coisa.
Ela deu de ombros ligeiramente, com um mísero sorrisinho de canto.
— É nova. Se eu tivesse Instagram, o mundo já teria visto. Foi o que Candice disse, pelo menos.
Ele continuou encarando, vasculhando cada pedaço de pele pintada que podia absorver com os olhos, indo e voltando com um brilho maníaco nas pupilas, algo sedento e abismado que deu a a vontade de dizer “está tudo bem, Jaehyun, é só uma tatuagem”.
— Ela é linda. Ficou muito bem em você — concluiu ele, com um suspiro de pura admiração genuína. Em sua cabeça, provavelmente, jamais havia cogitado a possibilidade de fazer uma tatuagem – nem de brincadeira, nem mesmo daqueles adesivos de chiclete. E assim, inconscientemente, a imagem dela ia se distanciando cada vez mais da que conhecia. — Da onde surgiu a ideia?
Foi impossível não desviar os olhos de novo para qualquer outro canto. Não apenas pela resposta que ela jamais daria a ele sobre o motivo do surgimento da ideia – mas a quem ela recorreu. Quem estava lá com ela, quem a ofereceu apoio e literalmente o colo naquelas horas angustiantes, e gostaria muito de estar falando apenas da tatuagem, apenas daquele momento no estúdio de Polyc, sem considerar o aperto de Jungkook em outras ocasiões que invadiram seu coração sem aviso e a fizeram chegar onde estava naquele momento.
Que droga, era totalmente injusto pensar em Jungkook na presença de Jaehyun.
— Alguém fez… Um desenho pra mim. Depois de uma conversa — ela riu engasgada, e percebeu como sua voz tremeu pateticamente com a resposta indireta. — Um amigo do tatuador. Era muito talentoso.
— Eu concordo… Ele fez um ótimo trabalho.
Jaehyun ainda encarava a tatuagem enquanto o rosto de se tornava cada vez mais sério e apreensivo, e um grande silêncio constrangedor se instalou no pequeno espaço entre os dois enquanto tentavam achar o próximo assunto.
Estava na cara o quanto Jaehyun queria falar. E , mesmo com aquele turbilhão de pensamentos, desejava que ele não tocasse naquele ponto, tudo menos aquele ponto, tudo menos…
, eu…
— Não precisa — ela interrompeu sem perceber, piscando os olhos com rapidez e um certo nervosismo. — Se for dizer o que estou pensando que vai dizer, não precisa. Você não me deve nenhuma explicação.
Você não me deve nada, ela pensou internamente. Não estou perguntando sobre nenhuma dessas coisas, não quero detalhes, não quero nada disso.
Jaehyun não soube o que dizer. A reação de tinha sido inesperada o bastante.
Reparando agora, talvez ele conseguisse ver um pouco de indiferença partindo dela; uma indiferença que estava presente nos mínimos detalhes. Quando o viu saindo daquele camarim, os olhos castanhos da garota mostraram uma surpresa genuína; até mesmo um choque, caso ele reparasse demais, o que era totalmente dentro do esperado, já que eles não eram desconhecidos e ela não esperava vê-lo.
Mas desde o início daquela noite, ou a partir do momento em que ele teve coragem o suficiente para chamá-la para uma conversa, parecia o retrato contínuo de uma inteligência artificial; algo mecânico, feito para responder perguntas e não fazê-las. Nervosa demais para ficar e ansiosa demais para sair.
Bem, não é como se ele não tivesse imaginado esse cenário. Afinal, estava certa sobre a sua realidade: o mundo estava de olho em seus passos e não tinham compromisso nenhum com a verdade verdadeira.
… Aquelas fotos foram… Elas não são o que você está pensando.
— Jaehyun…
— Foi um mal entendido — a interrupção dele soou irada e genuína, uma ira que também incluía sua própria pessoa no pacote. — Uma fofoca. E eu sei que já devia estar acostumado com fofocas, que devia estar preparado, mas… — Jaehyun puxou o ar com força pelo nariz, e de certa maneira, isso findou qualquer outra coisa que pudesse dizer. Não existia mais o que dizer; qualquer coisa além de um pedido de desculpas entregariam Ali e todo o esquema que tinha pacificamente se livrado.
, ainda surpresa pelo comportamento agitado e culpado de Jaehyun, manteve a boca entreaberta enquanto murmurou um:
— Ahm… Tudo bem.
Havia humilhação em sua voz quando o rapaz respondeu:
— Quê?!
— Eu disse que está tudo bem.
frisou, mas não considerou o fato de que ela e Jaehyun não eram bem amigos. Não como era amiga de Candice, não como estava se tornando amiga de Yoona e não como era amiga de Jungkook, apesar de todos os pesares. Ele não entenderia que estava tudo realmente bem para ela, porque não estava bem para ele.
— Mas eu não… Não falei com você…
— Jaehyun — agora trincou os dentes e suspirou com cansaço, e semicerrou os olhos de uma maneira um tanto mais feroz do que um momento antes. — Eu já disse…
— Eu entendo que fui um babaca.
— Isso não importa…
— Eu reconheço, . É só que… As coisas ficaram caóticas. Malucas, piradas de uma forma que infelizmente não posso te detalhar agora. Soou como uma merda e é exatamente como parece. Acho que eu devia ter te dado uma explicação.
— Por que? — gesticulou com as mãos, buscando encará-lo de forma firme, uma forma que certamente nunca o tinha encarado antes porque poderia não ser atraente para ele — Porque nos beijamos duas ou três vezes antes de você viajar? Porque você me ajudou com toda a coisa das fotos? Porque tivemos uma química bacana e perdemos o assunto com a distância? Me diga, por que você pensa que me devia alguma coisa?
— Porque eu gostava de você — respondeu casualmente — Não, não, sendo o mais objetivo que consigo: porque gosto de você. Porque te achei linda e atraente desde a primeira vez que te vi, e porque deixei claro em todas as letras que sentiria sua falta. E porque, , te convidei pra jantar, e não foi da boca pra fora. Foi pra valer.
sentiu o baque antes que se tocasse do que estava acontecendo. É, como poderia ter pensado que ela e Jaehyun ainda pudessem se tornar razoavelmente amigos, mesmo com as coisas em patamares diferentes? De jeito nenhum. Um amigo não te lançava um banho de água fria daqueles sem que você tivesse 5 segundos para se preparar. Não mesmo.
Consequentemente, as palavras desapareceram. O cérebro de não estava preparado para aquela possibilidade.
— Você… o quê? — sussurrou ela, ainda perdida na revelação. Jaehyun trocou o peso de uma perna para outra até tomar coragem e avançar um passo, temendo que , no fundo, desaparecesse para longe caso ele não soubesse se expressar direito.
— Gosto de você. E falei sério sobre o jantar. Também falei sério que manteríamos contato e todas essas coisas, mas… A dimensão com que tudo aconteceu… — e ele travou de novo, e compreendeu, de repente, que aquilo era um segredo. O que quer que tivesse acontecido, era muito maior do que ele — Seja como for, quero conversar com você. Quero saber como anda sua vida, o que andou fazendo, se experimentou mais da culinária típica, se já gravou os principais endereços da cidade, se ainda se embola nos caracteres difíceis, se assistiu aos filmes que eu indiquei, quero saber sobre tudo. O convite ainda está de pé.
sentiu novamente aquele frio gélido vindo de algum polo desconhecido tomar conta de suas costelas, atravessando sua espinha até que a imobilizasse de novo. Aquele medo de não ser amada, carregado dentro dela pelos últimos sete anos e redescoberto apenas há pouco, insistiu em sair pra fora, insistiu em dar as caras e fazê-la sair correndo de novo, mas… percebeu que aquela era a primeira vez que ouvia aquilo de um cara. Que ouvia-o confessar que gostava dela, e que não parecia conter nenhum tipo de intenção de levá-la pra cama.
A situação transtornou um pouco o cérebro de . O bater descompassado no coração, tão desejado desde que o tinha visto naquele edifício, agora estava ali, completamente presente, ficando eufórico por aquelas palavras tão simples e que ela desejou tanto ouvir daquela voz principalmente, palavras vindas daquele cara alto usando roupas caras da Prada, mas a voz que chegava até ela era distorcida… Era outra voz, uma voz de seu cérebro, uma voz que seu coração fazia questão de transformar e fantasiar…
deu um passo para trás repentinamente, balançando um pouco a cabeça para se livrar da outra voz, a voz cujo dono havia feito perder tudo, inclusive a capacidade de amar o cara à sua frente, o cara certo e destinado com quem ela poderia se entregar.
— A-ah… Eu não sei… — balançou a cabeça novamente, e sabia que não estava pensando direito. Por que rejeitaria um convite já aceito? O que ela estava fazendo? — Digo, você não precisa fazer isso, você não…
— ele a interrompeu com um suspiro forte — Você não teria motivo nenhum para acreditar em um cara que vacila do jeito que eu vacilei e aparecesse de repente para reivindicar um pedido já feito, mas… Fiquei pensando em você. Um monte de vezes. E nesse momento também. Eu queria mesmo te ver.
— Jaehyun…
— É um convite sincero — Jaehyun não queria insistir tanto, não ao ponto de deixá-la minimamente desconfortável, afinal, lembrava-se de que eles eram amigos, minimamente amigos — Confia em mim, é sim. Um convite de um cara que não vai embora dessa vez — e aproximando-se devagar, ele perguntou em um fio de voz hesitante e apreensivo: — Posso te levar pra jantar?



Jungkook estava com medo da própria mente naquele momento.
Ele cruzou a alameda há pelo menos 100 por hora, curiosamente vazia no início da noite, torcendo para que enxergasse as placas de trânsito escondidas no escuro enquanto matutava um único pensamento na cabeça: pressentimentos ruins não existem.
Quem perdia tempo acreditando nesse tipo de coisa era sua velha avó que morava no interior de Gimhae, descascando batatas e amassando uvas com os dedos no quintal gigante de uma propriedade datada da dinastia Joseon, onde Jungkook sempre era firmemente forçado a frequentar, ainda que tenha dito para ela que não era mais necessário que as casas tradicionais se revestissem com talismãs antigos, estátuas de Buda e imagens do antigo imperador pela parede. Não existiam mais reis, escravos, guilhotina ou membros da corte para verificar quem ainda se submetia a isso.
Mas a senhorinha Young insistia em manter sua fé acesa e bem difundida pelo espaço, e enchia os bolsos do neto caçula com variações infindáveis de talismãs chineses e papeis de orações, reiterando que ele era alvo de muitos olhares e precisava se blindar sobre isso. Tinha um pressentimento ruim sobre isso.
Pressentimento ruim. Que piada.
Mas aquela ansiedade anormal que tomava seu peito enquanto os pneus da Mercedes pareciam mais lentos do que nunca o fizeram pensar na velha no mesmo segundo, porque havia algo no ar aquela noite, algo que não estava se revelando por conta própria e que deixava Jungkook zangado, e ele não tinha mais palavrões para mandar no grupo do Kakao, já que aqueles idiotas não estavam mais respondendo.
A festinha é aqui em casa. E hoje nem precisam trazer a cerveja.”
Ele precisava de mais do que isso. Precisava, certo? Mesmo que um convite para beber na casa de Yugyeom, que tinha decidido comprar uma casa na saída da cidade, fosse tão comum quanto andar para frente, ainda seria bom darem motivos para tal comemoração tão repentina em uma segunda-feira.
Porque Jungkook sentia – meu Deus, que besteira é essa coisa de sentir –, que qualquer que fosse a razão para ele não precisar levar cervejas para a casa de Yug, ela não seria boa. Ou seria totalmente inesperada. Ambas as opções não eram nem um pouco acalentadoras. Ele estava descobrindo, da forma mais patética possível, que suas convicções não eram à prova de balas – ou à prova da vovó Young.
Novamente, ele tentou perguntar à Yugyeom ou a qualquer um dos desgraçados que quisessem ler a porra do celular o que estavam aprontando. No entanto, o vazio das respostas permaneceu o mesmo até que ele se aproximasse do grande muro que cercava a residência de pedra, algo que ninguém, absolutamente ninguém de fora julgaria ser a moradia de Kim Yugyeom.
Mas, à medida que teve o acesso liberado e sentiu o aroma característico de desinfetante com grama recém cortada e ouviu a música vinda lá de dentro, ele soube exatamente para que tipo de festinha havia sido convidado. E em como estava com zero animação pra isso.
Jungkook estava longe de querer agito em qualquer configuração de convite. Pareciam haver tantas coisas acontecendo, mesmo que, de verdade, não estivesse acontecendo nada. Sua cabeça se concentrava no presente quando bem entendia; as coisas no trabalho pareciam mais sufocá-lo do que distraí-lo; seu coração inchava e doía toda vez que pensava em – e todas as perguntas sobre o que ela poderia estar fazendo naquele momento, ou com quem, o que era pior ainda; seu pau reclamava cada vez mais pelo período de abstinência, e Jungkook tinha vergonha de como não estava sendo capaz de completar uma conversa simples com nenhuma garota, tão simples e direta como um convite pra trepar. Simples e cotidiano, ou era cotidiano antes de , assim como sua paz de espírito também era, assim como tantas coisas eram e agora tinham virado pó por causa de uma frase:
Você mexe comigo.
Mas o que era isso, cacete? O que ela queria dizer com isso? O que ele deveria entender, o que deveria fazer com isso? Em nenhum arranjo do mundo, em nenhum aspecto do destino, em nenhum bloco do diagrama de toda aquela confusão em que tinha se metido com ela, Jeon Jungkook considerou que algum dia sentisse algo por ele.
Que se apaixonasse por ele. Meu Deus, isso parecia maluquice, uma insanidade! Ela era a pessoa perfeita para o acordo justamente pelo fato de que jamais se apaixonaria por ele. Porque já estava apaixonada por outra pessoa, porque tratava sexo e amor como duas estradas longínquas e separadas, porque tinha todos os motivos para odiá-lo, porque logicamente estava apenas se divertindo enquanto se descobria como uma gostosa, e porque…
Você mexe comigo.
Ah, droga. Não tinha como! Era impossível! Como ele poderia ter o poder de mexer com outras partes de que não fossem carnais? Como ele, justo ele, poderia entrar naquele coração? Como poderia ter esse coração? Ele era tão idiota. Tão fútil, tão moleque, tão perdido, tão fodido, e tão…
Tão medroso. Um covarde de primeira. Incapaz de abrir mão do último fiapo de seus princípios e aceitar que o tiro tinha saído pela culatra. Que aquela garota estava bagunçando tudo – ou consertando tudo, era difícil dizer. O fato era que nada mais parecia no lugar, e isso o enlouquecia.
Era mais fácil que ele se apaixonasse por ela. Mesmo que a ideia nunca tenha passado pela sua cabeça antes, mesmo que parecesse a maior piada da história, mesmo que soasse como a maior idiotice que faria na vida.
Mas Jungkook nunca disse que não era idiota. E o que quer que tenha acontecido entre ele e naquela festa há meses atrás, o que quer que tinha acontecido no banco de trás daquele carro, o que aconteceu desde o começo naquele backstage do estádio olímpico, o que quer que vinha acontecendo no decorrer dos últimos meses, deixava-o preocupado com o resultado disso no final. Um resultado que estava bem ali, martelando no seu peito entulhado de saudade, indicando que ele estava mais fodido do que jamais esteve na vida.
Por essas e outras, ele estaria muito mais confortável na grande mansão de Itaewon, tocando suas músicas favoritas no violão enquanto Bam dormia dentro da caixa da guitarra, seu novo lugar favorito da casa e abarrotando suas paredes com Daniel Caesar, mesmo que o fizesse se lembrar dela ainda mais.
Vamos lá, cara, ele disse a si mesmo antes de soltar o cinto de segurança e deixar a Mercedes. Uma hora estava de bom tamanho. Ele só ficaria por esse mísero tempo até voltar pra casa. Uma hora dava pra 3 cervejas. Uma cerveja que ele com certeza não saberia o nome, mas nenhum líquido tão gostoso quanto uma Leffe Brown o faria ficar mais do que isso.
Antes que tivesse a chance de levantar o dedo para tocar a campainha, a porta se abriu em um rompante na sua cara, e a fumaça saiu para fora antes mesmo da voz do indivíduo.
— JK! — Era Eunwoo e sua risada que imitava um porco, jogando-se para cima de Jungkook com braços e tronco nu, fedendo a muita vodka e muita maconha.
— Ei, ei, menos — Jungkook se afastou com uma careta, e o amigo aprumou a cabeça groguemente. — São só 9 horas, cara. Não dava pra esperar?
— Yugyeom trouxe um negócio diferente — Eunwoo respondeu com um grande sorriso, passando um braço pelos ombros de Jungkook. — Comprou lá na Europa, em um lugar chamado… Ah, foda-se, não vou conseguir dizer o nome, mas diz ele que importaram do México. E você sabe o que tem no México, não sabe? — ele deu um tapinha no ombro de Jungkook, que revirou os olhos e deu uma risada pelo nariz. — Vem, entra logo.
Eunwoo o puxou para dentro, fechando a porta com o pé, sem soltar de Jungkook. À primeira vista, o primeiro andar da casa parecia intacto – ou tão intacto quanto uma residência sem vidrarias quebradas poderia parecer. Yugyeom era um amante do minimalismo e comprava todos os cursos e livros de Marie Kondo em segredo, acreditando em toda aquela porcaria de posição de móveis e energia espiritualista de um lar, mesmo que isso soasse tão ridículo para Jungkook como dizer que dormir com os pés para a porta é chamar a morte.
Talvez Yugyeom fosse se dar muito bem com a velha vovó Young.
Por isso, Jungkook não precisou que Eunwoo o guiasse: as festas na casa de Yugyeom nunca aconteciam no primeiro andar. Se alguém tocasse em um talher ou guardasse um copo no lugar errado, era capaz de perder o dedo.
— Por que estamos aqui? — Jungkook se viu perguntando assim que chegaram ao primeiro lance de escadas, que estava intensamente lustroso, mesmo com os pés calçados pisando nele.
Eunwoo ergueu a cabeça e olhou o amigo com choque.
— Como assim o que estamos fazendo aqui? Beber, porra! Encher a cara! Falar besteira, contar as novidades, precisa de motivo pra estar aqui?
Jungkook bufou e tirou a mão de Eunwoo de seu ombro, agora terminando de subir.
— Não é isso, idiota. Eu só não ‘tava muito afim de vir — ele coçou o nariz quando se aproximaram do segundo e último lance de escadas antes do terraço. Eunwoo fez um barulho estranho e alto com a boca, como se JK tivesse dito uma piada — Que foi? Sabia que eu trabalho?
— Eu também, e daí? Só porque vai ao Grammy e a gente não, somos vagabundos? — Eunwoo revirou os olhos brincalhão, enquanto Jungkook estalava a língua e bagunçava o cabelo já revolto do amigo. — Mas pra sua sorte, imbecil, temos sim um motivo pra essa reunião. Um motivo muito bom, cadê a sua pulseirinha?
— O quê?
— Nossa pulseirinha da amizade, cadê ela?
Jungkook franziu o cenho e puxou uma das mangas do casaco para mostrar a pulseirinha cintilante da Cartier que não saía de seu pulso em qualquer lugar fora do palco. Tinha sido uma pechincha que o próprio Eunwoo havia conseguido quando assinou com a marca, e todos os 5 amigos a usavam constantemente como parte de seu visual natural.
Os olhos de Eunwoo cintilaram tanto quanto o ouro na pulseira, e suas mãos grogues abriram a porta do terraço com energia.
— É isso aí, finalmente a reunião completa do grupo — ele deu um gritinho quando abriu e entrou correndo para o espaço — E o penúltimo homem está entre nós! Tragam mais cerveja!
O conjunto de estímulos que o aguardavam no último andar foram tão intensos que Jungkook não teve tempo de se atentar às últimas palavras de Eunwoo. O ar estava frígido em volta deles, e de longe, toda a Seul brilhava debaixo de um céu nublado e escuro, mais escuro do que nunca. A cobertura de Yugyeom era menor do que mansões comuns de Gangnam, mas ainda dava pra organizar grande coisa. Imediatamente, ele enxergou Mingyu sentado em cima de uma mesa qualquer, terminando de acender um baseado que ele mesmo tinha bolado, jogando o isqueiro na grande bagunça ao lado que tinham todas as coisas do processo espalhadas: a erva, a seda, isqueiro e um dichavador de policarbonato. Na frente dele, esparramado em uma poltrona grande onde só o dono da casa poderia sentar, estava Yugyeom e seu sorriso idiota e claramente chapado, com uma garrafa de Imperial Blue encolhida no fundo do colo, lacrada. Ele a estava segurando com uma mão anormalmente protetora, o que queria dizer que Eunwoo já devia estar louco e chato o suficiente para tentar roubar aquilo dele, o que sempre acabava rendendo uma briga entre os dois e, talvez, uma troca de socos na amizade.
Pura amizade.
Ao ser visto, Mingyu jogou as pernas para fora da mesa, abrindo os braços e dizendo:
International playboy, como posso te servir hoje? — ele afinou a voz e Yugyeom soltou uma risada alta. Jungkook revirou os olhos mais uma vez e se aproximou, cumprimentando os amigos com um pequeno soco.
— Você não me abraçar como esse idiota fez na entrada já tá de bom tamanho — ele puxou uma das Heinekens agrupadas dentro de um balde de metal recheado de gelo, abrindo-a com os próprios dedos — E você sabe que eu não vou misturar isso — ele apontou para a garrafa aninhada com Yugyeom, e logo em seguida aceitou a guimba de Mingyu, que já estava com os olhos pequenos.
— Ah, mas você vai sim! — Yugyeom deu um tapa na própria perna, apontando para Jungkook — Você veio pra uma comemoração, Jeon. Eu gastei uma fortuna nessa merda pra esse momento, é a noite de você misturar o que eu quiser.
— Hoje é segunda-feira, porra. Que comemoração você quer fazer? Os Lotte Giants ganharam dos SSG Landers?
— Já tá rolando a KBO League[1]? — perguntou Eunwoo.
— Você acha que os SSG ganhariam dos Lotte Giants? Ficou maluco? — interviu Mingyu.
— Ei, eles são de Busan. Meu pai me levava nos jogos quando eu era criança, tenho memória afetiva.
— Memória afetiva não faz aquele time de merda acertar mais entradas. Eles são horríveis.
— Eles vão estar na pós-temporada esse ano, quer apostar?
— Não aposto com você.
— Por que não?
— Porque você é mais rico do que todos nós juntos e é um babaca sobre isso.
— O que eu fiz? — Jungkook franziu o cenho.
— Você não lembra quando apostou 80 mil dólares que o Yugyeom ficaria sem limpar a cozinha por dois dias depois que você abriu camarões em cima da pia? — falou Eunwoo. Yugyeom balançou em um calafrio.
— Os piores dois dias da minha vida.
— E apostou 50 mil que eu não conseguiria pegar a Suzy no Drama Awards de 2019.
— E você não conseguiu — JK levantou uma sobrancelha — O que significa que me deve 50 mil pratas mais os juros.
Yugyeom gargalhou com a cara embasbacada que Eunwoo fez. O garoto abriu e fechou a boca e, por fim, bateu o pé com o olhar furioso.
— Era a Suzy, porra. Em que mundo aquela mulher vai dar alguma moral pra mim?
— Se você contar pra ela que nunca fez uma cirurgia plástica, pode ser uma vantagem.
Mingyu quase cuspiu a cerveja com a risada explosiva.
— Até parece que ela vai acreditar nisso!
— Ei, eu nunca fiz nenhuma plástica — Eunwoo se defendeu. Mingyu abanou o ar com a mão.
— Quem se importa, cara? Ninguém é tão bonito assim naturalmente, as pessoas desconfiam — o amigo deu de ombros, observando Eunwoo piscar os olhos com singela surpresa, adentrando em uma reflexão momentânea sobre “ser bonito demais para ser verdade”, o que fez o resto dos garotos esconder o rosto nas mãos para rir alto — Enfim, já liguei para as garotas, devem estar aí em menos de 20 minutos.
— Garotas? — Jungkook perguntou.
— São as gostosas de Macau? — Eunwoo roubou o cigarro dos dedos de Jungkook antes que ele tragasse de novo, virando-se para Mingyu.
— E gostosas amigas das gostosas.
— Você conhece essas amigas? Porque se eu ver…
— Relaxa, Yug, tá tudo esquematizado. Ninguém vai passar por aquela porta com um celular, eu te garanto.
— Que se fodam os celulares, se alguma delas vomitar no meu piso ou desalinhar os vasos das minhas plantas, vou mandá-las embora sem pensar duas vezes.
Os garotos esperaram 3 segundos antes de estufarem o peito para começar mais uma sessão de gargalhadas. Yugyeom piscou os olhos em confusão, resmungando que seriam eles a limparem depois caso algo desse errado, e desistindo logo em seguida, reiterando que não confiava em nenhum deles para fazer aquilo.
— Essa eu quero ver — Jungkook, ainda rindo, bebeu um gole grande da cerveja e apoiou o quadril na mesa ao lado de Mingyu — Mas o que tá acontecendo? Contrataram um show de pole dance? Algum de vocês ganhou uma fortuna e eu não tô sabendo?
Antes que Yugyeom abrisse a boca para responder, Eunwoo soltou uma expiração forte e correu imediatamente para o parapeito da cobertura, da onde provavelmente deve ter visto a Mercedes chegando da outra esquina, ainda que estivesse escuro demais para enxergar até mesmo o asfalto fora do muro. Aparentemente, o garoto também estava vendo e ouvindo o que ninguém estava.
— É ele! Ele tá chegando! — com um gritinho, ele correu para a mesma porta em que Jungkook entrou.
— Ele quem? — JK perguntou, franzindo o cenho enquanto os outros dois amigos soltaram uma risada.
Eunwoo se virou para ele do batente.
— Como assim, quem? A porra do Buda! A sósia do Ghandi. O bundinha de pêssego!
— Se você chamá-lo assim, ele vai fazer aquela careta — Mingyu zombou, e Eunwoo apenas deu de ombros e desceu as escadas.
— A careta de pêssego? — Yugyeom comprimiu os lábios para não rir, mas não foi o suficiente. Mingyu soltou uma gargalhada alta, enquanto Jungkook ficou parado. Tomou um gole. Assimilando.
Assimilando…
— Ele é o mais velho. — Mingyu deu de ombros.
— A gente já combinou que não tem dessa aqui…
Você combinou, porque se fosse assim, você seria o mais novo. E sendo o mais novo, posso mandar você abrir essa porcaria logo… — o amigo se preparou para ir para cima de Yugyeom.
— Não vou abrir, sai daqui, idiota…
— Isso custa mais do que o seu carro, qual é…
— Chegou! — Eunwoo estava de volta pela mesma porta, gritando a plenos pulmões e saltitante, como uma criança de 5 anos — Nosso último homem está entre nós, senhoras e senhores! Jeong Jaehyun e toda a parafernália da Prada.
Com gritinhos, Mingyu e Yugyeom se levantaram e foram de encontro ao cara que adentrava na cobertura. Jungkook, ainda parado, ainda processando, olhou para o amigo recém chegado com nada menos do que choque.
Ele já estava cheio da energia angustiada e insatisfeita que ultimamente sempre parecia se instalar em seu coração depois de ver, falar ou simplesmente pensar em e em toda aquela confusão, e odiou profundamente como ela foi seu primeiro pensamento assim que pousou os olhos no amigo.
Jaehyun abriu um sorriso grande e verdadeiro quando deixou que Mingyu o abraçasse, um sorriso que era verdadeiramente seu, um que te envolvia e fazia você se sentir como parte do grupo antes de literalmente ser. Era o que tinha acontecido com Jungkook, era o que tinha acontecido com todos ali.
Os 4 amigos à sua frente riram e brincaram como sempre, puxando Jaehyun e a camisa social aberta para mais perto até que ele pousasse os olhos em Jungkook.
O tal do sorriso amigável e inclusivo pareceu hesitar por um milésimo de segundo, coisa que podia ser confundida facilmente com ilusão de ótica, e logo ele sorriu novamente, caminhando para ele para juntá-lo em um abraço.
— Ei, cara! — ele disse com um tapinha nas costas — Que bom te ver.
Jungkook demorou o tempo de uma respiração para retribuir o gesto. Se aquele trejeito tinha sido básico um dia, naquela hora, parecia um soco na cara de Jungkook.
Maldita culpa. Maldito pressentimento ruim. Maldita vovó.
Ele sorriu com alegria sincera, e conseguiu limpar a garganta para dizer quando se soltou:
— É… Muito bom te ver. Bem vindo de volta.
[1]campeonato coreano de beisebol.


"Eu vejo sua cara emburrada
E é como olhar para um cano de uma arma
E então ela dispara
E de lá saem todas essas palavras
Oh, existe um lado muito agradável em você
Um lado que eu prefiro muito mais."

🖤🎤 Mardy Bum


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Jeong Jaehyun era um poço de tranquilidade.
Nas conversas baixinhas de corredores e nos poucos relatos femininos que tiveram a chance de uma experiência, ele poderia até ser chamado de um tédio sem fim. Não havia nenhuma reclamação sobre seu desempenho na cama – muito pelo contrário; nenhuma delas conseguia descrever o que era aquilo que o homem guardava por debaixo da vestimenta dândi. Mas o caminho até chegar lá? Esse sim era árduo, e um tanto cansativo para quem só queria a parte do quarto.
Mas Jaehyun nunca escondeu que estava acima de relações casuais. Em vez de sair à caça como o restante de seus amigos, ou aproveitar as oportunidades que seu nome e status o traziam, o rapaz preferia ter algo que eles carinhosamente desprezavam na maioria das vezes: uma conversa. Olhar para o rosto de uma mulher, entender seus desejos, preferências, pescar as necessidades não ditas, histórias e medos apenas pelo modo como sorria e se portava. Sabia perfeitamente bem que nem todas as palavras que saíam da boca de alguém acompanhavam os olhos. Que as pessoas mentiam descaradamente para benefício próprio. Que ele, ao esperar algo mais profundo do que isso, estava simplesmente fadado à solidão e ao fracasso.
E, na maioria dessas vezes, quando se cansava rápido de uma interação em que não o despertava a mínima vontade de avançar em nenhum aspecto, ele tinha de dar uma de babysitter sobre os exageros dos amigos. Sempre foi assim. Jaehyun, o salvador da pátria. Buda, Ghandi, um pouco de pai e irmão mais velho, com seu maldito senso moralista e defensor dos fracos e oprimidos.
Os adjetivos soavam engraçados no começo. Jaehyun não concordava com a maioria deles, porque não olhava para si mesmo como um arquétipo perfeito que a sociedade o moldava, um protótipo de sucesso feito para a mídia, um tipo de fardo que não era diferente do qual os amigos carregavam, mas que ele levava com um pouco mais de seriedade. Talvez porque tinha medo. Talvez porque não tivesse encontrado nada forte o bastante para fazê-lo desistir e se soltar dessas amarras que ele diligentemente carregava.
Ao conhecer , uma luz ficou verde sobre tudo isso. E não apenas porque esbarrou nela tão violentamente em New York, não apenas porque voltou a encontrá-la de forma tão anormal naquele estádio, e não quando ouviu sua história e captou todos os detalhes de sinceridade que não via em muita gente. Não; parecia despertar algo novo dentro dele pela estabilidade. Porque tinha saído do outro lado do mundo e ido parar ali, sofrendo mudanças adversas e loucas como ele nem imaginava como era, e mesmo assim, continuava com a mesma verdade inatingível, a mesma convicção de seus sonhos, de seus erros, de seus medos, e também de suas mentiras. Ele sabia quando ela mentia, sabia que omitia a maioria das coisas, e ainda assim, estava sempre pronto para pisar forte no acelerador de seu conversível até os pneus guincharem e fazerem fumaça e ir até ela.
Jeong Jaehyun estava pronto para partir como um foguete ao menor sinal de necessidade de . E pensava nisso constantemente agora, enquanto respondia mais um SMS dela, que dizia alegremente como tinha tirado a nota máxima em sua primeira apresentação sobre Estética e Imagem. Houve muita parte técnica, malditos artigos infinitos que falavam sobre a mesma coisa e muitas aulas de coreano para conseguir falar por 10 minutos. Ele perguntou se ela gostaria de um frozen yogurt para comemorar e a viu negar imediatamente, dizendo que odiava aquela coisa.
Estranho. Ela parecia gostar muito naquela festa de Jeno, e Jaehyun não viu nenhum traço de fingimento sobre isso.
“Tudo bem, o que vai fazer agora?”, digitou ele, passando um dos dedos sobre os lábios inconscientemente com uma lembrança recente. demorava um pouco para responder; com certeza por causa do celular antigo, mas aquela até que veio bem rápido:
“Acho que vou assistir um filme. Musical. Eu adoro musicais.”
“Musicais são o melhor gênero para filmes. Qual é o seu favorito?”
“Já perdi as contas de quantas vezes assisti La La Land. Não tem outro pra me indicar?”
“Você tá falando sério? É o meu favorito também!”, Jaehyun digitou com um sorriso, a euforia ampliando as batidas de seu coração. Aquelas semanas em que esteve conversando com ela tinham lhe revelado tantas coisas em comum. Ele descobriu que gostava de branco, como ele. Que ela amava fazer aniversário, como ele. Que preferia o inverno, como ele. Que até gostava do maldito cheiro amadeirado de museus, como ele. Como poderia existir alguém assim?
Mesmo que ela, por muitas vezes, parecia pensar por um tempo mais longo que o normal para responder perguntas simples, como “qual a sua comida favorita?”, mas isso não tocava na área de advertência vermelha que Jaehyun tinha sobre as pessoas. Ele acreditava que estava se mostrando aos poucos para ele; e que ele estava gostando muito, muito disso.
— Você vai rir até quando pra esse telefone? — O espaço ao seu lado do sofá afundou quando Jungkook se jogou nele, esparramando as pernas por cima da cadeira à frente. As botas pesadas fizeram um barulho alto e cristalino quando bateram na superfície. Jaehyun olhou para o lado por um breve segundo para notar que o amigo tinha as mãos ocupadas por uma cerveja e um papel amassado.
— Não estou rindo. O que é isso? — Ele bloqueou o telefone e se virou um pouco. Estavam sentindo o vento fresco na esquerda do rosto e o quente do lado direito, onde a porta de vidro extensa mostrava o cômodo luxuoso e intensamente abarrotado de pessoas da residência de Bambam, que achou que seria uma ótima ideia reunir alguns amigos e muitos conhecidos depois de se livrar de sua gravadora para comemorar.
Jungkook tomou um gole da cerveja e atirou o papel para qualquer canto.
— Multa de trânsito. Parece que ultrapassei o limite de velocidade numa área escolar. Mesmo que tenha sido quase meia noite — ele revirou os olhos. — Me diz, alguém por acaso vai ter aulas nessa hora? De que importa se estou correndo ou não quando não vai ter pessoas pra atropelar?
— De que velocidade estamos falando?
— Só 110km.
— No meio da cidade? Quem você acha que é, o Max Verstappen? Acha que Seul é a pista de Mônaco? — Jaehyun riu pelo nariz, e tomou a cerveja das mãos de Jungkook.
— Eu só queria chegar logo em casa. E eu ainda fui devagar, a Mercedes tinha muito mais pra oferecer.
— O motor dela se sai bem mesmo nesse ar frio? — Jaehyun deu de ombros. Jungkook sorriu enviesado, os caninos cintilando naquela luz colorida do quintal.
— Rápida e descomplicada. Parece comigo, se você souber ligar os pontos — o amigo tomou a cerveja de volta, recostando-se ainda mais naquele couro vermelho do sofá de dois lugares. As pálpebras baixas de Jungkook demonstravam seu total estado alheio à sociedade desde que acordou em uma manhã e leu aquele anúncio de Ali Dalphin. Desde que se viu sozinho em um impasse sobre o status do relacionamento deles, desde que andou por aí como um morto vivo por quase 1 semana até que repentinamente… Estava bem. Ou tão bem quanto estava antes de ela ir embora. Antes que toda a bomba estourasse.
Jaehyun realmente não queria ver o que aconteceria caso ele continuasse naquela situação.
Ele fez um barulho de desdém com a boca e pegou o telefone de novo, se recompondo ao receber a próxima mensagem de . Um sorriso deve ter despontado de seus lábios sem querer, e Jungkook soltou um suspiro áspero ao ver a cena.
— Está falando com ela? — Automaticamente, seu tom mudava de forma e agora ele não sorria mais. Se tivesse sido Eunwoo a pessoa que estivesse sentado ali, provavelmente faria piadas idiotas e perguntaria porque ele ainda não tinha levado a garota pra cama e todas essas coisas que amigos te incentivavam a fazer. Mas com Jungkook a coisa era diferente; ele parecia segurar a careta de asco toda vez que via os dois juntos, ou apenas o ouvia falar sobre .
— Sim — Jaehyun respondeu sem olhar pra ele, e se preparou para ouvir algum resmungo de JK, qualquer coisa que demonstrasse o quanto ele não seguiria em frente na missão de apoiá-lo naquela coisa com ela.
Em vez disso, Jungkook comprimiu os lábios e se ajeitou no banco.
— Você pretende beijá-la alguma hora ou vai ficar nesse lenga-lenga até ela cair fora? — Ele perguntou enquanto vasculhava o bolso da frente do jeans até puxar uma caixa de Dunhill.
— Lenga-lenga? — Jaehyun franziu o cenho, e em seguida estalou a língua. — Se acender essa porcaria perto de mim, não vamos terminar essa conversa.
Jungkook parou com os dedos no isqueiro, puxando o cigarro preso entre os dentes da frente com um revirar de olhos e guardando-o de volta na caixa, abrindo um sorriso irônico para Jaehyun e resmungando o quanto ele era um chato.
O problema não era Jungkook fumar. Ele já fazia isso desde que o conheceu, com menos frequência e mais em casos especiais. Mas a questão era que nos últimos 3 anos, ele não tinha limites, e tudo piorava quando bebia demais como naquela festa, e em todas as outras antes dessa.
— Vai, responde — Jungkook voltou a dizer. Jaehyun se virou um pouco mais pra ele.
— O que é lenga-lenga?
— Conversa fiada, meu amigo. Você colocando essa sua mania de querer analisar tudo e todos pra ver quem será a escolhida para provar um pouquinho de você. Achava que isso era alguma vertente de amor próprio, mas acho que você teme não dar conta do recado — Jungkook passou uma língua pelo lábio, e segurou uma risada na garganta. Jaehyun revirou os olhos e balançou a cabeça.
— Você é um idiota.
— E você é um frouxo. Que é, sei que você quer beijar a paparazzi sonsa e por mais que eu tenha uma lista inteira de mulheres muito melhores, muito mais bonitas e que não vieram das Fronteiras do Inferno pra cá, eu creio que…
— Ela já me beijou, Jungkook.
Jungkook parou a frase no meio, agora virando o tronco quase inteiro para o amigo, entreabrindo a boca com singela surpresa.
— Ahm… Tá. Calma, disse que ela te beijou?
— Isso. Há dois dias. Depois do Music Bank.
Jungkook pareceu embasbacado demais. Piscou os olhos com incredulidade, juntando as sobrancelhas logo depois e tocando os bolsos rapidamente na área do celular.
— Ela te beijou mesmo? Tipo, de verdade?
— Sim, cara. Quer me explicar por que tanta curiosidade? — Jaehyun bufou, apoiando os antebraços nos joelhos. Estava esperando que Jungkook dissesse algo bem afiado, como: se tivesse sido comigo, eu seria capaz de chamar a polícia. Como pode desperdiçar beijos com uma garota dessa?, mas o amigo parecia querer poupá-lo de sua aversão à e apenas assentiu devagar com a cabeça, voltando a beber sua cerveja.
— Nada. Só não achei que ela seria capaz de acelerar as coisas tão rápido — ele fez um som de asco pelos lábios, e Jaehyun identificou seu grande controle ao dizer aquilo. Ele apenas riu pelo nariz e balançou a cabeça, roubando a cerveja de Jeon novamente.
— Eu já queria fazer isso, de qualquer forma. Ela só facilitou.
— E agora faltam quantos passos para você levá-la pra cama?
— Não é tão simples assim.
— Ah, é assim sim. Você sabe que é. Seus métodos cansativos e seus interrogatórios policiais param as coisas antes que aconteçam, mas se você ficar de boca fechada, garanto que vai se divertir mais do que os outros idiotas. Então, já que essa garota teve estômago para passar pelo seu processo seletivo, por que não…
— Não é assim com , JK — Jaehyun disse incisivo. — Quer me perguntar se quero dormir com ela? É claro que eu quero. Se eu quero beijá-la de novo? É óbvio. Mas ela tem… Algumas coisas.
— O quê? Bafo? Caráter duvidoso? Devo concordar.
— Não, idiota. Ela tem coisas que eu quero saber. Que eu quero conhecer. E está bom do jeito que está agora — ele deu de ombros, tranquilo com o fato, e Jungkook o olhou como se ele fosse um alienígena. Como se fosse um ser estranho da floresta.
A reação do amigo foi rir e tomar sua cerveja de volta, porque depois de ouvir aquilo precisava ainda mais dela.
— Cara, eu entendo toda a educação pomposa e fofa que seus pais te deram. A minha mãe é louca por você, você sabe disso, só porque você faz questão de lavar as louças e limpar o tapete sempre que vamos à Busan, mas… É só uma garota — ele riu agora mais abertamente, como se o fato estivesse tão óbvio quanto a tabuada. — Se o seu pré requisito é gostar de conversar com ela, ele já foi atingido. Pronto. Se é isso que uma garota precisa pra você tirar a calcinha dela, por que não faz isso de uma vez?
— Acha que eu só quero tirar a calcinha dela?
— É claro que eu acho. O que mais você poderia querer com ? Ela não é confiável, mas pode servir de diversão por uma noite caso você esteja tão encantadinho assim.
Jaehyun abriu e fechou a boca com genuíno espanto pelas palavras de Jungkook. Elas saíram tão naturais e simples dos lábios do amigo, que nem se deu ao trabalho de olhar para ele enquanto falava. Jaehyun sentiu a fagulha do aborrecimento queimar no estômago, e teve vontade de dizer a Jungkook que ele não estava sendo apenas idiota, mas um escroto de primeira, e que nada daquilo era verdade e nem passava perto de suas verdadeiras intenções. Jungkook responderia que ele que era um idiota e provavelmente completaria sua sentença dizendo que Jaehyun teria menos dor de cabeça se usasse do bom e velho “comer e esquecer”, como Jungkook já tinha feito, como Yugyeom fazia sempre, tratando seus paus de merda como os soberanos de qualquer relação.
Jaehyun repudiava esse lado dos amigos, mas estava em paz com a forma que ele lidava com as coisas, com a consciência limpa de fazer o que achava certo. Sua garganta entulhou um discurso para jogar em cima de Jungkook, deixando bem claro que sim, talvez e muito talvez, ele não quisesse apenas uma noite de diversão com , e que seus sentimentos não se baseavam apenas nesses desejos temporários, mas Jungkook com certeza soltaria uma gargalhada e não se daria ao trabalho de ouvi-lo, porque em sua cabeça egoísta e ferida, não havia nada para gostar em . Absolutamente nada. E achava que isso estava claro para todo mundo.
Engolindo toda a sua palestra raivosa, Jaehyun se levantou de seu lugar, não fazendo o menor esforço para esconder a expressão fechada.
— Eu nunca te pedi pra controlar sua língua do meu lado, Jungkook — disse ele, e notou os dentes trincados nervosamente. — Mas se abrir sua boca pra falar de desse jeito de novo, vou te fazer calá-la do pior jeito possível. Babaca de merda.
E ele se afastou sem dar a chance de resposta à Jungkook, que permaneceu no mesmo lugar com a testa enrugada de confusão, sem entender o que tinha dito de tão grave para que incitasse tal reação em Jaehyun.
Depois de um tempo, o garoto soltou uma risada desacreditada, sentindo-se livre para puxar a caixa de Dunhill e acender um sem restrições. Que baboseira, ele não tinha expulsado Jaehyun e nem nada disso. Se ficava bravo por ouvir a verdade – que ela não era mesmo confiável – o problema era dele! Se queria transar com uma garota assim, problema dele ao quadrado! Mas Jungkook sabia que ele queria isso e não era capaz de admitir. Não queria se igualar aos amigos, não queria ceder à tentação da facilidade suprema em atender aos seus desejos sórdidos com uma garota qualquer e voltar a seguir a vida. Jaehyun não sabia ser essa pessoa, mas não significava que não era essa pessoa, em alguma parcela de seu ser.
Era isso. Só podia ser isso.
A parte ruim foi que o amigo tinha ido embora antes que ele tivesse a chance de perguntá-lo se preferia vinho seco Merlot ou Chardonnay. Seria uma informação importante para , agora que tinha tido a coragem de beijá-lo. Era uma estratégia para conseguir dar o próximo passo. Ela queria tanto quanto ele, devia querer até mais. E, bem, Jungkook tinha dito que a ajudaria. Que a informaria coisas. Que a daria assunto.
Mas nunca disse que faria a mesma coisa com Jaehyun.

⏪⏪⏪


Jungkook achou que não seria capaz de acompanhar as conversas.
Achou que o turbilhão de pensamentos e sensações fossem barrar qualquer senso de normalidade que geralmente tinha entre os amigos.
Achou que estar perto de Jeong Jaehyun, finalmente, depois de tanto tempo e tantas mentiras, fossem contribuir para que sua culpa fosse alimentada e ele não parasse de pensar em tudo que já estava pensando antes.
No entanto, quem diria que algumas cervejas e doses de Imperial Blue depois, fizesse com que nenhuma dessas coisas importasse?
Quando percebeu, ele já estava alheio a todos os acontecimentos de fora daqueles muros. E com risadas barulhentas, piadas de humor negro, debates sobre o jogo e novidades esporádicas sobre quem tinha pegado quem, ou quem tinha dado um fora em quem, Jungkook se viu no meio de uma reunião típica dos velhos amigos que continuavam os mesmos velhos amigos desde que os conhecera.
Amigos que tinham suas próprias vidas e seus próprios segredos, sim, mas que faziam as coisas nunca mudarem.
Abaixo de todas as preocupações de Jungkook, existia uma saudade intensa daqueles momentos. Parecia que estava vivendo outra vida, sendo outra pessoa nos últimos meses; desde Ali, desde as notícias, desde a composição, desde e toda a loucura em que estava inserido agora. Tinha se esquecido de como era bom estar com amigos – seus amigos de sempre, amigos que tinham uma ligação que não estremeceria abruptamente por qualquer coisa.
Era nisso que tentava pensar toda vez que olhava para Jaehyun e ria junto com ele. Seja de Yugyeom, de Eunwoo ficando cada vez mais bêbado e retardado, de Mingyu tão animado como sempre por simplesmente estar rodeado de gente e todas as pessoas que começaram a chegar, mas que ele nem reparou. Jungkook aliviou sua metanoia e conferiu várias vezes que não estava pensando em , não estava pensando se ela já sabia que ele estava aqui, ou se ele a tinha avisado, ou se até já a tinha visto, mesmo que tenha dito que tinha acabado de chegar.
E Jungkook estava acreditando fielmente que estava sabendo disfarçar bem. Que nenhum traço anormal de sua expressão estava chamando atenção.
Isso foi antes de receber um peteleco no meio da testa em algum momento relapso de tempo, e logo em seguida gemer de dor e massagear a região com uma careta.
— Ai, porra! Por que fez isso? — Ele balançou a cabeça ao mesmo tempo em que Jaehyun ria pelo nariz.
— Você estava olhando muito pra mim, achei que devia te lembrar das minhas preferências nesse assunto.
— E alguém ainda não acredita que você seja um narcisista do caralho? — Estreitando os olhos, ele observou o amigo rir e se sentar ao lado dele em um irônico sofá de dois lugares, o qual ficava no meio de um deck agora parcialmente lotado, com pessoas ao redor que começavam a abarrotar sua visão.
— Um narcisista que você sentiu falta, pode falar — Jaehyun respondeu quando bebeu um gole grande da Heineken. Não era tão comum que ele ficasse bêbado; na verdade, ele parecia ser incapaz de tal coisa. Tinha uma tolerância acima dos amigos, e por isso era sempre o que restava de pé, mas quando seus ombros estremeciam com risadas e ele soluçava sem mais nem menos, Jungkook sabia que ele estava se aproximando de ter problemas.
E que se foda, não é mesmo? Era uma comemoração! Ele estava de volta!
— Já disse que pode falar! — Ele se aproximou de Jungkook, passando um dos braços pelos seus ombros e murmurando perto de seu ouvido. O maknae só teve tempo de estalar a língua e se desvencilhar do amigo.
— Ai, me larga. Tá bem animadinho. Não tinha bebida o suficiente na sua festinha particular?
— Não tinha nada de ilegal ou exótico, e percebi como isso é um porre às vezes. Acho que vocês finalmente me estragaram.
— Bom, se eu tivesse ficado sabendo que você pretendia parar o carro aqui hoje, teria vindo com mais disposição e… — ele percorreu o lugar com os olhos brevemente. — Uma mesa de sinuca, talvez. Ou um baralho.
Jaehyun deu uma risada engasgada.
— Achei que você diria garotas.
— Já tem garotas o suficiente aqui. Mingyu fez esse favor. Aquelas duas ali — ele apontou com o queixo para duas garotas altas e estonteantes que tinham os quadris recostados na superfície de pedra negra da bancada do bar particular de Yugyeom. — São modelos da Malásia. Mingyu contou que o motor delas morreu na frente da empresa justo na hora em que ele passava. O que você acha?
— Acho que Mingyu é um grande idiota pra acreditar em uma coisa dessas.
— Pois é. Pra você ver que ele tem feito o que sempre fez: se humilhando por uma boceta estrangeira. Tem coisas que não mudam nunca — Jungkook arqueou uma sobrancelha antes de beber mais um gole. Jaehyun tentou controlar uma gargalhada, mas falhou miseravelmente. Ele parecia estar dentro de um estado muito particular de felicidade. Um que Jungkook, mesmo sem estar totalmente sóbrio, conseguia perceber. — Que foi, galã? Tá rindo porque somos amigos de um neandertal ou porque ficou interessado?
— Interessado em quê?
— Nas garotas, oras! Elas poderiam armar pra se perder na mesma estrada abandonada que você. E se os seus valores principescos nunca te permitiram experimentar com duas, posso te garantir que você tá perdendo muito. Vai virar a chave do seu mundo.
Jungkook encarou o amigo pelo canto do olho, procurando ver alguma coisa, talvez uma faísca de interesse ou de mera imaginação no rosto de Jaehyun, mas não havia nada. Havia apenas os olhos parados do amigo, fitando as duas garotas como quem olha para duas árvores no meio do mato.
Depois, ele balançou a cabeça, dando um tapinha na perna de Jungkook.
— Não, valeu, eu tô bem. Elas são todas suas.
Jungkook sorriu sem mostrar os dentes, e notou como aqueles malditos pensamentos retornavam no menor dos detalhes. Lembrou-se imediatamente da última conversa que teve com ele ao telefone, em como tudo estava caótico com a história das fotos e em como Jaehyun não parecia suportar ouvir o nome . Se tinha desistido dela, era esperado que fosse fácil abrir uma exceção às garotas naquele dia, já que estava fazendo a mesma coisa com a bebida.
Ele sentiu um pequeno empurrãozinho de Jaehyun contra seu ombro, e mais um resmungo motivacional para que o maknae fosse atrás das garotas. Jungkook riu sem humor, balançando a cabeça em negação.
— Não, também estou bem — murmurou, quase inaudível, sentindo um nó brotar do estômago ao ponderar que Jaehyun não queria se deliciar com duas malasianas perfeitas pelo mesmo motivo que ele.
Jaehyun se permitiu o prazer escasso de dizer um palavrão afiado, rindo pelo nariz sem olhar para Jungkook.
— Uau. Então tá bom. Você ficou mais seletivo no tempo em que eu estive fora?
— Você não é parâmetro pra julgar seletividade, você é quase um sósia do Papa Francisco. É o pior tipo de mocinho que eu conheço: o que não é virgem, mas age como se fosse.
— Como eu ajo?
— Fazendo cu doce pra transar. Se bem que do jeito que chegou todo feliz, deve ter trepado com alguém no banheiro do seu evento de gente rica. Ou foi em cima do capô do seu carro?
Jaehyun fez um som de “pff” com a boca, rindo novamente.
— Eu nem estou de carro. E a festa tava um porre, mas ficou divertida. Muito divertida — ele sorriu antes de levar o vidro da garrafa para os lábios de novo. Jungkook se coçou para perguntar o que ele queria dizer com isso, mas tinham lhe ensinado o básico sobre querer extrair informações de um bêbado. Ou elas eram picotadas demais ou exageradamente verdadeiras.
— Eu diria pra aproveitar e se divertir o tanto que uma turnê não deve ter permitido, mas pelo visto, você esteve ocupado nela — Jungkook mudou a posição, recostando-se ainda mais para trás e trazendo as pernas para cima. Jaehyun não o encarou. Com os braços abertos sobre o encosto do sofá, o rapaz olhou para um ponto neutro dentre todas aquelas pessoas, parecendo refletir sobre algo que drenou um pouco do seu sorriso.
— É, foi legal. Em várias coisas. Outras nem tanto — ele fez uma careta ao dizer, tão baixo que Jungkook quase precisou pedir para que repetisse, mas não era necessário. Jaehyun era muito bom com expressões faciais. E aquela estava mostrando um segredo, uma correia solta que ele tinha deixado escapar.
Jungkook se empertigou novamente. O quão bêbado precisava ficar para parar de pensar naquela história? Para impedir sua curiosidade que estava escapando de suas entranhas? Para que não se visse abrindo a boca e perguntando sobre ela? Sobre eles? Sobre o que porra tinha realmente acontecido na Califórnia e o que ele faria agora? Ou o que não faria?
Mas antes que se deixasse levar por esse impulso, a cabeça do amigo se virou rapidamente em sua direção e um novo sorriso grande veio acompanhado da pergunta:
Beer pong, melhor de três?
Jungkook retribuiu o sorriso, esperando que uma atividade chula como aquelas talvez fosse capaz de consertar seus pensamentos.
— Você vai comer poeira!



sabia que tinha espaço o suficiente naquele vagão.
Faltando pouco menos de 45 minutos para as onze da noite, o metrô na capital se transformava em um cenário de paz e monotonia muito diferente do horário de pico da manhã e tarde. A grande caixa metálica abrigava naquela hora apenas os remanescentes de um dia cheio de trabalho, com as cabeças pendendo no vidro da janela adiantando um cochilo de exaustão, pessoas que conseguiam segurar um livro estático nas mãos enquanto acompanhavam cada linha sem nem desviar os olhos mesmo com o movimento nauseante da locomotiva, um homem que desenhava algo em um caderninho e um casal jovem que parecia muito apaixonado. Bem apaixonados. Do jeito que se encolhiam nos fundos e escondiam as mãos nos casacos, pareciam bem apaixonados mesmo.
Todas essas figuras distribuídas aleatoriamente em um corredor de quase 15 metros. Ninguém estava perto de ninguém – tirando o casal –, ninguém parecia disposto a girar os olhos para ninguém, e isso era o normal para , que já se considerava familiarizada com a linha 3 laranja.
Mas, bem, quem diria que Ji Changmin também era?
Rodeados de assentos vazios, o rapaz estava sentado bem ao seu lado, com os joelhos tocando nos seus, agora um pouco mais expostos pela fenda da saia Anna Scott. Estava tagarelando desde que saíram do evento. Desde que , depois de esperar mais de 20 minutos para finalmente se mexer depois que Jeong Jaehyun havia deixado o lado de fora, tinha marchado para dentro do saguão e dito para Changmin que precisava ir embora, e que preferia que ele não a falasse para ficar. Ele ainda tentou dizer mesmo assim, mas aceitou o pedido dela. E se ofereceu para ir junto.
De metrô. No meio da noite. Trajado de sua bolsa preta de equipamentos e seu sorriso solícito e confiante. Foi andando com ela até a estação – andando –, comprou bilhetes e entrou na linha 3. Deu boa noite a uma senhora que lia uma revista. Pediu que escolhesse o melhor lugar. Sentou-se ao lado dela como se estivessem imprensados em um vagão no horário de pico. E estava falando desde então, rolando a tela do Instagram para mostrá-la perfis de fotógrafos que admirava e que adoraria conhecer.
Meu Deus, esse cara era muito gentil ou muito emocionado? Era um mistério.
tirou o telefone da parte da frente da bolsa e descobriu que só tinha um fiapo de bateria. Assim como percebeu que ia ficando cada vez mais tarde.
— Você não precisava ter vindo comigo — ela disse; ou melhor: repetiu o que tinha dito na mesma hora em que ele começou a segui-la para fora do hotel. E Changmin, com seu sorriso inabalável, fez o favor de reiterar a mesma coisa:
— Você é minha convidada. Não ia te deixar voltar sozinha tão tarde.
segurou uma risada. O suficiente para provocá-lo a continuar sorrindo.
— Como vai voltar pra casa depois?
— Vou pegar um táxi até Dobong-gu e ir andando para Nowon-gu. Onde eu estou hospedado, aliás. Não chamo um apartamento cheio de poeira e sem nenhuma decoração de casa. Abro as janelas de 8 em 8 meses, é um pouco mórbido.
— Qual a ligação da sua hospedagem com Nowon-gu? Dava pra imaginar que você combina bem mais com Gangnam.
Changmin riu, e pela primeira vez notou um certo escárnio no ato.
— Aquele apartamento foi a única coisa que meus pais me deixaram. E não, isso não é tão legal assim — ele suspirou, e um de seus cotovelos foram apoiados no encosto do assento. — No início, eles foram contra a minha decisão de tirar fotos pra ganhar dinheiro. Imagino que seja o maior clichê do mundo: garoto de 19 anos acusa os pais de serem vilões de seus sonhos e foge para as colinas para conquistá-lo. No meu caso, fugi pra New York com menos de 2 mil dólares e não voltei nos próximos 4 anos. Estava dentro do carro na frente da Estátua da Liberdade quando recebi a ligação da minha mãe aos prantos sobre a morte dele.
curvou os ombros mais um pouco para o lado para olhar o rapaz. Ele não tinha tirado o brilho divertido dos olhos, mas agora parecia estar se forçando internamente a sorrir.
— Não é nada. Ele estava doente antes de eu ir embora — continuou ele, dando de ombros. — Talvez por isso quis tanto que eu fizesse a faculdade de Direito. Queria me ver assumindo os negócios da família, botando pra quebrar no mundo corporativo e talvez sendo o próximo juiz Ji da 1º Vara do Trabalho. Mas isso era coisa do meu irmão mais novo, não eu. Nunca me vi nesse papel, e não podia desperdiçar minha vida por um capricho dele — Changmin virou a cabeça para , e umedeceu os lábios antes de dizer amargamente: — E por isso, o que me restou de uma herança gorda que me deixaria confortável por muitos anos foi um apartamento de 70m² em Nowon-gu. Pelo menos ele não tem infiltração, o que é ótimo, porque sou apavorado com todas as coisas que passam dentro de canos. Um amigo já me sugeriu que vendesse, já que aquela garagem não cabe nem um Suburban, mas gosto de não gastar dinheiro com hotel quando venho pra cá. Gosto de usufruir do patrimônio de um Ji, além dos jantares anuais que frequento em uma propriedade muito maior em Gwangju.
não estava certa sobre a distância que já havia percorrido naquele vagão desde que entraram há mais de 15 minutos atrás, mas nem se tocaria se estivessem chegando nos limites da cidade. Seus olhos pousaram em Changmin com um interesse absoluto, com um sentimento que ela não se atrevia a dizer que tinha sentido antes porque beirava a uma identificação – e não podia dizer que tinha sentido isso com muitas pessoas na vida.
Com um sorrisinho solidário, ela perguntou:
— E a sua mãe?
— Ah, sabe como são mães. Elas nos amam, mas nem sempre sabem demonstrar isso do jeito certo, apesar de tudo que dizem. A minha veio de um casamento calado, sem poder dar opiniões ou expressar seus julgamentos, e quando finalmente pode fazer isso e usar a própria voz, viu que não conseguia mais. Tinha perdido pra sempre — ele deu um suspiro derrotado, e logo recuperou o sorrisinho antes que este também se perdesse. — Mas, bem… Algumas vezes, uma quantia razoável aparecia na minha conta sem mais nem menos, e o apartamento sempre era limpo e o estoque da geladeira completo toda vez que eu avisava que estava vindo em direção à cidade. Mesmo que ela soubesse que eu não ficaria por muito tempo.
sorriu novamente pra ele, um sorriso não tão aberto e não tão melancólico, mas que era verdadeiro em toda a sua essência. Normalmente, acharia estranho que um cara que mal a conhecesse estivesse se abrindo daquela maneira com ela sobre coisas de família, sonhos e outros aspectos profundos, mas percebeu que só acharia isso estranho porque ela não faria o mesmo. Porque sentia coisas que não queria sentir ao falar e constatar que não tinha uma família de verdade. Que era vítima desse pensamento voraz por tantos anos que ainda não sabia como se livrar completamente dele, ainda que tenha se libertado de grande parte quando decidiu ir embora.
Changmin também tinha ido embora. E parecia muito alegre e livre sobre o fato, liberto do passado. E isso pareceu um sinal para que ela o considerasse um grande amigo em potencial antes que chegassem à próxima estação.
Ele ainda a estava encarando profundamente, como se estivesse esperando que ela retribuísse a sessão de fatos íntimos e compartilhasse um seu também, mas era muito boa em se esquivar de assuntos íntimos.
— Mas e então? — disse ela, ajeitando a postura. — Uma garagem tão pequena assim? Onde guarda o seu carro, então?
Changmin soltou uma risada alta. Distraidamente, seus braços foram parar no encosto atrás dos ombros de .
— Eu não tenho carro, gata. Odeio essas coisas. Automóveis cheios de frescura que deveriam servir apenas para ir e vir e viraram artigo de ostentação. Mas motos são outra história — o sorriso dele cintilou por baixo das luzes azuladas. — Pelas motos, eu agradeço a invenção da roda.
riu quando ele se inclinou um pouco para mais perto, novamente sem notar. Ela limpou a garganta e se afastou por um milímetro, não tanto para que ele notasse que tinha feito um movimento impróprio. Ji Changmin era legal e estaria mentindo se dissesse que não era atraente, mas talvez ele devesse apenas ficar onde estava.
— Hm… E cadê a sua moto? — ela levantou uma sobrancelha. Ele suspirou lentamente.
— Oficina. Algum repórter idiota fez o favor de derrubá-la naquele dia da festa, ou vários deles de uma vez só. Me fizeram pegar um taxista novato que não sabia nem chegar em Insadong. — riu da história. Ele arqueou uma sobrancelha. — Aposto que pensou que eu fosse um riquinho de merda que dirigisse um Tesla e não soubesse pegar um ônibus. Pois saiba, , que devo ter pegado esse metrô mais vezes do que você.
— Considerando que você era um chaebol…
— Eu não era um chaebol nos Estados Unidos, era só mais um cara. Sozinho, com menos de 2 mil dólares, lembra? Trabalhei em uma concessionária por um tempo. Tirei uma foto pra eles usarem de divulgação e voilá, meu primeiro emprego na área — ele fez um movimento de abertura com as mãos. — Às vezes, você só precisa dar uma de enxerido no trabalho dos outros e pronto. Sua vida vai mudando.
Ela balançou a cabeça, e reparou em como ele sempre voltava com as mãos para a bolsa preta onde ficava sua câmera especial, e se perguntou se ela tivesse algum valor sentimental.
— E como você foi parar lá, afinal? Na festa de Candice.
— Fui contratado, gata. Ainda pensa que eu sou um penetra? — ele estreitou os olhos, brincalhão. bufou levemente.
— Quando parar de me chamar de gata, posso reconsiderar isso.
Ele riu mais uma vez e passou uma língua pelo lábio inferior.
— A Vogue me contratou. Como um presente para Candice Chaperman e seu novo cargo.
— Um presente? — franziu o cenho. Changmin assentiu.
— É. Já trabalhei em alguns editoriais da Won In Jae, a antiga chefe, e devo dizer que as capas eram verdadeiros rios de dinheiro. Quando ela se recusou a publicar as fotos do Holland na capa depois que ele se assumiu gay para o país inteiro, ameacei expor o conteúdo das suas reuniões indiscretas com os novos modelos da coleção. Dica: envolvia ordens expressas sobre o que eles deveriam fazer com os peitos dela ou nunca veriam nem a boca de uma lente — ele contou naturalmente, enquanto abriu a boca em choque. — É, eu sei, parece absurdo, mas o mundo da moda é um submundo um pouco mais colorido que o normal. Tanto luxo consegue esconder muita sujeira. Sabia que estar nesse meio poderia me contaminar, mas pelo menos tenho critérios sobre as megeras que eu escolho trabalhar. E um deles é não ser um ser humano de merda e não me apalpar quando ninguém estiver olhando. Não sem permissão, claro. — Ele lhe deu uma piscadinha divertida e logo suspirou: — De qualquer forma, as coisas começaram a funcionar de novo quando ela se mandou. Disseram que os setores esfriaram um pouco, mas creio que com a ajuda de Candice Chaperman, eles vão voltar a se agitar.
soltou uma risada de satisfação, percebendo como era bom que mais alguém além dela mesma enxergava o talento e o carisma de Candice como um atributo para a salvação do mundo. Ou a salvação de algo grandioso o bastante.
Grandioso também parecia ser o nome e o papel de Changmin em toda a área de fotógrafos renomados. Ele era tão bom assim para ser dado de presente? Como nunca tinha ouvido falar dele? Ele andava por aí sob um pseudônimo? Faria sentido. Ela teria feito a mesma coisa caso tivesse coragem o suficiente para sair pelo mundo vivendo de seus registros.
— Você é muito corajoso — ela se viu afirmando, verdadeiramente. As palavras em sua garganta estavam agitadas demais para ficarem paradas. — Mesmo. É inspirador.
Changmin lhe deu um sorriso gracioso, e pareceu ter chegado ainda mais perto.
— Você não é a primeira pessoa a me falar isso, mas devo dizer que saiu muito mais bonito na sua voz?
revirou os olhos e o rapaz riu. Podia imaginar dezenas de outras coisas para fazer que não fossem estar trancada em um vagão de metrô com um cara que conhecia há 48 horas, que tinha um sorriso tão iluminado quanto faróis de carro e que não tinha medo de viver um sonho. Um cara que parecia loucamente e inquestionavelmente interessado nela, mas que ainda assim, preferia se fingir de cega para o fato. Mesmo que o olhar dele não se desviasse nem por um segundo, e que parecia estar querendo analisar cada pintinha do rosto de .
Ela desviou o rosto na mesma hora ao ouvir a porta de um dos vagões batendo e passos rangendo sobre o piso da locomotiva ao mesmo tempo em que ela diminuía gradativamente a velocidade. Estavam finalmente chegando. Antes que ela se virasse para começar a se despedir do rapaz, ele tomou uma de suas mãos em um piscar de olhos, visualizando o mesmo fim.
— O que você vai fazer na sexta-feira? — Changmin perguntou apressado, à medida que o banco não se balançava mais pelo movimento, à medida que iam parando em um lugar que não lhe parecia muito familiar. Pela primeira vez na noite, viu o tamanho daquele sorriso diminuir e se tornar quase forçado, hesitante, como se estivesse nervoso demais para pensar em sorrir. — Quero dizer, sei que existe a semana inteira, mas Seul e a Vogue tomam o meu tempo durante os dias e horários úteis, e me transformo em um homúnculo ao invés de um homem quando tudo acaba, mas gostaria muito de te ver de novo, . Na sexta à noite, como manda o roteiro de Metropolitan*.
olhou para a mão dentro da dele novamente. Desta vez, especificamente desta vez, o gesto parecia intencional. Lotado de todas as intenções possível. reconheceu que ele a fisgaria em qualquer outro momento de sua vida – que ela se veria dizendo sim, mesmo que fosse se martirizar depois por ser meio virgem e nunca ter ido a um encontro de verdade.
Em outro momento, ela diria sim à Changmin com um sorriso brilhante. Mas naquele em especial, quando ele estava atrasado, ela só tinha a dizer:
— Sinto muito. Tenho um compromisso.



Depois de três partidas seguidas de beer pong e uma derrota, Jungkook se sentia bêbado o bastante para dar um tempo da cerveja.
Ele se afastou da mesa de jogos, agora rodeada de uma plateia que estava pronta para torcer e gritar pela próxima dupla: Eunwoo contra uma das malasianas. O amigo já estava trocando os pés e as próprias palavras antes de pegar em uma bolinha, mas aí estava a graça do jogo. A garota já sabia que não precisaria fazer nenhum esforço, e ainda se divertiria bastante no processo.
Só então, quando se afastou o suficiente das pessoas até os fundos da cobertura, bem de frente ao parapeito do murado, que Jungkook puxou uma caixa de Camel do bolso de trás da calça. Estava amassada, com apenas 2 unidades. Não era exatamente dele, para início de conversa – Taehyung gostava de cigarro caro e americano, mas desde que tinha migrado para o Lucky Strike, por uma questão de preferência histórica, disse ele, se livrava de seus antigos com uma facilidade estrondosa. Jungkook tinha cada vez mais certeza que Taehyung não era fumante de verdade – não que ser um fosse um motivo de orgulho –, porque para conter a ansiedade que dava as caras sem pedir licença, qualquer coisa com nicotina já ajudava bastante, independentemente do nome escrito na caixa.
Quando tragou e soltou a primeira leva de fumaça para o alto, ele se viu tentado a fazer algo que sempre fazia na antiga casa de sua mãe, algo que a fazia berrar e colocá-lo de castigo quase todas as vezes, mas que era mais forte do que ele: Jungkook prendeu o cigarro entre os dentes da frente, apoiou as duas mãos no parapeito de pedra e elevou o corpo para cima, sentando-se no espaço perigoso e gelado, jogando as pernas para o outro lado. Ele soltou uma risada grogue com o movimento rápido que chacoalhou sua cabeça. Foi quando percebeu que estava usando jaqueta escura e tênis de corrida. Em uma festa. Quem usa tênis de corrida em uma festa?!
E riu de novo, totalmente alheio à queda de 10 metros de altura abrindo os braços para ele.
— Ei, cara! — A voz repreensiva veio de ninguém mais, ninguém menos daquele que já a tinha em prontidão para coisas daquele tipo: Jeong Jaehyun e seus pés rápidos e, hoje em especial, um pouco trôpegos para chegar perto do amigo.
Jungkook girou a cabeça para trás a tempo de vê-lo se aproximando. Havia algo estranho e intenso nos traços tão delicados do rosto de Jaehyun, com suas sobrancelhas erguidas para cima e a boca aberta em um tipo muito sutil de pavor.
Jungkook não entendeu aquela expressão. Era como se ele precisasse fazer uma pergunta, como se Jungkook estivesse de repente pelado e ele não conseguisse achar as palavras certas para dizer o quanto aquilo era inaceitável.
Foi quando o garoto tragou o cigarro inconscientemente e pareceu entender tudo.
— Ah, fala sério — Jungkook estalou a língua e revirou os olhos. — Você que veio até mim dessa vez, o que quer dizer que tenho o direito de não apagar. — Ele ergueu um dedo para mostrar o tabaco queimando. Jaehyun piscou os olhos freneticamente e franziu ainda mais o cenho.
— Esse não é o problema, seu idiota. O que tá fazendo aí em cima?
— Em cima onde? — Perguntou, pateticamente aéreo. Quando virou o rosto devagar e topou com a imensidão escura da noite se ampliando sob seus pés, não sentiu medo, ou qualquer outra coisa que parecesse minimamente normal de se sentir em uma posição tão perigosa. Ele apenas riu. E alto. — Ah, tá falando disso. Não esquenta, só não quero a fumaça atrapalhando seu espaço, senhor.
Jaehyun, sabe-se lá por qual motivo, achou muito engraçado a forma arrastada com que o amigo disse a palavra “senhor” e sufocou um riso, tentando voltar a ficar sério depois.
— É sério, desce daí…
— Eu estou ocupado, Jeong, e muito confortável também. Por que não sobe você?
— Porque eu tenho alguma noção! Qual é, JK…
— Então as pessoas que fazem isso — Jungkook inclinou o ombro para baixo, perigosamente para baixo — não tem noção?
Jaehyun trincou os dentes diante do amigo rindo. Jungkook achou que ele seria capaz de usar a força bruta e puxar aquele casaco para o chão, ou que ele chamaria os outros amigos para intervir na maluquice, ou que fizesse algo bem mais trágico como acabar com a festa por causa daquilo, mas não. Jaehyun não fez nada daquilo, ou qualquer uma das coisas que Jungkook achou que ele poderia fazer.
Ele apenas murmurou:
— Babaca de merda.
E em um segundo, estava elevando as pernas longas para posicionar o corpo no parapeito bem ao lado de Jungkook, colocando-se ainda mais rápido e mais ágil do que o rapaz na mesma posição, de frente para o abismo da selva de pedra.
Jungkook deu um sorriso fraco para si mesmo, pensando em zombar da constante mania de Jaehyun de cair sempre na mesma pilha quando se tratava de Jungkook e sua manipulação para que ele saísse um pouco da zona de conforto.
Em vez disso, o garoto colocou as mãos nos mesmos bolsos de antes, puxou a caixa de Camel, lambeu os lábios e soltou:
— Aceita? — Estendeu um dos cigarros para o meio dos dois. Jaehyun virou a cabeça e encarou a guimba, encarou por tempo demais. — Posso te ensinar, se quiser.
O brilho de malícia naquele sorriso de Jeon trouxe Jaehyun de volta para a realidade, balançando a cabeça em negação.
— Não. Estou bem.
— Aham. Claro — Jungkook voltou a guardar a caixa. No fundo, ficou aliviado pela recusa dele. Não queria que Jaehyun fosse obrigado a ler os próprios livros de autoajuda mais tarde.
Os dois ficaram naquela posição por um tempo indeterminado, sendo envolvidos por um silêncio que seria um silêncio de verdade se não fosse a música acontecendo bem em suas costas. Jungkook não fazia ideia de onde estava seu celular, ou as chaves do carro, ou como tinha se deixado ficar em uma festa que jurou que não passaria mais de 1 hora, mas ficar em casa teria sido melhor? Sozinho, com seus próprios pensamentos? Carente, sem ela? Torturando-se com Daniel Caesar e John Mayer?
Como se tivesse lido seus pensamentos, a voz de Jaehyun soou abafada e impossivelmente legível sobre o som:
— Vi a .
Jungkook torceu para ter ouvido mal, então perguntou:
— Quem?
— Eu vi a . Hoje.
A tensão que tomou todos os músculos de Jungkook parecia concreto líquido. A menção do nome dela saindo da boca dele já ativava sentimentos suficientes, sentimentos que ele estava fugindo, e sua imaginação pipocou de tantas imagens que ele não conseguiu se conter em virar a cabeça para o amigo, o maxilar tão duro que travava a própria língua.
— Onde? — Conseguiu perguntar, e parecia que tinha cascalho na boca. Um manto frio tomava todo o seu estômago, que encolhia e encolhia e encolhia. — Como?
— Ela estava no evento da Esquire. Com outro cara.
Jaehyun não pareceu muito cabisbaixo, mas Jungkook mal reparou nesse fato. Foi como se o amigo tivesse tirado uma arma pequena e apontado para ele, direto em seu coração, que contraiu e contraiu até doer.
— Um cara? Que cara?
— O fotógrafo da campanha. Não sei quem ele é, mas eles pareciam ser amigos. Pareciam se conhecer a um tempo, eu acho. Eu não reparei muito… — Jaehyun franziu os lábios enquanto encarava algum ponto distante no amontoado de árvores. Jungkook sentiu os dedos se fecharem devagar nas bordas do peitoril, agarrando o concreto sem notar, tentando imaginar quem era o cara que ele não teria como saber. Candice havia arrumado mais um encontro? Era o mesmo de antes? E um fotógrafo?! Um que a levou diretamente para Jaehyun…
Ele cuspiu mais um montante de fumaça. Tossiu, até. Deus, era como se tivessem chicoteando seu peito. O aborrecimento que crescia dentro de si era real, impossivelmente real, ridiculamente real.
— Ela estava na sua sessão? — Jungkook perguntou de repente, sabendo que tinha interrompido o que quer que Jaehyun estivesse se queixando, mas não deu a mínima pra isso. O amigo apenas balançou a cabeça que sim. — Ela sabia que você estaria lá?
Jaehyun negou com a cabeça.
— Não tinha como ela saber.
— Ainda não estava falando com ela?
— Não.
Jungkook cerrou os dentes disfarçadamente de novo. Desta vez, fez um favor a si mesmo e escondeu os dedos rígidos dentro do bolso da jaqueta.
— Eu fiz merda, Jungkook — Jaehyun suspirou alto, livrando-se de um peso invisível. — Sei que eu fiz. E sei que foi por um bom motivo, mas ainda assim, os bons motivos não deveriam acabar tão mal. Quero dizer, as coisas entre mim e ainda não acabaram, mas com certeza preciso consertar algum-
— Não acabaram? — Jungkook virou a cabeça imediatamente. — Como não acabaram? E aquelas fotos, e seu comportamento, e o fato de que você não queria nem tocar no nome dela da última vez que nos falamos?
— Eu sei, mas…
— Mas o quê? Se queria garantir que ela te entendesse, poderia ter contado pra ela tudo que contou pra mim. Aliás, o que você achou que contou. Mas acredito que sumir de repente e dar um gelo na menina sem mais nem menos não te tornam um pretendente muito confiável. Poderia pelo menos ter dito a ela que aquelas fotos não eram o que parecia antes da mídia transformá-las em um livro de romance, mas o que você fez? Nada — Jungkook arqueou as sobrancelhas ao mesmo tempo que abriu um dos braços, exasperado. O Camel queimando entre os dedos quase escapou para a queda de 10 metros.
Jaehyun abriu e fechou a boca diante do amigo como se ele não fosse a mesma pessoa com quem tinha falado no celular há 2 semanas.
— Cara, você tá exagerando... — ele começou e se calou. Jaehyun voltou a olhar para a cidade, pensando que seria injusto retrucar com um “vamos lá, me diga como é tão fácil fazer fotos suas com outra garota desaparecerem em um piscar de olhos, como é fácil enfrentar uma coisa dessas na nossa posição”, então desistiu da ideia. De certa maneira, procurou desabafar com Jungkook porque tinha pensado que ele se manteria calado sobre qualquer assunto envolvendo , então aquela reação inesperada estava sendo um pouco difícil de processar. — Eu sei que eu menti. Na verdade, omiti coisas pra caramba de nesse tempo, pensei nas melhores opções, ajudei na situação…
— Ajudou? — Jungkook soltou uma gargalhada curta e seca. Amarga. — O que você ajudou? Entregando a garota que você gosta de bandeja pra outro cara?
As palavras nem pareciam ter saído dele. E aqueles olhos que não se desviaram de Jaehyun também não pareciam ele. Pareciam o Jungkook que o whiskey transformava, aquele que vasculhava o estoque de verdades que o garoto entalava na garganta em algum momento e abria o cadeado que as prendia, e que Deus ajudasse quem estivesse na frente.
Por outro lado, Jungkook estava pouco se fodendo com aquela expressão confusa de Jaehyun ao olhar para ele. Que se foda! Não era nenhuma mentira! E que se foda que ele estivesse sendo o maior hipócrita escroto do planeta. Se Jaehyun não o estava reconhecendo naquele momento, o sentimento era mútuo. Porque estava sendo difícil passar da ideia de que Jeong Jaehyun, um sujeito íntegro e tão corretinho de uma maneira a respeito da qual era divertido brincar com Mingyu e Eunwoo, era um mentiroso e egoísta igual a todos os outros.
— Qual é o seu problema? — Jaehyun demorou um pouco para falar, e também para soltar uma risada desacreditada. — Sério, por que tá dizendo essas coisas? Até parece que você se importa com o que vai acontecer entre eu e . Mesmo com essa coisa bizarra de serem amigos.
— Bom, foi pra mim que você fez o favor de encher o saco com isso, não foi? — Jungkook piscou para os próprios pés, tentando parecer um pouco mais tranquilo, mas o traço de irritação na voz era palpável. — Me vejo na merda do direito de poder ter a porra de uma opinião.
— Não foi exatamente assim… — Jaehyun balançou a cabeça, e riu novamente pelo nariz. Não havia motivos para rir de nenhuma parte dessa merda, segundo Jungkook. Mas se bem estava se lembrando, Jaehyun havia enchido sua paciência uma vez com aquilo. Naquele dia em Tóquio, quando fez a chamada de vídeo para dizer que gostava de . Uma conversa na qual Jungkook respondeu que tudo bem, que o problema era todo dele por estar afim da paparazzi, mas por dentro, a sementinha do caos já começava a brotar em uma linda flor chamada culpa, porque é claro que Jaehyun tinha que se apaixonar justamente pela paparazzi que ele estava transando.
Ou justamente Jungkook, num momento explicitamente ruim de sua vida, tinha que transar logo com a paparazzi que seu amigo gostava?
Por que aquele estúpido não tinha feito o favor de se apaixonar por ela antes? Ou de tê-lo avisado antes? Ninguém estaria nessa situação agora.
Ou estariam?
— E vocês conversaram? — Jungkook perguntou com nítida má vontade, aquele aperto no estômago não passando de jeito nenhum. Piorou ainda mais quando viu o sorrisinho nos lábios de Jaehyun.
— Sim. Um pouco. Não havia muita coisa pra dizer naquela hora, mas… Foi muito bom vê-la. Muito bom mesmo.
Jungkook prensou os lábios. Os dedos se fecharam ainda mais ao lado do corpo.
— Eu sei o que parece, tá legal? Sei que eu fiz merda, sei de tudo isso mais do que você — continuou ele, e de novo, não parecia tão incomodado com isso como Jungkook achou que estaria. — Mas agora acabou. Eu olhei pra ela hoje, tão linda, tão… diferente. Não sei explicar. Não parecia a mesma de dois meses atrás, e isso me deixou apreensivo, mas determinado. Tudo que se passou nessa turnê vai ser enterrado, pelo menos quando penso nela. Agora quero voltar ao normal, a minha vida normal, e aos planos que eu tinha antes de ir.
Jungkook umedeceu os lábios secos, respirou fundo a brisa fresca para acalmar o coração agitado e perdido. Alguma coisa ali dentro estava lentamente se desintegrando ao encarar o rosto de Jaehyun e avaliar a veracidade de tudo que ele dizia. A atração, paixão, amor ou seja lá o que fosse que ele sentisse por , estava sendo dito sem palavras, demonstrado sem nenhum medo ou receio.
E se ele levantasse dali agora e fosse atrás dela com aqueles mesmos olhos, ele temia que ela não fosse pensar duas vezes antes de voltar a sentir o que sentia há dois meses. Isso se já não tinha voltado depois de se verem naquela porra de festa! E então, adeus à todo “você mexe comigo” que se repetia como um disco arranhado em seus ouvidos, fazendo-o sentir coisas terríveis e maravilhosas ao mesmo tempo.
Porque em algum momento, em algum mísero momento, Jungkook tinha chegado a ponderar que pudesse estar apaixonada por ele.
Ponderar não. Ele acreditou. Torceu por isso, até, se fosse ser completamente sincero. Desejou com todas as forças por isso, porque o que sentiu quando pensou nisso, foi o sentimento de mais pura satisfação e devoção. Como se ele estivesse enxergando um sinal dos céus de que sim, nem tudo estava perdido; sim, ele ainda tinha um coração e um coração bom, limpo, curado, e sim, ele não tinha mais medo e poderia correr pra lá, pular no precipício de , beijá-la pelo tempo que fosse preciso até que ela não tivesse a chance de duvidar dele. Nunca mais. Ela nunca mais duvidaria de nada.
Mas em outro milésimo de segundos, tudo explodiu. E a explosão fatal tinha um nome bem conhecido, o fantasma que fazia Jeon Jungkook questionar seus princípios e valores como amigo: Jeong Jaehyun.
O primeiro da fila no coração de .
O motivo de fazê-la perder o orgulho para pedir sua ajuda há dois meses.
O rosto com que ela sonhava desde New York.
O cara certo pra qualquer garota que quisesse ser tratada como uma rainha.
O cara que ele não era, não importava o quanto a fizesse implorar por ele entre quatro paredes.
Ah, Deus! Que tortura! Que merda de pensamento! Ele nem conseguia olhar pra Jaehyun naquele momento.
— Planos, é? Todo mundo fala isso — ele riu pelo nariz, limpando a garganta duas vezes, tentando se manter o mais indiferente possível. — Fim da turnê, vida nova. Esses seus planos de antes podem esperar, você só precisa beber de hoje até sexta pra voltar a ficar bem — ele deu um soco de leve no ombro do amigo. Jaehyun riu, balançando a cabeça.
— Concordo com você, mas vou abrir mão da sexta. Tenho compromisso.
Jungkook riu com incredulidade e revirou os olhos.
— Nem fodendo. Achei que eles iam te dar no mínimo 3 semanas de folga depois de pegarem a Europa de última hora.
— Não é trabalho — Jaehyun respondeu, e um sorrisinho triunfante escapou dos lábios. — Vou sair pra jantar. Com .
E Jungkook, certo de que preferia sua vida a quase todos os seus bens, se sentiu muito tentado a deixar que aquela escuridão o engolisse.


"Tudo está em ordem em um buraco negro
Mas nada parece tão bonito como o passado
﹝...﹞
É apenas uma lembrança e aqueles sonhos
Não eram tão bobos quanto pareciam
Não tão bobos quanto pareciam
Meu amor, quando você os sonhou."

🖤🎤 Fluorescent Adolescent


As primeiras imagens do próximo lançamento do Tomorrow by Together estavam, finalmente, liberadas no mundo.
Assim que o sistema concluiu as postagens, a equipe criativa entrou em polvorosa. Parecia um 4 de julho em outro polo geográfico. O número de likes instantaneamente piscou nas telas, os comentários e hashtags subindo, e a felicidade em resposta a tudo isso acontecendo naquele pequeno escritório da agência Hybe já demonstrava o principal sobre o projeto: um sucesso. Ou um que estava se encaminhando para isso.
Apesar disso, reparou que Yoona não estava imersa nessa animação, o que era espantoso. Ela mesma estava rindo e gritando como os outros, sorrindo ainda mais quando os elogios às suas fotos vieram de todos os lugares e abraçando quem quisesse e permitisse ser abraçado, assim como se deixou tomar uma mistura um pouco duvidosa de makgeolli com suco de uva. Ficou na cara o quanto era uma forasteira no meio dos outros, porque sentiu a cabeça girar intensamente enquanto os demais mantiveram a postura até a hora do almoço.
E o almoço oferecido nada mais era do que: Gopchang-jeongol, um amontoado de tripas de boi.
Ainda bem que Yoona encarou aquela bomba com o mesmo nojo que ela, apressando-se imediatamente para procurarem outro lugar para comer.
— A Woonie não vem — disse ao olhar para o celular. A assistente tinha passado a trazer comida de casa depois de Sooyoung ter feito um discurso sobre ela não participar das confraternizações em conjunto por causa de um mero detalhe como comida. — Acho que ela não confia em restaurantes no geral. Diz que não dá pra saber em qual chapa colocam os ingredientes, mesmo que sejam veganos. Parece que ela sente o cheiro de manteiga de longe.
Ela suspirou e guardou o celular ao chegarem na calçada, segurando um livro contra o peito. O sinal vermelho tinha acabado de tomar o lugar no semáforo, e demorou quase 1 minuto inteiro até que se virasse para o lado silencioso em sua dianteira.
— Yoona? — Perguntou ela, fazendo a amiga virar a cabeça rapidamente. — Ouviu o que eu disse?
— O quê? Sobre a Woonie? É, ela vai comer as próprias cenouras e o agrião, vai ficar bem — respondeu distraída, voltando a mirar o semáforo. franziu o cenho e apenas assentiu.
Quando terminaram de atravessar o tráfego, ela perguntou novamente:
— O que você quer comer?
— Tanto faz.
Tanto faz?
— Yoona?
— Oi?
— “Tanto faz?” — esperava que a amiga visse o quanto aquilo foi estranho. Yoona piscou os olhos e deu de ombros.
— É, podemos comer o que você quiser. Quer bife? Macarrão? Talvez uma salada?
— Podemos comer bife. Aliás, temos que comer carne hoje, é um dia especial — sorriu com entusiasmo, e freou um pouco os passos. — Mas você deveria ser a pessoa a estar dizendo isso. Achei que eu fosse a pessoa do tanto faz.
— Eu falaria bife?
— Você falaria para irmos ao karaokê. E beber cerveja com frango frito — deu de ombros. Não fazia ideia de como tinha guardado aquela informação. Yoona deu uma pequena risada pelo nariz e baixou os olhos. — O que foi? Tá tudo bem?
A outra mordeu levemente o lábio inferior. Antigamente, não teria notado esse detalhe, assim como não teria captado aqueles ombros atipicamente rígidos na garota que era o sinônimo de invencível e inabalável, mas ultimamente andava pensando em Yoona daquela maneira: alguém que agora tinha um espaço reservado no seu cérebro, reunindo informações pouco a pouco. Alguém que se preocupava minimamente se estava se sentindo bem ou não.
Com um suspiro forte, a roteirista recomeçou a andar devagar pela calçada.
— Eu tô legal. Quer dizer, não o legal de sempre, mas um meio legal… A verdade é que eu tô surtando por dentro e não tenho nenhum lugar para descarregar essa coisa — ela gesticulou com as mãos, um pouco agitada. — Estou surtando com as próximas semanas de divulgação porque cada dia que passa ficamos mais perto do lançamento do MV. E sabe quem escreveu aquele MV, ? Eu mesma. Eu e outras pessoas, é claro, mas fui a diretora do roteiro e assinei aquele último papel, ou seja, é o meu nome que vai estar em letra grande nos créditos. E se for ruim…
— Yoona, não está ruim.
— Eu sei, mas essa é a opinião de o quê, 40 pessoas? Nem os garotos viram o clipe ainda.
— Claro, porque eles precisam gravar o react para o canal. E não tem como estar ruim, Yoona. Você os transformou numa cria dos Ramones, as pessoas vão gostar.
— Mesmo? — Yoona virou a cabeça para , pressionando os olhos com real preocupação. — É que não fazem muito isso com idols por aqui, e bem… Não quero ser uma decepção na minha primeira vez liderando algo grande. Trabalhei pra caramba por uma oportunidade dessas. Não quero ser rebaixada como Sooyeon fez com aquela garota que tentou colocar algemas no Namjoon.
— Ela fez o quê?
— Era pra uma cena do MV de Fake Love, e não seriam algemas de verdade, é claro, mas parece que era em uma parte bastante sugestiva da música onde eles dizem algo sobre “me tornar o seu boneco”, então os comentários poderiam ser negativos. Eu particularmente não me importaria de algemar aquele homem nas barras da minha cama, e olha que ela nem tem barras.
soltou uma risada. Em seguida, se aproximou o suficiente de Yoona para passar um braço pelo seu ombro.
— Sabe de uma coisa? Devíamos comer frango frito.
— Eu também acho — a amiga suspirou aliviada e apontou para uma fachada qualquer há alguns metros, onde se dizia em letras garrafais que se não fosse beber uma cerveja junto com o frango, não precisava nem passar pela porta.
Yoona garantiu que era o lugar perfeito. E quando disse isso, uma breve rajada de vento balançou o cabelo de para trás, o que a fez encarar o céu ao mesmo tempo em que o estrondo apocalíptico soou de dentro das nuvens carregadas, matando todo o restante de visão do céu azul que ali existia.
Merda, logo pensou, inconscientemente apressando o passo. Yoona resmungou algo que pareceu com “não acredito nesse clima”, e concordou rapidamente, cheia de raiva e rancor por aquela virada de tempo, apertando o livro com mais força no peito, tentando abafar todos os seus gatilhos.
Depois de sete dias de avisos na previsão do tempo, parecia que a chuva finalmente estava pronta para cair na primeira oportunidade, trazendo com ela uma grande massa gélida que terminaria de empurrar o verão para bem longe de Seul. Do jeito como as nuvens estavam escuras e túrgidas, seria uma chuva intensa e barulhenta.
engoliu em seco. Odiava essa parte do verão: quando ele acabava.
Felizmente, o lugar era quente e barulhento o suficiente para que não se lembrasse da chuva. Grandes risadas e falatório preenchiam o ambiente junto com um enorme painel atrás de um balcão mostrando as opções para o almoço, que iam desde o frango frito comum ao frango frito com mil e um acompanhamentos. E, claro, também tinha…
— Eles tem hotteok — Yoona arfou, batendo uma pequena palminha.
— O que tem?
Yoona pressionou um pouco os lábios.
— Um dia, vi Namjoon, Yoongi e Taehyung comendo um desses no refeitório com os novatos do Enhypen. Estavam tão fofos querendo enturmar os meninos. Ah, Jungkook também estava lá. Ele comeu uma porção inteira — ela parecia animada com aquele fato, e o rosto de ficou tenso por meio segundo. — Vou pedir uma também. Vamos.
Por um instante, pareceu que Yoona tinha dito o que disse à espera de uma reação de . Desde a noite da festa de Candice, quando a amiga tinha presenciado um Jungkook que talvez nunca tenha antes, quando percebeu coisas que nunca queria que ela tivesse percebido, Yoona tinha adquirido aquela estranha mania de tocar no nome do maknae ao lado de e simplesmente esperar… uma resposta. Algo que a fizesse entregar uma confissão, ainda que jamais fosse fazer isso. Se Yoona vibrou como uma corrente elétrica quando soube de Jaehyun, melhor nem querer imaginar o que faria se soubesse de Jungkook.
Apesar de que, no fundo, ela já sabia. Estava na cara. Não houve tempo para que ela perguntasse a diretamente, mas todas as respostas estavam nos olhos dele naquela noite. Culpa dele, toda dele.
Ficando de boca fechada, ela seguiu Yoona por entre as mesas de madeira até uma das poucas vagas no canto do lugar, uma com 4 lugares que eles certamente as mandariam se levantar caso um grupo grande chegasse de supetão.
— Não tem uma de 2 lugares? — perguntou a Yoona enquanto se sentava.
— Eu não sei, talvez…
— Não precisa, aqui está perfeito.
A voz familiar que respondeu não veio de . Quando giraram o pescoço para o lado, viram apenas a sombra de um lenço estampado envolvendo um rosto pálido e um sorrisinho cheio de dentes perfeitos, abaixo de um óculos escuros redondos que não pareciam custar menos de 200 dólares.
teve o espaço apenas de uma respiração para entender o que acontecia.
Candy?
Candice riu pelo nariz em confirmação. Rapidamente, puxou a cadeira ao lado de , sentando-se em frente à Yoona, que ainda parecia um pouco estupefata.
— Surpresa — murmurou ela, tirando os óculos escuros e revelando aqueles incríveis olhos de cor cinza.
Os dois outros pares de olhos na mesa continuavam arregalados e sem entender coisa nenhuma.
— O que tá fazendo aqui? — balançou a cabeça, ainda focada naquele lenço terrível no cabelo loiro que foi comprado sete meses antes em alguma loja na Rodeo Drive. — Achei que fosse comer no escritório.
— Era o meu plano pra hoje. Na verdade, acho que era o plano para o próximo ano inteiro — ela fez uma careta pela constatação, diminuindo um pouco o sorriso. — E é exatamente quando pensei nisso que percebi que não posso viver assim. Não quero ficar me escondendo, evitando os espaços públicos como uma fugitiva, abrir mão das coisas que eu gosto como sair de casa por causa de… de…
— De ser a namorada de Min Yoongi? — Yoona deixou escapar automaticamente, um pouco alto demais do que o permitido, e Candice a olhou como se fosse colocar em prática seu eficiente gancho de direita.
— Yoona — murmurou, e todas as três olharam rapidamente para os lados, conferindo que as conversas aglomeradas estavam onde deveriam.
— Desculpa, desculpa, é que… ainda não consegui me acostumar — explicou a garota coreana, levantando os ombros com um sorrisinho de desculpas. — Sempre pensei que o seu cara fosse o Namjoon.
Namjoon? Por que o Namjoon?
— Sei lá, você tinha dito que ele tinha um corpo esculpido na fornalha dos deuses.
— Quando eu disse isso?! — Candice guinchou, um pouco assustada com as palavras de Yoona; assustada, não brava. — Digo, tá bom, ele é um gato, mas não é o meu gato. E quanto a ele, vai entender que eu não estava suportando mais toda essa gente. E não quero mais ficar escutando fofocas de corredor na empresa de pessoas que pensam que não estou escutando quando dizem que a imagem da Vogue pode ser prejudicada por causa do meu namoro.
— Por que diriam algo assim? — Perguntou .
— Porque agora pensam que todas as matérias que fiz do BTS desde que cheguei teve uma mãozinha amiga por trás, e que as informações um pouco mais pessoais que consegui extrair também foram pela mesma coisa, e sabemos que não foi isso. A única coisa que eu escrevi foi que Yoongi se interessava por aprender marcenaria, e depois ele realmente aprendeu, e transformam isso como se eu tivesse feito ele começar — Candice fechou um pouco os punhos por cima da mesa, balançando um pouco a cabeça e desatando uns fios louros para fora do lenço. — Algumas pessoas pensam que sou uma fraude, mas não estou nem aí, nunca falei com nenhuma delas e muito menos me conhecem. A única parte ruim disso tudo é ter cautela com Yoongi em público. E, claro, sem mais matérias do BTS pra mim. Mas não tem problema, já que tenho algo que nenhum dos repórteres jamais terá: o coraçãozinho de um deles.
Candice sorriu travessa e se viu retribuindo por um momento, sentindo um orgulho intenso pela postura da amiga diante de todo o caos da situação.
Do outro lado da mesa, Yoona ainda continuava com os olhos grandes, mas agora juntou as duas mãos na frente do peito e disse, enérgica:
— E justo o coração daquele que as pessoas duvidam que tenha um — Yoona riu pelo nariz, e Candice franziu o cenho. — Ah, você sabe, você é a primeira namorada pública do Yoongi. Em 10 anos, existiram um milhão de rumores de lá a cá sobre todos eles, mas Min Yoongi… ele sempre soube disfarçar muito bem.
— Horas certas, é o que dizem — Candice sorriu mais uma vez e suspirou. — Pois então. Fiquei quase 20 minutos parada dentro do meu carro esperando vocês passarem. Achei que comeriam em algum lugar na frente da empresa, por que vieram pra… isso? — Ela encarou ao redor com uma careta leve. Pudera, o cheiro de gordura estava impregnado em cada centímetro da parede de concreto grosso. O tampo da mesa era poupado por uma toalha de papel, caso contrário, tinha certeza que todo o álcool e gel do mundo não dariam conta.
Mas era muito engraçado ver Candice disfarçada daquele jeito, olhando como estava olhando para o lugar onde estava prestes a almoçar.
Com uma risada, acariciou um de seus ombros.
— Eu imaginei que estava sendo seguida por uma loira meio psicopata e quis ajudar no disfarce dela. E então, o que vai ser? Frango frito com queijo ou com barbecue?
Yoona deu um gritinho alegre enquanto Candice fez uma careta de asco, forçando um sorriso logo em seguida.
— Vocês que escolhem.

Com o cotovelo a noventa graus, Yoona depositou o último osso da porção de coxas de frango com muito barbecue e extra de queijo dentro da bandeja.
Depois de quase uma hora, Candice não parecia mais estar pensando no quanto toda aquela comida gordurosa iria doer na consciência depois. Esqueceu dessas coisas quando, durante toda a refeição, escutou as novidades de e Yoona sobre o lançamento recente, e dos próximos que viriam no futuro, na próxima semana e na outra. Ouviu Yoona repetir sobre o medo de ter o nome em um espaço tão importante do acontecimento e tudo não passar de expectativas frustradas, e ouviu tranquilizando-a na mesma intensidade. As duas pareciam mais próximas. Ou pelo menos, mais do que estavam naquele dia do karaokê.
Candice não pensava no quanto iria doer se de repente encontrasse outra melhor amiga, porque aquilo era uma besteira. Ela sempre seria a melhor-melhor amiga. A única que recebia o título de família.
— E ouvi os garotos dizendo que o Taehyun vai comemorar em uma boate hoje à noite, com a namorada — Yoona confidenciou com um sorriso malicioso por trás da caneca cheia de chopp. e Candice permaneceram em silêncio. — Uma namorada, galera. Kang Taehyun tem uma namorada.
Candice olhou pra por um segundo antes de responder:
— Somos do ocidente, Yoona. As pessoas lá namoram o tempo todo.
— Aqui também — reiterou, puxando o canudo do suco de laranja que tinha pedido. Um pedido que já estava se arrependendo.
— Mas existe uma diferença cultural nessas relações. Não tá olhando pra mim? Eu deveria estar usando isso se namorar fosse normal? — Candice destacou o tom do óbvio. Yoona piscou os olhos e deu uma risadinha sem graça pelo nariz.
— Então… O que você pretende fazer hoje pra comemorar, ? — perguntou ela para a diretora de fotografia, que tentava golpear o fundo do copo com um canudo para dispersar a espuma do suco – ou o que quer que fosse aquilo condensando no vidro.
levantou a cabeça depois de alguns segundos, distraída.
— Ah… achei que a gente já estava comemorando.
— Claro que não, estamos almoçando. Um almoço de comemoração, mas é um almoço — Yoona puxou outra coxa crocante, gesticulando-a para . — O que você acha de irmos à boate? A mesma do Taehyun? Só pra matar a minha curiosidade, eu preciso saber…
— Hoje não dá. Preciso estudar — respondeu ela, com um sorrisinho de desculpas. Yoona bufou.
— Você anda estudando todos os dias dessa semana. Não me disse que teria provas.
— Não estudo só quando tenho provas. Tenho que montar um portfólio e já estou atrasada por causa do trabalho — se apressou em afirmar, e Candice se virou brevemente pra ela.
— Você anda frequentando aqueles cyber cafés no submundo onde é cheio de adolescentes de 14 anos jogando LOL e comendo lámen a noite toda pra estudar?
— Quê? Claro que não — riu engasgada, mas não pareceu tão convincente.
— Então por que está chegando tão tarde em casa essa semana? Acha que não escuto a porta só porque durmo no final do corredor?
— Acho que não escuta por causa das suas máscaras faciais e dos pepinos no olho — levantou uma sobrancelha. Yoona soltou uma risada por entre um gole. Candice trincou os dentes e de repente estava com as sobrancelhas arqueadas.
— Não me diga que é porque…
— Não — cortou, puxando um pedaço do frango com firmeza. — Estudando, Candice. Você se esquece de quase tudo que eu falo sobre a UNS, mas não quer dizer que eu ainda não frequente.
se lembrou de olhar para a loira enquanto reiterava esse fato, já que de jeito nenhum queria provocar mais um falatório sobre os perigos do consumo de Jeon Jungkook e seja lá o que tivesse guardado dentro das calças.
Consumir Jeon Jungkook estando apaixonada por ele parecia ainda pior. Parecia uma droga letal que o enunciado prometia sua ruína completa, mas que ainda assim você achava que não seria atingida.
Foi apenas com aquele olhar de aviso que conseguiu fazer Candice entender e permanecer calada. E Yoona, do lado oposto, encarou as duas por um tempo até rir engasgada e continuar:
— Mas e amanhã à noite, ? Sexta-feira, faça mil favor. Com um pouco de sorte, a gente consegue reserva naquele clube El Diablo em Itaewon. Dizem que o I.M do Monsta X vive indo lá…
— Amanhã também não dá — balançou a cabeça em negativa, com a voz saindo mais baixa desta vez. Uma voz que certamente não responderia “estudar” para a próxima pergunta indignada de Yoona:
— Por que não?
olhou de uma a outra por um momento, e lentamente engoliu em seco. Os olhos de Candice estavam esperando, como um predador encarando a presa dar um passo em falso, pronto para pegá-la no bote.
Naquela semana, não tinha contado a ela. Sobre nada. Mesmo depois de chegar em casa na segunda feira, logo após ter sido deixada na frente do apartamento por Ji Changmin a pé – que ainda tentou chamá-la para irem a um McDonalds 24h porque ela parecia com fome, mesmo que ele pretendesse jogar as batatas fritas no primeiro cascalho fora da estrada depois, alegando que a Coreia não sabia fazer essas coisas –, com aquela roupa maravilhosa que não fazia parte do armário de e a maquiagem simples e bem chocada que fez quase ter uma síncope, ela ainda não contou. Ambas as coisas: sobre Changmin e sobre Jaehyun.
Mas também não precisou. As notícias estavam por todo canto no dia seguinte, pipocando na mídia com fotos da celebridade do NCT chegando no aeroporto de Incheon com seu look Prada, envolto por seguranças, sendo protegido de fãs caindo de joelhos em busca de autógrafo, e tantas outras coisas que não restavam dúvidas de que ele estava de volta. Não precisava contar a Candice sobre isso. Sobre ele.
Mas agora, isso não pareceu uma boa ideia quando respondeu:
— Tenho um compromisso. Nada demais.
Yoona bufou com desgosto. Candice continuou olhando.
— Um compromisso mais interessante do que ver o I.M? — Yoona puxou sua bebida novamente, mas logo limpou a garganta ao colocá-la de volta. — Vou ao banheiro. Tinha esquecido que cervejas com muito levedo não gostam de lugares apertados como a minha bexiga.
A garota rapidamente se levantou e seguiu para outra direção. Candice continuou olhando para , sem nem piscar.
Depois de 2 minutos naquela mesma posição, como uma psicopata, revirou os olhos e resmungou:
— Tenho um encontro.
Os ombros de Candice se aprumaram imediatamente, os olhos e boca se abrindo tanto que um pouco do nó do lenço se desfez.
— Quê? — ela arfou. suspirou, puxando o canudo de novo como se não fosse nada demais.
— É, tenho um encontro.
— Não!
— É sério.
— Com quem?
suspirou e se preparou para o ricochete de Candice.
— Com o Jaehyun.
O arfar de resposta foi audível o suficiente para todos no restaurante. Poderiam pensar com muita tranquilidade que a loira do canto tinha visto um fantasma ou um homem bomba além daquelas janelas grudentas de fritura.
— Minha nossa! Você tem um encontro com Jeong Jaehyun? — a pergunta saiu mais aguda do ela pretendia, e chutou cegamente seu pé por debaixo da mesa. Ouviu seus tênis fazendo contato com o couro dos sapatos da amiga, que resmungou um gemido de dor.
— Você quer me transformar na próxima manchete? — gesticulou com os braços, sussurrando o quanto pode. Candice fez uma careta e murmurou um pedido de desculpas.
— Você precisa me contar como isso aconteceu, . Ele não está de volta desde o início da semana? Como…
— Encontrei ele na sessão de fotos que fui na segunda-feira. E no coquetel…
— Ele te chamou pra sair em um coquetel?
— Ele tinha acabado de chegar, Candy. Não é como se tivesse tempo para dirigir até lá em casa.
— Ele não avisou que estava aqui?
— Não, mas…
— Qual foi a desculpa que ele deu? — agora Candice estava passando para o próximo nível de sua expressão depois do choque, um sentimento mais sólido e mais previsível como: seu ranço pelo outro cara que fazia parte da vida de . — Vamos, quero ouvir o que o príncipe encantado tem a dizer sobre suas férias no mundo maravilhoso de bocetas no outro continente. Vamos, quero…
— Candy, menos — interrompeu com um revirar de olhos. A arma que existia na língua de Candice Chaperman parecia estar mais engatilhada nos últimos dias. Ela parecia prestes a atropelar qualquer um que a olhasse torto com as rodas traseiras do carro. — Eu não esperava vê-lo lá, eu… Sei lá, acho que não esperava mais nada dele. E então ele disse que o convite ainda estava de pé, e eu… achei que devia tentar.
desabou as costas na cadeira de madeira, um pouco aliviada por finalmente ter deixado sair aquele motivo que esteve tateando nos últimos dias. Por que tinha aceitado o convite? Mesmo sabendo que as coisas não eram mais as mesmas? Mesmo que ele também soubesse disso?
Tentar. Ela tinha que tentar. Exatamente o que Candice tinha dito a ela naquela manhã de domingo quando o mundo parecia estar desabando do outro lado da janela: Você não se permite ser amada porque já acredita que ele não vai ser capaz de te amar, e pode estar certa. Mas isso não quer dizer que ninguém vai fazer isso. Pode prometer pra mim que vai tentar pensar?
Candice pareceu ter se lembrado da mesma coisa, e sua expressão tensa lentamente foi se anuviando.
— Quando você diz tentar, estamos falando de um jantar e uns beijos ou algo mais? — perguntou ela. arqueou uma sobrancelha.
— Vai me dizer pra não ir pra cama com ele?
— Ah não, de jeito nenhum, pelo amor de Deus, ele pode ter se isolado em algum canto escuro dos Estados Unidos nos últimos meses e ter te deixado no vácuo, mas ainda é Jeong Jaehyun. Jamais diria pra você ser tola nesse ponto — a loira riu pelo nariz, e encontrou cobertura para rir do mesmo jeito. — O que quero dizer é que os seus sentimentos mudaram. E não sei se está disposta a fazer com que mudem de novo.
ficou imóvel por um momento, estalando os dedos de uma mão. O que mais queria era que sim, seus sentimentos mudassem de novo, de preferência que se fechassem em silêncio em algum cantinho do peito e fosse selado por um cadeado, impedindo a entrada e saída e qualquer livre acesso que ousassem cometer, mas aquele era Jaehyun. Jeong Jaehyun, o cara pelo qual ela já precisou lutar para manter a respiração ofegante sob controle. O cara que era dono de um beijo que já a fez se sentir como se estivesse encostando os lábios contra o metal quente de um carro ligado. O primeiro cara da história da vida de que balançou seu coração de tal modo que a fez entender porque escreviam tantos livros de romance por aí.
Ela devia isso a si mesma. Devia tentar retornar a esses sentimentos, devia colocar sua vida nos trilhos, ainda que seu coração no momento latejasse e doesse por outro cara que, muito pelo contrário, a fez sentir tanta raiva e frustração para uma vida inteira.
— Eles podem mudar — afirmou ela com convicção, plantando a sentença no universo, mentalizando e atraindo aquele presságio. — Não vou saber se não tentar. E de qualquer forma, é só um jantar. Podemos sair de lá como grandes amigos ou…
— Ou como um grande casal em potencial. Claro, caso ele te dê motivos plausíveis para isso — Candice riu languidamente, mas não parecia tão ácida como antes. Estava na cara que se tivesse que escolher um dos dois para abrir mão de sua antipatia e entregar para a selva romântica, esse cara com certeza não seria Jeon Jungkook. — Amor não está só na língua de quem fala sobre ele, , mas nas atitudes. Apesar de que é sempre bom falar. As pessoas não tem bola de cristal.
olhou para o tampo de madeira quando se lembrou das palavras de Jaehyun naquela cobertura do hotel. “Eu gosto de você” foram declaradas de um jeito tão natural e irredutível, sem nem prender a respiração, que se sentiu incapaz de ignorá-lo. Mas ainda que ele já tenha se confessado nessa primeira etapa entre eles, ainda assim… precisava concordar com Candice sobre atitudes. E quantas coisas estaria disposta a deixar de lado para se empenhar em mostrar o melhor dela para ele. A parte boa, pelo menos.
No momento seguinte, Yoona apareceu bem ao lado da cadeira de Candice, se aproximando com pulinhos discreto antes de perguntar:
— E então, quem quer hotteok de sobremesa?



À meia-luz do estúdio profissional do 8º andar, Jungkook praguejava de novo.
E de novo, e de novo.
A cadeira rangeu quando ele a empurrou para trás outra vez, agarrando a paleta vermelha com os dedos já cansados, assim como a própria mente, enquanto a guitarra pendia preguiçosa no peito e no colo. Estava ligada na pedaleira enquanto mandava as vibrações do som direto para os seus ouvidos através dos headphones. Já tinha tocado tudo que conhecia: Arctic Monkeys, Nirvana e um pouco de Led Zeppelin – pelo menos achou que aquilo era Led Zeppelin. Tinha dito que precisava desligar a mente, mas nem mesmo aquele volume 70 nos ouvidos estava adiantando de alguma coisa. Ele não conseguia encontrar um desfecho instrumental para a nova música antes de gravá-la e isso o fazia praguejar de novo, como se resolvesse alguma coisa.
Mas que inferno.
Longe dali, do outro lado do vidro que o separava da mesa de som, os dois produtores o encaravam com certo tédio e indignação. Um deles, Joo Hyuk, já tinha invadido aquela sala acústica duas vezes para perguntar se ele não gostaria de tentar outro dia, que estava tudo bem não estar inspirado, e o outro tinha sido mais direto ao falar para Jungkook que, já que o maknae não pretendia gravar nada, por que não liberava o estúdio para os outros? Ele só estava deslizando aquela paleta pelas cordas, fazendo um som qualquer zunir, com aquela cara de tacho de quem não dormiu nada bem na noite passada, perturbando a paz alheia.
Na verdade, era até gentil supor tal coisa. A verdade era que ele não parecia dormir bem desde o início daquela semana, e isso era muito ruim para quem estava prestes a pegar um avião para a Califórnia e se apresentar na premiação mais importante do mundo da música.
Ele não aparentava estar muito preocupado com aquele tipo de coisa no momento, como talvez devesse estar. Até disseram por aí que tinha ficado bêbado há uns dois dias e comprado uma moto nova na primeira concessionária que encontrou. Uma Indian Scout preta e fosca. Um absurdo completo.
Joo Hyuk e os outros funcionários do estúdio preferiam acreditar que ele estava sim muito nervoso e pressionado com o Grammy, e aquela era a sua forma de não demonstrar – ou de lidar com o fato. Só podia ser isso. Possivelmente, o garoto nunca tinha pensado em chegar tão longe, ascendendo na direção do topo como estava, e isso devia enlouquecer qualquer um.
O que ninguém estava vendo – e jamais veriam, não se Jungkook não permitisse – eram as palavras que andavam sendo rabiscadas em Chainsaw, as novas palavras que destoavam quase completamente das antigas, uma composição que ganhava uma linha nova a cada dia, uma que nascia de todo o turbilhão devorando sua mente desde a fatídica noite no terraço.
O turbilhão chamado .
Jungkook demoraria a perceber que estava escrevendo uma música para ela, e graças a Deus por isso! Se notasse aquilo naquela hora, teria levantado daquela cadeira imediatamente e implorado a alguém para salvá-lo. Ou pelo menos pediria uma testemunha para reiterar que ele não estava enlouquecendo e que não começaria a cantar músicas do David Kushner pelos cantos.
Enlouquecendo. De novo. Daquele jeito que ele bem conhecia, mas que parecia diferente desta vez. Brutalmente diferente.
Por um momento, se perguntou onde estaria caso deixasse toda essa loucura tomá-lo completamente.
— Ei, Jungkook — a voz invadiu o espaço ele no exato instante em ele tinha decidido parar de tentar tirar aquela coisa daquela guitarra. Jungkook se virou para ver quem o estava chamando. — Você quer uma porção de frango ou coisa assim? Ji Pyeong vai pedir daqui a pouco. Precisamos fazer os últimos ajustes da música título dos outros garotos.
Jungkook ficou completamente em silêncio, agora encarando Joo Hyuk pelo canto do olho. Com um suspiro, o rapaz voltou a cadeira para o mesmo lugar e se desfez dos vários fios ao redor, levantando-se com uma pisada firme no chão de carpete grosso e, então, jogou o cabelo longo para trás e amarrou em um coque mal feito na altura da cabeça.
— Vou buscar um café — disse ele, abruptamente, saindo de dentro daquela sala fechada e puxando as chaves que deixou na mesa de som.
Joo Hyuk estalou a língua.
— Você deveria comer alguma coisa, cara. Há quanto tempo tá tentando tirar alguma coisa dessa guitarra?
— Tô sem fome. Vou ficar só com o café — respondeu ele, puxando as mangas da jaqueta jeans até os cotovelos. — E pegar um cigarro, já que não me deixam fumar aqui.
Ele deu uma risada debochada e estava pronto para sair correndo dali, mas ouviu a voz do produtor mais uma vez quando disse:
— Você não precisa se apressar como está fazendo — Joo Hyuk suspirou, cruzando os braços na altura do peito. — O álbum de vocês já está quase pronto e a sua música tem que vir quando você estiver pronto. Sei que tá assustado, mas…
— Eu não tô assustado — Jungkook frisou ao virar-se novamente para o homem, a face repleta de indignação. — Não é isso que tá acontecendo.
— Então por que fica revisando sem parar uma coisa já pronta? Eu já aprovei, Ji Pyeong também, e as partituras estão no lugar, do que ainda tá com medo?
— Não tô com medo — repetiu ele, parecendo ainda mais frustrado. Abriu a boca para continuar a falar, mas nada veio. O que viria? Mais absurdos sobre ele sentir que algo ainda estava faltando, só que não fazia ideia do que? — Eu só… Preciso de um café. Forte. Um que eu não vou achar aqui, então até mais tarde.
Ele ouviu Joo Hyuk tentar lançar uma última tentativa de uma conversa, mas os passos de Jungkook já estavam desaparecendo daquela sala à medida que os forçava para uma única direção além daquele corredor, daquele andar e daquele edifício imenso.
É, ele estava com medo. Todo mundo já estava percebendo. Se abaixasse a cabeça e espiasse embaixo da carroceria da Mercedes, até os gatos de rua escondidos ali falariam que ele estava mais esquisito do que já esteve antes. E, claro, que parecia um cãozinho medroso. Essa era clássica. Ele tinha mesmo essa característica.
Mas daquela vez, ele sabia a origem do medo. Sabia para onde esse sentimento o estava levando, sabia o que ele o faria pensar quando a cabeça começasse a esfriar. Aquela música e tudo que estava acontecendo faziam parte de duas fases distintas na vida do Golden Maknae que se entrelaçaram sem intenção. Ali Dalphin tinha sido sua musa inspiração em pensamentos de amor, raiva, saudade, tristeza e depressão, estimulando-o apenas a curto prazo, porque era horrível se lembrar dela, quanto mais escrever sobre ela.
Por outro lado, e suas palavrinhas gentis e sinceras sobre “isso tá incrível”, ou “você é muito talentoso, um artista” que ele lia absolutamente todos os dias em qualquer veículo da internet, mas que soavam tão mais reais da voz dela, era impossível ignorar. Era impossível não acreditar, e já fazia algum tempo que Jungkook não acreditava em alguma coisa quando dizia respeito a ele mesmo.
tinha ajudado-o a enfrentar Ali Dalphin e todos os seus “conselhos” sobre deixar aquele garotinho sonhador de lado. Tinha ajudado-o a terminar aquela maldita música só por estar perto dele, porque com ela, ele se sentia corajoso para não se esconder, livre de pressões externas e internas de perfeição que ser uma celebridade trazia como um fardo, livre para escrever sobre o que quisesse, desenhar o que quisesse, livre para encarar Ali direto do papel e dizer tudo que ele provavelmente nunca diria para ela.
Em resumo: Jungkook tinha escrito a música por causa de Ali, mas só foi capaz de cantá-la por causa de .
E essa era a parte assustadora. Porque a música, de certa forma, nasceu para manter Ali no coração. Para externar a revolta que ele não seria capaz de jogar em cima dela quando a visse de novo, e deixar apenas os sentimentos bons de tudo que passaram nos últimos anos. Mas a cada vez que tocava aquela música, seja com um instrumento ou sem, Ali Dalphin era mais expelida de seu peito, tanto os momentos bons quanto os ruins, transformando-se gradativamente em uma imagem de indiferença, o que era bizarro para alguém que antes ocupava todo o seu coração.
Mas Jungkook não sentia o coração caindo no vazio por isso. Não estava oco, como pensou que ficaria quando se libertasse totalmente da mulher de seus sonhos. Ele não se sentia completo, mas também não estava… incompleto. Derrotado. Sem esperanças de algum dia sentir aquela loucura gostosa de estar apaixonado de novo.
E talvez Minji estivesse certa: existiam outras formas de se apaixonar. Menos espalhafatosas e irracionais, menos propensas a mudar quem você era de verdade.
A ideia de se apaixonar andava parecendo menos fodida e mais legal até o dia em que viu seu amigo de novo e se lembrou da realidade em que estava metido. E seria tão mais fácil, tão estupidamente fácil, se Jungkook apenas aceitasse aquele panorama e esquecesse. Ficasse longe, como já estava acostumado a fazer. A distância e o tempo melhoravam as coisas exatamente como diziam; era do que precisava para parar de pensar naquilo, nela, em tudo que a envolvia.
Porque só de pensar em , Jungkook se sentia exposto, vulnerável, mostrando para todos que aquele cara debaixo daquela jaqueta, daquelas tatuagens e daquelas performances animadas não passava disso: um cara. Normal. Um pouco solitário, talvez. Hipócrita e incoerente. Um ex cidadão de Busan. Nada muito incrível como as revistas diziam.
Atestar a simplicidade de seu próprio eu depois de tanto tempo tentando ser o grande Jungkook do BTS era um soco no estômago. Diminuía sua coragem e confiança. Esse cara normal teria colhão para enfrentar o mundo com aquela música tão íntima? Estava pronto para ouvir o que diriam sobre ela? Teria colhão para enfrentar uma nova inspeção de sua privacidade novamente, quando nem ele mesmo andava fazendo isso?
O estacionamento demorou a chegar. Jungkook mal notou por quais portas passou, quais pessoas cumprimentou e quantas escadas desceu até achar o corredor estreito que levava à saída dos fundos, abrindo-se para um início de tarde quente, mas ainda nublado. Ele colocou os óculos escuros e se desfez do casaco, posicionando-o no ombro direito enquanto mexia no bolso esquerdo, andando mais rápido até a Mercedes estacionada na sua vaga com nome, bem ao lado da Lamborghini de Jin, que aceitou o convite insistente de Jimin para ensaiar quando o que queria mesmo estar fazendo era jogar Valorant o dia inteiro no grande apartamento em Songpa-gu.
Contudo, assim que chegou aos pneus traseiros do carro, ele viu a silhueta dela despontando no meio da faixa de pedestres.
Na visão de Jungkook, o sol iluminou tanto o sorriso dela que era como se estivesse na frente dos faróis de seu carro. Um sorriso aberto e animado, um que ele não se lembrava de ter visto desde a noite das tatuagens, um que fazia o coração dele inchar e sacolejar conforme acompanhava cada passo dela cruzando a rua até chegar à calçada, gesticulando com os braços enquanto contava algo divertido para a amiga baixinha de cabelo liso.
Para Jungkook, não existia nenhuma amiga ou quaisquer outras pessoas a um raio de 4km. Só e o cabelo preso por duas mechas atrás, a calça jeans escura, a camiseta branca básica e o casaco xadrez, que hoje não tinham mangas compridas até os cotovelos, o que deixava à mostra um pouco da tatuagem no braço direito, e finalizando com – Jungkook deu um sorriso curto e sozinho com isso – as sapatilhas de freira.
Sapatilhas que ficavam lindas nela. Assim como aquele casaco que não combinava. Assim como o cabelo preso às pressas. Assim como as unhas e seu esmalte nas últimas.
Deus do céu, parecia que não a via há séculos. E pela forma como seu coração ficou, ele entendia porquê isso foi bom. Se ela o desse um oi naquele momento, Jungkook não sabia se seria capaz de responder, porque estava sentindo as batidas no ouvido. Porque seu fluxo sanguíneo tinha duplicado a velocidade. Porque seu rosto e corpo inteiro estavam queimando e formigando tanto que ele teve certeza que precisava bater em retirada dali antes que ela precisasse buscar ajuda para ele.
Só que antes que desse qualquer passo, se virou para encará-lo. O ato poderia ser mais difícil, mas não era; o estacionamento a céu aberto ficava bem ao lado das portas giratórias da entrada lateral do edifício, e a Mercedes preta fosca, localizada bem à vista, não era um elemento que não se olhava duas vezes. Mas parecia uma piada do cosmos olhar para o veículo bem no momento em que seu dono, camuflado do tom de preto do próprio carro, estivesse bem ao seu lado.
Imediatamente, Jungkook pensou em recuar para a escuridão do Sedan quando seus olhos se encontraram, mas ficou. Ficou e mergulhou no olhar intenso de , que previsivelmente perdeu um pouco do sorriso quando o viu. Pareceu perder um pouco da coordenação motora também, já que reduziu o ritmo de seus passos para dentro da empresa, coisa que ele mal notou. Só ficou ali, olhando para ela através dos óculos escuros, esperando que ela desviasse o rosto primeiro.
Durou 1 minuto. Até menos do que isso. Bastou uma cotovelada de Yoona para que levasse um susto e ativasse um tipo de foguete nos pés, apressando-se para as portas, balançando a cabeça e emitindo uma risada sem graça para a amiga, retornando ao estado feliz de antes.
Feliz, é isso. Ela parecia mesmo feliz. Devia estar feliz por saber que Jaehyun voltou. Devia estar pulando de alegria porque ia ter o seu tão desejado encontro, prenunciado há meses atrás. É claro que ela estava feliz.
E ele estava na merda.
Com o coração ainda palpitando no tímpano e a garganta arranhando por nicotina, Jungkook destravou o carro e entrou rapidamente, fazendo uma manobra profissional para finalmente sair daquele lugar.
Ao ver a Mercedes-Benz acelerando avenida afora, finalmente voltou a respirar.



Horas mais tarde, a mesma Mercedes estava rugindo na direção de Gangdong-gu, para um conglomerado de prédios no fim de um morro estreito em uma rua escura sem saída, estacionando no meio fio bem abaixo da placa ridícula de “pare aqui sim, por favor!”.
Agora sem os óculos e a jaqueta, Jungkook parecia ainda mais pertencente do lugar. As botas características fizeram tanto barulho na entrada que ele não se espantaria se as pessoas dos imóveis vizinhos olhassem para fora. Nada costumava emitir um ruído tão alto naquela região quanto o rock e folk das caixas de som de Nitro enquanto mexia no motor de outros carros nos fundos. Outros carros que passariam por uma completa transformação autoral que tornariam seu dono o possuidor exclusivo de uma relíquia.
Lá dentro, a luz fraca, o cheiro e a música estavam como sempre, o que deixou o rapaz mais tranquilo. Era tudo que precisava: mesmice. Estar em um lugar que não tinha mudado, ainda que ele sentisse que tudo estava mudando.
Nitro estava recostado em uma das prateleiras do saguão, lotado de fileiras e mais fileiras de estantes que guardavam todo o tipo de discos de vinil – do mais popular ao mais raro, do mais chato ao mais clássico, do mais comum ao mais simbólico. Tinha um pequeno bloquinho nas mãos, onde devia estar fazendo a 7º vistoria do estoque daquele ano, sem notar nada ao redor.
Jungkook ficou parado na entrada por um longo tempo, encarando-o sem nenhum motivo especial até limpar a garganta com um sonoro alto e resmungar:
— Boa noite, velhote. Por acaso saberia me dizer a diferença entre uma Harley e uma Indian Scout no quesito de estereótipo? Quero ficar parecido com um rockstar que quebra um quarto de hotel.
Nitro levantou a cabeça instantaneamente, sorrindo logo em seguida ao ver quem era.
— Moleque. Decidiu se lembrar de fazer uma visita? — ele se aproximou de Jungkook, guardando o bloquinho nos bolsos do colete sem mangas e puxando-o para um abraço. — Nossa, você ficou mais alto? Ou tá exagerando com as barras?
— Só dando socos por aí. Faz tempo que não piso na academia, mas não conta isso pro Namjoon. Ele quer que eu esteja em forma na semana que vem.
— É verdade, vi na TV. Quando vai viajar mesmo?
— No final de semana. Ainda tenho uns 10 dias para fingir que não tô nervoso — ele deu de ombros e riu pelo nariz. Jamais diria a alguém além de Nitro que toda aquela história de Grammy estava tendo um peso muito maior do que ele esperava. No fundo, Jungkook só queria imitar seu amigo e passar um dia inteiro ajudando-o a mexer na Janis enquanto ouviam o zunido dos insetos nas árvores à sua volta no jardim dos fundos e sons da respiração que a Mercedes 1970 emitia enquanto seu motor esfriava. — Como você tá?
Nitro levantou os ombros lentamente com um sorriso de canto.
— Você sabe, aproveitando meu tédio. Um dos caras do Vipers veio aqui pra me passar o cronograma das visitas, e até pretendia ir em algumas, mas meu joelho começou a doer bastante ultimamente, então acho que não vai rolar.
— Precisa ir ao médico de novo? Você sabe que eu…
— Fica na sua, garoto. É só um joelho, e eles são só um motoclube. Não tem nada de grave na situação — Nitro lhe deu um tapinha de leve nos ombros e voltou a andar em direção ao balcão. A metade de Run to the Hills do Iron Maiden estava soando mais baixa que o normal, o que era incomum para todo o estabelecimento que vendia música. — E que história é essa de moto? Achei que era só mais um boato.
— Você acompanha os meus boatos?
— O algoritmo do Instagram da loja acompanha — respondeu ele. Jungkook riu alto.
— É verdade sim, e agora você não tem mais motivo para não me ensinar as manobras ou me colocar na lista dessas corridas perigosas que ficam chamando de visitas. — Jungkook sorriu e Nitro o encarou com repreensão. — Eu só vou ir pra assistir, eu juro.
O homem revirou os olhos e guardou o bloco em alguma gaveta.
— Então… A que devo a honra da sua aparição hoje? Tá querendo conversar?
— Sei lá, eu precisava espairecer. Não consegui me concentrar no trabalho e quis vir te dar um oi. E ah, pegar as fotos — Jungkook se lembrou, seguindo-o até o caixa. — Elas estão prontas?
Nitro assentiu com um sorriso.
— Claro que estão. Terminaram de secar ontem, e ficaram realmente muito boas. é mesmo… — Nitro parou de falar repentinamente assim que viu os olhos de Jungkook piscarem forte em direção ao chão, fugindo inconscientemente de qualquer conversa que pudesse envolvê-la. — Enfim. Vou buscá-las pra você, espera aqui.
— Na verdade, eu posso esperar no…
— Espere aqui, garoto. Já volto — Nitro frisou, o que foi um pouco estranho no início, mas a mente de Jungkook já estava um pouco cansada e letárgica para notar. Se estivesse mais concentrado, teria percebido que a música baixinha não era a única coisa esquisita no seu lugar favorito.
Pouco menos de 5 minutos depois, Nitro estava cruzando a portinhola que dava acesso ao corredor escuro e estreito que levava para os outros cômodos do prédio, retornando com dois envelopes grossos em papel cartão e entregando-os à Jungkook.
— Aqui estão, Jeon. Me doía pensar que você nunca iria querer ver essas maravilhas da Bencini reveladas, mas ainda bem que não desperdiçou meus filmes 127. Eles são raros e uma fortuna. E ah, o Bam é mesmo um garotão bem bonito.
Jungkook riu ao abrir o primeiro envelope, puxando de lá as fotos em 10x15 de Bam em cima daquele puff na grama, bem na frente do pote de ração instantes antes de destruí-lo, e uma outra onde ele mesmo o pegava no colo e dava um sorriso, e cliques espontâneos em preto e branco onde ele parecia estar conversando com o cachorro como se conversava com qualquer pessoa falante.
O ângulo de todas elas tinham ficado tão lindos como fotos de família. Jungkook as colocaria em um diário, caso tivesse um. E acharia muito válido acompanhar o crescimento dele daquela forma ano após ano, de preferência no mesmo lugar e com a mesma fotógrafa.
Isso parecia tão impossível naquele momento que ele guardou as fotos de Bam e passou para o próximo envelope, de repente se esquecendo do que havia nele.
— Tinham tantas assim? — murmurou, devolvendo o primeiro envelope para cima do balcão e abrindo o segundo. Nitro sorriu sem mostrar os dentes.
— Dessas não tem muitas, infelizmente.
Jungkook franziu o cenho e puxou as fotografias. As imagens o fizeram se sentir ferido na mesma hora.
, linda naquele vestido azul e com o batom vermelho inesquecível, estava virada de lado em seu momento particular de conexão etérea com as câmeras antigas do Covil. , com seus olhos brilhantes e um sorriso que não foi pego totalmente pela câmera, mas que Jungkook se lembrava em cada detalhe. Se lembrava do dia, das horas, da música que tocava ao fundo, de seus pensamentos, do que fizeram depois. Olhando agora para trás, poderia pontuar aquele dia como a data que tinha escolhido para foder com a sua cabeça. Para deixá-lo como estava ali, agora, sentindo o peito doer só de olhar para uma foto dela. Uma foto que ele tinha tirado, duas para ser exato, e uma terceira que era dele mesmo, na única vez na vida que esteve na frente da lente dela e não se sentiu revoltado com o fato.
Jungkook não soube por quanto tempo ficou encarando as revelações em preto e branco até ouvir a voz arrastada de Nitro dizer:
— Se não quiser ficar com elas, pode devolver pra mim.
O rapaz puxou o envelope para o peito imediatamente, antes que a mão de Nitro avançasse sobre o papel.
— Elas são minhas, miserável — Jungkook grunhiu, e Nitro sufocou uma risada. Nunca deixaria ninguém tocar naquelas fotos. Não deixaria que a crônica de seus desejos mais intensos fosse arrancada dele assim.
Mesmo que … Bom.
Bom.
Guardando-as no segundo envelope, Jungkook soltou um longo suspiro e avisou:
— Vou ao Covil.
E sem esperar resposta, apoiou o invólucro em cima do balcão e começou a andar em direção ao complexo de corredores na primeira curva. Porém, incrivelmente agitado, Nitro se colocou à frente do garoto com um sorrisinho amarelo.
— Como assim? Já? — ele deu uma risadinha. Jungkook juntou as sobrancelhas. — Digo, tem cerveja na geladeira. Achei que quisesse tomar uma bebida e falar da vida.
— Se tem algo que eu não quero falar hoje é sobre a minha vida, cara — bufou, desvencilhando-se do amigo. — Só vou ficar no máximo 1 hora. Um pouco sozinho. Nada demais.
— Acho que não é uma boa ideia — Nitro interviu novamente, e Jungkook agora arqueou as duas sobrancelhas. — Quero dizer, só… — ele comprimiu os lábios e trocou o peso de uma perna para outra. Como não parecia ter mais argumentos, apenas estalou a língua e revirou os olhos. — Tá bom, só não fuma lá dentro, tá legal? Vi você mexendo num maço desde que chegou.
Jungkook soltou uma risada desacreditada, certo que Nitro só podia estar fazendo uma piada.
— Quê? Qual é, você fuma lá dentro.
— Mas hoje eu não quero que você fume.
Jungkook diminuiu um pouco o sorriso. O tom de Nitro foi a coisa mais estranha de todas as coisas estranhas que estava lentamente começando a captar. O tom autoritário que se esperava que um cara de quase 40 anos usasse contra um garoto de 24 com botas de motoqueiro que parecia estar pronto para vandalizar seu estabelecimento. Um tom que Nitro usava com ele quando ele era mesmo uma criança. Mas naquele dia…
Com o cenho franzido, Jungkook se firmou nos pés e puxou o maço de Dunhill do bolso de trás, erguendo-o na mais explícita luz até pegar um dos cigarros e colocá-lo entre os dentes, estreitando os olhos com o deboche incrustado no sorriso de delinquente.
— Tô indo nessa.
E voltou a andar na direção do corredor.
Nitro trincou os dentes audivelmente, e soltou o ar com força quando o seguiu.
— Qual é, fedelho, fuma na porra do terraço!
— Me obriga, velhote — a voz malcriada saiu por entre os dentes que seguravam a guimba, e Jungkook percorreu rapidamente o passadiço escuro com hieróglifos anarquistas marcados nas paredes, puxando o isqueiro Zippo de outro bolso e posicionando o dedo para acendê-lo quando puxou a porta do Covil rapidamente, recebendo a luz fluorescente direto no rosto e o calor do ambiente, mostrando que ele não estava vazio como de costume.
Ele não ouviu seu nome ser chamado por Nitro. Não ouviu o “ah, merda!” que o amigo lançou por trás de suas costas quando viu que ele já tinha pisado no batente do cômodo das câmeras. E nem ouviu o que mais que pudesse estar tocando no espaço assim que viu a pessoa sentada em frente a uma pequena mesa de té no tapete escuro da sala, digitando algo em um laptop familiar antes de virar a cabeça com um susto para a entrada repentina.
E em um piscar de olhos, Jungkook simplesmente deu um passo para trás e fechou a porta de novo.



Agitado, o rapaz jogou a guimba sem fogo em qualquer lugar do chão e agarrou na curva do cotovelo de Nitro, arrastando-o até onde pôde naquele corredor sombrio, rastejando para bem longe daquela porta de madeira velha até que pudesse dizer em um sussurro furioso:
— O que ela tá fazendo aqui?!
— Bom, se você tivesse me deixado explicar…
— Explicar o quê, porra?
Nitro bufou e passou uma das mãos no cabelo grisalho e ralo, fazendo o anel de prata no polegar brilhar bem no reflexo dos olhos arregalados e alvoroçados de Jungkook.
— Ela tem vindo aqui de vez em quando.
— Como assim?
— É, ela andou aparecendo aqui todos os dias dessa semana, e antes disso…
— Pra quê? — Jungkook interrompeu, tentando ignorar o quanto o peito estava descompassado.
— Sei lá, alguma coisa de mestrado e aulas online. Parece que ela tinha um trabalho pra entregar que andava bem devagar, e o Covil parece deixar ela inspirada.
Com calma, Jungkook ainda permaneceu com os olhos focados em Nitro, esperando por mais. Como nada mais veio, o garoto baixou os ombros e assentiu devagar, acionando a trava de segurança da própria mente e voltando a respirar normalmente depois da surpresa.
— Tudo bem — murmurou ele, acrescentando logo depois: — Vou embora.
— Ei, ei, como assim? — Nitro agarrou no cotovelo de Jungkook antes que ele desse um passo. — Ela já te viu, garoto. Não vai falar com ela?
— Eu não sei se ela quer falar comigo — ele resmungou com nítida dor na voz, ainda podendo ouvir a voz de na frente daquele banheiro quando disse: não sei se a gente devia fazer isso. É complicado.
Você mexe comigo.
Você mexe comigo, então é complicado.
Nitro revirou os olhos e o soltou, balançando a cabeça em negativa.
— O que foi que você fez?
— Acolhedor saber que você já supõe que eu fiz alguma coisa.
— Estou errado?
— Nem tanto — murmurou ele em um sussurro. Nitro soltou uma risada pelo nariz. — É uma história longa pra caralho.
— E você não quer me inteirar dela agora, não é?
— Não mesmo.
— Mas se não for entrar naquela sala, vai ter que fazer isso. E você sabe que eu consigo te prender aqui — Nitro estreitou os olhos ameaçadoramente, ainda que não fosse sério o suficiente. — E então, o que prefere? Ir falar com a garota ou se abrir comigo?
Jungkook passou uma língua furiosa nos lábios, querendo de repente enfiar o punho nas costelas de Nitro e marcá-las com suas impressões digitais nervosas. O olhar e sorriso do homem eram tão debochados quanto os dele, e Jungkook quase entendeu da onde tinha adquirido aquela sua característica – e o quanto poderia irritar as pessoas.
Com isso, levou menos de 5 segundos para que o garoto sugerisse gentilmente que o velho tivesse uma péssima noite de sono e se virasse na direção da porta recém fechada, sentindo-se amedrontado como se estivesse caminhando de encontro a um monstro no armário, e energizado ao mesmo tempo pela mísera possibilidade de vê-la.



voltou a cabeça devagar para a tela do laptop, movimentando-se como em um sonho, como se seu corpo tivesse sido tomado por outra entidade naqueles breves segundos e tê-la feito assistir a tudo de camarote em outra parte da sala.
As letras na tela não faziam mais sentido. Seu coração atrofiou com o mero vislumbre do rosto dele naquela soleira. juntou as mãos no colo, nervosa de repente, desejando do fundo do coração que fosse um delírio. Ou, se não, que ele tivesse a brilhante ideia de ir embora, porque ela tinha chegado ali primeiro e ele devia ter consciência de que os dois não tinham nada para conversar – nada de bom, pelo menos.
E tinha o fato de que ela não conseguia pensar direito perto dele. Isso era perigoso.
Mas então, não muito tempo depois, Jungkook abriu a porta da sala, mostrando ser real e não uma alucinação desejosa da mente de , olhando para ela com olhos intensos e o rosto um pouco corado demais. Ele parecia assim naquela outra noite. A noite em que disse que sentia sua falta.
— Ei, — Nitro surgiu logo atrás daquele Jungkook imóvel, passando um dos braços pelo ombro do garoto. — Esse paspalho apareceu aqui do nada. Veio fazer sua visita mensal ao Covil, e parece que quer que eu olhe a moto nova dele — Jungkook virou a cabeça para ele na mesma hora, gritando com os olhos: do que você está falando?!, mas Nitro ignorou e apenas se voltou para a garota sentada no chão. — E então, você quer o seu café agora?
levou um tempo para olhar para Nitro e fazer um sorriso despontar nos lábios, um muito pequeno e não muito firme, mas o bastante para que conseguisse dizer:
— Quero sim, Nitro, muito obrigada.
E com um último olhar fuzilante, ele encarou Jungkook pelo canto do olho e se retirou da sala, deixando os dois sozinhos com o que quer que estivesse tocando ao redor.
Um minuto muito longo se passou até que ele trocasse uma perna para outra, embaraçado até os ossos quando disse:
— Foi mal, não queria te atrapalhar — ele gesticulou para o notebook aberto em cima da mesinha. ajeitou a postura e balançou a cabeça nervosamente, igualmente atrapalhada.
— Não, tudo bem, eu já tinha acabado — disse, fechando a tela logo em seguida.
Mais um momento de silêncio constrangedor. De repente, como se tivesse deixado aquele aposento há 3 dias atrás, Nitro surgiu novamente por trás do garoto, empurrando-o os dois copos térmicos de café e lançando um último sorriso para antes de sair novamente.
Jungkook levou um tempo até ver que havia dois. E sabia que não tinha pedido café nenhum.
Ele fechou os olhos por um instante e pensou seriamente em desistir daquela ideia de merda de ficar ali, entregar o café dela e sair pela porta, girar a chave do seu carro e ir se martirizar em outro canto, mas…
Bem, estava ali. E cada célula de seu corpo, cada fiapo de seus neurônios sabia que, se ela estava, então ele ficaria ali. Independentemente de ser estranho ou não.
Aproximando-se dela, Jungkook estendeu o primeiro copo e perguntou:
— Posso tomar café com você?
Ele a viu hesitar por um momento. Logo quis tossir desculpas e dizer que entendia caso ela não quisesse; que ainda podia estar ocupada com o que quer que estivesse digitando naquele computador, que ele não tinha mesmo nenhum assunto relevante para tratar, mas antes que metesse os pés pelas mãos, ela o encarou de baixo e balançou a cabeça levemente quando disse, em voz baixa:
— Claro.
Foi a hora do coração de Jungkook se desconfigurar, e logo depois triplicar de tamanho e bater de uma forma preocupante para o ministério de saúde. Limpando a garganta, ele rapidamente se abaixou para se sentar ao lado dela, pegando no copo quente de papelão com força para garantir que ele não escapasse de seus dedos meio idiotas. Ele inteiro se sentia idiota. Virava um completo tolo quando ela estava perto. E isso era muito idiota.
O cheiro dela tomou suas narinas assim que se acomodou ao lado de seus ombros. Jungkook deixou as longas pernas esticadas bem ao lado da pequena mesa, enquanto as cruzava em borboleta sobre o carpete. Ela ainda tinha os olhos abertos para a parte externa do laptop, e não estava mais usando sapatilhas da Irmã Deloris de Mudança de Hábito, mas sim os tênis All Star que sempre combinava com suas roupas que não fugiam do básico.
Novamente: ainda conseguia ficar linda. Se fosse ser sincero, conseguia ficar ainda mais linda do que com aquele vestido granfino da festa de Candice. E Jungkook quis se desesperar por estar, de repente, pela primeira vez, pensando em como ela ficava bonita com as roupas que ele sempre detestou. Como sentia a pele arrepiar só de sentir o cheiro dela. Como se sentia o Edward Cullen quando Bella se sentou ao lado dele naquela aula de Biologia, fazendo do possível ao impossível para não pular em cima dela e mordê-la – no melhor sentido da palavra.
O que estava acontecendo com ele, afinal? Nada naquele dia parecia ser como antes.
— Então… O que estava fazendo? — ele puxou o assunto, seguindo o olhar dela para a tela abaixada no notebook. bebeu um gole do café devagar.
— Terminando um trabalho da universidade — respondeu, olhando-o de soslaio. — Faz algum tempo que pedi aulas online depois que assinei o contrato com a Hybe. Foi o jeito de conseguir levar as duas coisas.
Ele assentiu, balançando um pouco a ponta dos pés.
— E o que tá achando?
— É mais difícil. Mas nada impossível.
Jungkook balançou a cabeça e tomou um gole da bebida quente. Quase fez uma careta quando sentiu o gosto diferente na ponta da língua.
Preto e com muito açúcar.
Ele odiava café com açúcar. E provavelmente também odiava aquelas coisas instantâneas de maquininha que Nitro mantinha na loja. Mas naquele dia, Jungkook teve um pensamento maluco de que o beijo de naquele momento teria gosto de café barato e calórico, e não se importou nem um pouco de beber um gole maior.
Minha nossa, como ele estava fodido. Deveria ligar os faróis da Mercedes e dirigir de volta pra casa naquele instante.
Outro momento torturante de silêncio se instalou enquanto os dois buscavam alguma outra frase que pudesse ser dita de forma casual. pressionou os dedos dentro dos tênis, balançando distraidamente o copo de papelão enquanto testava a própria capacidade de se manter estável quando sentia os ombros dele roçando nos seus de forma muito simples, mas nada era tão simples quando se tratava de Jeon Jungkook.
Eles mantiveram a posição por mais 2 minutos até que uma melodia acompanhada de um ruído um tanto melancólico enchesse o ar em volume mínimo, mas que pareceu um berro no meio do silêncio palpável entre os dois.
Jungkook soltou uma risadinha fraca pelo nariz, um que pareceu brevemente um soluço.
— Você tá ouvindo o álbum novo dele.
assentiu e escondeu o sorrisinho atrás do copo.
— Estou ouvindo todos os dias desde o lançamento.
— Eu também. Andei tentando tirar Always no violão, mas em umas 8 horas ficou parecendo…
— É a minha favorita — de repente virou o rosto pra ele, abaixando o copo para o colo, a animação brilhando nos olhos. Jungkook sentiu o coração acelerar ardentemente quando respondeu:
— A minha também.
E Always de Daniel de repente havia matado qualquer tentativa de ambos de parecerem minimamente indiferentes um ao outro.
Jungkook foi incapaz de desviar os olhos de , tão perto naquele instante, com o nariz e boca a uma distância ridícula da sua, com os detalhes de seu rosto tão marcados dentro dele, com todos os aparatos que faziam seu estômago se encher de borboletas ridículas que formavam parzinhos entre si e dançavam, dançavam e dançavam, igual os passarinhos da Branca de Neve, igual a um baile qualquer das histórias da Disney. Minha nossa, chegava a doer de tanto que dançavam!
Ele não percebeu que estava sorrindo até que ela limpasse a garganta e desviasse os olhos para a frente de novo, com as bochechas queimando e uma zonzeira vertiginosa. Minha nossa, que ideia de merda ter aceitado tomar um café com ele. Se ficasse mais um segundo perto de Jungkook, seu segredo seria facilmente descoberto.
Ela discretamente chegou um pouco para o lado, e seus ombros não se tocavam mais. Jungkook bufou, recostando a cabeça na prateleira atrás de suas costas e puxando uma das pernas para cima quando finalmente perguntou, farto do nó na garganta:
— Você o viu, não é?
Para onde quer que pensou que ele iria com o assunto naquela hora, certamente não esperava por aquilo. Não tão diretamente.
Ela concordou com a cabeça e respondeu apenas um:
— Sim.
— E vão sair em um encontro?
— Sim, vamos.
Jungkook se ajeitou levemente no lugar. As borboletas tinham sido espancadas. Estavam zonzas, como ele depois daquela confirmação. Isso dava um certo tipo de enjôo, mas no fundo não importa. Ele já estava ali, e não tinha mais nada a perder com .
Era o que achava, pelo menos.
— Provavelmente, ele vai te levar em um lugar bem caro. Transformar isso em um grande evento — ele tentou parecer casual, mesmo que sua voz enclausurada denotava nada mais que uma tentativa de puxar assunto. assentiu.
— Imagino que sim.
— Talvez um com comida italiana. Ele gosta muito dessas coisas mais refinadas, com Champagne Bollinger e aspargos enfeitando o prato.
— É possível.
— E com certeza vai usar um terno. Italiano também, se eu for apostar. Ele curte a vibe da Europa dos anos 2000.
— É, pode ser.
Ele passou uma língua nos lábios, murmurando:
— Não se sinta pressionada a usar nada elegante demais. Você fica linda de qualquer jeito — e acrescentou em voz baixa: — Ele com certeza sabe disso.
prensou os lábios e apenas assentiu.
— Talvez ele também…
— Eu já sei. Já sei de tudo. Você já me disse isso, Jungkook.
Uma pontada de aborrecimento escapou do timbre dela quando se virou novamente para ele por um segundo antes de olhar para o chão de novo. Onde ele queria chegar? Queria fazê-la admitir que não era fã de nada daquelas coisas que teria de enfrentar no dia seguinte, mas que iria mesmo assim porque precisava desesperadamente esquecê-lo?!
Jungkook umedeceu os lábios e entendeu a deixa, respirando fundo por um segundo até murmurar:
— É verdade. Já te contei tudo sobre ele.
Um fato verdadeiro que tinha se transformado em doloroso. Jungkook jamais imaginou que fosse se entristecer como se entristecia agora ao constatar como tinha impulsionado a paixão de sobre Jaehyun, um sentimento que aparentemente não tinha se perdido por completo.
— Tá animada? — ele perguntou de repente, antes que o novo silêncio abrisse portas para que mudassem de assunto. deu uma risada fraca e um pouco triste.
— Você não quer saber dessas coisas.
— Só achei que eu devesse perguntar. Porque somos amigos e essas coisas.
automaticamente sentiu o coração destroçar, mas conseguiu engolir em seco e dizer:
— Claro, você está certo.
E bebeu mais um gole do café que tinha perdido toda a graça. Numerosos motivos continuavam vindo, avisando-a que ela deveria ir embora, já que o trabalho já estava encaminhado e agora Jungkook tinha descoberto suas visitas secretas, motivo mais do que suficiente para que ela procurasse outro. A palavra amigos saída da boca dele proporcionava dezenas de razões para que ela o tirasse da cabeça nem que fosse por uma lobotomia, mas quando ele estava perto, tudo era mais difícil. Seu corpo parecia caminhar para um declive, uma curva onde tudo sempre terminaria na cama e na boca dele em um sonho lindo e quente, mas que se revelaria como uma ilusão logo depois com as palavras: somos amigos.
No entanto, tentava trazer na memória as sensações de paz e confiança que sentia quando conversava com ele. Quando se abriu com ele, sobre coisas que nunca imaginou. E tentou forçar o coração a enxergar o cara de preto ao seu lado como uma boa companhia, e não como um amante inalcançável quando continuou:
— Eu estou… mais normal do que imaginei. Sobre tudo isso. Achei que estaria fazendo um buraco no piso de tanto nervosismo, mas posso encarar. Eu gosto de comida italiana.
Ela deu de ombros, tentando parecer divertida. A única coisa de italiana que tinha comida era macarrão e lasanha, e qualquer receita fora desse nicho poderia ser um baque, mas não era difícil. Não era!
Afinal, era Jaehyun. Já tinha jantado com ele e outros amigos antes. Não seria nada difícil.
Jungkook tentou dar um sorriso.
— Acho que eu também esperava isso — disse ele em voz baixa, virando a cabeça lentamente pra ela. — Acha que se enganou? Quando disse que não estava mais apaixonada por ele?
retribuiu seu olhar com uma dose extra de tensão.
— Eu me enganei sobre muitas coisas.
Ele não disse nada. Provavelmente, teria que remendar o enorme buraco que estava se abrindo no peito desde que Jaehyun o tinha falado do encontro, desde que fez questão de avisá-lo do sim de , aquele sim que entrava como uma farpa em seu coração, um milhão de farpas, totalmente inimigas de seu bom senso.
Deus do céu, isso estava pior do que imaginava. Estava irritante e ridículo. Mais ridículo porque era algo que ele já esperava que fosse acontecer.
Mas à medida que a hora ia chegando, e todas as coisas se tornavam realidade…
— E se eu pedisse pra você não ir?
Jungkook mal notou a pergunta saindo. Estava olhando para algum ponto neutro da parede, não conseguindo completar a merda de uma respiração. O verão de repente tinha transformado aquele porão em um inferno.
Os olhos de se voltaram para ele de súbito, e choque e encabulação tomando conta de sua expressão.
— Quê? — ela arfou brevemente, girando até mesmo os ombros na direção dele. — Por que você faria isso?
Ela parecia desgostosa com o fato. Jungkook abriu a boca pra responder, mas não sabia como prosseguir. Além disso, não tinha nenhum argumento válido que descrevesse como se sentia por dentro.
A verdade era que, mesmo que tenha tido um ímpeto de dizer que não estava mais apaixonada por Jeong Jaehyun, isso não importava, porque quando saísse com ele, com certeza demoraria menos de 2 horas para voltar a se apaixonar. Porque Jeong Jaehyun era apaixonante por natureza, bem mais do que ele. Exalava amor e romantismo a longo prazo, tudo que precisava, tudo que ela merecia. E Jungkook, se fosse abrir e olhar dentro de si mesmo, sentia que não podia dar isso a ela. Que não conseguiria, por motivos óbvios.
Porque foi um babaca.
Porque não era um cara bom.
Porque estava quebrado demais.
Porque a magoaria de algum jeito.
Porque não a merecia.
O problema sempre tinha sido ele.
O problema estava sendo ele naquele momento, quando mesmo sabendo de tudo aquilo, não suportava a ideia de deixá-la ir daquele jeito.
— Porque… Porque…
— Não — cortou, e suas costas se ergueram para a frente. — Você não vai fazer isso. Não vai fazer de novo.
, espera…
— Por que eu faria uma coisa dessas? Me diz? — ela o desafiou antes que se levantasse de uma vez. Estava sentindo de novo aquela raiva misturada com agonia quando vivenciava as tentativas dele de confundi-la. Quando ele dizia coisas que a faziam pensar que sentia alguma coisa, quando na verdade não existia nada dentro daquele coração a não ser ego ferido e um monte de poeira. — Desde o início, a gente sabia desse encontro. E nem venha me jogar a desculpa de paixão porque sabemos que isso não é pré-requisito pra se levar alguém pra jantar. E de qualquer forma, o que quer que eu sinta, não é da sua conta.
— Eu não disse que era. Mas você deixou claro naquele terraço que se preocupava com essas coisas, disse que estava imaginando…
— Eu disse que me enganei sobre várias coisas, Jungkook — se viu falando firme, pegando o laptop para guardá-lo na bolsa, fazendo o possível para não encará-lo por tempo demais. — Inclusive sobre as coisas que te disse no terraço. Inclusive sobre amor.
Ah. Com certeza tinha se enganado sobre isso.
era uma não acumuladora convicta, e quando se tratava de sentimentos, menos ainda. O que dissera a ele naquele dia pareceu tão natural, uma fantasia que cultivava por muito tempo, assim como a ilusão de amor de sua mãe, e que agora não faziam sentido nenhum.
Eu não fujo do amor, Jungkook. Na verdade, gosto da ideia.”
Ele tinha zombado disso. E talvez estivesse mais certo do que ela esperava em fazer isso.
Mas assim como antes, acreditava que existia amor. Um amor certo, recíproco, um que ela não precisaria afogar todos os dias para que ele não a permitisse fazer loucuras medonhas que sonhava todas as noites em fazer, como aceitar um punhado de migalhas que a outra parte lhe oferecia em troca de algumas horas de felicidade e êxtase completos.
Esse tipo de coisa não existia ali, no meio dela e de Jeon Jungkook.
Ele bagunçou um pouco o cabelo e a encarou com os olhos claramente perdidos, tentando buscar a melhor desculpa que respondesse a pergunta dela.
— Só achei que não valeria a pena — argumentou. — Depois de tudo, , eu pensei que…
— Não é da sua conta — repetiu entredentes, finalmente se colocando de pé.
— Tudo bem, tudo bem, não é — ele se apressou, imitando o movimento. — Sei que o acordo foi para o ralo e sei que tenho agido como um idiota sobre você, que tenho dificuldade em aceitar tudo isso, mas não dá. Eu tentei, e não dá. Não consigo fingir que os últimos dois meses foram um parque de diversões e de repente voltar a te ver da mesma forma que antes. E é claro que você também não consegue — aproximando-se, Jungkook soltou o ar com força ao admitir: — Acha que menti quando disse que sentia sua falta? Acha que eu não penso mais em você? Ou que eu não sinto falta das nossas conversas? Eu sinto, ! Diferente do que você pensa, nem tudo foi baseado no sexo — frisou, gesticulando com os braços. — Inclusive, quando disse que éramos amigos…
— Repita o seu conceito de amigos, Jungkook! — furiosa, deu um passo à frente, assim como tinha se orientado a não fazer, mas ele novamente estava querendo entrar em seu sistema. — Disse que não dorme com seus amigos, não beija eles, não junta as duas coisas como as outras pessoas fariam. Mesmo que tenha aberto milagrosamente uma exceção pra mim, já que tudo isso e mais um pouco continuou acontecendo, não muda nada. Também sinto a sua falta e mudei minhas opiniões sobre você, e tudo isso me faria gostar de ser sua amiga, mas eu quero mais. Eu preciso de mais.
respirou fundo, sentindo o peito estufar e o fôlego lhe abandonando à medida que se via esgotada. Farta de tantas coisas que guardava e que pretendia continuar guardando, mas que ele, com aquelas confissões abaladas, não deixavam.
O mundo de Jungkook estava estremecendo ao redor. De repente, pensou que deveria parar e simplesmente fazer o que devia ter feito antes: ir embora. Mas algum tipo de limite tinha sido atingido ali, e tudo que ela sentia ao olhar no rosto espantado dele no momento era raiva.
— Você não quer ser meu amigo. Também não quer ser o meu mais. Você não faz a menor porra de ideia do que quer, e eu cansei de ficar no meio disso. Você precisa me deixar ir.
Jungkook travou o maxilar, os olhos cravados nela com padecimento.
, me deixa explicar…
— Por favor. Qualquer coisa que você disser agora é uma tentativa de me fazer desistir de seguir em frente. De garantir que eu vou cair na sua cama independente de quantos encontros eu participe. Pior: na sua cabeça, Jaehyun é intimidante porque já tem uma história comigo, e isso pode me blindar contra você. É isso que tá acontecendo ou você só está preocupado que eu conte do nosso verão? Porque eu não vou…
— Caralho, não é nada disso! Qual é,
— Nós não somos mais amigos — pontuou, dando um passo para trás assim que ele se achegou novamente. Todo o seu corpo tremia discretamente com as palavras brutais. Tremia antecipadamente com o que estava prestes a falar: — Se é de um ponto final definitivo que você precisa, aqui está ele: não somos mais amigos. Até você decidir o que realmente sente por mim e me dizer isso, não quero mais te ver, Jungkook. Não quero falar com você. Não quero suas dúvidas ou sua curiosidade sobre o que eu ando fazendo ou as pessoas que ando saindo, não quero sua interferência a sós ou em público em nada que eu não peça. Vamos acabar com isso agora pra que tudo não volte a ser como antes. Por favor.
Agora as borboletas tinham morrido de vez. Foram atingidas por uma bomba nuclear, uma imitação do bombardeio de Pearl Harbor. E o estrondo se estendeu para todos os cantos do corpo, inclusive em seu coração.
Um impacto violento e impetuoso. Algo tão forte que roubou o movimento de suas pernas.
E naquele momento, naquele mísero momento em especial, ele soube o que sentia por ela. Na verdade, soube como era impossível que não sentisse. Aquela coisa feroz e tempestuosa que ele vomitou por 3 anos intitulando de amor. Aquilo que o deixava à mercê da loucura e da felicidade ao mesmo tempo, que o deixava com sintomas físicos de dor, que tomava todos os órgãos sensoriais e os programava para responderem imediatamente à menor aproximação da pessoa, responderem na forma de mãos geladas, garganta seca, falta de fôlego e todos os sinais que ele ignorou por tanto tempo.
Só uma coisa dessas podia deixá-lo daquele jeito.
Só uma coisa dessas quebraria o coração de Jeon Jungkook.
E só tinha o poder de fazer isso agora.
Parecia uma piada. Não, piada não.
Parecia karma.
Quem imaginaria que fosse quebrar o coração de Jeon Jungkook.
Atordoado, ele tentou abrir a boca para falar, mas parecia segurar outra explosão. Outra explosão que seria engatilhada pela voz dele, por quaisquer tentativas de mais desculpas. E ele não se sentia intelectualmente pronto para dizer ou revelar alguma coisa, porque era impossível que ela fosse deixá-lo terminar uma frase.
— Entendi — a voz dele saiu em um sussurro, o sangue queimando de desespero nas veias. Ele sabia que estava implorando por alguma coisa em seus olhos quando olhava para ela; mas não correspondia a um terço disso. — Eu não… não quis te chatear. Me desculpa. Eu juro… — quando soltou a respiração e fez menção de caminhar, Jungkook tocou em seu pulso para fazê-la parar. — Não, por favor, fica aqui. Eu que comecei, eu que vou embora. Não vou mais te incomodar. Prometo. — A última palavra saiu incrustada de pesar e, desse jeito, não havia mais nenhuma razão para ficar ali. Os cacos quebrados estavam se quebrando de novo. Espalhando-se em mil pedaços. Deus do céu, a sensação era tão horrível quanto se lembrava. Jungkook achou que saberia lidar tranquilamente com um próximo coração partido quando estivesse disposto a isso – talvez aos 35 anos. Talvez mais.
Mas até aquele momento, soube que um coração poderia se partir de inúmeras formas diferentes. E que a dor nunca era a mesma.
Desorientado, ele começou a caminhar para a porta, sufocado até os ossos, vivenciando um par de pulmões já muito castigados que foram se atrofiando e colapsando, mas parou de repente e se virou para ela de perfil, crendo que seria a última vez que falaria aquilo:
, eu só… Você merece ser feliz. Ser muito feliz — declarou, tentando manter o eminente ataque de pânico sob controle. — Da maneira que bem entender. Vou torcer por isso.
E pensou em dizer mais alguma coisa, mas seria injusto. Seria injusto jogar aquela pancada de sentimentos nela agora, quando teve inúmeras chances não aproveitadas. Quando ela estava a um passo de ser feliz de verdade. Porque era Jaehyun.
E ele era Jungkook. E existia um abismo enorme entre as duas pessoas, uma lista imensa de prós e contras que gerariam um resultado previsível no final.
Fugindo da tortura dos olhos turvos de , Jungkook apressou o passo para fora, passando por aquele corredor estreito sem vê-lo de verdade, apertando o tecido da camiseta no tórax inconscientemente, como se rezasse pela primeira vez na vida para que aquilo não fosse verdade. Estava ficando tarde, o dia tinha sido cansativo, e estar com remexia com toda a sua lógica, mas a cada passo que dava para mais longe dela, sentia aquela veracidade explodir e explodir a cada minuto, a cada segundo, emanando dele junto com o oxigênio, tomando-o por inteiro, desde o último fio de cabelo até a ponta dos pés.
Merda. Mil vezes merda!
Isso não podia estar acontecendo…
— Ei, ei! — a voz de Nitro surgiu junto com seu braço em seu cotovelo, fazendo-o parar antes que deixasse o estabelecimento. Ele nem percebeu que estava saindo. Parecia tão desnorteado como um homem bêbado. — Mas o que foi que aconteceu? Aquilo foram gritos?
Jungkook engoliu em seco e não respondeu. Em vez disso, andou até o balcão mal iluminado e começou a puxar os envelopes.
— O que foi que você fez? — Nitro perguntou, com a voz arrastada. Não de acusação, mas de tédio. De “lá vamos nós de novo”.
Jungkook fechou os olhos com força e achou que estava louco, porque sentiu um bolo quente na garganta querendo subir e gritar. Gritar aquela verdade para o mundo, gritar para Nitro, gritar para a cidade que… Que…
Meu Deus!
— Estraguei tudo — ele murmurou em um timbre que quase não se ouviu, pegando o primeiro envelope com as fotos de Bam. No segundo, apenas puxou a primeira foto e remexeu nos bolsos até achar aquele cartão, aquele mísero cartão que morava entre os seus jeans, esperando a oportunidade para ser usado, oportunidades que existiram mas que ele tinha estragado todas elas. Por fim, o rapaz se virou para Nitro e tinha um olhar tão carregado que o homem não precisou perguntar nada. Já tinha entendido. Era o nível do elo estabelecido com o garoto há anos atrás. — Dá isso pra ela, por favor. É a última chance que eu tenho de entregar — ele apontou para o segundo envelope no balcão. Nitro abriu e fechou a boca.
— Garoto…
— Tchau, Nitro.
E ele saiu no momento seguinte, escapando para o conforto da escuridão da rua, fugindo para o silêncio privativo da Mercedes, desejando que existisse algum lugar da cidade que fosse profundo e distante o bastante para que ele pudesse se esconder pelos próximos dias. Meses. Se martirizar o suficiente até que estivesse pronto novamente para voltar à superfície.
Mas Jungkook percebeu que era exatamente onde estava naquele momento: na superfície. Que esse tempo todo estivera debaixo d’água, nadando contra a maré, escapando da terra firme, sendo o personagem principal de uma deturpação empírica da sociedade: ele estava fugindo da praia. Porque achava que amar era desafios, loucura sem norte, apostar com falhas alheias, resistir à condições extremas, era se meter no mar aberto sem bote, era afundar e afundar e afundar até que se sentisse íntimo do mar e aprender a lidar com toda aquela vastidão, ainda que fosse um pouco desconfortável.
Mas quem afundava, morria. Se perdia. E muitas vezes, não achava o caminho de volta. Não voltava a ser a pessoa que era quando tinha os pés firmes na areia.
Levou menos de cinco minutos para que grunhisse alto e socasse o volante com certa violência. Um só. Para doer, para que sentisse. Tanto tempo embaixo d’água tinha deixado-o desorientado, prejudicado. A luz do Sol embaçou sua visão. O oxigênio era estranho. Todas as coisas simples que o fizeram ser quem era tinham ficado na ilha, e tudo que ele era agora era apenas… partes do oceano. Partes de outras pessoas. Expectativas adquiridas. Uma forja de conveniência.
Em algum momento daquele ano, tudo aquilo começou a ligeiramente incomodá-lo. As coisas erradas se tornaram claras primeiro como um vento forte que mudava a correnteza para a ilha, e depois como uma âncora se desintegrando dentro dele mesmo, forçando seu corpo a voltar, a retornar, a se lembrar, a aceitar e perdoar, e tantas outras coisas que ele mal se tocava à medida que ia acontecendo.
Talvez a infidelidade de Ali tenha mudado tudo. Alterou a percepção de Jungkook, deixando-o frustrado por se ver como alguém insuficiente por quem mais amava, gerando o impulso que o forçou a olhar para trás. Ou melhor: para cima.
E aquilo que explodiu dentro dele no Covil… aquilo explicava tudo. Minha nossa, como ele lidaria com aquilo? Todos os seus medos e senso de preservação que manteve com não serviram de nada; não foram mais fortes do que a verdade, uma verdade que parecia inevitável desde o início, a resposta para todas as dúvidas que teve desde que aquilo começou.
Jungkook experimentou o desespero e a euforia na mesma intensidade. Todas as coisas ficaram grandes demais, iluminadas demais, maravilhosas e terríveis à medida que parou de lutar contra a corrente e inspirou o ar do fato:
Estava completamente
Fodidamente,
Profundamente,
Musicalmente,
Intimamente,
Emocionalmente,
Desesperadamente,
Apaixonado por .
, que o enxergava de verdade.
, que era tão pouco surpreendida.
, que tinha sonhos e planos tão bonitos quanto ela.
, que olhava para o mundo com poesia.
, que o encorajava a não se esconder.
, que vencera passado e presente com força e determinação.
, que tirou a armadura para mostrá-lo um sorriso lindo e encantador.
, que era inteligente e atrapalhada.
, que não tentava ser perfeita.
, que não tinha medo de errar.
, que guardava segredos e medos.
, que tinha uma opinião sobre quase tudo.
, que era valente e esperta.
, que não gostava de raios, mas gostava da galáxia.
, que relaxava com as mesmas músicas que ele relaxa.
, que era talentosa e linda pra caralho.
, que era uma pessoa de verdade.
. . .
Que tinha invadido seu coração da mesma forma que invadia camarins.
Que tinha puxado-o para a superfície.
E agora tinha acabado de perdê-la pra sempre.


"Esta casa é um circo, frenética pra caralho
No entanto, temos a tendência de ver isso como uma vantagem
﹝...﹞
As memórias deles são falsas
E a última coisa que eles querem é que este sentimento acabe
﹝...﹞
Quanto mais você abre a sua boca, mais você força o desempenho
E toda essa atenção está fazendo eu me sentir importante (sendo muito chato, sendo muito chato agora)
Agora que estamos aqui, nós podemos muito bem ir mais longe
﹝...﹞
Observando de forma desinteressada os rostos na fila
E estamos lutando com a noção de que isso é a vida, não filme."

🖤🎤 This House is a Circus


Unhas compridas pintadas de preto se afundaram com delicadeza nos fios de cabelo de Jungkook.
Fios agora curtos e delgados, quase raspados nas laterais, deixando à mostra além do conjunto de brincos novos, o novo piercing de metal atravessando a cartilagem da orelha em transversal. Também havia um novo na sobrancelha e no canto do lábio, e Polyc quase o tinha convencido a colocar um nos mamilos, mas Jungkook conseguiu negar a ideia de merda e trocar por uma tatuagem. Pequena e discreta, a mais discreta que já tinha feito, marcada na costela direita.
Era uma palavra. Apenas uma palavra desenhada em letra cursiva, escondida por trás de um rabisco grosso que formava um X em cima dela, escondendo-a parcialmente, o que fez Polyc entoar um severo e ríspido “tem certeza?” para o garoto, que não fez muita questão de explicar o pedido.
Mas em relação ao piercing no mamilo, Jungkook não precisava se preocupar de não tê-los colocado. Estava diante de um par deles muito brilhantes e bonitos, com bolinhas dos dois lados do metal, tal qual ele tinha colocado na sobrancelha. E enfeitavam um par de peitos mais lindos ainda; cheios, redondos e empinados, igual a bunda e as pernas perfeitas da garota de cabelo azul, que cintilava na luz amarelada daquele quarto de hotel.
Descobrir qual hotel era a parte difícil. Jungkook só sabia que era alto e com muito vidro. As paredes eram praticamente feitas de janelas, e Seul inteira brilhava lá embaixo, enquanto ali dentro ele assistia apenas o reluzir do metal nos mamilos da garota que pousava os pés na cama e caminhava até ele com gracejo, recostado na cabeceira da king size, enxergando-a através da fumaça de um baseado qualquer.
Nossa, ela parecia estar se aproximando dele há horas. Tudo estava tão devagar. Era muito mais gostosa pessoalmente do que deixou transparecer naquelas fotos que Jimin enviou, mas ainda estava de calcinha, e ele sentia o pau se animar gradativamente dentro da calça jeans, mas… Ainda estava de calça jeans.
Já tinham tido um primeiro round e estavam aguardando o próximo? Ou nada tinha acontecido ainda?
— Adivinha o que tem no frigobar — ela deu uma risadinha sugestiva até flexionar os joelhos e se agachar para sentar em seu colo, puxando um bastãozinho avermelhado de algum lugar das costas. — Tcharam!
Jungkook apertou os olhos para enxergar. Quando estendeu a mão para ver melhor, riu um pouco mais alto.
— Então você curte essas coisas — ele levantou uma sobrancelha maliciosa, devolvendo o tubo do lubrificante. A garota, com o mesmo sorriso, deu de ombros.
— Você não?
— Tenho pouquíssimas proibições quando o assunto é trepar, Siyeon.
— Quem diria que seríamos tão parecidos? — ela sorriu abertamente e pareceu se mexer ainda mais em cima dele. Jungkook soltou uma expiração forte, encarando aqueles mamilos duros como um convite, descendo os olhos para a calcinha de renda tão transparente e tão alinhada com a cintura, mostrando-o a porta de entrada para o fim de sua abstinência, para um mundo novo, um mundo do qual ele estava precisando mais do que nunca.
O rapaz levantou o dedo livre para acariciar a barra do tecido, apreciando a pele macia e perfumada, desejando acabar logo com aquilo e meter a língua ali, ou, como ela parecia tão apressada, ir direto para o lubrificante e fazer tanto ele quanto ela muito feliz àquela noite.
Notando o interesse, Siyeon baixou o tronco até o pescoço dele, que naquela noite em especial exalava a essência de loção de barba, álcool e erva. Um odor muito fino e muito leve de fruta atingiu as narinas dela quando beijou e mordiscou a curva de sua clavícula, descendo atenciosamente para o peito nu, passando pelas costelas e pela nova tatuagem, prosseguindo até a barriga e o umbigo, mirando no destino inevitável do meio de suas pernas, o ponto exato que o renderia um potente relaxamento, mais até do que a maconha.
Jungkook recostou a cabeça para trás e fechou os olhos. A boca dela raspou com a língua com agilidade. As unhas acariciaram seu pau por cima do jeans. O desgraçado se animou, mas era exatamente o que queria. A descida foi maravilhosa e contínua. Os lábios dela estavam mexendo com a sua percepção igual à erva, igual às 15 garrafas de Heineken que tinha tomado antes dali, igual aos acordes de Piledriver Waltz que ele tinha insistido que tocasse em algum aparelho de som daquele quarto chique. Estava tudo encaminhado, perfeito. Logo mais, ele estaria no paraíso.
Só que ao abrir os olhos e encarar o teto, um pouco rodopiante, Jungkook mal percebeu quando deixou escapar um grunhido sonolento que parecia:
— Você é… muito gostosa… que horas são?
Siyeon interrompeu o trajeto e ergueu o queixo, ainda totalmente empinada na direção de sua ereção.
— Tá com pressa? — outro lampejo de malícia escapou daquela voz sedutora. Jungkook riu pelo nariz e balançou a cabeça, atordoado.
— Longe disso. Eu só quero… — a boca abriu e fechou três vezes até que ele desistisse da linha de raciocínio. — Quer saber, deixa pra lá. Podemos continuar da onde-
— Ainda são 8 horas. Temos muita diversão pela frente — ela passou uma língua atraente nos lábios rosados e voltou a abaixar a cabeça e seguir com os beijos, empinando-se mais ainda, demonstrando uma surpreendente flexibilidade, encarnando qualquer tipo de fantasia que Jungkook desejasse.
Aceitando isso, ele voltou a encarar o teto e se concentrar na boca, que se aproximava ainda mais do objetivo. 8 horas. 8 horas da… Sexta-feira?
Era sexta-feira.
Sexta-feira.
A concentração durou menos de 2 minutos. Se ela alcançasse seu zíper e o abocanhasse do jeito que ele tinha certeza que seria abocanhado, ele não teria mais como fazer o que queria fazer. O que precisava fazer. Por uma questão de sanidade.
— Espera, um minuto — Jungkook ergueu as costas repentinamente e, com a força de um único braço, envolveu a cintura da garota até tirá-la de cima de seu colo. Siyeon enrugou a testa pela interrupção abrupta, e o viu passar a língua pelos lábios antes de descartar a guimba em um cinzeiro e se virar para ela. — Preciso te pedir uma coisa.
O sorriso da garota era lascivo como um animal selvagem.
— Claro, gatinho. O que você quiser.



— Deixa eu ver se entendi — Siyeon, agora com as sobrancelhas franzidas de uma forma um tanto desconfortável, tentou rir casualmente. — Você quer que eu te beije?
— Não, eu não quero — respondeu Jungkook prontamente.
— Mas achei que tinha dito…
— Eu não quero que você me beije, mas eu preciso que faça isso.
A garota levantou uma sobrancelha.
— Você precisa?
— Exatamente.
— Mas achei que você não beijava na boca — retrucou ela, com um risinho, desta vez mais tenso que o outro. — Pelo menos é o que todo mundo diz…
E estava na cara que agora estava se perguntando se tinha sido enganada sobre o verdadeiro desempenho de Jeon Jungkook, ou se ele era um pouco maluco antes do sexo – ou apenas quando estava chapado daquele jeito.
Ele apoiou os cotovelos nas coxas, passando uma mão pelo rosto.
— É verdade, eu não beijo.
— Então por que…
— Mas eu acho que fui enfeitiçado e você pode me ajudar a me libertar.
Siyeon piscou os olhos, imóvel.
Ok, ele era um pouco maluco. Gostoso de morrer, sexy e bem dotado, mas com certeza um pouco doido.
— Quanto você bebeu? — perguntou ela, com cautela. A questão era válida, oras. Só fazia 1 hora e meia que tinha recebido a ligação dele, e jurou que poderia ser um trote, já que tinha falado com Jimin que o queria desde a festa de Candice Chaperman, e Park Jimin não costumava mentir quando dizia “vou dar o seu número pra ele”, e normalmente os caras que tinham o seu telefone o usavam, mas Jeon Jungkook… estava um pouco atrasado, mas repetindo: era um gostoso de morrer.
No entanto, as coisas estavam começando a se desencaminhar quando ele abriu um sorrisinho embriagado sem mostrar os dentes e suspirou forte ao responder:
— Menos do que eu gostaria. Muito menos. Porque estou olhando pra você e ainda estou vendo ela…
Siyeon soltou um “ah”, e revirou os olhos imediatamente.
Claro. Era isso.
— Acho que saquei, gatinho — ela suspirou e acariciou as mãos dele no colo. — Tá apaixonado, não é?
Jungkook encarou as unhas pintadas raspando em seus dedos, concordando com a cabeça distraidamente.
— É. É isso mesmo — sussurrou, sentindo a pontada aguda de dor irradiando no peito com a constatação do fato. De repente, ele precisava de mais álcool. — Deviam chamar essa droga de mal do século, junto com a depressão.
Ele estendeu o braço para puxar a guimba de volta, junto com o isqueiro. Naquele momento, muitas coisas ficaram claras para Siyeon, que sempre tinha sido observadora demais para o próprio bem, mas que era um talento e tanto para se aproveitar das situações – e também se safar delas.
No caso de Jungkook, ele estava chapado e embriagado desde o momento em que se encontraram, e não seria um problema se o garoto tivesse deixado que ela o chupasse devidamente, mas agora que tinha captado o motivo daquilo, Siyeon foi tomada apenas por um sentimento perto da compaixão.
— E por que não está com ela agora? — perguntou, ainda que provavelmente fosse tocar numa ferida.
O maknae riu com certo sarcasmo, mas que não escondeu a tristeza.
— Porque ela está com outro — a resposta era simples e dolorosa. Fez Siyeon esboçar uma careta. — Já deve estar no carro dele, indo pra algum restaurante caro em Gangnam e se preparando para se beijarem depois disso, quem sabe até… enfim — ele balançou a cabeça e desviou os olhos para o chão. — Acho que a ideia de treparem nem é a que mais me perturba, por mais louco que isso pareça. É o beijo. O beijo, Siyeon — Jungkook voltou a encará-la, agora com um pouco de agonia — Nunca fiquei tão perturbado por causa de um beijo. E talvez eu só… precise de outro para desfazer esse efeito, entende? Trazer minha vida normal de volta.
— Sua vida normal não incluía beijos, se lembra?
— Sim. Mas também não incluía trepar e me apaixonar por uma garota que eu detestava, então quem se importa? — ele deu de ombros pelo fato. Siyeon pareceu ligeiramente surpresa. — Assim que eu beijar você, vou me lembrar do porque não faço isso e voltar a ser o cara desprezível que vai te dar a melhor foda da sua vida, bem nessa cama, com todos os tubos de lubrificante que você quiser.
Ele a encarou firmemente com a promessa. A garota não demonstrou o quanto aquele olhar e a voz dele combinados causaram uma avalanche quente dentro da sua barriga; indiscutivelmente, queria tudo e mais um pouco que Jeon Jungkook pudesse oferecer. Chegar ao topo com ele, validar aquele voto implícito.
— E o que acontece se me beijar e imaginar ela? — retrucou, provocativa. Jungkook deixou de sorrir. — Vamos ficar nessa de beijos pela noite inteira? Sem problemas para mim, gatinho, eu gosto de beijar. E esse seu piercing me dá muita curiosidade — ela levantou os dedos para tocar na joia metálica que contornava seu lábio delicadamente. — Mas talvez seja um pouco difícil pra você. E então, vai imaginá-la?
Ele engoliu em seco e tentou novamente dar um sorriso convincente de indiferença, por mais que pedir para que desconhecidas o beijassem passasse bem longe disso.
— Não, não vou.
— Ótimo. Isso também não seria um problema pra mim, sou muito bem resolvida. Mas se você está apaixonado e tudo mais, esse beijo poderia atrapalhar um pouco a parte da foda selvagem que você prometeu e criar um certo clima de amorzinho. E não sei se enfiar seu belo instrumento no meu rabo combina muito com isso.
Jungkook esbravejou em uma risada alta, estremecendo o próprio colchão, e Siyeon igualmente se deixou rir porque… Bem, ninguém nunca tinha dito que ele ficava tão bonito sorrindo. Eram só relatos de erotismo, línguas e tapas, nada mais.
— Eu discordo um pouco de você — disse ele, balançando ligeiramente a cabeça em negação. Siyeon levantou os ombros.
— Tanto faz, não entendo nada de romance. Então… — com um suspiro, ela se aproximou do rapaz com as mãos em prontidão nos dois lados de seu rosto, e sentiu Jungkook trincar os músculos da face instantaneamente. — Posso?
Ele hesitou por instante, repensando a proposta, mas agora já estava no alto da escada. Já tinha chegado até ali. O que lhe restava?
— Vá em frente.
E Siyeon se aproximou devagar de sua boca, alternando o olhar entre seu lábio inferior e os olhos hesitantes, procurando um último indício de aquilo ser uma grande brincadeira. Mas o rapaz continuou imóvel, talvez tenso demais, porém sem sair ou afastá-la. Então, tomando como uma afirmação, ela finalmente selou seus lábios em um impacto leve, macio e vigoroso.
Na mesma hora, Jungkook fechou bem os olhos, concentrando a mente no presente a todo custo, o que não foi difícil no início, já que aquele era um beijo novo de qualquer forma. Quando abriu a boca para deixar que Siyeon a explorasse, pôde ver que ela tinha transformado o ato de enroscar em algo bem diferente do que ele estava acostumado. A língua era furiosa, porém unidirecional, insistindo tanto no mesmo movimento que ele próprio tomou a liberdade de tirar as mãos do colchão e envolver a cintura dela com força para puxá-la para perto, levando a outra para trás de sua nuca e finalmente fazendo-a virar a cabeça para o outro lado e orientar aquela língua do jeito certo.
Ironicamente, pareceu que era exatamente o que ela estava esperando: que ele mostrasse. Que tomasse as rédeas. A ideia de controle era muito sedutora para Jeon Jungkook, e assumia esse papel sem nenhum problema, mas daí ele se lembrava daquela noite em que tinha deixado uma garota na porta de casa e estava pronto para ir pra sua quando teve o casaco agarrado e um beijo roubado por uma boca igualmente desorientada, porém totalmente determinada. Ousada, valente. Uma garota que já o teve de todas as formas possíveis, mas que se preocupava com um mísero beijo na boca.
Um beijo que ele não teve controle.
E pronto, já estava pensando nela de novo. Lembrando do dia do casaco, do dia da janela da suíte, dos dias aleatórios em que ele só quis beijá-la, sem tomar coragem para tal. Pensar nesses beijos era bom e fulminante. Sem estar sóbrio era pior ainda; a ilusão quase ganhava vida. Agarrando com mais força o cabelo de Siyeon, Jungkook aprofundou sua boca na dela, o oxigênio, aperto, os movimentos eficientes da cabeça, tudo que ele gostaria de estar fazendo com a garota que roubou seu coração.
Mas a ilusão teve facilmente um prazo de validade quando Jungkook decidiu abrir minimamente os olhos e enxergou outro rosto ao invés daquele na sua imaginação.
Devagar, o rapaz se afastou, puxando pernas e braços para si novamente e chegando com cautela para trás, desviando os olhos para o carpete. Em torno do aposento, tudo que se ouvia era a respiração ofegante de Siyeon, que estava imóvel naquela posição estranha, a cabeça meio tombada para o lado, os olhos piscando freneticamente como se acordasse de um sono profundo.
Quando voltou a olhá-la, ela se ajeitou rapidamente no lugar, limpando a garganta com um certo constrangimento. Minha nossa, o que tinha sido aquilo? Nunca na vida alguém a tinha beijado daquele jeito.
— E então? — ela perguntou quando se recuperou, ainda sentindo as articulações fracas ardendo em chamas e os mamilos tão duros como pedra. Eles estavam muito bem expostos para que Jungkook notasse a mesma coisa. No entanto, seu sorrisinho e o tom de voz soaram tão comuns quanto possível quando respondeu:
— Foi… bom.
— Eu concordo — Siyeon sorriu ainda mais. Parecia ter perdido um pouco da pose de empoderamento quando se inclinou para mais perto dele, os olhos brilhando como velas acesas. — Foi muito bom. Precisa de outro para se certificar?
— Na verdade — Jungkook se afastou ainda mais quando ela literalmente avançou. Antigamente, ele reagiria com risadas e deboche pela garota ter adquirido a doce ilusão de que poderia beijá-lo quando bem entendesse; coisa que jamais aconteceria. Não se ela não fosse sua namorada, e não se não fosse . — Preciso te pedir outra coisa.
— O que foi?
— Desculpa — em um segundo, ele já estava de pé, subindo o zíper semi desfeito da calça e procurando seus outros pertences de forma desengonçada. — Eu preciso ir.



caminhou pelo quarto, esfregando as mãos nervosamente. Poderia parecer que estava se aquecendo ou apenas planejando o que pegar primeiro diante do mar de caixinhas pequenas e médias, cheias de jóias reluzentes que Candice havia despejado em seu colchão, ou se preparando para escolher qual dos sapatos combinaria melhor com todo aquele brilho. Essa parte era fácil – ela com certeza escolheria o com os saltos menores, não importava se Barack Obama estivesse na mesa.
Mas diante daquele espelho ainda quebrado do cômodo, não conseguia se preocupar tanto com as jóias ou os sapatos. Elas fariam diferença, sim, mas era naquele vestido que seus olhos se fixavam, hora ou outra, encontrando coisas há muito esquecidas naquele tecido verde claro, um passado que a chamava não com maldade, mas com um lembrete.
Você fica tão bem de azul, seu pai havia dito há muitos e muitos anos atrás, quando levou para comprar o seu primeiro vestido para um evento da escola. Você fica bem em qualquer cor, , corrigiu ele, mas azul é a cor que te destaca. É a cor da sua aura. Espero que os momentos mais belos da sua vida aconteçam quando você estiver usando azul.
Uma risadinha melancólica escapou de seu nariz. Aquela afirmação era coisa de adulto para criança – fatos que não eram totalmente verdade, mas que os mais velhos deixavam para que você descobrisse por conta própria, com a vida e o futuro. nunca se deu ao luxo de ficar pensando em cores favoritas e momentos favoritos, mas bem… Aquele verde combinava com aquele outro verde da festa de Jeno. O verde que havia sido inundado por vermelho de sangria e foi visto por Jaehyun sem julgamento. Era uma coisa simbólica, por mais brega que fosse. Ela amava azul, mas o verde a procurou primeiro – o verde que ela teve a ousadia de escolher naquela loja, ignorando todos os outros tons de anil no ambiente, e principalmente os que não tinham tom, como o maldito preto.
Olhando agora, ele parecia adequado o suficiente para seja lá onde Jaehyun a levaria. Na verdade, não era capaz de encontrar nada com a denominação de adequado quando se tratava de Jeong Jaehyun. Com ele, as coisas pareciam beirar à perfeição. Livre de erros e inconveniências, ou escolhas equivocadas sobre encontros. A noite inteira à sua frente era um borrão imprevisível, e ela só esperava que ele não desse uma de Park Seo Joon e soltasse fogos bem em cima da cabeça deles.
Ainda descalça, deu uma última voltinha no espelho e ajeitou as alças finas do vestido. Batia logo acima do joelho, revestido de um tule transparente por cima de um forro, e brilhava um pouco debaixo daquela luz. O braço direito completamente exposto revelava a tatuagem colorida que até combinava um pouco com a roupa, e com as jóias que tinha escolhido, exibia uma beleza estonteante. Parecia uma princesa. Com saltos e tudo.
— Puta merda — o rosto espantado de Candice surgiu logo atrás, ultrapassando o batente da porta com pulinhos animados. — Você tá tão, mas tão linda! Se me perguntarem, fui eu que te arrumei.
— Você não teve participação dessa vez, Chaperman — estreitou os olhos com divertimento, e Candice espalmou uma mão no ar e estalou a língua.
— Besteira, eu disse que o verde estava ótimo. E você conseguiu até mesmo comprar sapatos. Vou acender uma vela de gratidão hoje à noite — a loira suspirou e se abaixou aos pés da cama, puxando um calçado de cada par para cima. — E então, já escolheu? Qual deles você acha melhor?
Parecia estranho que Candice estivesse perguntando ao invés de ordenando com qual dos sapatos Lizia iria ter que ir, mas era compreensível. Até ela estava vendo que aquele não era qualquer encontro. Não era com qualquer pessoa.
Por mais que isso soasse como uma pressão absurda que não deveria existir.
cruzou os braços, avaliando as duas opções com uma tediosa cautela.
— Aquele dali. Tem cara de que não vai me deixar cair na primeira escadaria — ela apontou para o da esquerda, e Candice encarou a escolha por um minuto longo até assentir e guardar o outro.
— É isso. Branco e verde são uma ótima combinação. E com aqueles brincos — a mulher caminhou até o montante de brilho e pegou um par para , um par de brincos de prata reluzentes com detalhes em dourado. — Coloque eles que vou escolher o colar. E a pulseira, você ainda não colocou nenhuma? Vê se pode. Ainda faltam muitos detalhes, você não v…
revirou os olhos e segurou uma risada enquanto se virava novamente para o espelho e desatarraxava os brincos, inclinando-se para mais perto para enxergar o furo e colocar o primeiro.
Nesse breve movimento, seus olhos captaram outra coisa jogada no tampo da escrivaninha, assumindo um papel de penteadeira naquela noite. Em meio à escovas de cabelo, mudas de roupa, maquiagem e acessórios variados, enxergou o cartão em retangular em branco e laranja quase sufocado pelo caos, levando-a de volta a todos os questionamentos e pensamentos infortúnios que estava tendo durante todo aquele dia, até que tivesse de se preocupar com a urgência de seu tão esperado encontro.
Ela passou o brinco da mão esquerda para a direita e puxou o cartão. Doutor Park Sung Chul. Psicólogo. O elemento encontrado dentro do envelope de papel pardo que Nitro havia feito questão de entregá-la no dia anterior quando saiu afoita do Covil, com uma necessidade brusca de ir pra casa e chorar até de manhã. Nem perguntou nada a ele. Não tinha aberto aquele envelope até a hora do almoço. Basicamente, tinha se esquecido de sua existência assim que saiu do táxi e entrou no apartamento 402. Esqueceu de tudo que precisava fazer porque chorar pareceu mais urgente.
E chorou. Chorou tanto como quando perdeu o pai, há quase 11 anos atrás. Chorou como se Jungkook, ao sair daquela sala em sua pose imponente logo após reconhecer que era um desgraçado, tivesse roubado e levado seu coração junto com ele – o que o tornava um desgraçado ao quadrado. Porque ter o coração arrancado doía. Doía muito. Doeu tanto que não conseguiu raciocinar mais pelo resto da noite, e na manhã seguinte não passava de uma funcionária e uma amiga tão inútil quanto uma porta. O verão era insosso e sem graça. Parecia que choveria de novo. Parecia que a chuva jamais iria desaparecer.
A borda das fotografias reveladas escapava do envelope logo abaixo do cartão. A menos evidente mostrava ela e uma concentração etérea nos apetrechos rústicos do Covil, o maior acervo de antiguidades que já tinha visto e que a deixava com um sorriso no rosto só por se lembrar. Aquele encontro tinha sido bom. Tinha sido um sonho. E vestia azul.
Mas em evidência, logo em cima, estando bem visível por baixo da luminária, a foto dele em preto e branco ainda era difícil de olhar. Ou melhor: difícil de parar de olhar. Ele era um retrato magnético de beleza. Ali de pé ao lado da vitrola, com suas roupas escuras e botas de combate feitas sob medida, atingiam o coração de com tantas coisas de uma vez que era difícil definir apenas um sentimento. Ele era tão lindo. Lindo e cheio de segredos. Cheio de medos, dúvidas, vícios e egoísmo. Cheio de travas, como ela. Cheio de coisas que não conseguia dizer. Igual a ela.
O pensamento a fez olhar para o cartão de novo. Um psicólogo não parecia uma má ideia. Nunca tinha feito parte de nenhuma ideia de , para falar a verdade, mas Candice tinha feito terapia uma vez depois do relacionamento tóxico e horrível com o cara do Porsche e estava ali, feliz da vida, exalando autoconfiança e namorando um cara tão incrível quanto ela. O maior medo de Candice quando recebeu alta foi ter uma recaída e se envolver com um pobretão que morava em um trailer e tinha ficha na polícia, mas caras assim nem chegavam perto de Candice Chaperman. Ela era intimidante o bastante para afastar não só eles, mas todos os outros.
Talvez pudesse tentar. Talvez fosse um meio para o fim que tanto queria: se libertar de Jeon Jungkook. Essa sim era uma boa ideia. Era a única ideia que precisava.
! — Candice a advertiu em um sonoro alto, e os ombros de pularam de susto. — O que você tá olhando? Já são quase 8 horas. É indelicado se atrasar.
juntou as fotos e o cartão dentro do envelope em um jato, voltando à realidade com um murmúrio na garganta. Queria dizer que as horas não a incomodavam, já que só precisava terminar de colocar aqueles brincos e prender os sapatos nos pés, mas Candice procuraria coisas para ajeitar antes que pudesse sair do quarto, como a maquiagem e o perfume, alegando que ela precisava estar perfeita.
Perfeita. Perfeita.
Por que ninguém dizia que ela precisava ser apenas ?
Seu cérebro respondeu: “Não se sinta pressionada a usar nada elegante demais. Você fica linda de qualquer jeito.”
A raiva misturada com desespero voltou imediatamente. Cala a boca, cérebro! Ela iria ficar perfeita sim, mesmo que fosse cansativo. Iria ser a garota mais linda e elegante de Seul, se isso se encaixava nessa denominação. Fingiria a noite inteira que estava acostumada com isso, se precisasse. Encarnaria a para o Jaehyun como bem mandava o figurino se isso a fizesse voltar ao ponto de partida de toda aquela loucura e a desse um norte novamente. Aquela sem passado, sem preferências exóticas, sem opiniões diferentes, sem vergonha ou timidez e que não gostava de misturas estranhas de comida.
para Jeong Jaehyun. Garota perfeita. A garota que iria prová-la que ela poderia ter mais.
— Tá legal, do que mais eu preciso? — se voltou para Candice, o coração martelando no peito com uma repentina ansiedade. — Me deixe perfeita.
Candice abriu um sorriso de uma orelha à outra e deu um gritinho de animação, prontíssima para falar pelos cotovelos. deixou que ela falasse. Deixou que ela agisse. Deixou aquela ideia se espalhar por todo o seu cérebro e todo o seu ser para que estivesse bastante reforçada quando descesse daquele elevador direto para o carro dele, indo para seja lá onde caras perfeitos levavam garotas em um encontro perfeito.
Mas quando Candice agarrou em seus ombros e a virou de frente para o espelho, toda a sua convicção estremeceu quando a amiga falou, em um tom muito natural e amoroso:
— Você já é perfeita.



Tigelas escuras e copos de água estavam reunidos em grupos na vastidão da mesa retangular do restaurante Privilege Rooftop.
nunca tinha ouvido falar daquele lugar e, pensando bem, por que ouviria? Nunca fez parte de suas intenções selecionar uma roupa bonita para caminhar pomposamente até um elevador de vidro e subir até o 17º andar para comer macarrão a uma queda de 25 metros.
Seria melhor se aquele revestimento não fosse de vidro, porque assim ela não olharia para a imensidão escura com tanta facilidade. Por Deus, era alto demais. Sofisticado demais. Os pés doíam por dentro dos sapatos de salto, o que a deixou com raiva, porque não fazia parte das expectativas. Eles não a deixariam cair, mas isso estava custando caro, muito caro.
Se lembrou outra vez do que Jungkook havia dito sobre ternos italianos, comida italiana e seja lá o que fosse. tinha decidido por pura revolta não acatar aqueles conselhos. Mas agora que já estava ali…
O desgraçado estava totalmente certo. Sobre tudo.
Quando serviram o primeiro prato, tentou se concentrar nas dezenas de garfos sobre a mesa, tentando se lembrar das dicas de etiqueta de Candice. A única coisa que tinha gravado era o garfo da salada, e não havia salada. Olhou para Jaehyun, sentado do outro lado com um sorriso solene e lindo, e depois para o próprio garçom, que fazia contato visual apenas com a comida servida. Tentou até mesmo olhar para o chão, de mármore negro e polido, adornado de faixas trêmulas coloridas que desenhavam padrões no chão de um jeito vertiginoso. Outro tipo de decoração moderna que era definitivamente horrorosa.
— Isso é spaghetti carbonara — Jaehyun falou, tentando amenizar o silêncio sepulcral de , que parecia um pouco assustada com o capricho exacerbado em algo que viraria bolo fecal no intestino. — É um clássico.
olhou dele para o prato. Spaghetti era uma palavra familiar, mas a imagem que se formava em sua cabeça sobre o significado era muito diferente daquele enrolamento de massa única no meio de um prato gigante, junto de algo que se parecia muito com o talo de uma planta meio queimada, coberto com pontinhos escuros que se pareciam cinzas.
— Tenho certeza que sim — respondeu ela, um pouco atrapalhada. Tomou os talheres com delicadeza, tentando se lembrar de suas funções enquanto seu acompanhante agarrava uma taça de vinho que certamente não era desse século.
Aproveitando aquele mísero momento de descontração em que enrolava um pouco da massa no corpo do garfo e provava a iguaria, Jaehyun se permitiu olhá-la diretamente.
Ela estava absolutamente linda. Em uma das trapeiras estreitas no teto — um tipo de engenharia e arquitetura que imitava uma clarabóia —, a luz da Lua brilhava forte para dentro do restaurante, e escolher uma mesa bem ao lado dos vidros altos com vista para a cidade, que deixava a iluminação por conta de outros elementos externos a não ser lâmpadas, tinha sido um ótimo negócio, porque o vestido dela brilhava junto. Reluzia, cintilava. Desde que ela tinha entrado em seu carro há 40 minutos atrás e sorrido quando lhe deu um boa noite, Jaehyun precisava se controlar para não ficar o tempo inteiro olhando para ela.
E pela postura, não fazia ideia disso. Mal devia ter se olhado em um espelho de corpo inteiro. Caso tivesse feito, o estaria olhando com um pouco mais de confiança, admitindo que estava, sim, puramente deslumbrante, não se movendo de uma forma tão desajeitada como estava.
Depois de 5 minutos em que ela esteve diligentemente mexendo na própria comida, Jaehyun mordeu o lábio em nervosismo e sugeriu:
— Pode pedir outro prato caso não tenha gostado desse.
Ela levantou a cabeça em um susto, ficando encabulada no mesmo momento.
— Não, não é nada disso que…
— Tá tudo bem, . Eu devia ter perguntado.
É, talvez sim. Mas esse não era nem de perto o problema principal. O problema era estar notando esses problemas. Antigamente, não importava o que Jaehyun apontasse em um cardápio qualquer e mandasse servir em uma mesa, ela comeria com um sorriso no rosto, independentemente se fosse Sundae[1]. Afinal, não queria dar motivos para parecer minimamente incompatível com ele.
Mas pensar assim estava sendo cansativo. Agir assim estava sendo cansativo. E percebeu que tinha desaprendido bruscamente a fingir como antes.
No entanto, aquilo ainda era comida e ela ainda estava em um lugar que provavelmente não poderia pagar nem por um pãozinho sírio. E, claro, ainda estava em um encontro.
— É macarrão. Não tem segredo — respondeu ela com um sorrisinho, enrolando mais um montante de massa no garfo.
— Não mesmo. Mas descobri uma curiosidade sobre esse especificamente antes de vir pra cá. Sabia que essa massa é um artesanato preparado ao ar livre numa cidade da Itália chamada Gragnano, onde eles literalmente sovam e cortam esses filetes de massa e penduram em varais no centro para que fiquem expostos ao vento que vem direto do mar? Eles chamam essa brisa de Le Mistral, ela vem da direção de Provence e durante a fermentação… — Jaehyun parou ao ver o olhar minimamente surpreso de , e como esperado, o constrangimento tomou conta de suas bochechas. — Desculpa, é uma bomba de informação aleatória. Acho que estou um pouco nervoso.
sorriu um pouco. Saber os fatos do processo por trás de um prato de quase 500 dólares nunca foi seu objetivo, mas aquilo foi… Fofo. Inesperadamente fofo.
— Tudo bem, já é muito bom saber que não tô comendo fezes de caramujo.
— É bem gostoso, inclusive — ele salientou com inocência, e não se segurou para olhá-lo com choque. Em seguida, ele já estava rindo, balançando a cabeça. — Brincadeira, eu jamais faria isso com você.
— Obrigada — disse aliviada, e se permitiu rir pela primeira vez na noite, autorizando-se a ficar um pouco feliz por ter de abortar a missão de voltar para casa à meia noite, como tinha dito à Candice que faria.
Uma nova onda de silêncio tomou à mesa à medida que ia se acostumando com o gosto forte e diferente do macarrão – ela se certificou de afastar todas as azeitonas pretas e o excesso do molho verde que era tão amargo quanto uma oliva inteira no prato –, enquanto Jaehyun, do outro lado, comia um prato que ela nunca tentaria gravar o nome, mas visualmente se parecia com uma sopa pálida misturada com alguns filetes de carne. Saber qual a carne era demais para . Mas, se já não estava tão maluca, jurou ter visto ganchos compridos de polvo saltando para fora daquela piscina.
Que bom que ele pensou que ela também não estava pronta para aquilo.
Na metade da refeição, ela não sabia mais o que acrescentar. A presença dele por si só nunca tinha sido um incômodo ou minimamente desconfortável, mas os dois costumavam ter trocas significativas de palavras. Às vezes até mesmo palavras em uníssono, fazendo se ver, pela primeira vez, como uma pessoa que queria falar e falar muito com alguém que não fosse Candice.
Será que o peso de um vestido bonito, um lugar caro, fru-frus italianos e a palavra encontro mudavam tanto assim as coisas? Isso não estava certo. Não era para ser assim.
Não foi assim no seu primeiro encontro. Mesmo que ele tenha sido um test drive.
Quando se agachou brevemente para examinar as tiras dos sapatos apertados de couro, que tinham um desnecessário bico pontudo, soube que precisava fazer algo. Precisava inclinar aquele rascunho de catástrofe em direção ao encontro que tinha sonhado meses atrás, para a que tinha moldado no verão, que tinha o objetivo de chegar a aquele momento. Mas antes que pudesse abrir a boca, ouviu a voz dele dizendo:
— Eu assisti àquele filme que você indicou.
piscou os olhos e franziu o cenho.
— Qual filme?
— A dos anões. Na verdade, os hobbits. Mark odeia que eu os chame de anões — ele fez um barulho engraçado com a boca. continuou encarando, tentando se lembrar de quando havia indicado qualquer filme para ele. — A história é interessante, com todas aquelas batalhas, monstros, espadas, arcos e aquele bicho esquisito que não parava de falar “meu precioso”. Me lembrou um pouco o Dobby de Harry Potter, obcecado pelo dono. É divertido pensar em como eles chegaram nos elfos sem nenhum poder especial… — Jaehyun levantou os ombros, e piscou os olhos, atenta, segurando um riso. — Quero dizer, nunca fui muito chegado em obras de aventura e fantasia, mas essa foi muito legal. Mais sensata que a maioria, se eu posso chamar assim. Os valores pessoais foram bem definidos, eles fizeram uma boa jornada de amizade. Mesmo que aquelas árvores falantes fossem bem chatas.
Ele riu, achando o tópico engraçado. fez a mesma coisa, porque imaginar Jaehyun na frente de uma tela assistindo algo como a batalha de Dagorlad ao invés de um lindo diálogo de Before Sunrise, era no mínimo hilário.
agora se lembrava exatamente do dia em que tinha dito a frase “Como assim você nunca assistiu Senhor dos Aneis?
Já fazia um tempo que ela estava religiosamente assistindo aos filmes dele, ou fingindo que os assistia, assim como fingia que gostava, porque era o que Jungkook dizia para fazer e estava totalmente certo nisso. La La Land? Check. Sociedade dos Poetas Mortos? Check. Interstellar? Check. Diário de Uma Paixão? Check com muito custo. Jaehyun não escondia seu apreço por romance com um toque de aprendizado, e no meio de tantas conveniências forçadas, ela achou que poderia, pelo menos uma vez, ser sincera com ele sobre o que ela gostava. Uma vez.
E, bom, ela gostava dos hobbits atrapalhados – não anões! – que saíram em uma jornada alucinante para destruir um anel do mal em uma montanha assustadora e aprenderam o valor da amizade. Uma epopeia cheia de orcs, elfos e batalhas, nada de romance, nada de dogmas virtuosos para a vida, nada encontrado em livros de auto ajuda.
Ela trocou um olhar com ele sobre o jantar e abriu um sorrisinho sincero, feliz por ele ter sido aberto pelo menos para ver o filme.
Ela deu de ombros e o perguntou:
— Não existem árvores chatas falantes em nenhum dos seus indicados ao Oscar?
— O Jar Jar Binks de Star Wars vale por toda aquela floresta em questão de importunação. Eu juro.
riu alto, puxando a taça do vinho.
— Você não assistiu Senhor dos Anéis, mas sim Star Wars? Não é muito aventureiro pra você?
— São os filmes favoritos do Sebastian. Pelo menos quando ele tinha 8 anos e ainda não queria salvar o jazz.
franziu o cenho por um momento, o olhar com uma dúvida encabulada.
— Sebastian. Ryan Gosling. La La Land — Jaehyun respondeu à pergunta não dita, e fez um som de “é mesmo”. — Em uma parte alternativa do roteiro, diz que ele acendeu uma vela e ficou dizendo para o escuro o quanto queria ir visitar o espaço pra procurar outra Estrela da Morte, porque ainda existiam desgraçados do Império vivos e ele os queria bem longe de qualquer corpo estelar da nossa galáxia. Isso me fez pensar em como a gente já quis ser coisas tão impossíveis de uma forma tão racional. Quer dizer, racional para uma criança de 8 anos — ele emitiu outra risada, bem gostosa e um pouco pasma desta vez, recostando-se confortavelmente na cadeira. — Uma vez, fui fazer um projeto social com os caras em uma escolinha de baixa renda no interior de Daegu e uma das crianças disse que queria ser um caminhão quando crescesse. Um caminhão — ele semicerrou os olhos, e balançou os ombros com uma risada por trás da taça. — Eu juro. A gente esperava astronautas, freiras, policiais, pilotos de rally ou coisa assim, e ganhamos um caminhão. Isso que dá ficarem passando Transformers nos intervalos.
largou os talheres, recostando-se como ele, ainda rindo.
— As histórias de fantasia são muito legais na visão das crianças — ela deu de ombros, como se aquilo explicasse tudo. — Não estão preocupados com coisas que existem.
— Tem um monte de coisas usadas nas histórias de fantasia que existem. Estações do ano, horas, dias e noites… — estreitou os olhos em sua direção com o deboche. Jaehyun riu. — É sério. Amor e amizade. Os sentimentos. Inclusive, amor racional existe e é o que eu espero encontrar em um universo mais preocupado com salvar o mundo do que de unir casais, mas Aragorn e Arwen podiam ter se esforçado melhor para passar essa imagem. Essa coisa de “vou te amar pra sempre” é linda, mas funciona melhor na Los Angeles de Mia e Sebastian do que nas florestas da Terra Média. Inclusive, tem uma cena em que eles…
segurou um suspiro forte no fundo da garganta, pensando automaticamente: “lá vamos nós de novo”. Deus do céu, ele era lindo, inteligente, mais culto do que se deixava mostrar e muito agradável, exatamente como ela pensou que seria, mas pela misericórdia, ele gostava tanto assim daquele filme?
E gostava tanto assim de falar sobre amor?
Ela localizou a segunda taça de água com limão e bebeu um gole. Refletiu um pouco sobre o que aquilo queria dizer, mas não tanto. Não se lembrava de ter conversas anteriores com Jaehyun sobre amor para usar de comparação naquele momento, mas daí se lembrou de que não falava sobre amor com ninguém. Nem sabia que era um assunto a ser dissecado com tanta matemática daquele jeito.
Amor não era só amor?
— A sequência de O Hobbit também teve alguns sets em Los Angeles — ela remexeu no macarrão com um sorriso tímido. — Sempre tive a curiosidade de saber como fizeram um dragão na ponta do Verdugo Peak. Digo, é o que me fizeram acreditar. Quando descobri que o dragão era Benedict Cumberbatch cheio de pontos no rosto em um fundo verde, não quis mais saber sobre os bastidores de filme nenhum — puxou a taça do vinho, esperando se distrair de mais uma tentativa de parecer despojada quando estava o completo oposto disso. Pelo menos ele riu. — Como estava por lá, inclusive? Se divertiu?
O sorriso bem articulado foi ofuscado por uma sombra, e Jaehyun baixou os olhos para o vinho, concentrando-se na taça de cristal até murmurar:
— Não fui lá pra me divertir.
Ora essa.
— Ah. Uma pena — respondeu com sinceridade. Não era sua intenção querer tocar em um possível assunto que geraria desconforto como fotos dele com outra garota na cidade dos anjos, já que a carga do tópico era diferente tanto para ele quanto para ela e não pretendia fazer perguntas sobre o caso. Mas de acordo com a expressão que ele tentava disfarçar, evitar o assunto era a melhor opção. — A praia de Paradise Cove é ótima. Lembro que estavam fazendo umas reformas nos quiosques locais porque parece que a vigilância sanitária flagrou alguns casos sérios de tratamento negligenciado das lagostas à venda. Foi o que li na CNN, pelo menos.
Antes que ela começasse a tagarelar para preencher o silêncio constrangedor, Jaehyun riu, completamente espontâneo.
— Você sente falta de lá?
— Não exatamente. Da cidade não muito, o verão daqui conseguiu se superar. Da praia, talvez — suspirou, categorizando a imagem do mar quente e transparente na mente com a certeza de que não conseguiria explicá-lo se tentasse. — Ainda não fui a nenhuma praia daqui, então não tenho com o que comparar.
— Ainda não foi nas praias daqui? — Jaehyun ergueu uma sobrancelha. balançou a cabeça em negação. — Bom, você não tá perdendo muita coisa. Água salgada, areia quente, pedras na costa, tudo a mesma coisa. Só vai encontrar pessoas de jeans e sem interesse de pegar sol, mas de resto, é o esperado.
Jaehyun sorriu com diversão ao dizer tudo que disse, e esperaria retribuir aquele sorriso porque, afinal, ele não estava totalmente errado. Mas…
Bem, aquela não era a resposta que esperava.
— É claro… Deve ser — erguendo a taça novamente, desviou os olhos para outro ponto da mesa, engolindo sua pontinha de frustração junto com o álcool.
Jaehyun se inclinou novamente sobre o prato, remexendo em sua sopa até perguntar:
— Você lê… outros tipos de notícias? De Los Angeles, no caso.
— Quer saber se acompanho a revista? — ela riu nasalado e sacudiu a cabeça. — Não. Candice olha de vez em quando a sessão de cosméticos porque ainda não aceita que Ramira tenha ficado com esse cargo, mas é só isso. Não acho que tenha algo de interessante para ver lá.
Algo de interessante para mim, ela pensou em completar. Só se fosse para julgar os ângulos dos flagras dos novos paparazzis. Imaginar quem os estava ensinando alguma coisa ou se foram jogados no asfalto quente de Hollywood sem a menor orientação. Era a cara de James fazer uma coisa dessas, mas depois de todo o dinheiro que havia ganhado naquele mês, poderia ter pelo menos comprado câmeras novas. Existiam modelos mais compactos e discretos no mercado se você fosse ficar escondido atrás de uma palmeira por uma tarde inteira na frente do estúdio da Universal.
torceu para que o segurança mais velho continuasse dando cafezinhos às escondidas para as pobres almas com risco de insolação que só queriam ganhar um trocado para um sanduíche. E claro, pagar o aluguel.
Pensando nisso agora, se deu conta de que mantinha um carinho estranho e infundado por sua antiga vida na Califórnia, como se estivesse tudo bem não expôr essa parte como um troféu, mas reconhecer que ela não teria durado 2 meses no exterior sem aquele emprego.
— É claro… — Jaehyun agora sorriu menos do que nas outras vezes, e olhou para rapidamente antes de baixar o rosto para a comida, agora cada vez mais intocada e bem menos apetitosa. Ele mordeu os lábios uma, duas e três vezes, como se estivesse absorvendo um controle interno para não fazer ou dizer algo. — Eu… Passei por lá. Nessa viagem.
parou com o dedo prestes a tocar na taça, e ficou na mesma posição inerte por um minuto inteiro antes de murmurar um:
— Ah. — Ela assentiu, umedecendo os lábios. — Você estava curioso ou foi só…
— Não, eu fui até lá. Foi intencional.
A testa de foi se enrugando gradativamente à medida que ele levantava o rosto e a encarava com convicção. No fundo, ela esperava que ele dissesse que a fachada estava mais bonita graças à uma reforma de ponta de James. No máximo, que dissesse que a empresa parecia bem. Mas aquilo…
— Como foi até lá?
— Eu dirigi do Texas para Los Angeles até lá. Levou quase 3 dias e sei que parece estranho, mas… Eu não estava sozinho, eu… — ele se embolou destrambelhadamente, enquanto ainda parecia estar esperando a frase “é uma brincadeira, até parece que eu iria à LA Parker”, mas o que ele disse, após engolir em seco duas vezes e bufar, foi: — Eu estava com a Ali.
Na cabeça de , a boca de Jaehyun se mexeu em câmera lenta. Ela o ouviu dizer a palavra Ali e se calar, mas ainda continuou parada, imóvel, esperando que ele completasse o restante, porque só podia ser um mal entendido.
— Ali? — Ela perguntou depois do que pareceu uma eternidade. — Ali Dalphin?
O nome da modelo saiu depois de uma busca minuciosa das possibilidades que o cérebro de apresentou, e ainda assim, esperava que Jaehyun não confirmasse. Mas o pequeno aceno de sua cabeça não era algo que podia ser confundido.
— Isso, Ali Dalphin.
— Mas… O quê? Como ela está? E por que? — se viu com os ombros rígidos e ao mesmo tempo moles quando deixou as costas desabarem novamente na cadeira, tentando controlar os olhos arregalando-se a cada segundo. — Ah, Deus, não me diga que vocês…
— Não. Não, de jeito nenhum — Jaehyun rapidamente inclinou o tronco para mais perto do meio da mesa, falando de um jeito firme. — Eu jamais faria isso, . Não depois de toda aquela confusão, e não quando ela é ex namorada de um dos meus melhores amigos. Jamais faria isso com ele.
sentiu um bolo no estômago. O bolo característico quando o nome ou até mesmo a sombra de Jungkook era mencionada ao seu redor. No entanto, o peso da revelação de Jaehyun conseguiu fazer não pensar nisso.
— Mas então… Quer dizer que naquela foto…
— É. Era ela. Tingiu o cabelo de vermelho — ele suspirou levemente, falando mais baixo em seguida. — Ninguém sabe. Só eu e você.
achou uma enorme maluquice ser uma das únicas pessoas que soubesse da nova cor de cabelo de Ali Dalphin, mas aquela informação perto de tudo que Jaehyun tinha dito…
De qualquer maneira, não existia um único traço naquele rosto firme que denunciasse alguma mentira. Era a boa e velha honestidade inata de Jeong Jaehyun.
— Por que tá me contando isso? — a voz dela saiu mais baixa que o normal, recuperando-se do choque. Jaehyun levou uma das mãos para trás da cabeça, puxando um tufo de cabelos, e claramente estava se perguntando qual era o próximo passo depois de abrir a boca.
— Porque… Eu quero ser sincero com você — respondeu ele pouco tempo depois, apoiando os antebraços na mesa. — Existiu um motivo pra que eu não falasse com você por todo esse tempo e ele foi… Bem, ele foi a Ali.
— Não tô entendendo — falou rápido. As sobrancelhas estavam unidas no meio da testa, e seus ombros ainda continuavam tão rígidos quanto a borda daquela taça. Tensos, curiosos. Por mais que uma onda de nervosismo a comunicava que não gostaria de saber o restante da história.
Jaehyun ponderou por um minuto antes de respirar fundo e dizer:
— A Ali me procurou em Chicago. Sei que não foi porque somos amigos e nem nada disso, até porque nunca tivemos uma relação nada perto de próxima nos últimos 3 anos, mas ela sabia que eu estava junto com o Jungkook em New York em março. No dia do VMA, no dia de toda a confusão das fotos. E era isso que ela queria… O nome da paparazzi.
Ao ouvi-lo, teve certeza de que realmente não queria saber a verdade.
O ar faltou por um segundo, e ela agradeceu por estar sentada em um assento muito confortável e muito seguro.
— Ah… — foi a única palavra inteira que conseguiu murmurar. Jaehyun umedeceu os lábios, agora um pouco mais agitado.
— Ela disse que queria ir na revista, queria procurar a responsável pessoalmente, estava totalmente… Fora de si. De um jeito que eu tenho certeza que não era o normal dela.
— Ela está procurando por mim — sussurrou, aérea, como se as palavras de Jaehyun não estivessem conseguindo chegar até ela. Já tinha imaginado aqueles cenários um milhão de vezes, o contexto em que Ali descobria sobre ela e fizesse uso de qualquer um dos milhares de poderes que teria para fazer alguma coisa com . Ela não tinha certeza do que exatamente seria essa coisa, mas com certeza não era apenas quebrar a sua câmera novinha.
A imagem agora pálida de fez ambas as pernas e braços de Jaehyun formigarem, e ele imediatamente se viu arrastando a cadeira para mais perto dela, ainda que tecnicamente isso nem fosse permitido em um restaurante de renome. não o viu chegando, mas sentiu quando as mãos quentes e macias dele tomaram as suas, e a voz agora perto da dela.
— Ela estava, . Olha pra mim — ele tocou em seu ombro, e virou a cabeça inteira pra ele. — Ali estava procurando por você. Não mais. Eu poderia deixá-la ir sozinha e fazer o escândalo que quisesse pra voltar de mãos vazias, mas a ideia de que ela poderia não voltar de mãos vazias… Me apavorou. Me apavorou como o inferno porque se ela descobrisse seu nome, se por acaso algum daqueles babacas abrisse a boca…
— Eu sei. Eu imagino — ela deu uma risadinha triste pelo nariz. Jaehyun assentiu.
— Eu não quis imaginar. Não quis esperar pra ver. Então eu fui junto — explicou, gesticulando com a mão livre, agitada, que não sabia se tocava na dela ou se apenas extravasava loucamente pelo ar — Torcendo pra que não desse certo. Torcendo pra que eu pudesse fazer alguma coisa, caso desse.
se viu balançando a cabeça e encarando os olhos castanhos e aturdidos daquele cara que estava dizendo coisas muito reveladoras e muito chocantes, mas… Eram coisas reveladoras que ele tinha feito por ela. E , naquele momento ainda de choque, não perceberia isso na hora, e ainda não estava desejando tanto ainda estar apaixonada por ele como desejaria mais tarde.
O que estava sentindo naquela hora não tinha nome, mas lidar com a iminência de toda aquela confusão ser possivelmente desenterrada? Medo poderia servir por enquanto.
— E se eu ainda estou aqui, com meu emprego e minha dignidade intactos, quer dizer que ela não conseguiu?
Jaehyun balançou a cabeça em um não enfático, e finalmente havia chegado o momento em que seus ombros pareceram relaxar e o pulmão voltou a funcionar, deixando-o finalmente ajustar a postura ereta e soltar ligeiramente a mão de sobre o colo.
— James deu todos os créditos das fotos dos dois para Hilary — disse com uma careta, como se estivesse denominando-a internamente da mesma forma que tinha denominado uma vez: aquele filhote do demônio. — A garota que te sabotou.
Mas , ao invés de responder um “aleluia” ou algo mais aliviado, se viu agora virando o tronco todo para ele e arfando:
— O quê? Ele entregou Hilary? De bandeja?
— Acho que foi por uma questão de orgulho. De exibir um troféu. Aquelas fotos deram muito dinheiro pra eles, muito mesmo. Só de chegar no hall de entrada dá pra saber.
— Mas… E a Hilary? O que aconteceu? — estava quase pegando nas abotoaduras de seu pulso, tamanho era seu rebuliço mental. — O que Ali fez?
— Ela não fez nada, — Jaehyun quase deu uma risadinha. Não era possível que ela estivesse preocupada com as ações da maluca da Victoria Secrets ao invés de estar dando pulos de alegria. — Fiquei até pensando que caso ela soubesse que era você… Bom, ia ser um choque e ela poderia se sentir traída, mas Ali estava agindo com a cabeça quente, como eu imaginei. Ela queria o passado de volta, mas não sabia por onde começar. Achou que tendo essa pequena vingança na mão, seria uma boa moeda de troca pelo coração de Jungkook de volta, depois de tudo que aconteceu.
Uma onda de gelo vinda do mais profundo metro quadrado do oceano encheu e diminuiu drasticamente o sangue quente de , que foi tomada por um novo tipo de palidez.
— O coração de Jungkook? — não foi mais do que um sussurro. Jaehyun não reparou grandes mudanças na sua expressão; apenas balançou a cabeça em concordância.
— Ela ainda é louca por ele. Cega de paixão, se estava disposta a toda essa dor de cabeça — ele estalou a língua, como se tudo não passasse de um grande absurdo ridículo. — E por mais que ele esteja sorrindo de novo, compondo de novo e sendo o mesmo Jungkook de sempre, tenho certeza que ele não esqueceu ela. Só guardou em algum lugar. Percebi isso quando o vi desde que cheguei. Acho que ele tá apaixonado. Ainda. Me recuso a acreditar que ele não sinta a mesma coisa — continuou dizendo, e não viu as pálpebras de se agitarem minimamente enquanto seu rosto permanecia parado. Imóvel. — O que aqueles dois tiveram, eu duvido que ele vá ter de novo com alguém. E se Ali deixasse de ser covarde e explicasse a ele com sinceridade, tenho certeza de que a história deles poderia recomeçar. Que os dois poderiam ser felizes de novo.
Poderiam recomeçar.
Poderiam ser felizes de novo.
Ah, eles poderiam mesmo. Com certeza era o que aconteceria.
E aquilo doía demais. Doía muito. , aos 23 anos naquela noite de agosto no restaurante Privilege ainda não sabia como chamar aquela dor tenebrosa que se parecia muito com ter o coração fervilhando em ácido sulfúrico, mas sabia que algo estava quebrando. Algo que ela nem sabia que ainda estava tentando manter inteiro. Algo verde, feliz e minúsculo que se parecia com esperança.
A esperança estava derretendo e deslizando para longe, a esperança do amor. Não do amor geral, não do amor com outra pessoa, não de um amor que poderia ter com engenheiros, dentistas ou carinhas da cafeteria como Candice havia dito, não o amor que ela não tinha recebido da mãe, não…
O amor que ela teve mais certeza do que nunca que sentia por Jungkook. E as provas declaradas em fatos mostravam que ela nunca seria contemplada pelo amor dele.
— É… Talvez você tenha razão — a voz que saiu dela não parecia dela. De repente, a visão do rosto de Jaehyun se embaçou a um ponto crítico onde ela não conseguia enxergá-lo. Por causa disso, não viu quando os olhos dele se arregalaram e ele arrastou a cadeira para mais perto dela, puxando um guardanapo dentro de um recipiente vazio com pressa.
— Ei, calma, olha pra mim — ele estava próximo ao nível da ponta de seus joelhos roçarem um no outro. Jaehyun deslizou a superfície do pano por debaixo dos olhos de , que percebeu, com horror absoluto, que estava chorando. Chorando daquele jeito patético que não emitia som ou ruído, nem mesmo um soluço. — Tá tudo bem agora. Ali não vai chegar até você, e com certeza não vai chegar perto daquele lugar de novo. Ela vai esquecer e se recuperar e voltar a trabalhar, e é isso. Não vou deixar nada te acontecer, . Não quando você é uma das vítimas da história, quando é tão inocente quanto eles.
puxou o ar pelo nariz, sentindo-se ridícula e desesperada, sentindo como se o mundo inteiro não fosse um lugar legal para se estar vivendo naquele momento e seria bom se tudo aquilo não passasse de um sonho. De um pesadelo. Ninguém queria voltar a ter pesadelos.
Mas ao mesmo tempo, enquanto aceitava o guardanapo de Jaehyun e murmurava um pedido de desculpas pela cena, pausou todo aquele terremoto acontecendo dentro de si, um terremoto que atingia até mesmo a crosta de seu ser, para respirar fundo e agir com normalidade. E quando fez isso, quando tentou esquecer aqueles sentimentos espessos que não eram normais, mas não eram bons… olhou diretamente para Jaehyun, viu seu olhar gentil e um pouco preocupado e de repente se sentiu amada. Acolhida. Grata.
Foi quase como estar apaixonada por ele. Quase.
Porque aquele cara tinha desaparecido e aberto brechas em seu coração, brechas que ela só notou tarde demais, quando já estava deixando que outra pessoa entrasse e assumisse todo o espaço, um espaço que só cabia um. Uma só pessoa.
Aquilo parecia tão injusto naquele momento que não se sentia digna nem para dividir um pudim com Jaehyun.
Com o sangue voltando ao normal nas veias, conseguiu respirar pela boca e tentar abrir um sorrisinho fino e sem graça, limpando a garganta para afastar aquele nó.
— Desculpa. E obrigada. Não sei o que dizer além disso, eu só… Não esperava essa história, e não sei o que aconteceria caso ela…
— Não precisa mais pensar nisso. Já morreu. Ali não vai voltar — Jaehyun afirmou, com a mesma segurança de antes. — Digo, algum dia vai. Para acertar as contas com o Jungkook. Eles merecem um pouco de felicidade depois disso tudo.
E elevando um dedo, Jaehyun acariciou levemente os cantos dos olhos maquiados de , antes que uma lágrima inconveniente caísse.
No entanto, o sorriso que ela conseguiu abrir tinha sido o mais conveniente possível, ainda que rasgasse seu peito em dois.
— É. Claro que merecem.



O espelho retrovisor do conversível refletia a imagem de uma ainda distraída.
Curiosamente, o tempo estava um pouco frio. Não como uma anunciação do inverno, mas como uma sirene do fim do verão. O outono ia chegando mais perto nas primeiras rajadas de vento, e achava um absurdo como aquela noite poderia estar tão fria mesmo após o calor do dia.
Como poderia estar tão frio naquele carro quando ela estava com Jeong Jaehyun?
Ela nem reparou quando ele estacionou no meio fio e desligou a música. O caminho inteiro tinha sido uma troca de palavras pela metade, perguntas curtas com respostas mais curtas ainda. Ela não tocou em nada a não ser o cinto de segurança, e não que houvesse algo a tocar, mas talvez abrir a boca fosse uma boa opção depois de um encontro bom e atencioso. Candice diria que ela estava fazendo as coisas do jeito errado, mas o que poderia fazer? Ainda estava ouvindo a história de Jaehyun, do início ao fim, ressoando nos ouvidos, erguendo-se em 3D na mente, calculando possibilidades e um monte de “e se” para um final alternativo, o que era irônico, porque ela não teve problema nenhum em deixar aquela coisa pra lá nos últimos meses.
No fundo, sabia porque estava pensando tanto nisso. E considerando esse motivo, precisava mais do que nunca erguer a cabeça e se concentrar no presente.
— Chegamos.
A voz de Jaehyun cortou o silêncio como uma faca, e se virou para ele do banco do carona, voltando à realidade.
— Ah… desculpa — ela murmurou, soltando o cinto de segurança automaticamente. A única coisa que havia tocado no carro. Olhando para trás, talvez tenha sido uma das únicas coisas que tocou no encontro inteiro. — Sinto muito pelo recital. Espero poder te recompensar depois.
Jaehyun balançou a cabeça com um mísero sorriso.
— Eles vão se apresentar pelo mês inteiro. Podemos ir em uma próxima.
sorriu fraco. Não conseguia nem pensar em avançar teatro adentro e aguentar 2 horas de uma peça pela qual não sabia de nenhum precedente, por mais que Jaehyun tenha lançado aquela pergunta tão animada: “É uma releitura de La La Land. Nosso musical favorito, lembra?
Ah, Deus. Parecia tudo tão errado.
Ainda assim, ela tentou assentir minimamente e sorriu, porque admitia que tudo não estava perdido. Ela só estava um pouco… chocada. Talvez mais do que isso. Estava decepcionada. Desiludida. Desesperançosa.
E um pouco idiota por isso, porque era sua culpa. Ter nutrido aquela pontinha de esperança mesmo depois de todos os sinais era inteiramente e completamente um tiro certeiro no fracasso.
— Claro. Podemos sim — as palavras rolaram de sua língua sem um pingo de entusiasmo. E tal coisa finalmente ficou evidente para o motorista.
— Você está bem? — Jaehyun perguntou, e logo depois acrescentou: — De verdade agora.
suspirou fraco pelo nariz. A pergunta tinha sido feita no fim do jantar, no caminho para o carro, no momento em que pedia para ir para casa e ele comentava sobre o recital, um espetáculo perto de Itaewon que seria a próxima parada da noite que tinha tudo para ser perfeita, e repetiu a mesma pergunta há 3 esquinas atrás.
Estava cada mais difícil inventar uma expressão convincente.
— Sim. Sim, estou, é só… um tempo, eu acho — seus olhos foram parar direto no porta-luvas, ou outra parte do carro que não deixasse seu sorriso falso tão à mostra. — Fui atingida por uma bomba de fumaça. Só tô esperando ela se dispersar.
tentou rir, mas estava envergonhada demais para isso. Envergonhada e um pouco arrependida, porque não era assim que esperava que as coisas acabassem, não era parada dentro daquele carro com uma atmosfera semi carregada ao lado do cara que estava se esforçando muito para que as coisas dessem certo. Se esforçando há meses!
Jaehyun se empertigou no assento de couro, embalando no silêncio recém estabelecido com as bochechas um pouco vermelhas de constrangimento.
— Me desculpa, eu não devia ter dito nada…
— Não, é claro que você devia ter dito, Jaehyun — balançou a cabeça na mesma hora, voltando-se para ele. — Com certeza devia ter dito. Todas as informações que deu, do início ao fim — principalmente na parte em que deixa claro o óbvio que não quis enxergar: eu e Jungkook não temos chance nenhuma, pensou ela, engolindo ar e o restante dos pensamentos. — Principalmente porque… foi muito, muito legal o que você fez. Mesmo que de um jeito tão peculiar, como desaparecer e não mandar mais e-mails.
Um sorrisinho cativante achou liberdade para despontar na boca de . Jaehyun automaticamente relaxou, e não era nada difícil sorrir quando ela estava sorrindo.
— Eu não tinha desaparecido de verdade — ele estreitou os olhos com sarcasmo. assentiu, descontraída, e ergueu um dos braços para ajeitar as madeixas de cabelo que escapavam do nó que as prendia em um penteado atrás da cabeça.
— É verdade, eu via suas fotos depois de cada show. Era a única prova que você não tinha sido abduzido por aliens.
Jaehyun ergueu uma sobrancelha, e a risada que emitiu parecia despachar aquele clima terrível para longe antes que se transformasse em um tornado.
— Aliens? É outra dessas coisas de fantasia que você quer que eu veja?
O Oitavo Passageiro, 1979. É ótimo, sem romance, sem amizade, sem qualquer sentimento feliz, já que um monstro toma o corpo de uma tripulação inteira e vai matando um por um até restar o único sobrevivente. Você tem coragem?
— Sério? Nenhuma lição de moral no final? Nenhum ensinamento filosófico sobre a importância da confiança e nem nada?
— Temo que não.
Os dois esperaram apenas dois segundos e meio para gargalhar, completamente espontâneos de um jeito que não tinham sido durante toda a noite. chamaria aquele momento, mais tarde, como a virada de chave de tudo que planejava com Jaehyun naquele encontro, se é que estava planejando algo, mas a risada dele e as sobrancelhas extremamente desalinhadas enquanto balbuciava um “essa foi ótima” deixou sentir o que achou que deveria sentir desde que o viu pela primeira vez:
Atraída. Motivada.
E foi por isso que, à medida que as gargalhadas iam diminuindo e os dois mantinham os olhos um no outro, não disse mais nada. Apenas se inclinou para frente e o beijou.
Se não estivesse tão maluca, ela podia jurar que ele tinha se inclinado na mesma hora.
O beijo foi confuso no início, um impacto de bocas que não sabiam para onde estavam indo, mas que logo acharam um caminho pra seguir. Jaehyun soltou o ar forte pelo nariz e tentou se aproximar, resmungando um palavrão baixinho quando notou que ainda estava refém do cinto de segurança. Com uma mão livre, ele o desprendeu em um segundo e voltou a tomar , mais forte dessa vez, fazendo-a finalmente se lembrar do porque tinha feito isso antes no camarim daquela premiação.
O beijo dele era taticamente delicioso. O movimento de sua língua contornava trajetos quase científicos, propositalmente para adentrar na sua imaginação e fazer você ficar desesperada com uma pergunta peculiar, tipo: “como deve ser esse beijo em outro lugar do meu corpo?
E as mãos dele faziam um trabalho profissional ao pegar em sua cintura, e não se conteve ao usar os dentes em seus lábios, o que parecia deixar Jaehyun ainda mais agitado, e transformava aquele minúsculo compartimento do carro em uma lata de sardinha, uma que estava prestes a explodir porque ela estava particularmente começando a pegar fogo.
Quando , totalmente envolvida na atmosfera de tesão daquele beijo, moveu um braço para baixo em direção ao cinto da calça social, onde ela nem precisava olhar para verificar como ele estava duro, Jaehyun se afastou de sua boca em 1 milímetro para tomar fôlego e tentar dizer:
— Espera. Você… — a tentativa durou menos do que esperava, porque ele sentiu a ponta da unha dela roçando por cima de sua calça e… Ah. Isso. Era isso mesmo.
O toque só serviu para dissipar qualquer autocontrole que Jaehyun ainda tivesse, deixando que a mente apagasse ao passo que tomava o rosto dela com firmeza e a beijava com força, inconscientemente erguendo o corpo em sua direção, sem parar pra analisar o quanto era impossível fazer qualquer movimento brusco porque ainda estava em um carro, e ainda estavam no meio da rua, e todas essas coisas que deveriam ser corrigidas primeiro antes que fizessem o que queriam muito fazer.
No meio de um beijo desesperado e quente, onde tinha a boca muito bem explorada pela de Jaehyun, e a cintura recebendo um aperto tão forte de seus dedos que com certeza deixaria marca, o corpo dele tentava de novo se aproximar, agindo por conta própria, sem levar em consideração qualquer elemento externo, e talvez por isso tenha se desequilibrado pateticamente sobre o volante e acionado a buzina no centro, que soou como o som do apocalipse.
Jaehyun foi o único a se sobressaltar, afastando o rosto de o máximo que as mãos dela em volta de sua cabeça permitiram. A garota permaneceu com os lábios próximos, como se a buzina tivesse acontecido do outro lado da cidade.
. Eu preciso… — ele tentou de novo, e desta vez sentiu os lábios dela na curva de seu pescoço, e toda a tentativa de ser racional ia descendo pelo ralo. Deus do céu, o que era essa mulher? Ela não o deixava pensar em outra coisa que não fosse arrancar as roupas dentro de um carro, coisa que ele jamais faria porque estavam no meio da rua e isso não era nada romântico. Nada nobre, nada cortês.
— Hmm? — murmurou dentro de sua boca, e aquele som transtornou a mente de Jaehyun e o fez ter que segurar um gemido na garganta, ou qualquer outra palavra que ele normalmente não dizia ainda estando vestido, palavras que eram cunhadas por algum guia de kamasutra e que ele nunca tinha pensado em como faziam sentido.
— Preciso te perguntar… — ele disse em meio à respiração ofegante, e em meio aos beijos agora de volta para a boca dela, parando vez ou outra pela carga de desejo que não o deixava pensar direito. — … se é muito cedo… pra dizer que trouxe um vinho… e se você não quer…
— Quero — agora respondeu imediatamente, dando uma pausa nos beijos para olhá-lo nos olhos, e graças à canadense futura senhora Min, tinha arrancado aquele batom no banheiro chique antes de ir embora do restaurante. — Um vinho parece ótimo.
— Ótimo. Isso — Jaehyun disse em um tom quase sério, ainda que estivesse tentando voltar à órbita do planeta, ainda que estivesse completamente desorientado. — Candice não vai se importar? Ela está em casa?
Foi quando , ainda envolvida naquela gama de tesão e adrenalina, se tocou do que estava acontecendo.
Ou melhor: do que estava prestes a acontecer.
Uma sensação de déjà vu tomou seu corpo por completo, e ela se afastou de Jaehyun imediatamente enquanto dizia um enfático:
— Não!
Ele enrugou a testa, e não parecia que estava respondendo à sua pergunta. Ela muito menos. Só que de repente as coisas cresceram em sua frente na forma de uma parede grossa e impenetrável, e foi totalmente louco como ela se tocou de que ele estava pedindo para subir.
E Jaehyun não podia subir. Não, de jeito nenhum.
Ela balançou a cabeça finalmente, tentando dar uma risadinha sem graça.
— Quero dizer, ela não se importaria, até porque nem deve estar em casa, mas… Mas…
Mas você não pode subir!
Jaehyun continuou parado, e viu naquele olhar aquela mesma reação de quanto estiveram na mesma situação há meses atrás: as bochechas dele corando, o rosto virando para o forro do carro enquanto tentava se manter passivo diante da implícita rejeição de .
— Você não quer que eu suba? Tudo bem se você não…
— Não, não é isso — interrompeu, e Deus, aquilo era uma tortura. Ela não o estava rejeitando! Não era a mesma ali, de 2 meses atrás, naquele banco do carona. Não era a mesma medrosa que não queria travar na hora H porque tinha tirado a roupa pra um cara uma vez na vida. Não era a mesma que não sabia bem por onde começar. Não era.
Mas aquele apartamento também não era o mesmo daquela época, principalmente seu quarto, e principalmente sua cama. Eles já tinham sido invadidos, tomados, marcados em cada metro quadrado pelo aroma de cranberry que não saía nem com toda a limpeza diária do mundo. Porque o cheiro não estava na mobília. Não estava nas paredes. Não estava nos lençóis.
Ele só estava.
E não, de jeito nenhum ela faria isso consigo mesma e muito menos com Jaehyun.
Mas precisava pensar em uma desculpa. Ele já estava olhando pra ela pelo que pareceu 45 minutos, e Jaehyun certamente estava pronto para se desculpar por qualquer coisa que possa ter feito, mas juntou ar suficiente nos pulmões e conseguiu dizer:
— É que… Não tenho taças de vinho.
Ele pareceu confuso.
— Quê?
— Não tenho taças pro tipo de vinho caro que tenho certeza que você comprou, e não limpei a casa, e… — parou, tendo mais certeza do que nunca de que mentir era uma habilidade que não podia colocar no seu currículo. Abriu e fechou a boca algumas vezes, pensando no que complementar, mas fala sério, essas coisas importavam? Os dois queriam a mesma coisa. Então, desistindo da atuação, ela tocou no antebraço dele, onde a pele pálida deixava à mostra aquele conjunto de veias, e disse com o tom de voz mais baixo e abafado do que antes. — E tenho certeza que você deve ter taças melhores.
A voz teve o efeito esperado em Jaehyun, que suspirou com um certo alívio e logo acariciou a mão de por cima de seu braço, os olhos pegando fogo como um espelho do que a própria garota sentia.
— É, eu tenho taças. Muitas taças.
— Então o que estamos esperando?
Ajeitando-se no banco imediatamente, Jaehyun voltou a puxar o cinto com apenas uma mão e pisou no acelerador.
[1]salsicha de intestino de porco com intestino de vaca, comida típica da Coreia do Sul.


"E a onda me levou à sua boca
E me levou de volta à sua calmaria
São eles quem me colocam de volta à lembrança
Que o único oceano é o seu
(o único oceano é o seu)
No qual eu quero balançar
(o único oceano é o seu)
No qual eu quero permanecer."

🖤🎤 Potion Approaching


A batida lenta e suave de alguma música do The Neighbourhood tocava incessantemente no cérebro de enquanto ela se perdia nos braços de Jaehyun.
Da calçada silenciosa até a porta cinzenta de fechadura eletrônica no 10° andar, ela registrou todos os passos dentro da cabeça. Ele parou o carro dentro de um estacionamento subterrâneo, puxou o freio de mão como um louco e voltou a beijá-la até se lembrar que precisavam sair. Antes de chegarem ao elevador no mesmo andar, voltaram a fazer a mesma coisa. E lá dentro também. E quando saíram para o corredor largo, cheio de portas com números escritos em cima, um dos braços dele se mantinha firme em volta da cintura dela, que sentia os dedos longos pressionando sua pele a cada minuto, e a caminhada até a porta certa pareceu durar uma eternidade até que ele afastasse as mãos dela para discar a senha e finalmente entrar.
O apartamento de Jeong Jaehyun era com certeza uma das maiores curiosidades de qualquer paparazzi, sasaeng ou simplesmente curiosos de plantão que só sabiam de algo sobre o idol quando ele queria que soubessem. gostaria de ter dado uma olhada mais sucinta no entorno do lugar, nem que fosse para pescar alguma coisa esquisita ou surpreendente que só se via no espaço particular das pessoas, mas era difícil fazer isso quando a boca de Jaehyun fazia coisas com seu pescoço e no lóbulo de sua orelha que a deixava com dificuldade de lembrar o próprio nome.
A única vez que ele tentou levantar a cabeça e dizer alguma coisa foi para perguntar:
— O vinho está…
mandou o vinho para o quinto dos infernos quando o beijou com força de novo. E graças a Deus Jaehyun entendeu o recado.
Em algum momento, sentiu as costas batendo contra uma superfície dura e sólida, mais gelada do que uma parede normal, enquanto mantinha a língua furiosa dentro da boca dele e as mãos entre suas pernas, agora sentindo totalmente o volume que não tinha sentido no carro, ouvindo a respiração e a voz dele falharem, murmurando palavras ininteligíveis mas que soavam gostosas nos ouvidos de . As mãos dele sabiam tocar, mas ainda eram hesitantes, controladas, mesmo diante da garota pegando fogo, uma garota que puxou uma das mãos desorientadas do rapaz e a guiou para se fecharem em um de seus seios, que estavam muito bem desenhados e atrativos naquele decote.
Boa escolha, .
Ele a pressionou ainda mais sobre aquela parede, que pareceu deslizar sob as costas de , e ainda era muito gelada. Quando ela finalmente o empurrou para que pudesse se afastar daquela coisa, virou o rosto para trás e quase deu um grito agudo com o próprio reflexo.
— Cacete, que susto — arfou, ainda ofegante, afastando-se do espelho gigante instalado no meio do cômodo com uma moldura provençal escura que parecia saída direto de algum quarto real do século 17. Horripilante. Principalmente por ser enorme.
— Desculpa, esqueci de acender a luz — Jaehyun explicou, um pouco abobado, agora vasculhando as paredes em busca de um interruptor. notou que ele segurava o pau por cima da calça, como se temesse que a coisa pudesse escapar para fora a qualquer momento. A gravata dele estava quase totalmente desarrumada, e a camisa já estava aberta até o meio da barriga, mesmo que ela não se lembrasse de que horas havia feito aquilo.
A imagem daquele cara completamente bagunçado daquele jeito a encheu de mais uma nova onda de tesão maluco, e essa parecia uma razão tão boa quanto qualquer outra para esquecer essa história de luz.
— Vem aqui — mal emitiu a última letra antes de atacar sua boca de novo, agora se enroscando o bastante para que sentisse a ereção dele em cima de sua barriga, torcendo o pescoço para trás como a mulher elástica, o que a fez engolir uma risada, porque Jeong Jaehyun era bem alto para uma garota de um metro e 60. Talvez por isso seria bom já deitarem de uma vez, antes que ela tivesse um torcicolo.
Falando em pescoços, foi o exato lugar onde Jaehyun desceu os beijos em à medida que se dirigiam para a porta de madeira rústica ao lado do espelho gigante. Havia algo angustiante a respeito daqueles beijos. Uma impraticabilidade, diria , porque quanto mais ele descia em seu pescoço de pé, mais a cintura dele ia se afastando da dela, e mais seu pau igualmente ficava longe, e seus braços não eram tão longos assim para acariciá-lo como queria.
Com uma risadinha em cima de sua pele, Jaehyun murmurou:
— Bem apressada.
quase deixou as costas desabarem de novo na superfície refletora.
Foi um delay de no máximo 2 segundos, mas durante esse tempo, todos os seus músculos se contraíram e seus olhos abriram, encarando a escuridão do apartamento desconhecido com estranheza, sendo sugada temporariamente de volta para a realidade.
E a realidade era uma voz fantasma que sussurrou em seu ouvido, repetindo uma frase que já era conhecida de seu sistema nervoso:
Tão apressada, .”
Arfando, ela voltou a fechar os olhos com força e puxou a boca de Jaehyun para a dela em um ímpeto, obrigando o cérebro a voltar para o dia de hoje, para a data atual, para as horas atuais, para o presente, porra! Para o cara com quem ela iria transar agora, e não com o outro que ela estava tentando esquecer.
pode sentir brevemente quando mudaram de um cômodo para outro. Jaehyun, agora infinitas vezes mais relaxado, tirou ele mesmo a gravata já desamarrada, assim como a camisa que restavam apenas alguns botões fechados, revelando os músculos existentes entre o tórax e a pelve, onde quase tremeu ao ver a linha de pelos que descia do umbigo para baixo, adiantando um belo banquete de imaginação. Nossa.
sabia que estaria expondo um fato já conhecido até pelo presidente da República, mas precisou soltar a respiração e dizer:
— Você é tão lindo.
Jaehyun abriu um sorriso do tamanho daquele quarto, que devia ser enorme mesmo que ela não conseguisse ver, e se aproximou novamente dela, segurando a lateral de seu rosto com uma das mãos.
Você é muito linda. Estou louco por você — ele disse com a voz entrecortada, e a próxima coisa que fez lançou um aviso de alerta para o cérebro de , um aviso sem noção e totalmente inconveniente.
Ele raspou um dos dedos no ombro de , bem na alça fina do vestido, prestes a puxá-lo para baixo. A atitude era totalmente normal e esperada para quem tinha arrancado aqueles botões da camisa cara como um animal selvagem, mas de repente, estava dando um passo para trás em um salto, agarrando o tecido com força no mesmo lugar.
Sei que gosta quando eu tiro pra você…
Merda!
Mas qual era o problema dela?!
Jaehyun franziu o cenho de repente, com um pouco de preocupação, e se sentiu desesperadamente idiota.

— É a minha vez — rebateu ela, sem dá-lo a menor chance de protestar, já que Jaehyun pareceu ter perdido um pouco da capacidade cognitiva quando levou os dedos para as alças e as abaixou ao mesmo tempo, fazendo com que o vestido verde e lindo caísse aos seus pés.
O que usava por baixo tinha sido a única exigência de Candice para aquele dia, já que sempre era possível passar do restaurante para o quarto na mesma noite, ou simplesmente fazer tudo no restaurante mesmo. Jaehyun passou uma das mãos no rosto, petrificado até os ossos. Levou um segundo para que ele movesse os pés para perto de , mas não para tocá-la, e sim para se inclinar sobre uma parede e apertar o interruptor, jorrando uma luz amarela de pequenas lâmpadas em miniatura pelo quarto, deixando o ambiente com uma cor quente de sépia, iluminando apenas o que precisava ser iluminado.
Como o conjunto em branco e dourado da lingerie que desenhava o corpo de , a calcinha asa delta sendo observada com mais atenção por Jaehyun, que começava a sentir a sanidade indo para o espaço.
Meu Deus, ela era linda! Ele não conseguia descrever a profundidade do que estava sentindo no momento.
— Você se importa? — perguntou, com os olhos fixos na lateral do tecido, vasculhando cada pedaço de pele exposta, ainda que não estivesse falando exatamente disso. levou quase 1 minuto inteiro para entender que ele falava da luz.
— Não, não me importo.
Os olhos dele estavam soltando fogo para cima dela. É claro que não importava!
Jaehyun caminhou novamente para ela, tomando sua boca, a língua ardendo na de , desobstruindo um pouco mais de seu controle. Ele não percebeu o quanto ela tinha ficado repentinamente… deslocada. Um sentimento inconveniente que tinha conseguido afastar na frente do espelho, mas que tinha voltado de repente com os dedos dele em sua alça, e isso era totalmente ridículo e desrespeitoso com Jaehyun. Ele era lindo, gostoso e tinha uma ereção pulsando na calça por ela. O que estava acontecendo ali era o que planejou que acontecesse durante todo o verão. Não tinha porquê deixar que suas memórias estragassem tudo!
Lutando contra o cérebro, passou os dois braços pela nuca dele e deixou que ele a guiasse para a cama, ela mesma dando passos para trás até sentir o estrado de madeira nas panturrilhas, deixando-se cair no colchão até senti-lo fazer a mesma coisa por cima dela. Jaehyun ainda mantinha mãos e pés comportados, focando-as no quadril de , e seus dedos gentilmente raspavam na barra da calcinha, e ele a olhava com tanto desejo que parecia não saber por onde começar. Ou não saber o quanto mostrar para que ela não se assustasse.
Mas a única coisa que queria no momento era saber o que aquelas mãos grandes que seguravam um volume aparentemente grande podiam fazer. E calar as vozes de sua cabeça, claro.
De novo, ela puxou sua mão e a colocou em cima de seu seio, e desta vez um gemido agudo escapou de imediato porque Jaehyun o agarrou com tanta vontade que foi inesperado. arfou, e sorriu, e o puxou para ser beijada novamente, trazendo o corpo dele para junto de si. Ela se mexeu um pouco por baixo, e sentiu os dedos de Jaehyun ultrapassarem a linha e entrarem por dentro da renda do sutiã, agarrando seu mamilo já duro de tesão, fazendo prender a respiração dentro de sua boca, apertando seus ombros, enquanto Jaehyun não esperou mais um segundo para abaixar a metade da peça e abocanhar o seio quase inteiro de .
Foi como ter a alma colocada em uma garrafa e despachada para outra dimensão. A língua dele contornava todas as bordas de seu mamilo direito, e a outra mão subia pela costela de , chegando perto para tomar o esquerdo. Uma respiração ruidosa escapou do âmago de seu estômago, fervilhando pela sensação inebriante da carícia decidida de Jaehyun, desejando poder fazer o mesmo por ele, desejando esticar a mão e enfiá-la bem dentro daquela calça já fadada a ser arrancada e que estava fora de seu campo de visão.
Com a boca úmida, Jaehyun ergueu a cabeça, respirando com dificuldade, imerso no mamilo agora duro, inchado e molhado de , fazendo o pau latejar em desespero. Franzindo o cenho, ele desceu a outra parte do sutiã, e então o hemisfério superior exposto do corpo de o causou um tipo intenso de vertigem.
— Nossa, como você é gostosa — ele disse com a voz embargada de desejo, estendendo sem jeito uma mão na direção do quadril de , bem em cima da pequena palavra tatuada quase escondida pelo tecido da calcinha. Ele inclinou a cabeça para beijá-la bem no vale dos seios, espalhando-os por toda a região. — Tô muito feliz… de você estar aqui. Eu sabia que seria bom esperar. Porra, , você nem imagina.
Jaehyun, prestativamente, puxou uma das mãos dela para seu pau. Por dentro da calça. E automaticamente pressionou ainda mais os dedos em seu ombro.
Minha nossa. Ela quase podia sentir as veias escapando dele.
Um momento se passou em silêncio enquanto ele ainda a beijava e movimentava lentamente a mão, focando naqueles beijos, focando naquela língua em seu peito e no que ela poderia fazer em outras partes, focando no que queria fazer agora que era abrir as pernas para aquele cara e focando no que realmente precisava, quando ele arfou na curva de seu pescoço e disse, quase em sofrimento:
— Quero fazer tantas coisas com você. Coisas que você nunca vai esquecer. Você é perfeita, , tão perfeita…
fechou os olhos com força quando o sentiu arranhar os dentes pela pele do pescoço. Um tipo de agitação diferente tomou toda a área do coração. As mãos pararam de acariciá-lo por dentro da calça. Por um segundo, todas as coisas do mundo deixaram de respirar e o planeta foi envolto no silêncio, exceto pelo barulho de insetos invisíveis do lado de fora da janela e exceto pela risadinha debochada que ecoava direto no cérebro de .
Meu Deus. Meu Deus!
O que ela estava fazendo?!
O tumulto no peito triplicou. O fôlego de se esvaiu no primeiro vento. De repente, tudo tinha saído fora do lugar. Destrambelharam, caíram, tombaram como um trem descarrilando. não viu o momento em que empurrou Jaehyun levemente e o pediu que parasse. Jesus, nem viu quando se sentou na cama e depois levantou e puxou o sutiã de volta para o mesmo lugar.
? — Jaehyun paralisou em cima do colchão, vendo a garota olhar para o chão repetidas vezes em busca de algo. — , o que foi?
— Nada, eu só… — não se atentou ao que respondia. Tudo que precisava era achar sua maldita roupa. Precisava abrir uma janela. Precisava respirar.
Que merda, ela estava indo tão bem! Eles estavam indo tão bem.
Ela não ouviu o colchão fazendo barulho quando ele se colocou de pé, e quando ele estendeu a camisa branca que usava antes para que se cobrisse. Com constrangimento, ela agarrou a cortesia e a vestiu imediatamente, fechando os botões com rapidez para se esconder.
— Qual o problema? Você está bem? Você…
— Sim. Sim, eu só… — não aguentava mais te ouvir falando, era a frase que queria sair para o mundo.
Jaehyun, com os olhos um pouco arregalados e o sangue correndo gelado nas veias, coçou a cabeça e tentou dizer:
— Eu machuquei você? Fiz algo que você não gostou? Eu…
— Não! — respondeu em um ímpeto, se afastando novamente quase até a outra parede, sentindo-se sufocada por si mesma. Minha nossa, aquilo estava tão, mas tão errado! Deveria estar enxergando a situação com lógica: eu queria estar aqui e deveria estar aqui, então por que não consigo ficar aqui?
Porque parecia falso. Parecia ambicioso. Parecia mentira, porque era uma mentira.
— Eu… O problema sou eu — ela disse em voz baixa finalmente, resmungando um palavrão enquanto tomava as duas partes da cabeça, agoniada com a própria presença. — Não posso fazer isso. Não com você.
Jaehyun piscou os olhos por um momento, totalmente confuso. não encontrava forças dentro de si para explicá-lo melhor do que aquilo. Simplesmente não podia fazer isso com ele quando sabia o que ele sentia. Quando agora sabia de seus motivos para ter sumido. Quando ele estava tentando protegê-la por todo esse tempo, e ela estava… estava…
Merda, ela estava enroscada na cama com Jeon Jungkook enquanto ia se apaixonando por ele.
Injusto! A situação era injusta demais. Jaehyun gostava de uma ilusão. Acha perfeita uma mentirosa.
Mas ele se achegou mais perto novamente, agora bruscamente curioso enquanto a tocava no ombro.
— Do que você está falando? Por que você seria o problema?
Porque estou corrompida, Jaehyun, o cérebro dela gritou na mesma hora, e um aperto intenso no peito murmurou outra coisa: Porque também menti pra você por todo esse tempo, e não foi por um bom motivo. Na verdade, nem se parece com um motivo agora. Menti em benefício próprio. Menti muitas e muitas vezes.
Simplesmente menti, menti, menti, menti…
— … Menti.
A palavra saiu em voz mais clara do que ela pretendia. Jaehyun enrugou a testa novamente, chegando mais perto dela.
— O que está dizendo? Mentiu o que?
inspirou o ar fundo pelas narinas. O cheiro dele e daquele quarto eram a prova suficiente de que ela estava em um lugar novo, assim como estava tentando ser uma mulher nova, uma mulher que se encaixasse naquele espaço, mas pelo visto, toda aquela bagagem dos últimos meses era pesada demais para deixá-la avançar.
E assim, engolindo duas vezes e finalmente olhando-o nos olhos, umedeceu os lábios e anunciou:
— Preciso te contar uma coisa.



Aquele programa de TV não era nada interessante quanto esperou.
No slogan dizia claramente: “aqui você vai se distrair enquanto vê a superação de um joão-ninguém” e de repente, várias pessoas comuns, realmente com caras de joões-ninguém, tinham que completar um circuito ridículo de cones, ou colchonetes de plástico em cima da água e coisas absurdas como essas para tentarem ser engraçados por um prêmio ridículo de mil dólares.
Mil dólares. Então ele assistia à programação americana. Era uma surpresa.
Mas aquele programa não estava cumprindo o que prometeu, se isso servia de alguma coisa. Já fazia quase 20 minutos que estava sentada naquele sofá com as costas eretas, olhando para a tela quase muda sem vê-la de verdade, absorvendo as imagens coloridas por osmose depois de ter vomitado todos os acontecimentos malucos dos últimos dois meses em cima de Jaehyun. Aliás, quase todos. Ela fez um favor a si mesma e à sociedade ao omitir nomes, acordos e novas amizades, mas a parte do sexo e da paixão avassaladora? Estava tão na ponta da língua que ela se perguntou como ele não tinha percebido antes.
Sua tentativa do momento era a de manter os pés parados e não soltar o grito entalado na garganta, um grito que poderia ser abafado em qualquer uma daquelas almofadas no estofado.
Não havia motivos para gritar, na verdade. Ela que tinha dito que precisava respirar. Precisava de um tempo. Até tinha dito que queria ir embora, mas seria um pouco indelicado fazer isso naquela hora, quando tinha simplesmente estragado tudo.
Então, quando Jaehyun, gentil e solícito, disse para ela se sentar na sala e ligar a TV enquanto ele preparava um chá, ela achou que fosse sarcasmo. Porque isso não ajudaria, não a deixaria completamente sozinha, como estava desesperada para ficar, só pra poder se martirizar em paz. Só pra não precisar olhar no rosto dele e ver qualquer tipo de mágoa ou decepção.
Mas, bom, dito e feito: sentar e obedecer tinha ajudado seu sangue a pelo menos voltar à velocidade normal.
— O seu chá está pronto.
ergueu a cabeça rapidamente para o lado quando ele começou a entrar no cômodo, trazendo duas canecas fumegantes nas mãos e estendendo uma pra ela.
— Olha, eu acho que não…
— Eu não sei que outra forma fazer você se acalmar e parar de mexer essa perna.
engoliu em seco e parou de mexer o que nem sabia que estava mexendo até aquele momento. Logo, desistiu da ideia e aceitou a bebida quente, tomando um gole imediato – pelo menos o chá tinha um cheiro e gosto agradável. Muito mais agradável do que aquelas coisas que Yoona guardava em seu armário dentro de saquinhos.
Jaehyun contornou a borda do tapete indiano e se sentou ao lado de , a pelo menos 2 palmos de distância, os olhos fixos na TV no momento em que um dos participantes faria o trajeto da água usando uma máscara preta do Pânico sem aberturas para os olhos.
Ah, que beleza. Que maravilhoso. Nem parecia que tinham se beijado como loucos no carro. Que iriam tomar um vinho. Que ele tinha chupado seu peito há menos de 30 minutos atrás.
Ele não disse nada. Talvez estivesse esperando que ela falasse primeiro. Que ela quebrasse a barreira estabelecida entre os dois, a barreira que ela tinha erguido.
— Obrigada. Pelo chá — murmurou, apontando para a caneca — E… sinto muito.
Jaehyun virou a cabeça para ela, e logo abriu um sorrisinho meigo para , porém ainda um pouco hesitante.
— Já falei que não precisa dizer isso — respondeu, aparentemente tranquilo, mas ele ainda estava sem camisa e conseguia ver os músculos tensionados em suas costas de qualquer direção.
— Mas eu quero dizer. Devo dizer, Jaehyun. Eu… — ela estava chegando um centímetro mais perto sem perceber, e ele espalmou uma mão no ar, cortando seus próximos argumentos. Não que ela tivesse tópicos válidos para apresentar, não que precisasse ter, mas sentia necessidade de falar alguma coisa.
— Você já disse. E eu já ouvi — disse ele, e se pareceu muito com um timbre mais cansado — Toda essa coisa do outro cara e tal. E tá tudo bem. Não tem mais o que eu dizer — ele se adiantou, porque estava na cara que esperava um outro tipo de reação de sua parte. Um tipo bravo, puto, ou muito magoado. Um tipo que não a impediria de ir embora caso quisesse. Um cara que estivesse se sentindo tão azarado como alguém que não tinha quebrado apenas um, mas quatro espelhos.
Dois minutos longos e arrastados se passaram até que ela aceitasse sua resposta. E Jaehyun, tomando um gole da bebida em silêncio, podia vê-la abaixando um pouco a cabeça pelo canto do olho.
— Tá mais calma agora?
balançou a cabeça que sim, ainda que isso não fosse totalmente verdade.
— Sim, só… Tentando superar toda essa aleatoriedade — ela tentou rir pelo nariz, mas o som quase não saiu. No fundo, talvez quisesse fingir que estava tudo bem, mas já tinha deixado a máscara cair; só lhe restava aguentar as consequências — Confesso que eu nunca tinha pensado em te contar sobre isso porque, bem… Não fazia muito sentido, ainda mais agora, quando estávamos tentando, mas… depois daquela história no restaurante eu não podia simplesmente fingir que nada aconteceu.
— Você ficou chateada com minhas atitudes. Ou a falta delas — não era uma pergunta. Jaehyun não olhava para ela e nem para a TV. A única coisa em sua panorâmica era a fumaça escapando da bebida — E isso abriu uma brecha, eu entendo…
— Não. Jaehyun, não foi assim que as coisas aconteceram — se apressou em negar, virando o corpo para ele — Elas… Esse cara surgiu antes de as mensagens terem parado, não foi um envolvimento de birra e nem nada disso. Não foi porque interpretei tudo aquilo entre a gente como um relacionamento e me senti traída. Na verdade, depois de tudo que você me disse, vi que as coisas entre a gente pareceram diferentes para cada um, mas não é esse o ponto. As coisas só… aconteceram. Ninguém planejou nada.
E Deus sabia que estava sendo sincera. Em cada uma das palavras, em cada letra que repetia olhando nos olhos atentos de Jaehyun.
Ele balançou a cabeça levemente, e apoiou a caneca ainda cheia em cima da mesa.
— Claro. Eu entendo — murmurou, de repente colocando-se de pé, caminhando até o painel da TV como se tivesse visto algo que não viu. As pernas vestidas com a calça social preta estavam abaixadas a um ponto de deixarem a borda inteira da cueca Calvin Klein exposta, e o cinto devia estar jogado em algum metro quadrado do quarto, e a pele dos braços estava tão pálida e visível naquela luz agora mais forte que conseguia ver não apenas as veias que saltavam naturalmente, mas também músculos. Ossos rígidos que estavam constantemente agora sendo pressionados, tanto os da mandíbula na face quanto nos braços e pernas.
Jaehyun não tinha se levantado para encarar algo na TV. Ele também precisava de espaço.
Por fim, quando não sabia direito como ele certamente a mandaria embora, o rapaz se virou para ela e perguntou, com os braços cruzados:
— Eu o conheço?
Deu pra ver como ele esteve se segurando para não perguntar, mas não conseguiu se conter.
E , no fundo do coração, não queria ter que fazê-lo enlouquecer e se afogar em possibilidades, mas aquela era uma verdade que não podia ser revelada.
— Não… — ela parou, e tentou reunir um pouco de coragem para esconder o mínimo possível. sentia um ligeiro arrepio com a breve ideia de que Jaehyun descobrisse sobre Jungkook — Não posso te contar. Não é importante. E de qualquer forma, eu e ele não estamos mais juntos. Tentamos ser amigos, mas nem isso conseguimos. Foi passageiro, de qualquer jeito.
Mais uma parte da máscara deslizando para o chão. Essa, pelo menos, doeu como se tivesse sido arrancada de uma só vez.
Jaehyun deu poucos passos à frente, e umedeceu os lábios ao fazer mais uma pergunta que preferia não fazer.
— E você ama ele?
quase engasgou quando o encarou.
— Quê?
— Tá apaixonada por ele, não é?
Ela pensou em negar. Imediatamente. Estava pronta para isso, porque de jeito nenhum queria magoá-lo ainda mais. Você não, Jaehyun. Você é a última pessoa que deveria sair magoada.
Mas não tinha benefício algum em mentir naquela hora. não conseguia mais ficar ali, naquele sofá, de frente para a sua primeira paixão, acumulando ainda mais inverdades quando seus olhos já diziam tudo.
E Jaehyun entendeu exatamente o que queriam dizer.
— Eu devia imaginar.
abaixou a cabeça, nada animada por ser tão transparente. Mais uma vez, pensou que ir embora fosse uma boa ideia. Uma ótima ideia. Deitar, dormir, acordar e torcer para que ela e Jaehyun pudessem pelo menos ser amigos.
Mas a convicção dele foi interessante. Houve uma pausa enquanto a repetia na mente, e sabe-se lá porque a fez ter vontade de rir na mesma hora.
— Não sei como, porque nem eu imaginava — respondeu ela, apoiando sua própria caneca ao lado da dele na mesa. — Não é como se eu tivesse dado indícios de que cairia de cabeça em um caso assim que você desse as costas.
Surpreendentemente, ele riu. Ou foi o barulho que seu nariz fez quando ele abriu a boca para falar.
— Não, não deu. Mas se tivesse lido os livros que eu disse, veria que essas coisas acontecem assim mesmo. Uma epifania em alguma fenda do tempo, um momento que não estamos esperando — ele a encarou através da luz da TV, e reparou que ele enfiou as mãos nos bolsos da calça ao se aproximar mais um pouco do sofá, escondendo os nós dos dedos brancos com a pressão exercida pelo seu nervosismo — Igual quando você esbarrou em mim em New York. Por que eu sentiria alguma coisa pela mulher que quase quebrou meu queixo?
acharia que fosse sério até ver os olhos estreitos dele e a sombra de um sorriso. Ela riu, vendo-o fazer a mesma coisa, acreditando que ele estava tentando dispersar a atmosfera pesada e restabelecer um clima pacífico, por mais que possivelmente ainda estivesse decepcionado com ela.
Jeong Jaehyun não existia.
Antes que ela dissesse mais alguma coisa – mais um pedido de desculpas talvez, ou a grande dúvida: o que fariam agora?, Jaehyun completou uma caminhada em semicírculo e perguntou, em outro timbre baixo:
— Esse cara… Sente a mesma coisa por você?
identificou novamente aquele aperto característico, um aperto que doía em todas as células do coração, um sentimento que a fazia duvidar de todas as coisas boas do mundo, como alguém que recebe uma crítica ruim e quer desistir de tudo.
Ela achou que tinha conseguido disfarçar a breve careta de mais um choro quando balançou a cabeça em negação, mas talvez Jaehyun tenha prestado atenção. Isso era um saco! se sentiu tentada a perguntá-lo se ele não tinha nenhum livro que ensinasse como superar caras que não te amavam, e principalmente como deletá-los completamente de seu sistema, porque até nos pensamentos ele a estava perturbando.
— Não — ela finalmente conseguiu responder, desviando os olhos seguramente para o programa — Ele não estava pronto pra nada desse tipo. Comigo. Foi uma relação que nasceu com data de validade.
Jaehyun ficou em silêncio. continuou encarando os números dos participantes, quanto de dinheiro haviam arrecadado, revezando a atenção de um para outro enquanto não conseguia olhar para Jaehyun de forma nenhuma.
Por fim, a voz dele soou mais de perto quando disse:
— Sinto muito.
Ouvir aquilo foi decepcionante. Ligeiramente angustiante.
se colocou de pé, e andou com os olhos no tapete quando balançou a cabeça.
— Não é culpa sua.
— Na verdade, acho que é sim — de repente, Jaehyun estava se aproximando impetuosamente dela, colocando-se diante da garota com um tipo diferente de olhar. Não era como antes, perdido e reflexivo, mas agora era quente, era acolhedor. Pegou totalmente de surpresa — Sabe, … se você pudesse se enxergar da mesma forma que eu te enxergo, veria como fui um tolo. Um idiota. Porque qualquer cara que não se esforça pra manter seu interesse, está te entregando de bandeja. Como eu fiz.
franziu o cenho.
— Você não me entregou de bandeja.
— Entreguei sim. Ouvi isso de um amigo essa semana e não concordei, mas agora tudo faz sentido. Se não valorizar o suficiente, vai perder a vez e essa é a verdade — ele bufou baixo, e por algum motivo prendeu uma das mãos na nuca e engoliu várias vezes antes de perguntar, com certa dor na voz: — Eu perdi a minha vez?
definitivamente não esperava por isso.
E, quando viu ele começando a chegar ainda mais perto, igualmente não soube o que fazer.
— Jaehyun…
— Eu não ligo, .
— O quê? — ela novamente enrugou a testa.
— Eu não ligo. Nos afastamos e você conheceu outra pessoa, não deu certo e estamos aqui de novo, o que quer dizer que você está um pouco disposta. Tô errado? — disse ele, com um ímpeto de segurança que não permitiu que respondesse. Jaehyun viu como uma oportunidade para dar mais um passo à frente e repetir o movimento de levar o polegar até a bochecha de — Eu não ligo para o que aconteceu nessa lacuna do tempo. Posso dizer que uma parcela de culpa também é minha. Não só pelo meu plano idiota de me manter longe, mas porque nunca disse o que sentia por você, . Abri espaço para que essas coisas acontecessem.
Não dava pra acreditar que ele estava dizendo aquelas coisas.
abriu e fechou a boca várias vezes, tentando ver a mágoa nos olhos castanhos daquele cara, mas aqueles momentos longos de silêncio em que ele ficou ali, de pé, pareceram culminar naquilo que ele estava soltando naquele momento. Um olhar cheio de bondade e gentileza, e sem nenhum indício de que começaria a gritar ou que usasse uma voz doce para dizer que a levaria pra casa.
É exatamente isso que ela pensou que aconteceria quando contasse pra ele. Era a reação esperada, emocionalmente esperada.
Mas podia jurar que o que não faltava naquela expressão de Jaehyun era emoção.
— Jaehyun, não… não é esse o ponto — deu um passo para trás, porque as coisas ainda não pareciam certas — Eu sei que no primeiro momento realmente me apaixonei por você, realmente senti sua falta e qualquer pessoa no mundo me diria que você é o cara certo, porque não consigo explicar como me sinto grata por todas as coisas que você fez por mim. Não tem comparação com nada do que alguém já fez, exceto minha melhor amiga. Sei que aceitei o seu convite e entrei no seu carro disposta a tentar esquecer e contornar tudo que aconteceu na sua ausência, mas… É algo que não consigo te prometer — O tom de sua voz despencou a muitas oitavas, e puxou o ar pelo nariz — Não dá. Não é algo que eu tenha sentido antes pra saber como funciona. Tenho medo de te envolver nisso e não conseguir, tenho medo de te atrasar, de fazer você perder tempo, de…
— Ei, ei, essa coisa de atraso ou perda de tempo são coisas que só eu posso decidir — Jaehyun se aproximou dela mais uma vez, e sua voz era gloriosamente calma, controlada — Se trata da minha vida, , é isso que eu quero que você entenda.
Ela quase riu com descrença. Ele não estava entendendo a gravidade da situação?!
balançou a cabeça furiosamente, afastando-se daqueles dedos gentis em sua bochecha.
— Não, você não entende. O que você quer de mim agora… Eu não posso dar — explicou, gesticulando com as mãos — Meus sentimentos, eles… Simplesmente não posso. Odeio admitir isso, mas andei ficando muito boa em fingir a maioria das coisas nos últimos tempos, mas isso… nisso não consigo fingir, Jaehyun, mesmo sabendo que é o melhor pra mim. Eu tô perdida, tô confusa, eu…
— Jaehyun chamou, desta vez se aproximando de supetão, agarrando a mão de para colocá-la sobre seu peito desnudo e quente — Fingiu quando disse que gostava disso?
Com um leve susto, quase recuou a mão, mas Jaehyun a puxou para mais perto. Os olhos dele pareciam intimidadores por um instante, intensos e lúcidos, fazendo perguntar quem era aquele homem.
Porém, de qualquer forma, balançou a cabeça e respondeu um enfático:
— Claro que não.
— E fingiu quando queria me tocar bem aqui? — agora ele levou a mão dela, lentamente, pelo trajeto do peito para a barriga, passando pelos gomos de músculos até o cós da calça social, deixando de repente à deriva dos mesmos pensamentos e sensações escaldantes que sentiu um momento antes naquele quarto, todas envolvendo uma fantasia de verificar o que tinha dentro daquele tecido.
Ela tentou engolir o que podia naquela garganta seca, respondendo com uma voz que mal se ouvia:
— Não…
O cheiro e o hálito dele ficaram mais próximos quando inclinou as costas na direção dela, tomando seu rosto e a lateral da nuca com as duas mãos. A mão dela não saiu de seu abdômen. Principalmente quando ele chegou perto de seu ouvido e emitiu sua melhor voz abafada quando perguntou:
— Fingiu quando tirou aquele vestido e gemeu todas as vezes que estava me beijando?
Sem encontrar as palavras, apenas balançou a cabeça que não.
Quando sentiu os dedos dele roçarem em sua lombar, ela entendeu onde ele estava querendo chegar. E por mais que o lado pervertido e angustiado de quisesse muito, ainda não sabia se seria a escolha certa. Não quando sabia dos sentimentos dele. Não quando…
Ela não pensou no próximo quando ao sentir o corpo agora colado ao dele, e a boca de Jaehyun roçando na sua quando disse, com um silvo:
— Então entenda que a única coisa que eu quero de você agora é continuar de onde paramos atrás daquela porta — afirmou, e parecia carregar um pedido por trás da frase, um que não esperou que ele fosse fazer: por favor, não vá embora — É fazermos o que queríamos fazer antes de toda essa confusão. Antes de lacunas de tempo e desencontros. As reflexões de depois ficam pra depois.
Ele foi abrindo um singelo sorriso tão devagar que achou que nunca se completaria. O coração estava esmurrando o peito com a vontade, e não importava o que os livros de romance diziam, aquele órgão humano batia forte também por tesão e adrenalina, e foi esse sentimento que fez sorrir minimamente, como um reflexo do dele, como se não estivesse toda bagunçada e louca por dentro.
— Você não sabe o que está dizendo — ela murmurou, ainda com a boca a milímetros da dele, sabendo que se cruzasse aquela linha, não iria mais juntar suas coisas — Eu não quero te machucar.
— Você não vai.
— Não quero te dar esperanças.
— Anotado.
arfou quando ele desceu uma das mãos até sua bunda, apenas roçando os polegares em sua pele, deixando-a em total estado de alerta.
Por fim, quando sabia que não conseguiria vencer a névoa pesada de desejo que tinha se instalado ali, sussurrou uma última imposição nos lábios entreabertos de Jaehyun:
— Não vou fazer amor com você.
Ele abriu um sorriso contido e um pouco amargo. Ai.
Tinha doído um pouco. Mais para ela, que agora conseguia mensurar a diferença.
— Acho que gostei desse lado honesta — ele se aproximou até selar seus lábios no de de forma calma, ao mesmo tempo em que levava uma das mãos para a borda da camisa social que ela usava, levantando o tecido até sentir, na ponta dos dedos, a calcinha de renda, contornando-a delicadamente até o meio das pernas de , que travou absolutamente todas as funções vitais até sentir a superfície de um de seus dígitos roçarem na parte quente e molhada de sua boceta. Jaehyun sorriu instantaneamente — Mas isso aqui não é fingimento. E se você está preocupada comigo, ou com os meus sentimentos, eu agradeço a consideração, mas podemos deixar o assunto de romance na mesa do restaurante? Por hoje — ele a beijou com um selinho forte novamente, e afastou as mãos devagar quando começou a dizer: — Mas se por acaso você não estiver à vontade, é só…
— Por Deus, cala a boca!
Em um instante, o beijou com força, com a força necessária para que toda e qualquer lembrança de Jungkook e todas as revelações dolorosas que tinha soltado se dissipassem pelo vento. Tão apressado quanto, Jaehyun a envolveu com os braços grandes ao redor de seu quadril, puxando-a para cima até que passasse as pernas por sua cintura, e soltasse um gemido abafado quando ele aproveitou a oportunidade para fechar uma das mãos na nádega nua por debaixo daquela camiseta dele. Gostosa pra caralho. Acendeu o mesmo fogo de antes sem nenhum esforço.
Jaehyun caminhou com ela até a porta do quarto sem deixar de beijá-la por um minuto sequer, ficando louco a cada segundo com as mordidas em seu lábio, que ativavam ainda mais a vontade de apertá-la forte, de parar com ela ali no meio daquele corredor, de abater a necessidade que queimava em seu sangue e se esquecer de toda a etiqueta que tentava manter antes de levar uma garota pra cama adequadamente.
Toda a calma foi mandada pelos ares. Um tipo de determinação nova estava brotando daquele cara naquele momento.
pareceu perceber a mesma coisa, porque não perdeu tempo em pular do seu colo assim que sentiu o cheiro dele pelo quarto, e tentou recuperar o fôlego quando se separou de seu beijo e o pegou pelo ombro, olhando-o com os olhos sedutores e misteriosos enquanto o de Jaehyun era mais do que faminto.
— Preciso que você me diga como vamos fazer isso — disse ela, ainda ofegante, sentindo os mamilos duros como pedra e as pernas queimando em brasa.
Jaehyun, notoriamente desorientado, ainda segurava em sua cintura quando perguntou:
— O quê?
E de repente, já estava cansada de tentar explicar ou demonstrar. Em um piscar de olhos, sua mão saiu do lado de seu corpo e foi de encontro ao...
Ah. Aí mesmo. De novo.
— Eu quero saber como você vai me foder — ela reiterou entredentes, sentindo-se como nunca se sentiu na vida, incorporando uma necessidade avassaladora de que ele entendesse o melhor formato daquela dinâmica. Nada seria parecido com antes. Mesmo que sentisse sua ereção nas alturas ali mesmo na palma de sua mão, ainda estava notando uma certa trava em Jaehyun, e Jesus Cristo, um homem com aquele porte não devia estar nervoso com nada, devia apenas usá-lo!
Que mandasse a etiqueta pra puta que pariu.
O gemido que ele soltou com a breve carícia encharcou a calcinha de em um piscar de olhos. O sorriso que ele lhe lançou desativou o movimento de suas pernas. E quando ele puxou seu rosto para mais perto de si e colocou uma mão em cima da dela na ereção, sussurrou bem devagarinho e com muita clareza para que ela entendesse:
— Vou fazer como você quiser — e com um aperto no próprio pau, ele reiterou: — E ainda melhor.
E de repente, ele jogou a etiqueta pra puta que pariu.
Jaehyun levou a outra mão para a nuca de , agarrando um tufo generoso de cabelo enquanto inclinava sua cabeça para um beijo violento. Ela não protestou; simplesmente sentiu cada ponto do corpo se abrindo e se agitando, as correntes elétricas se espalhando como veias e as pernas bambearem tanto que achou que desabaria no chão. O beijo dele era tão, tão bom; a pegada na cintura quase fazia desistir da ideia de controlar alguma coisa e deixá-lo fazer o que quisesse com ela, porque por Deus, por Deus, precisava sentir aquela coisa imensa pulsando em sua mão, precisava ver, precisava experimentar...
Soltando-se do beijo mais uma vez, ela baixou os olhos o suficiente para começar a se desfazer de botões idiotas e zíperes compridos como se sua vida dependesse disso.
— Vou chupar você — avisou ela, se desfazendo dos botões da calça social de linho. Jaehyun, desorientado pela onda do tesão, levou quase um minuto para entender e tentar argumentar.
— Me deixa fazer primeiro...
— Não — ela afastou a mão dele antes que tentasse impedi-la. Em um segundo, o empurrou de leve até a cama bem ao lado, onde ele se deixou cair por cima dos lençóis já bagunçados de antes, dando a ela a mesma visão arrasadora de mais cedo: ele com aquele abdômen perfeito, com aqueles olhos chamuscados de desejo e com aquele rosto entalhado de beleza iluminados pelo conjunto de luzes fracas, agora com o adicional de estar com o pau totalmente empinado para fora, fazendo cosplay de alguma escultura da Roma antiga.
ficou sem palavras por um instante, absorvendo a visão com os hormônios gritando histéricos dentro de si. Cacete, quantas vezes imaginou aquela cena? Quantas vezes, sozinha no quarto, tentou pensar no tamanho que ele tinha?
Era proporcional. E bonito, muito bonito. Quase tanto quanto o de...
Ela se ajoelhou na mesma hora, terminando de puxar a calça pra baixo, mordendo os lábios enquanto olhava para o membro erguido e catalogava aquilo na mente, catalogava que aquele era Jeong Jaehyun e que sempre fantasiava sobre estar recebendo aquela coisinha daquele cara dentro de si. E que nunca tinha existido outro.
Jaehyun se apoiou nos cotovelos e gemeu deliciosamente quando o segurou, fechando os olhos para deleite quando ela começou a acariciá-lo, e qualquer chance de pedi-la para mudar de ideia sumiu com o vento.
Aproximando-se, ela o enfiou, pouco a pouco e muito devagar, dentro da boca, raspando a língua na glande já úmida, enquanto ele soltava um palavrão baixo e abria os olhos para encará-la no fundo da alma, vendo-a preferindo se concentrar no pau. Aquele pau lindo, molhado e diferente, que desfrutava sem o adicional de de olhar seu dono nos olhos durante o processo.
Ela até olhou, mas bateu o recorde de 3 segundos antes que aumentasse a velocidade das mãos e simplesmente tentasse enfiá-lo até o fundo da garganta como bem seu lado pervertido a dizia para fazer. Jaehyun não segurou um gemido mais alto, sentindo como se estivesse viajando para outro cosmos, deixando o peito descer e subir enquanto a boca de o recebia com muito talento e com muita vontade, e minha nossa, era tão gostoso! Ele fez a burrice de olhá-la, mas quando viu os cantos da boca e os lábios totalmente lambuzados dele, sentiu o aperto no estômago indicando o que queria vir, e seria extremamente vergonhoso deixá-lo vir agora.
Mas quanto mais ela o recebia, ficava mais difícil. Ainda mais quando ela fazia questão de masturbá-lo e deixar a cabecinha de seu pau conhecer todas as fronteiras de sua língua. Deixá-la seguir com aquilo o fazia ter mais vontade de retribuir, mas será que ele seria capaz de fazer isso tão bem quanto ela? Surpreendentemente tão bem!
Puta merda, será que ela engole?, foi o primeiro pensamento débil que se instalou em Jaehyun quando mais um gemido tenebroso escapou de sua garganta, uma pergunta muito sincera que seu corpo estava fazendo por si só. Os joelhos tremiam na base, os cotovelos não estavam mais aguentando seu tronco, e ele não se atrevia a levar as mãos ao cabelo dela porque com certeza moveria o quadril pra se enterrar mais fundo, e pronto, explodiria como um vulcão.
Quando estava prestes a se declarar como vencido, se levantou imediatamente, um pouco ofegante pelos movimentos da cabeça e mãos, e limpou os cantos úmidos da boca com as costas das mãos. A imagem tirou Jaehyun tão do eixo que ele não viu o momento em que ela se abaixou para beijá-lo, e nem o momento em que ele mesmo agarrou em sua cintura com força, inspirando o gosto e o cheiro dela como uma nova fragrância de loucura, transformando a mulher em nada além do que seu desejo principal.
— Isso foi gostoso pra cacete. Meu Deus, , foi demais — ele murmurou entre os beijos, e tentou puxá-la para seu colo, mas permaneceu com o tronco inclinado e com os pés no chão, mordendo seu lábio novamente para murmurar:
— Você ainda não viu nada.
Antes que ele fizesse qualquer outro movimento brusco, ela se posicionou em exibição na sua panorâmica, e viu como ele a encarou desnorteado, completamente perdido ainda naquele boquete de antes, segurando o pau erguido para cima como uma criança em espera. Os olhos dele crepitavam de desespero, não ousando fazer nenhum movimento que ela não dissesse. se sentiu bem, eufórica, em deleite completo, porque era exatamente isso que queria: controlar as reações, tanto dele quanto dela. Sentir, provar e fazer o que ela quisesse, tornando a experiência única e memorável.
Principalmente única. Diferente. Era disso que precisava.
Com um sorriso sedutor como o inferno, ela começou a abrir os botões da camisa dele, um a um, até que a peça caísse aos seus pés, revelando novamente aquela mesma lingerie branca que o deixou tão perturbado. A escolha de tinha sido baseada no que se lembrava dos gostos dele, e Jaehyun e branco funcionavam muito, assim como Jaehyun combinava com aquele olhar estupefato ao olhar pra ela, olhar como olhou a quando eles tinham acendido a primeira fogueira e apagado em pouco tempo. Agora, para garantir que isso não acontecesse, já foi, ligeiramente, colocando as duas mãos para trás das costas, soltando o sutiã de renda com facilidade e jogando-o junto com a peça embolada no chão.
Os seios dela à mostra deixaram o rapaz totalmente em estado de alerta de novo. Jaehyun soltou uma expiração sem perceber, e nem precisava mais segurar o pênis na posição de disparo porque ele estava completamente petrificado. Eram desenhados e proporcionais. Naturais e simplesmente... maravilhosos. Os mamilos redondos o deram água na boca. E quando colocou os dois dedos na barra da calcinha, ele soube que estava perto da ruína.
Muito perto. Muito perto.
Sem fazer muito mistério, abaixou a última peça com sensualidade, empinando a bunda sem deixar de encará-lo e terminou de tirá-la com os pés, enxergando na expressão atônita de Jaehyun aquilo que sempre quis desde o começo.
A adoração. A certeza que via agora nos olhos dele de que ela não era uma garotinha. Que era uma mulher, uma mulher sensual e atraente que poderia deixá-lo maluco, mesmo se aquele encontro tivesse acontecido há meses atrás.
— Caralho... — o palavrão saiu em um sopro de ar. Poderia ter sido sussurrado pelo próprio vento, porque todo o oxigênio de Jaehyun foi drenado pela imagem da nudez de . Todo o seu sistema nervoso parecia estar entrando em colapso — Você é linda pra cacete, . Meu deus, linda pra cacete.
E novamente sem controle sobre os próprios músculos, Jaehyun passou um dos braços pela sua lombar, puxando-a para mais perto com uma força fantástica da agonia erótica, recebendo a boceta dela bem na altura do rosto, inspirando o aroma de sua pele e navegando pela bunda dela com as duas mãos.
Ele não perguntou; simplesmente afastou as pernas dela o suficiente para investir com sua língua no clitóris exposto, fazendo arfar de surpresa não apenas pela entrada violenta e repentina, mas pela potência aplicada por aqueles braços e dedos. Puta merda, ela não fugiria nem se quisesse, e de jeito nenhum queria isso, porque Jeong Jaehyun sabia chupar uma boceta. Sabia o suficiente para deixá-la sem ar e ter que se apoiar nos ombros dele, e percebeu como sua língua se concentrava nas partes superficiais de sua vulva, e ela talvez precisou trincar os dentes para não pedir para que ele fosse mais fundo, tanto com a língua quanto com o dedo, ele poderia escolher, mas daquele jeito... bem, já era o suficiente para que ela gemesse como uma condenada.
sentiu a protuberância dos músculos dele se enrijecerem nas costas, e sentiu o quanto ele estava querendo impulsionar seu corpo cada vez mais pra cima. Agarrando aqueles fios bagunçados com necessidade, soltou mais um gemido e cravou as unhas em seu ombro quando Jaehyun finalmente pareceu ter enfiado um dedo na boca e agraciou o interior de com ele.
Foi demais. Ela não gritou apenas pela grossura de um único dedo daquele cara, mas sim porque ele o enterrou com tanta lentidão torturante que acendeu o desespero de dentro de .
Algo urgente precisava ser feito.
se desvencilhou do toque, empurrando o tronco de Jaehyun para trás até que caísse na cama. Deixou que ele perdesse o fôlego por um instante pela visão de seu corpo naquela luz patética, e deixou que ele murmurasse outras tantas coisas que saíram quase ilegíveis por aquela boca perdida, e roçou uma perna na dele e se inclinou o suficiente para que deixasse sair um:
— Encosta.
Ele não fez imediatamente. Primeiro, Jaehyun se levantou para se sentar o suficiente e tentar envolver o rosto dela em um beijo. deixou que ele a beijasse um pouco, o tempo de 5 segundos até que ela se esquivasse com um sorriso safado e ele entendesse o recado, puxando o corpo para a cabeceira e esperando a próxima reação.
E ela veio com as pernas de passando por sobre seu corpo, posicionando-se bem em cima de seu colo, onde Jaehyun não conseguiu manter o gemido sôfrego na garganta, que saiu imediatamente assim que seu pau tão duro e sensível raspou no mínimo pedaço de pele da boceta exposta de .
Deus do céu, ele não duraria nada desse jeito.
— Onde você guarda a camisinha? — ela perguntou em um tom implícito de ordem. Jaehyun, com a respiração ofegante e hipnotizado pelos olhos firmes dela na escuridão, apontou cegamente para algum lado, murmurando o que pareceu gaveta de cima e vendo se esticar graciosamente até o móvel ao lado na cabeceira, sem mal sair de cima dele, deixando as curvas serem banhadas pela luz, atingindo-o com um impulso louco de tocá-la ali, de tocá-la por inteiro.
Quando ele enfim agarrou a curva de sua cintura para tentar amenizar o desespero queimando dentro de si, já estava de volta, erguendo-se por cima dele, os seios na panorâmica de Jaehyun como o par de peitos mais lindos que ele já deve ter visto. Um par que implorava para que fossem provados outra vez, para que ele caprichasse.
Antes que agisse cegamente mais uma vez, ele ouviu o som de rasgo do pacote médio, e de repente seu pau estava sendo tomado mais uma vez pelas mãos certeiras dela, que estava colocando a camisinha em um piscar de olhos.
Um pouco da névoa do tesão irracional se dissipou da mente de Jaehyun por um segundo. Apenas um segundo em que ele foi capaz de se questionar sobre o que estava acontecendo e o que raios estava prestes a acontecer, porque porra... O que era aquilo? estava colocando a camisinha nele? estava afastando seus dedos quando ele tentava tomar as rédeas? estava com um fogo sórdido no olhar de que faria apenas o que quisesse e ponto final? E estava fazendo tudo tão rápido?
Foi apenas um segundo. Um segundo para que ele avaliasse que estava prestes a viver algo que nunca viveu, prestes a perceber que a mesma daquela primavera não existia mais.
E ele não tinha certeza do que pensar sobre isso, porque porra, nenhuma garota tinha colocado a camisinha nele, caralho! E tão bem. Ela não era tipo inexperiente? Não era mais do tipo inocente e reativa? O que teve com esse outro cara tinha chegado ao ponto de mudá-la tanto assim?
Os pensamentos dele viraram fumaça quando ela se posicionou bem em cima de seu pau. Jaehyun precisou morder o lábio para não soltar outro gemido disfuncional. Aquele 1 segundo de limbo sumiu como se nunca tivesse existido. Agora, seu corpo queimava de um desejo tão furioso que ele não perceberia se o mundo estivesse acabando lá fora.
— Meu Deus, você é maravilhosa — ele disse com a voz tão arrastada que era de se imaginar que estivesse sofrendo um mal terrível no âmago de seu ser. Novamente, Jaehyun se impulsionou para a imagem divina de por cima dele, o cabelo caindo para as costas enquanto ela sorria minimamente ao se esfregar de leve por cima de sua ereção. deixou que ele a beijasse com intensidade, deixou o corpo ser tomado por aquelas mãos ao seu redor e sentiu o pau pulsando por baixo de suas pernas, implorando com agonia, ainda que Jaehyun fosse a pessoa que estivesse esperando um sinal verde. Quando ele, afoito e perdido, desceu os beijos para o colo dela e finalmente abocanhou um dos mamilos, gemeu baixinho, sabendo que a área sensível era palco para uma sessão paciente de chupadas e mordiscadas, e ela estava impaciente.
Estava temerosamente impaciente.
Quando ela puxou seu rosto para cima para livrá-lo de seus seios, apertou ainda mais as unhas em sua barriga e sorriu quando disse:
— Eu disse… que você não sabe o que está dizendo.
E então, sem um aviso prévio e sem tempo para que ele se preparasse, o envolveu de forma rápida e inesperada, e Jaehyun sentiu todos os músculos do corpo afrouxarem. Um palavrão escabroso foi a única coisa que conseguiu dizer quando ela subiu e desceu mais uma vez, agora devagar, desesperando-o mais uma vez, aumentando o ritmo gradativamente conforme ia viajando em seu próprio mundo, sorvendo a mente de Jaehyun para uma outra galáxia.
Ele não sabia o que fazer. Primeiro, a hipnose da visão de sentando em cima dele com a cabeça jogada pra trás enquanto viajava no próprio universo mexeu com sua cabeça de tal forma que ele paralisou totalmente. Depois, quando viu o vislumbre de seus seios pulando de lá pra cá conforme ela ia sentando com mais rapidez, ele não sabia que podia ficar mais duro. Agarrou um deles enquanto olhava dentro dos olhos dela, enquanto vasculhava aquele rosto que estava se deleitando no ato, deixando escapar gemidos deliciosos que ele tinha certeza que estavam sendo gravados no fundo da sua mente. Era a visão mais sexy que ele já viu, um combo de coisas novas que ele não sabia como descrever.
Em um impulso de desespero, Jaehyun cravou as duas mãos na cintura de , os olhos grudados no entrar e sair de seu pau naquela boceta molhada, e , ao sentir o toque, imediatamente puxou os dedos para longe, juntando-os por cima da cabeça dele até travá-los na cabeceira da cama, reação essa que deixou Jaehyun totalmente sem reação.
— Porra, . Por que... — ele estava prestes a protestar, mas ela não o deu chance porque chegou a centímetros quentes e perigosos de sua boca e simplesmente começou a quicar como uma profissional.
Jaehyun perdeu os argumentos no meio de sua respiração humilhantemente falhada. Gemeu alto e forte dentro da boca da garota, as mãos atadas para cima trazendo um novo tipo de excitação. Minha nossa, o que era aquilo, quem era aquela mulher? Ele nunca tinha sido dominado desse jeito antes. No momento, nem conseguia pensar no que fazia antes de estar ali, sentindo o sangue virar lava, a cabeça apagar completamente e o pau duro se segurando o máximo que podia para não acabar com a diversão muito cedo.
— Você é muito gostosa. Meu Deus, você é... — ela o calou novamente com um beijo. Jaehyun perceberia mais tarde que não o olhava nos olhos quando ele falava. Que ela absolutamente não curtia quando ele falava, já que impedia qualquer frase de se completar, e que ditar as regras era uma forma para que ele não fosse em frente com qualquer conversinha.
Mas porra... Ela era mesmo gostosa, e com todo aquele sangue queimando dentro dele, não dava pra ficar só parado absorvendo tudo.
No entanto, não dava mais pra segurar. O estímulo de coisas era demais pra ele e seu pau sem sexo há sei lá quantos meses. A garota era perfeita e quicava tão bem que ele não tinha mais pra onde correr. Ele murmurou um "vou gozar" quase inaudível, perto de seus dentes, um aviso claro que não demoraria a ser cumprido. mordeu sua boca quando ele avisou pela segunda vez e, finalmente, deixou seus braços livres, o que Jaehyun automaticamente entendeu como um passe para que ele agarrasse finalmente em sua cintura e colasse ainda mais seus corpos, assim como colou sua boca por alguns segundos em seus seios, assim como ele não sabia onde beijar, tocar ou investir primeiro, porque estava a ponto de explodir e não sabia da situação dela.
"Estou perto, ", foi uma forma educada de dizer que ele tinha 3 segundos ou menos caso ela continuasse sentando daquele jeito. Como uma piada, pareceu aumentar ainda mais o ritmo, e jogou os braços para a nuca dele, prendendo ainda mais seus corpos enquanto ela afundava o rosto na curva de seu pescoço, posição que Jaehyun não perdeu tempo em passar os braços por suas costas e senti-la ali, pele com pele, em um enlace que tanto quis, ouvindo a respiração falhada dela como uma resposta de que ela também estava perto.
E o perto se tornou muito perto quando mordiscou sua orelha, e se tornou o completo nada quando ela gemeu tão gostoso no seu pescoço que não existiu mais formas de se segurar. Jaehyun explodiu em um estouro alucinante, tão brutal que obrigou seus próprios braços a deixarem ela, os músculos se enrijecendo como cristais e o gemido forte e alto se pareceu com um rosnado quando ele se aliviava. Um de seus braços se apoiou na cama, tamanha tinha sido a onda violenta de tesão e alívio que tomou conta de si como um baque. Cada partícula de pensamentos ou palavras se esvaiu dele como se tivessem sido roubadas. Com os olhos fechados, ele parou e respirou fundo, sentindo ainda em cima dele, parada com a respiração ofegante, mas não tão ofegante quanto o cara que tinha acabado de gozar como se nunca tivesse gozado na vida.
Ele ergueu a cabeça lentamente com o cenho franzido, tentando voltar a se situar no ambiente, voltar ao que tinha acontecido, tentando entender o que aquela mulher tinha acabado de fazer com ele.
Jaehyun automaticamente tomou seu rosto em uma mão, aproximando a boca da de ao mesmo tempo em que a olhava direto nos olhos, procurando guardá-los no fundo da mente, guardar aquela que não conhecia, tendo certeza de que estava marcado pelo resto da vida.
— Você é... Uau — ele com certeza repetiu um outro "uau", e mais umas 2 vezes, porque nada parecia descrever aquilo. sorriu, mordendo um lábio inferior, inclinando a cabeça para beijá-lo por um segundo até murmurar:
— Vou ao banheiro.
E estava se colocando de pé em um minuto, juntando as duas mãos para puxar o cabelo para trás e amarrá-lo de qualquer jeito enquanto fez a passeata mais linda e sexy de todas debaixo da semi escuridão até a porta do quarto, a qual Jaehyun não conseguia se decidir pra onde olhava primeiro: para o seu rosto de perfil ou para a bunda maravilhosa que ele não teve a chance de ver antes.
Em um passe de mágica, já estava quase duro de novo. E suas mãos estavam totalmente meladas daquela explosão maluca, insistindo em mantê-lo perdido.
Deus do céu, iria demorar pra ele se recuperar de toda aquela loucura.
Um pouco zonzo, Jaehyun levantou para jogar a camisinha no lixo, sem perceber que estava sorrindo sozinho pela avalanche de ansiedade que já queria tomá-lo ao esperar que ela voltasse e que fizessem tudo de novo. Sim, se gostava dessa coisa de dominá-lo, ele deixaria com prazer. Era uma experiência nova, mas uma experiência nova muito gostosa, e na hora em que ela quisesse ser bem fodida e ouvi-lo sussurrar o quanto amava a boceta dela molhada, ele também estaria a postos e pronto pra isso.
Ainda sorrindo, ele voltou pra cama ao escutar o barulho do interruptor, e segurou o pau com expectativa, torcendo para que suas emoções não saíssem tanto do controle naquela noite e o fizessem dizer que a amava antes do sol nascer.
Uma coisa de cada vez, Jaehyun. Ela não o responderia de volta, de qualquer maneira.
Ao surgir novamente no batente da porta, parecia a própria encarnação de uma deusa egípcia com o cabelo preso fracamente para cima e um pouco de suor ou água nos ombros. Ele paralisou diante daquele espectro encantador e esperou que ela andasse até a cama, subisse no colchão de joelhos e o desse mais um beijo, deixando-o pronto para qualquer outra coisa que ela propusesse.
Jaehyun guardaria vários detalhes daquela noite pelo resto do ano, principalmente pelo fato de ter se surpreendido com a garotinha assustada que tinha conhecido há meses atrás, revelando-se como uma mulher ardente e confiante.
Mas quando toda a adrenalina passasse, Jaehyun perceberia que cumpriu exatamente com o que disse na cozinha: não vou fazer amor com você. E assim, indo contra todas as suas convicções e princípios cultivados por uma vida inteira, Jaehyun teve uma das melhores noites de sua vida com uma mulher que não o amava.
E veria, com um pesar absoluto de realidade, que as duas coisas eram muito, muito diferentes.



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Nota da autora: Olá! É um prazer te ter aqui!
Seguinte: caso você tenha caído aqui de pára-quedas, a história começou no Filme I, uma fic linda, gostosa e esclarecedora. Visite esse surto AQUI caso você ainda não conheça.
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